Para configuração da denunciação caluniosa, é indispensável que os fatos atribuídos à vítima não correspondam à verdade e que haja certeza de sua inocência por parte do autor. Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça trancou ação penal contra um grupo de advogados de Santa Catarina.
Eles denunciaram à Ordem dos Advogados do Brasil irregularidades que teriam sido cometidas pelo juiz, com a concordância tácita do promotor, em audiência de julgamento de uma ação penal. A OAB comunicou os fatos à Corregedoria-Geral de Justiça e à Corregedoria do Ministério Público, que instauraram procedimentos disciplinares contra o juiz e o promotor, posteriormente arquivados “por ausência de indícios de prática de infrações”.
O juiz e o promotor ofereceram representação criminal contra os advogados por denunciação caluniosa. Ao fim do inquérito, a Polícia Civil concluiu pela inexistência do crime, mas mesmo assim o Ministério Público denunciou os investigados como incursos no artigo 339 do Código Penal.
Em Habeas Corpus impetrado no Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a defesa pediu o trancamento da ação penal com o argumento de que os advogados “apenas exerceram seu legítimo e constitucional direito de petição”. Negado o pedido, a defesa recorreu ao STJ.
Ciência da inocência
O relator do recurso, ministro Rogerio Schietti Cruz, observou que a denúncia não aponta circunstâncias capazes de levar à suposição de que os advogados tivessem narrado fatos falsos ou agido cientes da inocência do juiz e do promotor.
Segundo o ministro, a doutrina e a jurisprudência do STJ consideram imprescindível para a ocorrência da denunciação caluniosa que a imputação de crime seja objetivamente e subjetivamente falsa. Em outras palavras, além de a vítima ser inocente, o denunciante deve ter a inequívoca ciência dessa inocência.
Schietti reconheceu que o elemento subjetivo do crime de denunciação caluniosa não precisa estar comprovado já no início da ação penal. No entanto, além de estar mencionado na imputação, deve também ser dedutível dos próprios termos da denúncia.
Risco à advocacia
“Qualquer pessoa — advogado ou não — pode representar e pedir providência em relação a fatos que afirme ilegais ou que configurem abuso de poder. Só haverá crime se esse direito for exercido por quem, intencionalmente, falsear os fatos, ciente de que acusa um inocente”, disse Schietti.
Do contrário, continuou o ministro, haveria o risco de cercear o próprio exercício da advocacia, “que compreende a possibilidade de que eventual abuso de poder seja comunicado aos órgãos de representação classista ou mesmo aos órgãos correicionais do Poder Judiciário, sem o risco de reações punitivas”.
Os demais ministros acompanharam o voto do relator e consideraram ilegítima a ação penal. A turma concluiu que, “comparando-se o tipo penal apontado na denúncia com as condutas atribuídas aos denunciados”, não estão satisfeitos os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, necessários ao exercício do contraditório e da ampla defesa. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
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RHC 61334
Revista Consultor Jurídico, 29 de setembro de 2015, 17h27
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