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segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Mediação e Arbitragem terão PLs no fim de setembro



Por Elton Bezerra


As comissões de especialistas responsáveis pela revisão da Lei de Arbitragem e pela elaboração de uma Lei de Mediação farão uma apresentação conjunta das propostas no final de setembro. O cronograma foi acertado nesta sexta-feira (9/8) em encontro que deu início ao trabalho conjunto das comissões.

A notícia é boa para o mercado brasileiro. Especialistas em fusões e aquisições contaram à revista Consultor Jurídico que empresários estrangeiros têm adiado investimentos no Brasil por conta da insegurança gerada com as incertezas sobre a nova lei de arbitragem. Como os grandes contratos entre empresas e com o poder público trazem, quase que obrigatoriamente, a cláusula arbitral, os investidores têm esperado para saber como resolverão possíveis litígios.

“Produziremos dois textos de lei. Um vai trazer adequações à lei de arbitragem e outro versará sobre mediação”, afirmou o secretário da Reforma do Judiciário, Flavio Caetano. Ele está à frente da comissão responsável pela elaboração de uma lei sobre mediação. Criado por iniciativa do Ministério da Justiça, o grupo iniciou os trabalhos há cerca de um mês.

Segundo Caetano, os trabalhos baseiam-se em projetos de lei dos senadores Ricardo Ferraço (PMDB-ES) e Pedro Simon (PMDB-RS), no novo Código de Processo Civil em trâmite na Câmara, na Resolução 125 do CNJ além de legislações de outros países. Uma das mais consultadas pela comissão é a italiana.

Caetano afirmou que a lei terá três capítulos: princípios gerais da mediação, mediação judicial e mediação extrajudicial. À frente de cada uma das partes da lei está um coordenador: conselheiro José Roberto Neves, do CNJ (princípios gerais), ministra Nancy Andrighi, do STJ (mediação judicial) e ministro Marco Aurélio Buzzi (mediação extrajudicial).

A comissão conta com 16 membros especialistas na área de mediação e conciliação, como os professores Kazuo Watanabe, Teresa Wambier e Tania Almeida, o promotor Humberto Dalla, o juiz André Gomma entre outros.

Eles farão reuniões conjuntas com a comissão de juristas criada pelo Senado para elaboração de um anteprojeto de Lei de Arbitragem. A equipe é presidida pelo ministro Luis Felipe Salomão, do STJ.

Alternativas
Na avaliação de Flávio Caetano, há no país uma cultura do litígio, o que resulta em um excesso de processos. Segundo o CNJ são 90 milhões de causas em trâmite, que demoram em média dez anos para serem resolvidas. Como alternativa, o secretário da Reforma defende adoção métodos como negociação, conciliação, mediação e arbitragem.

“O Brasil hoje está bem em relação à arbitragem. Temos uma lei que funciona há 15 anos, mas não temos um marco legal sobre mediação”, afirma Caetano, que deu alguns detalhes de como funcionará o trabalho conjunto: “Como a comissão do Senado trata de arbitragem e de mediação privada, ela vai receber nosso texto e vai trazer suas criticas e sugestões”.

Apesar de trabalharem em conjunto, as comissões da Lei de Arbitragem e de Mediação farão textos próprios devido às características de cada método. “A mediação é autocompositiva, ou seja, as partes chegam a uma solução. Na arbitragem a decisão é dada por um terceiro, o árbitro. São institutos completamente distintos que devem ser tratados de maneira distinta”, explicou Flavio Caetano.

Elton Bezerra é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 9 de agosto de 2013

'Diferente da sentença, mediação restaura comunicação'



Por Alessandro Cristo


Sem o formalismo da Justiça ou o glamour da arbitragem, a mediação tem avançado como forma alternativa para solução de conflitos, ao pacificar e até restaurar relações contenciosas ou dadas como perdidas. Apropriada para casos em que são adversárias partes ligadas por laços familiares, societários ou condominiais, a mediação virou obrigação dos tribunais graças à Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça, editada em 2010. A norma determina que as cortes devem criar centros de conciliação e mediação — os Centros de Justiça e da Cidadania (Cejusc) — por onde devem passar processos com chances de acordo.

Só no estado de São Paulo já funcionam 57 Cejuscs, sendo dois na capital. Até o fim de 2013 serão instalados mais 41. Números da Justiça paulista mostram que 2.979 conciliadores e mediadores trabalharam, entre janeiro e novembro do ano passado, em 373.132 audiências pré e pós-processuais. O resultado foram 106.877 acordos fechados sem necessidade de sentença.

Compõem esse exército de mediadores pessoas de todas as formações, que trabalham gratuitamente com a responsabilidade de evitar que discussões se eternizem em processos judiciais. A experiência desses facilitadores é descrita na obra recém publicada pela editora Dash Uma outra verdade na mediação, da mediadora, psicóloga e terapeuta familiar Mirian Blanco Muniz. Com experiência de nove anos na área, seis deles no Fórum de Santana, na capital paulsita, ela narra no livro, por meio de um relato fictício em forma de romance, um caso com situações peculiares e descreve como os voluntários que conduzem esses encontros auxiliam na superação dos conflitos dos envolvidos, restabelecendo a comunicação entre eles.

“A mediação oferece uma maneira diferente de resolver conflitos, indo ao encontro da ideia de oportunidade de as pessoas acharem, por si próprias, as respostas para suas demandas, sem depender de uma sentença judicial que lhes seja imposta”, resume Mirian em entrevista concedida à ConJur. E cita frase repetida à exaustão pelo ministro aposentado Cezar Peluso enquanto era presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça: “A sentença põe fim ao litígio, mas só a mediação e a conciliação pacificam os litigantes”.

Psicóloga há 30 anos e casada com um juiz, Mirian teve suas primeiras experiências na solução de brigas judiciais no fim dos anos 1980 e início dos anos 1990, quando foi nomeada por juízes de Varas de Família para fazer perícias psicológicas, principalmente em ações de regulamentação de visitas e mudanças de guarda, em casos de separação de casais. Naquela época, apesar de a mediação já ser uma prática em países como os Estados Unidos, a Argentina e alguns países da Europa, ainda era incipiente no Brasil.

Hoje, a mediação é uma das prioridades da Secretaria de Reforma do Judiciário, que articula no Congresso Nacional a discussão do tema em conjunto com projeto de lei que revisa a atual Lei de Arbitragem. Desde 1998, o Projeto de Lei 4.837, que regulamenta a matéria, de autoria da ex-deputada Zulaiê Cobra (PSD-SP), aguarda aprovação no Congresso. A proposta passou na Câmara e no Senado, mas como sofreu alterações na segunda casa, teve de ser novamente votada na Câmara, o que ainda não aconteceu.

Leia a entrevista:

ConJur — Um dos motivos que atrai a atenção do poder público para a mediação é a possibilidade de redução do número de processos judiciais e do prazo para solução dos conflitos. A expectativa tem razão de ser?
Mirian Blanco — A mediação permite isso porque propõe outra forma de resolução dos conflitos sociais, diferente do formato judicial. A expectativa é que a sociedade possa contar também com essa maneira colaborativa, em que há a participação de um mediador. Hoje, a sociedade tem o Judiciário como referência para resolver seus problemas. E na era digital em que vivemos, os conflitos têm crescido em maior velocidade. Algo inadequado que se diga pode reverberar e aparecer do outro lado do mundo em minutos, o que pode desencadear ou ampliar uma discussão. A difusão das comunicações tem um lado bom e outro ruim. Esse é o lado ruim.

ConJur — Investindo-se em mediação, pode-se diminuir em quanto a litigiosidade?
Mirian Blanco — A mediação não vem com essa promessa de diminuição imediata das causas, mas permite à sociedade contar com essa forma de resolução ao longo do tempo. A sociedade fica mais consciente, mais madura e protagonista não só da construção dos seus próprios conflitos, mas também da sua resolução. Porque, na mediação, é restabelecida a comunicação entre as partes. Elas têm condições de identificar suas necessidades, seus interesses, que muitas vezes não são contemplados no processo judicial. As partes se sentem empoderadas. Durante o processo de mediação, com a facilitação do mediador, as partes vão se apropriando do próprio potencial para resolver seus conflitos.

ConJur — As pessoas ainda estranham o procedimento?
Mirian Blanco — Como a mediação é nova, em um primeiro contato, temos o dever de explicar do que trata a mediação, qual é sua função, qual o papel do mediador, com quem elas podem contar e as regras a que estarão se submetendo. Apesar de a mediação ser considerada um processo informal, existem princípios norteadores que o mediador tem obrigação de seguir. É um processo conversacional. Os mediandos normalmente chegam muito inseguros.

ConJur — Quais são esses princípios?
Mirian Blanco — Um é a voluntariedade tanto por parte dos mediandos quanto do mediador. O mediador, a qualquer momento, pode interromper o processo se perceber que as partes não estão conseguindo evoluir. As pessoas também podem interromper a qualquer momento e voltar para o processo judicial. A confidencialidade é outro princípio importantíssimo também, bem como a imparcialidade do mediador. Outro princípio é o da autodeterminação, a possibilidade de as próprias pessoas determinarem qual será a solução do seu conflito.

ConJur — Esse desconforto em relação à mediação se deve à referência que as pessoas têm do processo judicial?
Mirian Blanco — No processo judicial há uma fragmentação, é uma pessoa contra a outra, numa relação adversária. As pessoas são nomeadas “partes”. Já na mediação, são mediandos ou mediados.

ConJur — O Código de Processo Civil já prevê essa tentativa de resolver o conflito sem processo. Por que poucos casos vão à mediação?
Mirian Blanco — O Código fala em conciliação, que é um dos momentos de um processo judicial. Muitas pessoas confundem. Existem diferenças muito importantes. A mediação é indicada para causas familiares, societárias e de vizinhança, porque são casos de relação continuada, relações que têm uma história e que podem continuar. O conflito faz com que a relação fique alterada, a comunicação é interrompida. Se essas pessoas puderem se beneficiar de uma mediação e seguir seu caminho de modo melhor, ótimo. Já a conciliação é mais indicada para conflitos pontuais, como um acidente de carro, uma batida de trânsito. Eu conheci a pessoa que bateu no meu carro naquele momento. Nós não temos uma história pregressa.

ConJur — Quem se submete à mediação abre mão de resolver seu caso na Justiça?
Mirian Blanco — Não. A mediação é uma oportunidade. Caso as pessoas não continuem na mediação, até porque é algo voluntário, podem ir à Justiça. Depois que os mediandos sabem do que se trata a mediação, podem aderir ou não. Não teria sentido se fosse obrigatório. Precisamos contar com a boa vontade dos envolvidos, a crença de que aquele método tem o potencial para ajudá-los e que eles encontrarão em si próprios os recursos para uma solução.

ConJur — O advogado participa desse processo?
Mirian Blanco — Sim. O advogado é uma figura muito importante na mediação, mas tem uma função bem específica. No fórum, nós recebemos os mediandos e seus advogados no primeiro encontro, porque é muito importante que o advogado que não conheçe o processo de mediação passe a conhecer, é importante que ele saiba o que está sendo oferecido ao seu cliente. Ele é a figura de credibilidade do seu cliente. Depois, o mediador vai se tornando também uma figura de credibilidade. Então o advogado é informado de que, a partir do próximo encontro, está dispensado, porque o nosso enfoque, a voz que queremos ouvir, é a do cliente dele. O advogado entra na mediação quando surgem dúvidas técnicas. É quando são convidados a comparecer. E eles têm trazido participações importantíssimas, porque o mediador não pode dar orientações técnicas do Direito. Ele é um facilitador da comunicação.

ConJur — Daí a importância da Psicologia, no seu caso?
Mirian Blanco — Eu posso falar de mim. Minha experiência na Psicologia e com trabalhos voltados às famílias me ajuda muito na mediação, porque o psicólogo tem uma escuta muito desenvolvida, treinada, além de ter o cuidado com as palavras.

ConJur — Que abordagem psicológica adota em seu trabalho?
Mirian Blanco — Existem várias abordagens. Eu me baseio na sistêmica. Na minha trajetória, fui me especializando em terapia de família, e a abordagem sistêmica nos traz uma visão ampla. Uma ação de um familiar pode provocar diversas reações em todos os componentes da família e essas reações alimentam, de algum modo, essa reação primeira. Um olhar sistêmico é o mais confortável para trabalhar porque a pessoa não está sozinha no mundo, ela vive em família, vive em sociedade.

ConJur — A mediação restaura relações?
Mirian Blanco — Esse é o nosso dia a dia. As pessoas entram muitas vezes sem sequer conseguir se olhar. Quando chegam, orientamos que o processo vai ter regras que elas terão de seguir. A primeira é o respeito, a cordialidade. Não são permitidas acusações ou agressões. Ali é um espaço de conversa. A prioridade é resgatar a comunicação. Não estamos acostumados, na nossa sociedade, a conversar. Ouvir, depois falar. As pessoas se atropelam. Um casal que está brigando na Justiça, na mediação é treinado a conversar. O mediador é o maestro dessa orquestra. Ele não está nem acima, nem abaixo dos mediandos. Está junto, mas com o dever de coordenar aquele processo.

ConJur — O advogado com formação processualista atrapalha ou ajuda nesse momento?
Mirian Blanco — O mediador tem que levar em consideração que há muito desconhecimento e que a formação do advogado é para brigar pelo seu cliente. À medida que demonstramos como é o sistema, eles têm atitudes muito participativas e percebem que vão poder executar seu papel, só que no momento em que for necessário, quando todos concordarem.

ConJur — O que o advogado ganha levando o processo para a mediação?
Mirian Blanco — Ele ganha a longo prazo. Hoje muitas faculdades já têm em seu currículo a matéria de meios alternativos de resolução de conflitos. Delas já saem advogados com uma formação um pouco mais ampla. O advogado pode ser litigante para aquele cliente que assim o deseja, mas também pode ser um mediador. Ou seja, ele é procurado por um cliente e convida a outra parte para ver se os dois querem percorrer o caminho da mediação. Ele estará sendo remunerado como mediador. As partes podem entrar em um acordo, que pode ser cumprido sem a homologação de um juiz. É possível também que o acordo seja levado para ser homologado. As partes entram em acordo e os advogados elaboram um termo, que é levado para o juiz homologar.

ConJur — Existem câmaras especializadas em mediação?
Mirian Blanco — Existem. Há, inclusive, câmaras de arbitragem que incluem a mediação antes da arbitragem.

ConJur — Qual tem sido o apoio do Judiciário à ideia?
Mirian Blanco — O CNJ [Conselho Nacional de Justiça] editou a Resolução 125, que diz que todos os tribunais têm que desenvolver um núcleo para estruturar os Centros Judiciários de Cidadania. Essa resolução faz constar a necessidade de computar resultados. O cidadão se dirige ao centro judiciário gratuitamente e pode passar pela mediação ou pela conciliação. Mas não é em todos os fóruns que existem setores de mediação e conciliação.

ConJur — Em qual trabalha?
Mirian Blanco — No Fórum de Santana, em São Paulo, uma vez por semana. Trabalho lá desde 2007. O setor de mediação foi instalado no Fórum de Santana em 2004. Passamos agora por uma transição importante, porque muitos dos fóruns que têm setores de mediação em suas instalações passarão a contar com algum centro judiciário à disposição. Já temos um na Barra Funda, inaugurado em 2011. Não se sabe se isso será centralizado ou se a estrutura atual será mantida.

ConJur — Quanto tempo dura uma mediação?
Mirian Blanco — No formato que usamos no Fórum de Santana, pode levar entre quatro e seis encontros, feitos a cada 15 ou 20 dias. Às vezes são necessários mais encontros, dependendo do caso. É bom que as pessoas tenham um espaço entre cada encontro para que a conquista obtida em um dia tenha tempo de ser posta em prática. O processo ainda tem a possibilidade de ficar suspenso por três meses, prorrogáveis por mais três.

ConJur — E quem controla isso?
Mirian Blanco — O juiz sabe. É ele quem encaminha o processo para o setor de mediação. As partes aderem e assinam um termo. Esse termo é enviado para o processo. Nós não temos contato com o processo, nem com o juiz. A única coisa que recebemos é um papel que diz onde corre o processo, qual seu número, sua vara, o tipo de ação, os nomes das partes e os nomes dos advogados.

ConJur — Qual é a taxa de efetividade dos acordos?
Mirian Blanco — É relativo. Já ouvi muitos juízes dizerem que mesmo quando as pessoas não chegam a um termo e voltam ao processo judicial, já estão muito sensibilizadas para um acordo. Mas pela minha experiência, há acerto em 70% ou 75% dos casos. O objetivo principal da mediação não é o acordo, mas sim a mudança na relação, o restabelecimento da comunicação dos envolvidos num conflito. Isso significa que o acordo ou falta de acordo não é em si representativo.

ConJur — Como é a mediação fora do Brasil?
Mirian Blanco — Os Estados Unidos estão muito à nossa frente, copiamos muitas coisas deles. Em alguns países, como o Canadá, as pessoas, quando vão buscar o Judiciário, primeiro têm de passar por uma mediação ou conciliação, obrigatoriamente. Isso ocorre em algumas cortes. Mesmo aqui no Brasil, quando o juiz encaminha para o setor de mediação, é obrigatório. O que não é obrigatório é as pessoas participarem, aderirem. Na Argentina, por exemplo, a mediação está mais avançada que no Brasil. Eles têm levado a mediação para as escolas, capacitando os alunos para que se voluntariem para ser mediadores. Diante de um conflito, exercem essa função. Um estudo mostra que a violência em uma determinada escola de Buenos Ayres caiu 80% depois que essa solução foi implantada, como comentado pela mediadora Helena Mandelbaum em entrevista recente. É um caminho promissor. Tem uma frase no meu livro que fiz questão de colocar: eu acredito no potencial do ser humano para se envolver nos conflitos, mas existe também dentro de cada ser humano um grande potencial para resolvê-los. É preciso responsabilidade, é necessário se sentir partícipe dessa construção. Enquanto se está apontando o dedo para culpar o outro, não se assume a sua parcela de responsabilidade. Quando quem faz o acordo é quem vai cumpri-lo, a probabilidade de sucesso é muito maior.

ConJur — Essa necessidade de um juiz para decidir uma causa tem relação com a demanda contínua das pessoas por leis e regras que resolvam problemas que dependem apenas de bom senso. Como emancipar a sociedade e fazê-la andar com as próprias pernas?
Mirian Blanco — Esse é um processo lento. A sociedade, e cada pessoa inserida nela, precisa se conscientizar da responsabilidade que tem. Esses norteadores que vêm de cima para baixo chegam por serem necessários em um determinado contexto ou em um determinado momento histórico. O que desenvolvemos na mediação pode-se levar para outros contextos na sociedade. As pessoas devem perceber que são protagonistas nos conflitos. Quando isso acontece, tem-se outro olhar. Na mediação, é a voz das partes que tem força.

ConJur — Há disputas que não podem ser resolvidas pela mediação?
Mirian Blanco — Existem aquelas que somente uma sentença pode pôr fim. Mas a sentença põe fim ao litígio e não necessariamente ao conflito. Na mediação, precisamos de pessoas com boa-fé e que acreditem que possam se inserir naquele contexto. Mas se elas não querem, só uma sentença pode encerrar a discussão.

ConJur — Qual o interesse das pessoas em ser mediadoras?
Mirian Blanco — Eu participo de cursos de capacitação de mediadores pela Escola Paulista da Magistratura. Dou algumas palestras em São Paulo, na capital e no interior, e tenho visto cada vez mais interessados. Dei uma palestra no ano passado para 160 alunos presenciais e 2 mil online. São pessoas de várias formações: Direito, Psicologia, Assistência Social... A formação original não limita. Qualquer pessoa pode ser mediadora.

ConJur — Os juízes têm participado também?
Mirian Blanco — Sim e isso é importantíssimo, porque uma das expectativas é que o juiz, além do papel de magistrado, possa ser um gerenciador do processo, no sentido de pegar um caso e ter o discernimento de enviar para a mediação se avaliar que isso possa beneficiar as partes. Esses cursos trazem muitos esclarecimentos para os magistrados.

ConJur — Como você compara a mediação de ontem e de hoje? Mirian Blanco — A mediação vem se inserindo no Brasil há 20 anos. Alguns profissionais brasileiros entraram em contato com trabalhos desenvolvidos nos Estados Unidos e começaram a se interessar. Capacitaram-se fora do país e trouxeram esses cursos para cá. Eu me capacitei mediadora em 2004, no Instituto Familiae.

ConJur — Algum caso em especial lhe marcou?
Mirian Blanco — Não poderia citar um caso real porque um dos princípios da mediação é o sigilo. Mas lembro de uma experiência que tive com um casal que, há uns quatro anos, entrou com uma ação de regulamentação de visitas e foi encaminhado para a mediação. Tinham um filho de dez anos e aderiram à mediação. Estavam caminhando conosco muito bem, o pai já estava conseguindo pegar o filho aos fins de semana, a mãe estava aceitando mais bem. Antes, ela impedia essas visitas com todas as suas forças. O pai teve de entrar com a ação. Até que em um determinado encontro de mediação, chegaram os dois com uma fisionomia que denunciava que alguma coisa havia acontecido. Sempre perguntamos antes de tudo como é que estão caminhando as coisas. Ela disse que estava muito contrariada porque no último contato que o filho teve com o pai, ele chegou com um celular de presente. A mãe, na mesma hora, diante da alegria da criança, pegou o celular, jogou no vaso sanitário e deu descarga. Perguntei por que ela teve essa atitude, como ela viu esse presente. Lidamos muito com significados em mediação, por isso a pergunta. Ela disse que, na hora, perguntou ao filho: “Quem é que mede a sua febre nas noites em que você está doente? Quem é que foi na semana passada na reunião de pais e mestres, quando a sua escola convocou? E quem que te ajudou ontem a fazer uma redação, quando você estava com dificuldade?” Nessa hora, o mediador sente também. Foi uma agressão moral à criança. Só que nós somos técnicos, temos que gerenciar nossas emoções para não entrar nesse contexto destrutivo. Então, eu perguntei a ela: “Quando você fez essas perguntas para o seu filho, o que você esperava que ele respondesse?” Ela começou a chorar, dizendo que tinha muito medo de perder o amor do filho porque o pai tinha uma condição financeira melhor do que a dela, e essa situação de permitir as visitas aumentou esse medo. O celular foi um símbolo dessa ameaça.

ConJur — Por que esse caso marcou?
Mirian Blanco — Porque a gente vê muitos mediadores com dúvidas em relação a essas situações, em que o mediador se sente afetado. Eu já escrevi um capítulo de um livro dizendo que concordo com a imparcialidade, mas neutralidade no sentido de afetações, é impossível. Esse caso me marca porque mostra como as perguntas são preciosas. Nós somos técnicos em comunicação e temos nossas ferramentas para trabalhar. Se pudermos fazer uma pergunta que os mediandos ainda não se fizeram, podem surgir respostas muito diferentes das que eles têm buscado.

ConJur — E como terminou nesse caso específico?
Mirian Blanco — Quando a mãe disse que tinha medo de que o filho escolhesse o pai, o pai falou: “Mas não é essa a minha intenção. Eu considero você uma mãe muito adequada. A única coisa que quero é poder conviver com o meu filho e ampliar cada vez mais o meu convívio com ele, porque ele precisa de uma mãe e de um pai.” Esse assunto é tratado no livro.

ConJur — A maioria dos casos de mediação é da área de família?
Mirian Blanco — Não. No próprio Fórum de Santana existe a mediação empresarial, feita por mediadores especializados nessa área. A mediação é muito eficaz nas áreas de família, empresarial, vizinhança, condomínio etc.

ConJur — O que seu livro traz de contribuição para esclarecer a mediação?
Mirian Blanco — Ele narra um caso fictício, mas é pautado em toda a minha experiência como mediadora. Descrevo uma mediação com começo, meio e fim. Descrevo a função da mediação, do mediador, a participação dos advogados e discrimino a importância da co-mediação, que são dois mediadores trabalhando juntos. Existem várias composições interessantes de mediadores. Há, por exemplo, a composição visando a diferença de gênero, um homem e uma mulher. Isso é importante dependendo do conflito a ser resolvido. Às vezes uma pessoa se sente mais à vontade se dirigindo a um homem ou a uma mulher. Outra composição é de dois mediadores, um mais experiente e outro menos experiente. Dessa forma se compartilha experiências com quem está iniciando. E há mediadores com formações diferentes e, portanto, olhares diferentes.

ConJur — O interessado em mediação pode pedir mediadores com o perfil que mais lhe agrade?
Mirian Blanco — Posso falar do fórum onde trabalho. Lá, os mediadores trabalham em dias específicos. Se a pessoa quiser saber quem está naquele dia, ela pode. Os mediadores são cadastrados, cada um tem sua pasta, que é aberta à população. Qualquer um pode procurar a pasta daquele mediador para ver sua formação. Mas a formação dos co-mediadores varia muito. Hoje eu posso estar com um, amanhã com outro.

ConJur — Se meu caso caiu com um mediador, será ele quem deverá conduzi-lo até o fim?
Mirian Blanco — Até o fim, e isso é importantíssimo, por conta do vínculo que vai se estabelecendo.

ConJur — É o seu primeiro livro?
Mirian Blanco — Que tenha escrito sozinha, sim. Antes, participei da obra coletiva Mediação no Judiciário – Teoria e Prática, editado pela Primavera Editorial, coordenado por Claudia Grosman e Helena Mandelbaum e escrito por nove autores. A obra é prefaciada pelo ministro Cezar Peluso, hoje aposentado do Supremo Tribunal Federal, com apresentação da ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça. Na minha contribuição, falo sobre a emoção do mediador no processo de construção da mediação.

ConJur — Quanto tempo levou para escrever Uma outra verdade na mediação?
Mirian Blanco — Oito meses. Eu ofereci esse livro para duas mestres da mediação. Uma é Vânia Yazbek, que fez o prefácio e é uma grande referência da mediação em São Paulo. Outra é Verônica Cezar Ferreira, advogada, psicóloga e mediadora. Elas são referências muito importantes na mediação, e me incentivaram a publicar.

Alessandro Cristo é editor da revista Consultor Jurídico

Revista Consultor Jurídico, 18 de agosto de 2013

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

SISTEMAS JUDICIÁRIOS BRASILEIRO E NORTE AMERICANO - Breve análise comparativa



RESUMO



Este trabalho apresenta noções tópicas sobre o Direito nos EUA, o seu sistema judicial, sua estrutura e dinâmica processual, cotejando-se alguns pontos de relevo com o sistema judiciário brasileiro e, nesse processo dialético, propõe-se a destacar algumas práticas judiciais e administrativas de ambos os sistemas.



1. OBSERVAÇÕES PRELIMINARES SOBRE O DIREITO NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. ESTUDO E PRÁTICA. FONTES.



O estudo do Direito[1]nos EUA, oriundo da tradição do povo anglo-saxão[2], está fincado na idéia dos precedentes (Common Law). É curial que o sistema judicial norte-americano incorpora a cultura da análise dos casos concretos julgados, diversamente do Civil Law adotado no Brasil, de origem romanística, que cultua o texto legislado, embora atualmente estejamos vivendo o fastígio da jurisprudência. A norma legislada também tem sido mais utilizada no regime do Common Law. Essa influência recíproca dos dois sistemas deriva inelutavelmente do intercâmbio sócio-cultural de economias globalizadas.



A primeira pergunta que o estudioso do Direito faz sobre o sistema norte-americano é como aplicar o direito aos casos analisados diante de esparsos repertórios jurisprudenciais de forma racional. A priori, infere-se que o volume de informações a serem esmiuçadas para encontrar determinado argumento jurídico obrigará uma pesquisa mais aprofundada. Também é mister uma boa dose de inteligência para apresentar um pensamento jurídico consentâneo com os fatos e teses jurídicas erigidas nos precedentes citados no processo. Importa destacar que esse método de argumentação não prescinde, de todo, da invocação de leis e regulamentos existentes naquele país.



De forma aligeirada e superficial, pode-se dizer que enquanto o estudioso do sistema norte-americano procura construir racionalmente seus argumentos a partir dos precedentes judiciais, quem se habilita a extrair soluções jurídicas no sistema brasileiro deve estar sempre às voltas com uma pletora normativa e teorias jurídicas.



Outra particularidade estadunidense é que se deve primar desde os primeiros trabalhos jurídicos pela objetividade e concisão. Uma das orientações dadas aos alunos do curso de Direito nos EUA é para “evitarem palavras e construções gramaticais muito sofisticadas. É limitado o número de palavras e consequentemente de páginas.”[3] Esse método de ensino produz reflexos na prática judiciária, pois os Tribunais norte-americanos podem até limitar o número de folhas das petições e arrazoados.[4]

Nas universidades americanas o estudo do Direito é pautado pela análise de casos com a síntese dos fatos, as questões jurídicas levantadas e a conclusão. Esse método é reproduzido também na vida profissional daqueles que seguem a carreira jurídica.

O direito norte-americano tem suas fontes, que são classificadas em primárias e secundárias. Consideram-se primárias ou de aplicação obrigatória as Constituições federais e estaduais, leis, regulamentos e precedentes de Tribunais da mesma jurisdição. As fontes secundárias ou não-vinculantes são as decisões de Tribunais com jurisdição diversa, doutrina e direito comparado.



2. ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA NORTE-AMERICANA



A Constituição dos EUA trata da organização judiciária, dispondo que“O Poder Judiciário dos Estados Unidos será investido em uma Suprema Corte e tribunais inferiores que forem oportunamente estabelecidos pelo Congresso...”[5]. Não há indicação no seu texto de outros tribunais inferiores, matéria que é da alçada legislativa do Congresso. Somente a Suprema Corte mereceu envergadura constitucional. Na Constituição brasileira, por seu turno, há minuciosas regras acerca da organização judiciária federal e estadual, inclusive quanto à composição e competência.



A organização judiciária norte-americana também alberga a dualidade de justiça: federal e estadual. A justiça federal é constituída da seguinte forma: 1) Cortes de 1ª. instância(Federal District Courts); 2) Corte de Apelação Federal, com jurisdição regional (United States Circuit Courts of Appeal), aproximando-se do modelo brasileiro de Tribunais Regionais Federais[6] ; 3) Suprema Corte. Os juízes federais, assim como os juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos, são escolhidos pelo Presidente da República, sujeitos à confirmação pelo voto majoritário do Senado Federal. A eles é assegurada a prerrogativa da vitaliciedade e não há aposentadoria compulsória pelo implemento da idade.



A jurisdição federal é estabelecida para as causas que versam sobre lei federal(ex. lei federal de marcas de patentes), conflitos entre estados ou mesmo com governos estrangeiros. Também decorre das pessoas em conflito, como p. ex., entre cidadãos residentes em Estados diferentes.



No âmbito estadual, existem as Cortes de 1º. Grau(State Court), os Tribunais intermediários(State Court of Appeals), uma Suprema Corte estadual e a Suprema Corte dos EUA. Em alguns estados da federação não há Tribunais intermediários, de modo que da decisão das Cortes de 1º. Grau o recurso é endereçado à Suprema Corte Estadual. Os juízes estaduais, em regra, são selecionados através de eleição popular[7] ou mesmo pelo Governador e têm mandato.



Os candidatos à magistratura, seja no âmbito federal, seja no âmbito estadual, geralmente são advogados destacados com muitos anos de experiência. Vê-se, também, que é comum às duas carreiras (federal e estadual) a escolha pelo Chefe do Executivo(Presidente da República e Governadores), quando não através de eleição para os estaduais. Não há falar em concurso público para a magistratura americana, pois a legitimação do juiz é política.



O fenômeno da especialização está presente na jurisdição estadunidense. Há Cortes Estaduais especializadas em família e trânsito e Cortes Federais que cuidam das lides fiscais. Não há, entretanto, segmentos do Judiciário trabalhista e eleitoral, cuja competência é definida em razão da norma desrespeitada ser estadual ou federal. Por outro lado, emerge um judiciário militar, com dois graus de jurisdição(Cortes Marciais e Corte de Apelação Militar – 1ª. e 2ª. instâncias respectivamente), podendo o caso ser alçado à Suprema Corte.



Merece registro a rigorosa filtragem dos processos que são admitidos à análise da Suprema Corte dos EUA. Noticia-se que são julgados menos de 100(cem) casos por ano. Isso sem falar que sua competência originária é muito reduzida, limitando-se basicamente aos casos que envolvem embaixadores e representantes diplomáticos, ou nos litígios em que os Estados Unidos sejam parte ou mesmo um Estado da federação. Não se pode dizer o mesmo em relação ao Supremo Tribunal Federal, que detém vastíssima competência originária e somente mais recentemente, por força de emenda constitucional que instituiu a repercussão geral, tem sido mais seletivo na subida dos recursos extraordinários



O Judiciário dos EUA é o gestor de suas atividades e do seu próprio orçamento. Tem sua própria disciplina normativa interna e não se sujeita à interferência dos outros Poderes. Entretanto, observa os parâmetros legais do Executivo em relação às finanças e administração de bens. Existem três órgãos administrativos no âmbito do Poder Judiciário estadunidense: 1) Administração dos Juízos dos Estados Unidos (Administrative Office of the U.S. Courts), que cuida da folha de pagamento, equipamentos e consumo; 2) Centro Judiciário Federal(Federal Judicial Center), responsável pelo treinamento dos juízes e funcionários das cortes, bem como pelas pesquisas relativas à administração da justiça; 3) Comissão de Sentenças dos Estados Unidos (U.S. Sentencing Commission), que apresenta diretrizes consultivas aos juízes federais.[8]

Em matéria de Administração Judiciária os americanos deram um grande salto de qualidade. Os profissionais que auxiliam o Judiciário no âmbito administrativo são submetidos à constante qualificação, até porque a evolução da organização implicou a necessidade de sofisticação do gerenciamento. Foram criadas instituições incumbidas da administração judiciária, com foco na gestão, pesquisa e treinamento.



Outra diferença marcante entre a justiça brasileira e a norte-americana apresenta-se no Júri. No Brasil, somente são julgados nesse juízo os crimes dolosos contra a vida[9], ao passo que, nos EUA, o direito ao júri é assegurado na Constituição[10] para todos os crimes, exceto os de responsabilidade. Ademais, as partes podem, na esfera cível, optar pelo julgamento pelo Júri ou pelo Juiz singular.



A solução dos conflitos através de métodos alternativos[11], como a arbitragem[12] e mediação é bastante propalada naquele país, o que confere maior celeridade, bem como desafoga a justiça estatal. Em um país onde viceja a funcionalidade e o perfil pragmático dos profissionais da área jurídica é natural que essas técnicas extrajudiciais tenham obtido aprovação de todos, inclusive e principalmente do maior interessado: os jurisdicionados.



3. O JUIZ, AS PROVAS E O PROCESSO NOS EUA E NO BRASIL



Ao juiz norte-americano não é dado preocupar-se com a colheita das provas. Essa atividade é extrajudicial e compete exclusivamente às partes fazê-lo, arcando inclusive com os custos.



Diversamente, no Brasil, as provas são judicializadas e o juiz deve conduzir o processo, aceitando ou recusando as provas apresentadas, fundamentando cada decisão, enfim presidir toda a dialética em torno da instrução processual. É o que se dessume do art. 130 do Código de Processo Civil.



Assim, enquanto no Brasil há um protagonismo do juiz em toda instrução, nos EUA a passividade é inerente ao trabalho do magistrado, ou seja, a busca da verdade real depende do conduzir-se das partes no caso. Registre-se, porém, que, nas ações coletivas, os juízes americanos exercem mais controle na atuação das partes, uma vez que outras pessoas que não integram a relação processual poderão ser atingidas com a decisão.



Nesse aspecto, impende reconhecer que há muito que aprender com os americanos em matéria de dinâmica processual voltada a resultados mais céleres e efetivos na prestação jurisdicional, em especial a colheita extrajudicial de provas pelas próprias partes. É cediço que, no Brasil, a fase instrutória tem sido um dos principais gargalos que provocam a morosidade. Se fosse delegado às partes o papel de municiar-se de todo o aparato probatório necessário em alguns casos, observando-se a legislação pertinente, decerto muitos processos poderiam ter seus julgamentos abreviados.



Nos casos cíveis, qualquer cidadão pode exercer o jus postulandi no sistema norte-americano, embora isso não seja comum, dada a complexidade do procedimento.[13] A petição deve ser escrita e deve conter a causa de pedir e o pedido. A falta de defesa resultará na procedência do pedido. A resposta contém uma parte técnica, com argumentos de cunho processual(ex. competência) e o mérito propriamente dito. A atividade instrutória é denominada discovery, realizada pelos advogados das partes, que abrange depoimentos, interrogatórios, provas documentais e perícias. Após coligidas todas as provas, as partes requerem o julgamento, fixando os pontos controversos e os não controversos. O julgamento pode ser antecipado pela conciliação.



Assim como no Brasil, também participa do processo civil o Ministério Público na condição de custos legis, bem como na propositura de ações voltadas à tutela de interesses difusos e coletivos.



4. OBSERVAÇÕES FINAIS



Após estudos e pesquisas acerca do Judiciário norte-americano, cotejando-o com a realidade brasileira, pode-se arriscar algumas observações:



a) É discurso reiterado que o Judiciário brasileiro passa por grave crise, em especial de celeridade, efetividade e segurança jurídica. O sistema judiciário norte-americano, como qualquer criação humana, também tem suas falhas e dificuldades, mas é imperioso reconhecer que tem aspectos na sua funcionalidade que poderiam ser mais experimentados no Brasil, como, por exemplo, as soluções alternativas dos conflitos fora do aparelho estatal e a atividade instrutória extrajudicial. De qualquer forma, o protagonismo dos Juizados Especiais já sinaliza o viés conciliatório. É certo, porém, que a presença de outros profissionais(psicólogos, assistentes sociais, etc) nas varas judiciais poderiam contribuir sobremaneira para arrefecer a beligerância dos litigantes.



b) A administração da justiça nos EUA merece de há muito toda atenção. Existem órgãos fundados para cuidar essencialmente das técnicas de gestão, pesquisa e treinamento, sendo que os cursos de aprimoramento são em regra de administração judiciária. Se no Brasil somente há pouco tempo esse assunto tem ocupado o debate nos principais cenários jurídicos, naquele país já lidera o nicho judiciário. Assim, uma maior interlocução parece necessária, especialmente em matéria de administração judiciária.



c) O modelo federal é muito assemelhado ao brasileiro, seja na distribuição de competências, seja na gestão administrativa. Merece destaque o Centro Judicial Federal, que cuida da pesquisa sobre administração judiciária e promove treinamento de juízes, dentre outras atribuições. Penso que muitos desses avanços alcançados naquele país poderiam ser aproveitados nas Escolas Nacionais de Magistratura, em especial as pesquisas voltadas às demandas de massa, seara na qual o Brasil tem matéria prima de sobejo para ser estudada pelos americanos.





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS





1. ALVAREZ, Anselmo Prieto; NOVAES FILHO, Wladimir. A Constituição dos EUA anotada. São Paulo: LTr, 2001.

2. ANDRIGHI, Fátima Nancy. Estrutura e Dinâmica do Poder Judiciário Norte-Americano: aspectos de composição judicial e extrajudicial dos litígios. Disponível em: HTTP://bdjur.stj.gov.br/jspui/ bitstream/2011/1538/4/Estrutura_Din%C3%A2mica_Poder.pdf. Acesso em: 24-03-2009, 20h02 min.

3. ATAIDE JÚNIOR, Vicente de Paula. O Sistema Judiciário e a Administração da Justiça dos Estados Unidos da América.Revista CEJ/CJF N. 33. Brasília:CEJ, junho/2006.

4. BARROSO, Luis Roberto. A Revolução da Brevidade. Disponível em:www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=65100. Informativo Jurídico On line. Acesso em: 20-03-2009, 18 h 06 min.

5. CASTRO JÚNIOR, Osvaldo Agripino de. A Relevância do Direito Comparado e Direito e Desenvolvimento para a Reforma do Sistema Judicial Brasileiro. Revista de Informação Legislativa N. 163. Brasília: Senado Federal, setembro/2004.

6. DAVID, René. Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo.3ª. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

7. FREITAS, Vladimir Passos. Juiz Pode Delimitar Tamanho das Petições. Disponível em www.conjur.com.br/segunda-leitura-juiz-nao-receber-peticao-tamanho-livro. Revista Consultor Jurídico, Acesso em 20-03-2009, 17h44 min.

8. MESSITE, Peter J. A Administração da Justiça Federal nos Estados Unidos da América(The Federal Justice management in the United States of America). Revista CEJ/CJF N. 24. Brasília: CEJ, março/2004.

9. ROSA, Alexandre Morais. Aspectos Destacados do Poder Judiciário Norte-Americano.Disponível em:www.oneofito.com.br/artigos/art01/inter23.htm. Acesso em 08-04-2009, 10h50min.

10. SAMPAIO, Rômulo S. R. Breve Panorama do Ensino e Sistema Norte-Americano.Disponível em :www.ibrajus.org.br/revista/artigo.asp?idArtigo=20 . Revista On line. Acesso em 18-03-2009, 19h10min.

11. SANTOS, Josaphá Francisco dos. Breve Análise Comparativa do Sistema Jurídico Brasileiro e do Norte-Americano. Revista do TRF- 1ª. Região N. 04, Ano 14, Brasília:TRF1, 2002.

12. SILVA, Ricardo Perlingeiro Mendes da. O Poder Judiciário Norte-Americano. Informativo ADCOAS Doutrina No. 3, Rio de Janeiro, 1999.










[1] A diplomação em Direito nos EUA é em nível de pós-graduação, de modo que o estudante deve cursar quatro anos na universidade antes de ingressar no curso de Direito. Para o exercício da advocacia também há previsão de um exame de Ordem(Bar examination) que o credencia a essa atividade.


[2] Com a independência americana e a consequente autonomia do direito, chegou-se a ensaiar iniciativas de codificação após a Constituição, como ocorrera no território de New Orleans(convertido no Estado de Louisiana em 1812), que aprovou um Código Civil em 1808.


[3] SAMPAIO, Rômulo S. R. Breve Panorama do Ensino e Sistema Norte-americano. Disponível em: www.ibrajus.org.br/revista/artigo.asp?idArtigo=20 . Revista On line. Acesso em: 18-03-2009, 19h10min.


[4] A propósito da necessidade de petições mais enxutas na atual quadra judiciária, oportuna a leitura de recentes artigos dos professores Vladimir Passos de Freitas (Juiz pode delimitar tamanho das petições. Disponível emwww.conjur.com.br/segunda-leitura-juiz-nao-receber-peticao-tamanho-livro. Revista Consultor Jurídico, Acesso em 20-03-2009, 17h44 min.) e Luis Roberto Barroso (A Revolução da Brevidade, Disponível em:www.migalhas.com.br/mostra_noticia_articuladas.aspx?cod=65100. Informativo Jurídico, Acesso em: 20-03-2009, 18 h 06 min.


[5] Art. 3º., Seção I, da Constituição dos EUA.


[6] Didática a explicação de Peter J. Messite(A Administração da Justiça Federal nos Estados Unidos da América(The Federal Justice management in the United States of America). Revista CEJ/CJF N. 24. Brasília: CEJ, março/2004, p. 6): “Temos um sistema de tribunais federais semelhante ao brasileiro, com juízos de primeira instância(cortes distritais), tribunais de apelação regionais e, no topo de pirâmide, a Suprema Corte dos Estados Unidos. Não contamos com nada equivalente ao Superior Tribunal de Justiça, uma vez que todos os assuntos constitucionais e questões referentes às leis ordinárias federais são julgados pela Suprema Corte”


[7] Nesse ponto, penso que a experiência brasileira de recrutar seus magistrados através de concurso público de provas e títulos é a mais acertada para a nossa realidade, além do que prestigia o mérito e a imparcialidade.


[8] Há similitude da organização judiciária federal daquele país com o Brasil. Ainda esclarece Peter J. Messite, ob. cit., p. 6/7): “o principal órgão do Judiciário Federal é a Conferência Judicial dos Estados Unidos, que estabelece políticas administrativa e legislativa da Justiça Federal. O Presidente da Suprema Corte é o Presidente da Conferência, composta pelos presidentes de cada tribunal regional, um juiz de primeira instância eleito por cada tribunal regional e o juiz presidente do Tribunal de Comércio Internacional...Existem doze tribunais regionais federais. Em cada região geográfica há um Conselho Judicial, que supervisiona a administração das cortes da região conforme as decisões da Conferência Judicial...A responsabilidade do dia-a-dia da administração judicial fica a cargo das 94 cortes distritais...Cada corte distrital tem um juiz diretor do foro, que além de atuar nos processos, tem responsabilidade administrativas relacionadas às operações da corte.”


[9] Art. 5º., inc. XXXVIII, da CF.


[10] Art. 3º., Seção II, 3, da Constituição dos EUA.


[11] Muito propalada a ADR(Alternative Dispute Resolution), que é uma forma de solução de conflitos em procedimento prévio de conciliação, no qual o juiz realça, dentre outras vantagens, a ausência de custas e de perdedor, bem como abreviação do tempo do processo.


[12] A arbitragem difere da mediação na medida em que naquela o árbitro decide o conflito, ao passo que nesta o papel do mediador revela-se na habilidade em promover uma negociação.


[13] No processo penal, o acusado que não puder arcar com o patrocínio de um causídico será representado por defensor público ou mesmo advogado designado pelo juiz.

Juiz Federal. Especialista em Direito Constitucional(UFPI) e Mestre em Direito(UFPE).

Fonte: IBRAJUS

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Meios alternativos de solução de litígios



Renata Helena Paganoto Moura


Mestre em Direito pela PUC/SP, Professora dos Cursos de Especialização em
Direito Civil e Direito Processual Civil da Consultime-ES e da AMAGES,
Professora da Pós-graduação em Processo Civil da PUC/SP
Professora de Direito Civil, Processual Civil e Prática Jurídica Extrajudicial da FACCAMP,
Diretora da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial da Associação Comercial de Campo Limpo Paulista,
Advogada.



SUMÁRIO: Introdução. 1 Trabalhando o conceito "meios alternativos de solução de litígios". 2 Conciliação 2.1 Conciliação e transação 2.2 Objeto da conciliação: direitos patrimoniais disponíveis 2.3 Classificação da conciliação: conciliação judicial e extrajudicial 3 Arbitragem 3.1 A formação do processo arbitral 3.2 A sentença arbitral e seus efeitos 3.3 Os meios de impugnação à decisão arbitral 3.4 Ação de nulidade de ato jurídico 4 Mediação 4.1 Institucionalização da mediação 5 Comissões de Conciliação Prévia 6 Negociação; Conclusão; Referências Bibliográficas.


Introdução


É pouco comum uma visão do Direito que não o veja através de seu aspecto litigioso e sendo assim através de seu método judicial de solução de conflito, o processo, e através de seus personagens, o juiz, o promotor, o advogado, o autor, o réu.

Mas o direto não é só conflito, e nem todo conflito exige como única possibilidade de solução a judicial.

Apresentar o Direito de uma forma menos litigiosa, dar a mesma importância a disciplinas como filosofia, sociologia, psicologia, entender que o direito material é efetivamente desvinculado do direito adjetivo - não se ensina direito civil para ajuizar uma ação, não se ensina direito do trabalho para se propor uma Reclamação -, e compreender que a solução de um conflito não deságua necessariamente no Poder Judiciário, são os desafios que devemos empreender na formação do profissional do direito.

Desse último aspecto cuida esse trabalho. Dos meios alternativos de soluções de conflitos.

Nem todo conflito exige como única solução a judicial. Temos cada vez mais a possibilidade de soluções extrajudiciais, como também cada vez mais temos o processo como um meio conciliador e não apenas julgador do conflito das partes.

Esse estudo pretende reunir os principais meios alternativos de soluções de conflitos, ou, pelo menos aqueles a que se tem dado maior ênfase. A própria definição da expressão "meios alternativos" não é fácil, pode-se através dela indicar mais de um caminho.

No estudo dos chamados meios alternativos, o que se busca, em última análise, é uma alternativa à solução judicial do conflito.

Assim falar de formas alternativas de solução de conflitos para muitos deve significar apenas arbitragem, mas talvez, apesar de em certos aspectos podermos considerá-la a mais importante - por ser completa, não necessita do Judiciário, e o Árbitro é juiz de fato e de direito - não é a única. Temos além desta a Mediação, as Comissões Prévias do Direito do Trabalho e soluções alternativas de conflito também passam pela visão de um processo que não sirva apenas de instrumento julgador, mas também fomentador da conciliação e para isso o estudo desta é extremamente importante.

E hoje cada vez mais o processo permite e obriga a conciliação, não sendo mais esta um mero acaso do processo.

Cada vez mais temos figuras extrajudiciais de conciliação, como as Comissões prévias de Conciliação e Julgamento do direito do trabalho, a mediação até na área de família.

Mas apesar de todas essas formas sabemos que não temos uma cultura conciliatória, uma cultura para solucionar conflitos através dessas fórmulas: Arbitragem, Comissões de Conciliação Prévia, Mediação.

E porque isso? Porque tudo isso passa pelo ensino do direito, pois enquanto a formação do direito for voltada para o litígio, para o processo, essas formas sempre serão eventuais.

E é também esse objetivo que buscamos nesse trabalho, o de fomentar em seus leitores uma visão menos litigiosa do Direito e assim menos litigiosa do conflito e que o profissional do direito não seja somente um formulador de ações e sentenças, mas de soluções, e soluções extrajudiciais.

Sob a designação 'meios alternativos de solução de litígios' pode se querer dizer muita coisa, a expressão não é unívoca e há mesmo quem hoje em dia a critique.

Por isso se faz necessário antes de tratarmos dos meios alternativos explicarmos um pouco essa história.

Há um apelo muito grande sobre os chamados meios alternativos como uma 'salvação' dessa grande crise de lentidão que o judiciário enfrenta há tanto tempo.

Assim aos meios alternativos tem se dado muita ênfase e inclusive o próprio judiciário tem incentivado muito a sua utilização, recentemente virou até notícia de televisão com um quadro no programa fantástico da Rede Globo intitulado 'O Conciliador' em que se apresenta ao vivo as tentativas de conciliação no Judiciário Paulista.

Todos então já ouviram falar sobre conciliação, arbitragem, mediação, negociação mas onde precisamente isso se enquadra dentro do nosso tema.

Inicialmente podemos dizer que esses são os "meios" alternativos. Mas não são só estes e mesmo estes tem naturezas muito diversa, alguns são judiciais outros são extrajudiciais, alguns impõe a presença de um terceiro, outro não. Sendo assim devemos primeiro definir o quer dizer a expressão "meios alternativos de solução de litígios" e qual o seu conteúdo.


Artigo publicado no sitio Mediação e Advocacia.


quinta-feira, 1 de agosto de 2013

TEORIA GERAL DO PROCESSO


Por Luiz Cláudio Borges


Segue link para pesquisa sobre Teoria Geral do Processo. O material é do professor da FGV Rodrigo Pereira Martins Ribeiro.

TEORIA GERAL DO PROCESSO

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...