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terça-feira, 11 de outubro de 2016

NJ Especial - Infância roubada: a triste realidade e os efeitos nefastos do trabalho infantil




A infância costuma nos deixar saudades e doces lembranças: brincar de pique-esconde, bolinha de gude, bonecas e bichinhos de estimação... E aquela professora inesquecível? Mas, infelizmente, isso não acontece com todos. Milhões de pessoas em todo o mundo se recordam desse período sagrado da vida com tristeza e desesperança. Elas tiveram a infância roubada, escondida, nas carvoarias, nos lixões, nas pedreiras, no trabalho duro da roça, no não menos duro trabalho doméstico, nas minas, nas oficinas de tapetes, nos sinais de trânsito e nas muitas outras formas de trabalho infantil ainda praticadas em nossa sociedade.
Neste exato momento, milhões de crianças estão trabalhando e deixando de usufruir de seus direitos fundamentais, como a educação, a saúde, o lazer. A existência de trabalho infantil em todo o planeta é uma triste realidade e tão incômoda que a maioria das pessoas prefere mesmo nem pensar no assunto. Por isso é que a Organização Internacional do Trabalho, em 2002, criou o "Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil", celebrado em 12 de junho. O objetivo: alertar todas as comunidades e seus governos sobre essa prática terrível e destrutiva que, em pleno Século XXI, ainda assola diversas regiões do mundo, desenvolvidas ou não, inclusive o Brasil. Essa campanha é mais necessária do que parece, pois a principal arma contra o trabalho infantil é a sensibilização da sociedade contra a exploração das crianças e adolescentes.
Neste ano, o tema adotado pela OIT foi "Não ao Trabalho Infantil na Cadeia Produtiva", com base na nova realidade desse problema social, principalmente devido ao crescimento de casos em empresas terceirizadas.
A Justiça do Trabalho também entrou na luta pela erradicação do trabalho infantil no país: desde 2012, o Programa de Combate ao Trabalho Infantil vem promovendo uma série de medidas, como estudos técnicos, seminários, debates, publicações e ações de marketing de grande repercussão sobre o tema. Para tanto, este junho de 2016 teve, não só um dia, mas todo o mês dedicado ao combate dessa prática nefasta. Com o slogan "Trabalho Infantil. Você não vê, mas existe", a nova campanha do Programa pretende contribuir para uma mudança de cultura, mostrando que o trabalho infantil existe e precisa ser eliminado para que a criança possa ter tempo e o prazer de ser criança.
Antes, em maio, a Semana Nacional de Aprendizagem, uma parceria entre a Justiça do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), já promovia audiências públicas em 22 estados brasileiros, buscando conscientizar empresas, sindicatos e instituições sobre o cumprimento da Lei de Aprendizagem (nº 10.097, de 19/12/2000) e do Decreto Federal nº 5.598/2005. De acordo com os dispositivos, as empresas de médio a grande porte devem destinar uma porcentagem de 5% a 15% para jovens aprendizes. A norma é uma garantia que o jovem não deixará os estudos pelo trabalho, já que exige a manutenção da educação formal, além da técnico-profissional. "Se contratados de acordo com a lei, os jovens têm a carteira assinada, todas as garantias trabalhistas, segurança, jornada de trabalho diferenciada e, o melhor, sem deixar de estudar", complementa a ministra do TST, Kátia Arruda, coordenadora do programa.
Cientes de que a matéria prima do combate ao trabalho infantil é a informação, a Justiça do Trabalho publicou em 2012 a cartilha "Trabalho Infantil e Justiça do Trabalho: Primeiro Olhar" e, posteriormente a segunda cartilha "Trabalho infantil: 50 perguntas e respostas". Em 2016, o agora Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem criou mais um canal de comunicação para divulgar ações e campanhas da Justiça do Trabalho na área: o perfil @combatetrabalhoinfantilJT no Instagram, rede social de compartilhamento de fotos.
E, nessa luta sem trégua, as ações não podem parar: vem aí o III Seminário de Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, que ocorrerá nos dias 20 e 21 de outubro de 2016, em Brasília.
Nesta NJ Especial vamos tratar do Trabalho Infantil, como ele ocorre no mundo e na sociedade brasileira, passando pela legislação sobre a matéria, com um breve histórico desse antigo problema em nosso país, suas causas e formas, as tristes estatísticas, as principais políticas públicas de combate e, por fim, por duas decisões da JT mineira que ilustram bem a questão e as circunstâncias que a rodeiam.
Trabalho Infantil: o que é e como identificar
Mas, o que, afinal, pode ser considerado "trabalho infantil"? De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o termo "trabalho infantil" pode ser definido como o trabalho que prejudica o bem-estar de uma criança e compromete sua educação, desenvolvimento e meio de vida no futuro, sendo considerada criança toda pessoa abaixo de 18 anos. Ou seja, o trabalho infantil é aquele que, por sua natureza ou forma em que é realizado, prejudica e explora crianças, privando-as das oportunidades educacionais.
Portanto, nem todo trabalho feito por crianças deve ser classificado como trabalho infantil. Para a OIT, a participação de crianças ou adolescentes em trabalhos que não afetam a sua saúde e desenvolvimento pessoal e não interferem na sua educação podem ser positivos. O auxílio em casa ou em um negócio de família, fora do horário escolar, são alguns exemplos disso, pois fornece habilidade e experiência, preparando a criança para a vida adulta.
Elvira Mirian Veloso de Mello Cosendey, Técnica do MTE e coordenadora do Fórum Estadual de Combate ao Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente de Minas Gerais, conhece de perto o problema, além de atuar no seu combate há mais de três décadas. Ela ressalta que o combate ao trabalho infantil não nega a importância desse contexto familiar que propicia o comprometimento, a responsabilidade e a cooperação da criança e do jovem, fortalecendo os vínculos familiares. O que se combate, nas palavras da especialista, "é o trabalho infantil explorador, que rouba o tempo precioso de vivenciar uma infância rica em brincadeiras, com boas horas de sono e amplo tempo para estudar e aprender" (Em Curso Online "A Escola no Combate ao Trabalho Infantil - O Trabalho Infanto-Juvenil: Características e Malefícios").
A maioria dos países estabelece uma idade mínima geral de admissão no emprego ou trabalho, geralmente fixada entre os 14 e 16 anos, com ressalvas a que o menor seja empregado em serviços leves, como aqueles que não prejudiquem sua saúde, sua frequência escolar, sua participação em programas de orientação ou formação profissional e, ainda, sua capacidade de se beneficiar da instrução Muitos países proíbem que crianças trabalhem em atividades consideradas perigosas, mesmo as que estão acima da idade mínima para admissão no emprego, mas abaixo de 18 anos. Essas situações estão previstas na lei nacional de cada país e, portanto, variam de um país a outro. Mas, geralmente, a legislação sobre a matéria se baseia nas duas convenções da OIT sobre trabalho infantil: a Convenção sobre a Idade Mínima de Admissão ao Emprego e ao Trabalho (C 138) e a Convenção sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil (C 182). Há, ainda, a Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas. O país que ratifica esses instrumentos, como o Brasil, assume o compromisso de observar suas disposições, embora, claro, tenha a liberdade de adotar leis que garantam mais proteções e que se ajustem às suas circunstâncias particulares.
No Brasil, só é permitido começar a trabalhar a partir dos 16 anos, exceto nos casos de trabalho noturno, perigoso, insalubre ou penoso, nos quais a idade mínima é de 18 anos, sendo permitido o trabalho a partir dos 14 anos, mas somente na condição de aprendiz. Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a pessoa é considerada criança até os 12 doze anos incompletos e adolescente, dos 12 completos aos 18 anos incompletos e o ECA conceitua Trabalho Infantil como aquele realizado por crianças ou adolescentes com idade inferior a 16 anos, a não ser na condição de aprendiz.
As piores formas de Trabalho Infantil
A Convenção sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil (C 182) se aplica a todas as crianças e adolescentes até a idade de 18 anos. Como seu título sugere, a Convenção se refere a determinados tipos de trabalho que não deveriam ser realizados por menores de 18 anos. São aqueles considerados como as piores formas de trabalho infantil, que abrangem as seguintes situações:
a) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão, tais como a venda e tráfico de crianças, a servidão por dívidas e a condição de servo, e o trabalho forçado ou obrigatório, inclusive o recrutamento forçado ou obrigatório de crianças para serem utilizadas em conflitos armados;
b) a utilização, o recrutamento ou a oferta de crianças para a prostituição, a produção de pornografia ou atuações pornográficas;
c) a utilização, recrutamento ou a oferta de crianças para a realização de atividades ilícitas, em particular na produção e tráfico de entorpecentes, tais como definidos nos tratados internacionais pertinentes; e
d) o trabalho que, por sua natureza ou pelas condições em que é realizado, é suscetível de prejudicar a saúde, a segurança ou a moral das crianças.
O que se busca é que essas piores formas de trabalho infantil sejam definitivamente banidas da sociedade.
Perigo: proibido para menores
Como se vê, o trabalho de crianças e adolescentes em atividades perigosas está elencado entre as "piores formas de trabalho infantil". De acordo com a Convenção 182, o trabalho infantil perigoso é aquele realizado em condições de risco ou insalubres que podem ocasionar morte, lesão, ou doença em uma criança ou adolescente, em razão da inexistência ou precariedade de medidas de segurança e saúde ou de condições de trabalho inadequadas. O conceito de "trabalho infantil perigoso" também é abordado na Convenção da OIT sobre a Idade Mínima (C 138).

A OIT estabelece que a lista exata de atividades perigosas seja determinada por cada país. Mas recomenda que, ao se determinar o que seja trabalho perigoso, sejam consideradas as normas internacionais de trabalho, como as que dizem respeito a substâncias, agentes ou processos perigosos (inclusive radiações ionizantes), levantamento de cargas pesadas e trabalho subterrâneo.
A Recomendação da OIT sobre as "Piores Formas de Trabalho Infantil" (R 190) também orienta governos a proibir o trabalho infantil nas seguintes circunstâncias:
a) os trabalhos em que a criança fica exposta a abusos de ordem física, psicológica ou sexual;
b) os trabalhos subterrâneos, debaixo d'água, em alturas perigosas ou em locais confinados;
c) os trabalhos que se realizam com máquinas, equipamentos e ferramentas perigosos, ou que impliquem a manipulação ou transporte manual de cargas pesadas;
d) os trabalhos realizados em um meio insalubre, no qual as crianças estiverem expostas, por exemplo, a substâncias, agentes ou processos perigosos ou a temperaturas, níveis de ruído ou de vibrações prejudiciais à saúde; e
e) os trabalhos que sejam executados em condições especialmente difíceis, como os horários prolongados ou noturnos, ou trabalhos que retenham injustificadamente a criança no estabelecimento do empregador.
O Brasil e o trabalho infanto-juvenil: leis de sobra
Com o objetivo de erradicar o trabalho infantil e proteger o trabalho do adolescente, o Brasil ratificou a Convenção 138 da OIT, que versa sobre a idade mínima para admissão em emprego, através do Decreto nº 4.134/2002 e, também, a Convenção 182, esta pelo Decreto nº 3.597/2000, relativa à interdição das piores formas de trabalho das crianças e ação imediata com vistas à sua eliminação.

Além disso, a nossa legislação é uma das mais completas do mundo quando se trata da proteção ao trabalho de crianças e jovens. Nas décadas de 80 e 90, foi aprovado o maior número de leis de garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes, colocando o Brasil em lugar de destaque internacional. Falta colocá-las em prática.
A Constituição Federal de 1988 proíbe a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor e estado civil (artigo 7º, inciso XXX). Além disso, a partir da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, no inciso XXXIII, do art. 7º, proíbe o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 anos e qualquer trabalho a menores de 16 anos, exceto na condição de aprendiz, a partir de 14 anos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reserva um capítulo inteiro para tratar do direito à profissionalização e à proteção no trabalho das crianças e adolescentes. Também dispõe sobre os direitos garantidos aos trabalhadores adolescentes e aos aprendizes, proibindo-lhes os trabalhos noturnos, perigosos, insalubres, penosos, realizados em locais prejudiciais à sua formação e desenvolvimento físico, moral, psíquico e social e àqueles que impeçam a frequência escolar.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com as alterações feitas pela Lei Federal nº 10.097, de 19 de dezembro de 2000, trata do assunto no capítulo IV - "Da proteção ao Trabalho do Menor", considerando "menor" aquela pessoa com idade compreendida entre os 14 e 18 anos. Nesse capítulo, estão estabelecidos vários critérios e deveres do empregador para com o adolescente empregado na sua empresa e o menor aprendiz. Entre eles, o de assegurar horários e locais de trabalho que permitam a frequência à escola, assim como a coincidência do período das férias do trabalho com as férias escolares. As empresas também são obrigadas a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a 5%, no mínimo, e 15%, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções exijam formação profissional.
Destaca-se que o artigo 424 da CLT dispõe que: "É dever dos responsáveis legais de menores, pais, mães ou tutores, afastá-los de empregos que diminuam consideravelmente o seu tempo de estudo, reduzam o tempo de repouso necessário à sua saúde e constituição física, ou prejudiquem a sua educação moral ".
Lei penal: quando trabalho infantil é crime
Conforme a disposição constitucional, no Brasil, o trabalho infantil é considerado crime. E algumas formas mais nocivas da exploração de crianças são especialmente tratadas no CPB (Código Penal Brasileiro). Entre elas:
Trabalho infantil escravo - Reduzir o trabalhador à condição análoga à de escravo, por meio de trabalhos forçados, jornada exaustiva ou condições degradantes de trabalho, artigo 149 do Código Penal brasileiro de 1940, com a agravante de se tratar de criança ou adolescente (§ 2º, item I). A agravante foi introduzida pela lei 10.803, de 11 de Dezembro de 2003 e aumenta a pena em uma metade;
Maus-tratos (artigo 136 do Código Penal), crime aplicável a menores - Expor, a perigo, a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado. Se a pessoa for menor de 14 anos, há a agravante do § 3º, introduzida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/90), que aumenta a pena em mais um terço.
Exploração da prostituição de menores - A exploração da prostituição infantil, considerada pela Organização Internacional do Trabalho como uma das piores formas de trabalho infantil, é crime previsto no artigo 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Pornografia de menores - Crime previsto nos artigos 260 e 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Venda ou tráfico de menores - Constitui crime previsto no artigo 239 do Estatuto da Criança e do Adolescente
Conto de fadas às avessas: causas e formas do trabalho infantil no Brasil
A condição de miserabilidade e desestruturação das famílias, a insuficiência de políticas públicas e a péssima distribuição de renda são as principais causas da exploração do trabalho infantil no nosso país. Antigamente, os filhos trabalhavam em negócios familiares, sempre sob a coordenação e responsabilidade dos pais e o ofício era, dia-a-dia, gradualmente aprendido. Hoje, a criança pobre é obrigada a trabalhar para ajudar no sustento da família, ou seja, não passa mais pela convivência saudável do trabalho.
Os efeitos negativos da exploração do trabalho infantil são tantos que geram um ciclo perverso: os filhos explorados no trabalho, geralmente, têm pais que passaram pela mesma situação e assim por diante. Eles não conseguem interromper o ciclo, porque o tempo dedicado ao trabalho e o cansaço lhes rouba o acesso à educação e as oportunidades de melhora. E, por ignorância ou necessidade, acabam expondo seus filhos à mesma rotina de trabalho precoce, permitindo que prestem serviços até mesmo em situações perigosas, insalubres e penosas. Ao combater essa prática, as autoridades locais muitas vezes se intimidam diante da enorme carência material vivenciada por essas famílias. Por seu turno, a sociedade também tem sua parcela de culpa, ao consumir produtos advindos do trabalho infantil, ao invés de denunciar a prática aos órgãos competentes.
Com 36 anos de militância na luta contra o trabalho infantil, Elvira Cosendey ressalta que as horas trabalhadas por crianças e adolescentes no Brasil podem chegar a até 8, 12 ou mais, seja em horário noturno ou diurno, em atividades formais e informais, na zona rural e urbana. E, ao discorrer sobre as formas de trabalho infantil no Brasil, ela nos relata a trágica realidade de nosso país:
"Hoje, ainda encontramos crianças e adolescentes trabalhando nas lavouras, em pedreiras, carvoarias, olarias, lixões, matadouros, indústria calçadista e na fabricação de fogos de artifício, como também nas ruas como vendedores, pedintes, guardas-mirins, lavadores de carros. As condições de trabalho são degradantes, crianças e adolescentes expostas a longas filas de banco, em contato com agrotóxicos, graxas, óleos, ferramentas cortantes, descargas elétricas, explosivos, altura etc. Caminham longas distâncias como vendedores, ambulantes de todo tipo de quinquilharias em sinais e pelas madrugadas. Sentados em posição incorreta, descascando alho, mandioca, ou quebrando pedras. Carregam pesos além de sua capacidade física em feiras, comércio e na agricultura. Expostos a todos os riscos nas ruas, como atropelamentos, abordagem pelo tráfico de drogas, prostituição e furtos. O trabalho doméstico é uma forma de trabalho infantil-juvenil amplamente usada em nossa sociedade no qual meninas vindas do interior e de zonas rurais buscam melhores condições de vida e, com a promessa de estudo, se empregam em casas de famílias como babás e empregadas domésticas, permanecendo nesta situação eternamente. Há também o trabalho ilícito, em que jovens cada vez mais jovens estão sendo utilizados como mão-de-obra no tráfico de drogas".
Estatísticas do Trabalho Infantil: números que não são brincadeira
Dados do Relatório Mundial sobre Trabalho Infantil 2015, elaborado pela OIT, apontam que 168 milhões de crianças realizam trabalho infantil no mundo. Entre elas, 120 milhões tem idades entre 5 e 14 anos e cerca de 5 milhões vivem em condições análogas à escravidão. E, o que é pior, mais da metade (85 milhões) está envolvida com trabalhos perigosos. Segundo a OIT, entre 20% e 30% das crianças em países de baixa renda abandonam a escola e entram no mercado de trabalho até os 15 anos.
No Brasil o censo do IBGE de 2015 aponta 3,3 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos trabalhando no país. Desse total, apenas 500 mil em situação regular, como aprendizes, ou com carteira assinada, os demais em situação de informalidade de vínculo, sem garantia de direitos. Meio milhão desses pequenos trabalhadores tem menos de 13 anos. E a maioria (62%) trabalha no campo, com agricultura (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD). Em suma: 84% dos jovens brasileiros estão trabalhando e mais da metade deles exercem atividades ilegais e perigosas, principalmente em indústrias, carvoarias e na agricultura. Ainda segundo o IBGE, no Brasil, 258 mil crianças e jovens realizam trabalho doméstico nas casas de outras pessoas. Nos centros urbanos, as crianças são encontradas como vendedores ambulantes nos semáforos e nos lixões. No campo, trabalham 450 mil meninos e meninas, sendo que quase 75% dessas crianças estão na agricultura familiar, sem receber pelos serviços realizados. Para coroar, um conto de horror: nos últimos cinco anos, 12 mil crianças sofreram acidentes de trabalho e 110 morreram.
Embora na década de 2000 a 2010 o país tenha reduzido o número de trabalhadores adolescentes e crianças em 12,8%, a pesquisa do IBGE de 2015 mostra dados preocupantes: o trabalho infantil aumentou 4,5% de 2013 e 2014, o que nos faz pensar que talvez não consigamos erradicar todas as formas de trabalho infantil até 2020, como prevê as chamadas "metas do milênio", reafirmadas na 3ª Conferência Global pela Erradicação do Trabalho Infantil, realizada no Brasil em 2013.
As autoridades que atuam no combate ao trabalho infantil no Brasil acreditam que nossa cultura aceita o trabalho de crianças e adolescentes como forma de ajudar o sustento da família e o maior desafio é mudar esta percepção. Quando a criança trabalha ela sai da escola ou tem um rendimento insuficiente e perde o direito de ser criança, de brincar e estudar. Só a conscientização da sociedade pode mudar esse quadro.
Combater para erradicar
As ações de erradicação ao trabalho infantil são guiadas pelo Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador. Criado em 2011 pela Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (Conaeti), sob coordenação do Ministério Público do Trabalho e Emprego (MTE) e com participação da sociedade, o plano tem como finalidade erradicar o trabalho infantil até 2020.
Pesquisa encomendada pela Fundação Telefônica para o "Projeto Promenino", divulgada em agosto 2013, revela que o custo com políticas públicas voltadas para tirar crianças do mercado de trabalho seria de 29,433 milhões de dólares, um investimento considerado pequeno em relação ao retorno econômico e social para um país ("Trabalho Infantil e Adolescente: impacto econômico e os desafios para a inserção de jovens no mercado de trabalho no Cone Sul").

Os principais programas nacionais direcionados à erradicação do trabalho infantil e à eliminação da pobreza são o "O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti)" e o Bolsa Família. O Peti foi criado no início de 1996 e realiza um conjunto de ações que buscam retirar crianças e adolescentes de até 16 anos das práticas de trabalho infantil. Ao ingressar no Peti, a família tem acesso à transferência de renda do Bolsa Família quando atender aos critérios de elegibilidade. Também passa a ter um atendimento assistencial, com encaminhamento para serviços de saúde, educação, cultura, esporte, lazer ou trabalho, quando necessário.
Já entre os benefícios do Bolsa Família está a garantia de que as crianças e adolescentes tenham a frequência mínima na escola e o cumprimento do calendário de vacinação do Ministério da Saúde. O programa completa 10 anos em 2013 e, atualmente, atende quase 14 milhões de famílias (mais de 50 milhões de pessoas), segundo dados da pesquisa da Fundação Telefônica. Além disso, é reconhecido internacionalmente como uma política pública social que conseguiu romper o círculo da miséria pela educação. Esses dois programas têm um papel importante no combate ao trabalho infantil, pois apoia as famílias mais pobres. Afinal, trabalho infantil e pobreza são as duas faces de uma mesma moeda.
Mesmo não tratando da questão do trabalho infantil diretamente, outras políticas voltadas às crianças e aos adolescentes que oferecem proteção à vulnerabilidade são de grande ajuda para o problema, como o Projeto Sentinela, que atende vítimas da violência e exploração sexual. Outro exemplo é o Programa Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano, que prepara adolescentes de 15 a 17 anos de idade para atuarem em suas comunidades em diversas áreas, promovendo o desenvolvimento e amadurecimento do jovem para o mercado de trabalho.
Trabalho infantil: tristes casos julgados na Justiça do Trabalho mineira
A seguir, duas decisões da JT mineira em que o tema Trabalho Infantil esteve em pauta. A primeira, retratando a situação do adolescente que, mesmo nos centros urbanos, trabalha em condições irregulares e perigosas, tudo para completar a renda necessária à própria subsistência e de sua família. A segunda ilustra com precisão a triste e ainda atual realidade das famílias que vivem em condições miseráveis nas zonas rurais do Brasil e que acabam por explorar o trabalho de seus filhos menores, muitos, ainda crianças bem pequenas.
1º Caso - Menor morre eletrocutado em acidente de trabalho
Nessa situação analisada pelo juiz Luiz Olympio Brandão Vidal, em sua atuação na 3ª Vara do Trabalho de Governador Valadares, o espólio de um menor falecido em acidente de trabalho aos 17 anos de idade pretendia o reconhecimento do vínculo de emprego entre o menor e uma serralheria, com o pagamento dos direitos trabalhistas decorrentes. Na mesma ação, a mãe do menor pediu indenização por danos morais e matérias em razão do acidente que tirou a vida de seu filho.
Vínculo de emprego - Pelo exame das provas, o magistrado constatou que a serralheria tinha como uma de suas atividades a montagem de estruturas metálicas (placas de aço) em eventos. E uma testemunha confirmou que, por cerca de um ano, o menor vinha trabalhando para a empresa na montagem e desmontagem dessas estruturas, que eram utilizadas para o fechamento do espaço das festas, o que fazia por dois finais de semana por mês.
Segundo o magistrado, embora descontínuo, o serviço do menor era permanente e necessário à consecução dos objetivos da empresa, ou seja, inserido em sua atividade normal. Dessa forma, o juiz afastou a alegação da ré de que o trabalho era eventual.
Constatando a presença dos elementos previstos no artigo 3º da CLT, o julgador reconheceu que o menor trabalhou com vínculo de emprego e determinou que a empresa anotasse sua CTPS no período de 01/02/2011 a 21/04/2012, na função de auxiliar de serralheiro, com remuneração proporcional do tempo trabalho (em dois fins de semana por mês, de sexta-feira a domingo), equivalente a R$ 210,00 por mês (R$ 35,00 por dia trabalhado). Ela também foi condenada a pagar ao espólio do empregado falecido as parcelas trabalhistas devidas (FGTS, saldo de salários, férias integrais e proporcionais e 13ºs. salários).
Acidente fatal - O acidente de trabalho ocorreu quando o menor subiu em uma torre onde eram apoiadas placas de propaganda que tinham que ser retiradas para dar passagem aos trios elétricos. Ele queria verificar como era feita a solda das placas. Nesse momento, encostou a cabeça em uma linha de transmissão de alta tensão, que ficava perto da estrutura, e foi eletrocutado, caindo de uma altura aproximada de 4 metros. O trágico acidente lhe tirou a vida, aos 17 anos de idade.
A empresa chegou a alegar a culpa exclusiva da vítima no acidente, afirmando que o adolescente subiu na torre por sua própria vontade, para verificar se ali teria uma vista privilegiada do parque de exposição, mas isso não foi provado. Ao contrário, o conjunto das circunstâncias convenceu o juízo de que o menor estava a serviço da ré, que atuava demarcando o local da festa, de onde as tais placas de propaganda tinham que ser retiradas. Assim, prevaleceu o entendimento de que, ao subir na torre onde foi eletrocutado, o menor estava cumprindo ordens da empresa. Com isso, ficou afastada a tese de culpa exclusiva da vítima.
Além disso, o "Relatório de Análise de Acidente do Trabalho" tornou evidente a culpa da empresa no infortúnio que subtraiu a vida do operário, pela negligência quanto às normas de segurança no trabalho, ao deixar de oferecer treinamento adequado para o acesso às áreas controladas ou de risco (Anexo I da NR-10); não proceder ao desligamento da rede ou a proteção dos locais energizados durante a execução do trabalho e, ainda, não fornecer EPI-Equipamento de Proteção Individual. E mais: conforme constou em auto de infração aplicado à empresa, o trabalho em montagem de estruturas metálicas é elencado na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil, vedado para menores de 18 anos. O reclamante tinha 17 quando foi vítima do acidente fatal.
Danos materiais: lucros cessantes - Além do espólio, a mãe do menor também foi parte autora na ação trabalhista, com a pretensão de receber indenização por danos materiais (lucros cessantes, na forma de pensão mensal vitalícia ou parcela única) da ex-empregadora de seu filho. O pedido foi parcialmente acolhido pelo magistrado.
De acordo com o juiz, o artigo 948, II, do Código Civil ampara a pretensão da mãe do menor, estabelecendo uma reparação consistente na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima. Também o artigo 229 da Constituição da República justifica o pensionamento dos pais, que retroage à data do ato ilícito (artigo 398 do Código Civil), no caso, o acidente que provocou a morte do adolescente.
"O menor era solteiro e não tinha descendentes. Como residia com a mãe, uma beneficiária do Programa Bolsa-Família, integrava uma família de baixa renda, o que faz presumir a dependência econômica entre os seus integrantes. Assim, é razoável que a mãe do de cujus receba uma indenização contabilizada por 55,8 anos, que era essa a expectativa de sobrevida de seu filho, segundo a Tábua de Mortalidade 2012 do IBGE (ou antes disso, em caso de falecimento da beneficiária)", destacou o julgador.
A indenização foi deferida na forma de pensionamento mensal, equivalente a 2/3 do salário do menor (R$210,00), fixada proporcionalmente ao salário mínimo (0,23 salários mínimos, desde o óbito (21/04/2012) até por mais 55,8 anos, limitada ao dia em que completaria 74 anos. Segundo o juiz, a pensão não pode ser no valor do total dos rendimentos da vítima, como pretendeu a mãe do menor, ou haveria concessão de indenização além do prejuízo material. "Deve ser levado em conta que a vítima gastava consigo 1/3 (um terço) do que recebia, segundo critério adotado pelo Supremo Tribunal Federal (RE 85.417, 1ª Turma, Rel.: Ministro Cunha Peixoto, julgado em 31/08/1976)", ponderou.
Por fim, o magistrado reduziu o pensionamento pela metade, a partir de 21/04/2019, quando a vítima completaria 25 anos, por presumir que ele constituiria nova família, seja pelo casamento, seja pela união estável ou, simplesmente, deixando o convívio familiar para ter uma vida independente, mas sem deixar de contribuir para o sustento dos pais, por se tratar de família de baixa renda.
Danos morais - Além da indenização por danos materiais, foi deferida à mãe do adolescente uma indenização por danos morais no valor de R$ 50.000,00. Conforme explicou o juiz, no caso, o dano moral se extrai dos próprios fatos, dispensando-se a comprovação do sofrimento íntimo. "Existe na hipótese o que a doutrina chama de "dano moral em ricochete", ou seja, os danos causados pelo óbito atingem reflexamente outra pessoa que compartilhava da convivência do acidentado", ressaltou o magistrado.
Recurso - Ao analisar o recurso dos reclamantes, a 4ª Turma do TRT-MG deu-lhe provimento, aumentando a indenização por dano moral para R$ 75.000,00. De acordo com o relator, Paulo Chaves Correa Filho, " o valor fixado na sentença é insuficiente para surtir os efeitos pedagógicos desejados, já que o acidente ocorrido era de fácil prevenção. Além disso, o trabalhador possuía apenas 17 anos de idade quando vitimado e o trabalho por ele exercido se encontra na Lista TIP (Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil), o que agrava ainda mais o dano causado".
01367-2013-135-03-00-9 RO - sentença: 19/05/2014 - acórdão: 08/10/2014
2º caso - MTE flagra trabalho de crianças em propriedade rural
No recurso apreciado pela Turma Recursal de Juiz de Fora, um proprietário rural pretendia a anulação de três autos de infração lavrados pelo Ministério do Trabalho em 30/07/2007. O primeiro, ao fundamento de que o proprietário mantinha em sua fazenda trabalhadores menores de 16 anos em serviços diversos. O segundo, por falta de fornecimento e fiscalização do uso dos equipamentos necessários à proteção e segurança dos trabalhadores. Por fim, o último, por ter o fazendeiro deixado de fornecer os documentos solicitados pela fiscalização. E, por maioria de votos, adotando o entendimento do relator, desembargador Marcelo Lamego Pertence, a Turma julgou desfavoravelmente o recurso, ao constatar que o proprietário rural praticou, de fato, as infrações descritas nos autos, inclusive quanto ao uso de mão de obra infantil. Assim, manteve a sentença que já havia declarado a validade dos autos de infração.
Em seu exame, o relator achou correto o procedimento do fiscal do trabalho, que desconsiderou a condição de parceiros agrícolas dos trabalhadores identificados na ação fiscal, reputando-os como meros empregados do fazendeiro. Isto porque, no contrato de parceria rural, o proprietário cede ao trabalhador o imóvel rural, ou parte dele, para que ali exerça atividade (agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa vegetal, mista, cria de animais, etc), cujos frutos, produtos ou lucros são partilhados, assim como os riscos do empreendimento (Lei 4.504/64 - Estatuto da Terra, artigo 96). Mas, no caso, o relato das testemunhas e do fiscal do trabalhado revelaram que os trabalhadores encontrados na propriedade rural não possuíam estrutura financeira para suportar os ônus desse tipo de contrato. "A prova dos autos evidencia, especialmente a testemunhal, que os supostos parceiros eram pessoas simples, que auferiam baixa remuneração pelos serviços que prestavam, juntamente com suas famílias, inclusive, necessitavam de empregar até mesmo a mão de obra de seus filhos menores para garantirem o mínimo se subsistência", frisou o desembargador.
As declarações de um trabalhador da fazenda, ouvido como testemunha, retratam bem as condições miseráveis das famílias que sujeitam seus filhos ao trabalho infantil. Ele disse que recebia cerca de R$350,00 mensais pela sua parte na meação do leite, necessitando contar com a ajuda de seus cinco filhos para o ajudarem nos serviços, a quem ele próprio remunerava. Além disso, o julgador constatou que os trabalhadores recebiam a parte que lhes cabia em espécie e estavam subordinados ao proprietário, de quem recebiam ordens sobre a execução dos serviços. Tais circunstâncias, segundo o relator, não se amoldam ao contrato de parceria agrícola, por contrariar a lei que rege o instituto. Ou seja, os "parceiros" do proprietário rural eram, na verdade, empregados, que prestavam serviços sem carteira assinada e sem receber os direitos trabalhistas que lhes eram devidos. Nesse quadro, foi reconhecida a nulidade dos contratos de parceria firmados com os trabalhadores, com base no artigo 9º da CLT e no Princípio da Primazia da Realidade.
Quanto à consistência do auto de infração pela constatação de trabalho infantil, não teve dúvidas o relator. Nas palavras dele: "Ficou evidente a existência de crianças trabalhando na propriedade do réu, o que não foi desmentido nem mesmo por suas testemunhas. Dentre as várias crianças encontradas trabalhando, todas tinham função definida, algumas na colheita de café, outras no corte da cana, sendo importante ressaltar que uma das crianças tinha apenas 08 (oito) anos de idade, o que, a meu ver, é inaceitável e lamentável".
Vale registrar aqui trechos da decisão, nos quais o desembargador expõe suas impressões sobre o tema do trabalho infantil:
"O trabalho infantil é prática odiosa que vem sendo combatida com esmero por toda a sociedade. Trata-se de um antigo problema de origem cultural e social arraigado há séculos no país. Porém, a partir de 1980, ao surgir um movimento social em favor dos direitos das crianças e dos adolescentes, esse quadro começou a mudar.
Vários foram os mecanismos criados para a solução do problema, como a promulgação da Constituição da República de 1988; a adoção, em 1989, da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança; a aprovação, em 1990, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA); os suportes técnico e financeiro do Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC) da Organização Internacional do Trabalho (OIT), somados aos programas do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) a partir de 1992, acabaram por incluir definitivamente o tema do combate ao trabalho infantil na agenda nacional de políticas sociais e econômicas do país e do mundo.
A partir daí o trabalho infantil tornou-se uma questão de garantia e defesa de direitos e passou a ser responsabilidade de toda a sociedade, nos termos do art. 227 da CR/88. "Assim, a adoção de leis e a atuação da fiscalização são necessários, mas insuficientes para um permanente e eficaz combate a esta nefasta prática. É imprescindível garantir a participação efetiva e integrada de todos os segmentos sociais. ".
Citando as Convenções da OIT 138 (sobre a idade mínima para admissão ao emprego) e 182 (sobre as piores formas de trabalho infantil), o relator pontua: "A ratificação dessas Convenções representa a consolidação de um comprometimento nacional com a efetiva erradicação do trabalho infantil".
Voltando ao caso julgado, ele conclui que: "pouco interessa seja a situação decorrente de parceria agrícola ou de trabalho com vínculo de emprego, o trabalho infantil nos moldes verificados é intolerável e deve ser combatido com rigor, pois atenta contra toda a sociedade, já que os prejuízos futuros serão experimentados por toda a coletividade". E lembra que a agropecuária, especialmente o corte da cana-de-açúcar, é considerada uma atividade perigosa por excelência, por expor os trabalhadores a ferramentas e máquinas que lhes trazem risco, como serras, motores, tratores e facões, além da exposição a produtos químicos, como agrotóxicos e herbicidas. Além disso, a preparação do solo, plantio, colheita e trato dos animais são atividades que exigem grande esforço físico e exposição às intempéries climáticas. "Imaginar uma criança de apenas 08 (oito) anos de idade exposta a tal situação é cruel", arremata.
Por fim, o desembargador reconheceu a validade dos autos de infração remanescentes, um por ausência de apresentação da documentação exigida pela ação fiscal e o outro pelo não fornecimento aos trabalhadores dos necessários equipamentos de proteção individual, já que não foi produzida nenhuma prova capaz de contrariar as constatações que embasaram a autuação. Acompanhado o relator, a Turma, por maioria de votos, negou provimento ao recurso do proprietário rural.
00589-2008-068-03-00-0-RO - acórdão em 06/10/2009


Notícias Jurídicas do TRT mineiro sobre o tema:

05/09/2014 06:05h - Município de Ituiutaba e conselho municipal são condenados por utilização de trabalho infantil ilícito

01/04/2011 06:01h - Funções de cobrador e motorista de transporte coletivo não podem ser exercidas por menor aprendiz

28/03/2011 06:02h - Juíza identifica fraude em caso de trabalhador assistido por advogado do empregador

25/10/2010 06:09h - Empresa indenizará menor que teve a mão triturada em máquina de moer carne

08/05/2010 06:09h - Empregador que explorava mão-de-obra infantil em lavoura de café é condenado em danos morais coletivos

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Futuro em Jogo - Game de combate ao trabalho infantil já está disponível para celular e tablete
Fiscalização flagra trabalho escravo e infantil em marca de roupas de luxo em SP
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Dia do Combate ao Trabalho Infantil é lembrado com participação da Justiça do Trabalho no Lixão de Porto Velho
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Fonte: TRT3

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

NJ Especial: Alimentação fornecida pelo empregador integra ou não o salário?







O fornecimento de alimentação ao trabalhador é uma faculdade do empregador, já que não há qualquer lei que imponha essa obrigação. Ao optar por fornecê-la, além de contar com uma maior satisfação de seu empregado em ter essa comodidade, o empregador também se beneficia, já que, por exemplo, evita dispersão do empregado ao sair do ambiente de trabalho por um período maior e diminui consideravelmente os riscos de acidente de trajeto, além de contar com incentivos fiscais.



Mas qual a repercussão da concessão dessa benesse pelo empregador no contrato de trabalho? Em outras palavras, a alimentação fornecida integra ou não o salário? Se sim, qual a sua repercussão no contrato de trabalho? É o que veremos nessa Notícia Jurídica Especial. O lanche fornecido pelo empregador tem ou não natureza salarial?



O direito do trabalho permite que o salário seja pago não apenas em dinheiro, mas também em bens ou serviços, denominados de utilidades. Nesse caso, tem-se o salário utilidade ou salário in natura, previsto no artigo 458, caput, da CLT.

A teor do disposto nesse artigo, compreende-se no salário, dentre outras utilidades, a alimentação fornecida habitualmente ao empregado, por força do contrato ou do costume. O artigo também incluiu no rol exemplificativo de utilidades a habitação, vestuário ou outras prestações in natura, que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado.

As utilidades salariais visam a satisfazer as necessidades individuais do trabalhador, de forma que, caso ele não as recebesse, deveria gastar parte de seu salário para obtê-las. Para sua caracterização, a doutrina e jurisprudência apresentam os principais requisitos: habitualidade (que pode ser diária, semanal, mensal ou até mesmo semestral ou anual) e que seja fornecida pelo trabalho e não para o trabalho.



Logo, o lanche fornecido pelo empregado, em regra, possui natureza salarial, sendo a utilidade enquadrada como salário in natura,. Assim sendo, ela integra o salário, ensejando a repercussão sobre outras verbas contratuais trabalhistas.

Isso, desde que a oferta de alimentação não se dê para viabilizar o trabalho, ao contrário do que ocorre em plataformas marítimas, em obras em locais inóspitos, etc. Nesse último caso, as utilidades equiparam-se a instrumento de trabalho e, consequentemente, não têm feição salarial, sendo ofertadas para o trabalho.

Já o vale refeição, concedido pelo empregador ao empregado por força do contrato de trabalho, reveste-se de caráter salarial e integra a remuneração do empregado para todos os efeitos legais. Nesse sentido, a Súmula 241 do TST.

A natureza não salarial de uma utilidade fornecida pode ser fixada em normas convencionais negociadas, em que tem sido comum estabelecer que a cesta básica será entregue, sem caráter salarial, ao trabalhador das categorias abrangidas pelo instrumento normativo.

PAT: Regras próprias - Não terá, igualmente, natureza salarial se a alimentação for ofertada na forma estipulada no PAT (Programa de Alimentação ao Trabalhador), que possui norma jurídica expressa nesse sentido. Trata-se de programa governamental de adesão voluntária, que busca estimular o empregador a fornecer alimentação nutricionalmente adequada aos trabalhadores, por meio da concessão de incentivos fiscais, tendo como prioridade o atendimento aos trabalhadores de baixa renda. Foi criado pela Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, regulamentada pelo Decreto nº 5, de 14 de janeiro de 1991. E, se o benefício não tem natureza salarial, as parcelas custeadas pelo empregador também não terão esse caráter e, portanto, não se incorporam à remuneração para quaisquer efeitos, não constituem base de incidência de contribuição previdenciária ou do FGTS, nem se configuram rendimento tributável dos trabalhadores, desde que cumpridas todas as regras do Programa. Além disso, o empregador optante pela tributação com base no lucro real pode deduzir parte das despesas com o PAT do imposto sobre a renda.

Contudo, os benefícios concedidos em desacordo com a legislação do PAT integram o salário, podendo constituir direito adquirido.

Vale lembrar ainda que há doutrina e jurisprudência no sentido de que um simples cafezinho disponibilizado aos empregados durante a jornada não caracteriza salário in natura,, pois não tem função retributiva. Esse entendimento, contudo, não se aplica ao lanche ou ao café completo.

Vejamos alguns casos decididos pela Justiça do Trabalho sobre a questão: Alimentação fornecida diariamente pelo empregador ao empregado tem natureza salarial



A 10ª Turma do TRT mineiro, reformando decisão de 1º grau, acolheu o pedido de um montador que buscou a integração à remuneração da alimentação fornecida pela empregadora, uma empresa de montagens e instalações industriais.

No caso, durante todo o contrato de trabalho, a empregadora fornecia ao trabalhador três alimentações diárias: café da manhã, almoço ou jantar e um lanche da tarde. O juiz sentenciante, com base no artigo 458, §2º, inciso I, da CLT, indeferiu o pedido por entender que a alimentação foi fornecida para a execução dos serviços, já que o trabalhador não tinha local fixo de trabalho.



Mas, por não entender essencial o fornecimento das refeições para a execução dos serviços pelo montador, a desembargadora Lucilde D'Ajuda Lyra de Almeida, relatora do recurso, discordou desse posicionamento, dando razão ao trabalhador. Conforme esclareceu, a teor do disposto nos artigos 457 e 458 da CLT, os benefícios pagos ao empregado de forma habitual correspondem ao salário e integram a sua remuneração para todos os efeitos legais.

A julgadora frisou que, nos termos desse último dispositivo legal, além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações in natura que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Ela cita a Súmula 241 do TST, nesse exato sentido, que dispõe: "SALÁRIO-UTILIDADE. ALIMENTAÇÃO. O vale para refeição, fornecido por força do contrato de trabalho, tem caráter salarial, integrando a remuneração do empregado, para todos os efeitos legais".

"Sabe-se, outrossim, que o valor fornecido pelo empregador ao empregado tem natureza salarial, conforme art. 458 da CLT e Súmula 241 do TST, a menos que a empresa esteja inscrita no Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT, tendo em vista o disposto na Lei 6.321/1976 (Orientação Jurisprudencial 133 da SDI-1 do TST), ou se for obrigação derivada de CCT ou ACT, cuja regra instituidora afaste a natureza remuneratória da verba", registrou a relatora, acrescentando que a empresa não demonstrou sua adesão ao PAT e a norma coletiva anexada aos autos, em sua cláusula décima, não estabelece a natureza indenizatória do valor concedido para alimentação.

Por esses fundamentos, a desembargadora reconheceu a natureza salarial da alimentação fornecida diariamente pelo empregador e determinou sua integração à remuneração do trabalhador, tomando por base o valor diário estimado na petição inicial (R$49,29), de acordo com os valores médios atribuídos pela Associação das Empresas de Refeição e Alimentação para o Trabalhador. Foram deferidos ainda os reflexos nos RSR (de forma simples, conforme OJ 394 da SDI-1 do TST), férias mais 1/3, 13º salários, horas extras pagas e FGTS com 40%.(00808-2014-054-03-00-6-RO - acórdão em 06/07/2016)

Descontos irrisórios pela alimentação fornecida não desconstituem sua natureza salarial



No caso analisado pela 6ª Turma do TRT mineiro, o desembargador Jorge Berg de Mendonça, negando provimento ao recurso apresentado por uma churrascaria, confirmou decisão de 1º grau que condenou o restaurante a integrar à remuneração de um passador de carne a alimentação fornecida.



A churrascaria ofertava ao trabalhador um almoço ou um jantar por dia trabalhado, no valor de R$10,00 ao dia. E, muito embora houvesse descontos mensais pela alimentação fornecida, esses descontos nunca ultrapassaram R$13,00. Considerando que os descontos eram de centavos, cerca de R$0,50 por refeição, o julgador entendeu que eles configuravam mera maquiagem de cobrança. De forma que a refeição, fixada em preço que a empregadora não admitiria nem mesmo como sendo de custo, de fato, era fornecida de graça. Portanto, conforme frisou, esses descontos irrisórios não têm o poder de desconstituir a natureza salarial da parcela.

Nesse quadro, e levando em conta que a empregadora não estava inscrita no PAT e que também não havia cláusula normativa dispondo sobre a natureza indenizatória da refeição fornecida, o julgador concluiu que ela tem natureza salarial, conforme artigo 458 da CLT e Súmula 241 do TST. O julgador observou que o empregado, ao deixar de desembolsar valores para fazer a refeição diária, obtinha, ainda que indiretamente, um plus salarial. Desse modo, a alimentação fornecida deve integrar sua remuneração. (00693-2014-005-03-00-0 - acórdão em 09/05/2016)

Turma nega integração à remuneração de verba concedida a motorista canavieiro



Apesar da insistência do trabalhador na condenação das empresas ao pagamento de repercussões salariais decorrentes do reconhecimento do caráter de salário in natura da alimentação e do alojamento disponibilizados pela empresa, a 10ª Turma do TRT de Minas, em voto da relatoria do desembargador Vitor Salino de Moura Eça, não lhe deu razão.



Embora tenha ficado incontroverso que uma das rés lhe fornecia moradia e alimentação (duas refeições, um café da manhã e um lanche), conforme revelou a prova testemunhal, o julgador, em harmonia com a decisão de 1º grau, entendeu que tanto a alimentação in natura, quanto a moradia foram concedidas ao trabalhador para que ele pudesse desempenhar adequadamente o trabalho para o qual foi contratado, uma vez que ele trabalhava na zona rural, como motorista canavieiro, e residia na cidade.

Dessa forma, o julgador concluiu que o fornecimento de moradia e alimentação não possuía caráter salarial porque indispensável ao desenvolvimento do trabalho, nos moldes do artigo 458, §2º, da CLT. Por fim salientou que não se aplicam ao caso as disposições da Súmula n.º 241 e da OJ-SDI1 n.º 413, do TST, pois o trabalhador não recebeu vale-refeição ou auxílio-alimentação, como previsto nesses enunciados, mas sim alimentação in natura,. (0011659-80.2015.5.03.0063-RO - acórdão em 24/08/2016)

Lanche fornecido por força do contrato tem natureza salarial



Em outra situação analisada na 1ª Turma do TRT mineiro, o juiz convocado Carlos Roberto Barbosa, modificando decisão de 1º grau, também deu razão a uma camareira que pretendia a integração à sua remuneração dos valores correspondentes à alimentação fornecida por seu empregador, uma rede de motéis.



Contrariamente ao decidido em 1º grau, o julgador considerou que o fornecimento de lanche não foge do narrado na petição inicial, referente à "alimentação" ofertada pela empresa. Conforme ponderou, ainda que não se tratasse de almoço ou jantar, o lanche também se inclui como alimentação. Levando em conta a admissão pelo preposto de que a empresa fornecia lanche diariamente, o julgador afastou a tese defensiva de que a alimentação somente era fornecida se o empregado não a trouxesse de casa. Diante disso, o relator explicou que os valores pagos pelo empregador a título de alimentação do empregado, sem ônus para este, representa um plus salarial, revestindo-se, em regra, de natureza salarial (art. 457, §1º, c/c art. 458, ambos da CLT e Súmula 241 do TST).

"A natureza salarial da parcela somente é afastada em virtude de comprovação de previsão normativa em contrário, estipulando-se o caráter meramente indenizatório daquela, bem como de seu fornecimento na forma do Programa de Alimentação do Trabalhador, cuja regulamentação (artigo 6º da Lei n. 6.321/76) tratou de fixar o caráter assistencial da verba, oriunda de incentivo fiscal, sendo o empregador mero intermediário, isto é, repassador de recurso federal", esclareceu o julgador. Mas ele concluiu que no caso analisado não foi comprovada a natureza indenizatória da alimentação fornecida, por falta de norma coletiva nesse sentido e da prova de filiação da reclamada ao PAT.

Na visão do magistrado, não houve comprovação de que o lanche concedido tinha como finalidade viabilizar a prestação de serviços, até porque a prova testemunhal indicou a possibilidade de se comprar a refeição numa loja que fica ao lado. Esse fato ratifica o caráter de liberdade na concessão do beneficio. Nesse cenário, o julgador não teve dúvidas de que o lanche era ofertado como contraprestação, possuindo, pois, natureza salarial. E em razão da alimentação comprovadamente fornecida pela empresa (lanche composto de café, pão e manteiga), fixou o valor deste em R$2,50 por dia.

Assim, o julgador deu provimento parcial ao recurso, para determinar a incorporação ao salário do valor de R$2,50 por dia, relativo ao lanche fornecido pela empresa, com reflexos em repouso semanal remunerado, décimo terceiro salário, férias acrescidas de um terço, FGTS e multa de quarenta por cento, horas extras (inclusive as referentes ao intervalo intrajornada) e adicional noturno. (00808-2014-054-03-00-6-RO - acórdão em 01/08/2016)



Notícias Jurídicas do TRT mineiro sobre o tema:


30/05/2016 06:00h - Auxílio alimentação pago desde a admissão e antes da adesão do empregador ao PAT tem natureza salarial

05/07/2013 06:02h - Reconhecimento da natureza salarial do auxílio alimentação repercute na complementação de aposentadoria

06/09/2012 06:03h - Auxílio alimentação concedido antes da criação do PAT tem natureza salarial

25/11/2010 06:06h - Turma determina incidência de contribuição previdenciária sobre vale alimentação

19/10/2007 06:55h - Não incide INSS sobre ajuda-alimentação definida como indenizatória em convenção coletiva


Clique AQUI e confira outras decisões do TRT mineiro sobre a matéria


Fonte: TRT3

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Jurisprudência contribui para inibir crimes contra dignidade sexual infantil




A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem caminhado no sentido de desestimular e combater quaisquer práticas ofensivas à dignidade sexual de crianças e adolescentes, dando a adequada responsabilização penal aos autores de delitos sexuais.

Recentes julgados interpretam de forma bastante abrangente a expressão “praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos” para caracterizar a consumação do crime denominado estupro de vulnerável, previsto no artigo 217-A, caput, do Código Penal (CP).

Já é pacífico no âmbito do tribunal o entendimento de que, para a configuração do estupro de vulnerável, basta que a intenção do agente seja a satisfação sexual e que estejam presentes os elementos previstos naquele dispositivo, “objetivando a reprimenda ali contida a proteção da liberdade, da dignidade e do desenvolvimento sexual”, conforme aponta o ministro Gurgel de Faria.

Para ele, isso significa que o delito se consuma “com a prática de qualquer ato de libidinagem ofensivo à dignidade sexual da vítima, incluindo toda ação atentatória contra o pudor praticada com o propósito lascivo, seja sucedâneo da conjunção carnal ou não”.

Contato físico

Ao fazer considerações acerca da caraterização do ato libidinoso referido nos artigos 213 e 217-A do CP, o professor de direito penal Rogério Sanches Cunha mencionou que a maioria da doutrina orienta que não há necessidade de contato físico entre o autor e a vítima, “cometendo o crime o agente que, para satisfazer a sua lascívia, ordena que a vítima explore seu próprio corpo (masturbando-se), somente para contemplação” (Manual de Direito Penal: Parte Especial, 8ª edição).

Seguindo essa linha de pensamento, em julgamento de agosto deste ano, a Quinta Turma considerou ser dispensável qualquer tipo de contato físico para caracterizar o delito de estupro de vulnerável. No caso analisado pelo colegiado, uma criança de dez anos foi levada a motel e, mediante pagamento, induzida a tirar a roupa na frente de um homem.

Em concordância com o voto do relator, ministro Joel Ilan Paciornik, o colegiado considerou que “a dignidade sexual não se ofende somente com lesões de natureza física”, sendo, portanto, “irrelevante que haja contato físico entre ofensor e ofendido para a consumação do crime”.

Presunção de violência

Em agosto de 2015, a Terceira Seção, em julgamento de recurso representativo de controvérsia, sedimentou jurisprudência pela presunção absoluta da violência em casos da prática de conjunção carnal ou de ato libidinoso diverso com pessoa menor de 14 anos. Naquela época, já havia vários julgados no sentido de que o consentimento da vítima, a ausência de violência real e de grave ameaça não bastam para absolver o acusado.

De acordo com o relator do repetitivo, ministro Rogerio Schietti Cruz, os fundamentos utilizados pelo tribunal de segundo grau para absolver o acusado seguiram um padrão de comportamento “patriarcal e sexista”, comumente observado em processos por crimes dessa natureza, “nos quais o julgamento recai inicialmente sobre a vítima da ação delitiva, para, somente a partir daí, julgar-se o réu”.

Ao proferir seu voto, o ministro fez uma reflexão sobre a história das ideias penais e das opções de política criminal que deram origem às sucessivas normatizações do direito penal brasileiro. Com base nesse estudo, ele concluiu que “não mais se tolera a provocada e precoce iniciação sexual de crianças e adolescentes por adultos que se valem da imaturidade da pessoa ainda em formação física e psíquica para satisfazer seus desejos sexuais”.

Ele se mostrou otimista ao afirmar que evoluímos, pouco a pouco, “de um Estado ausente e de um direito penal indiferente à proteção da dignidade sexual de crianças e adolescentes para uma política social e criminal de redobrada preocupação com o saudável crescimento físico, mental e emocional do componente infanto-juvenil de nossa população”. Preocupação que, em seu entendimento, passou a ser compartilhada entre o Estado, a sociedade e a família, “com inúmeros reflexos na dogmática penal”.

Contravenção penal

O ato de passar a mão por cima da roupa de menor, nos seios e nas pernas, e de deixar o órgão genital à mostra é suficiente para condenar alguém à pena de 8 a 15 anos de reclusão. Essa foi a conclusão da Quinta Turma, em julgamento deste mês. Os ministros, em decisão unânime, afastaram a desclassificação do crime de estupro de vulnerável para a contravenção penal prevista no artigo 65 do Decreto-Lei 3.688/41.

Na ocasião, o ministro Felix Fischer explicou a diferença entre o crime de estupro de vulnerável e a contravenção penal que foi aplicada ao caso pelo juízo de primeiro grau e mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Na contravenção do artigo 65, disse o ministro, o direito protegido é a tranquilidade pessoal, violada por atos que, embora reprováveis, não são considerados graves. Nesse caso, ele explicou que o objetivo do agente é aborrecer, atormentar, irritar.

“O estupro de vulnerável, por sua vez, é mais abrangente; visa o resguardo, em sentido amplo, da integridade moral e sexual dos menores de 14 anos, cuja capacidade de discernimento, no que diz respeito ao exercício de sua sexualidade, é reduzida”, afirmou Fischer. Para ele, a conduta de que trata esse tipo penal evidencia um comportamento de natureza grave.

Desclassificação

Precedente semelhante da Sexta Turma também refutou a desclassificação do crime de estupro de vulnerável para a contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor, prevista no artigo 61 da Lei de Contravenções Penais. No caso, um professor foi condenado em primeira instância a 39 anos de reclusão porque teria apertado a genitália de quatro alunas, com oito e nove anos de idade, dentro da sala de aula.

Por considerar os atos do professor como de menor gravidade, o Tribunal de Justiça de Sergipe afastou a condenação sob o fundamento de que as “ações se deram sobre a roupa e de forma ligeira, não havendo prova de qualquer contato físico direto, nem a prática de outro ato mais grave”.

Contudo, em concordância com a sentença, o STJ deu provimento ao recurso especial do Ministério Público estadual para condenar o acusado como incurso no artigo 217-A do CP.

“Efetivamente, considerar como ato libidinoso diverso da conjunção carnal somente as hipóteses em que há introdução do membro viril nas cavidades oral ou anal da vítima não corresponde ao entendimento do legislador, tampouco ao da doutrina e da jurisprudência acerca do tema”, defendeu o ministro Rogerio Schietti, relator.

Proteção integral

Schietti ressaltou a proteção integral à criança e ao adolescente ao mencionar o artigo 34, inciso “b”, da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Resolução 44/25 da Assembleia Geral das Nações Unidas, que foi internalizada no ordenamento jurídico nacional.

De acordo com o texto, os Estados se comprometem a proteger a criança contra todas as formas de abuso sexual e, para isso, tomarão todas as medidas de caráter nacional, bilateral e multilateral que sejam necessárias para impedir sua exploração na prostituição ou em outras práticas sexuais ilegais. Os números dos processos não são divulgados em razão de segredo judicial.

Destaques de hoje
Jurisprudência contribui para inibir crimes contra dignidade sexual infantil
Falta de convencimento do julgador não justifica extinção do processo
Após leilão, legitimidade para cobrar taxa de ocupação é do arrematante
Confirmada posse de candidato que perdeu prova física por causa de acidente onte
 
Fonte: STJ

segunda-feira, 16 de maio de 2016

NJ ESPECIAL: Controle de ponto por exceção é válido ou não?



Durante muito tempo uma empresa determinou que somente deveriam ser anotados nos controles de ponto dos empregados fatos excepcionais, como atrasos, faltas e afastamentos. Segundo a empregadora, as demais ocorrências corriqueiras, como horários de entrada e de saída, não precisavam ser registradas, pois poderiam ser presumidas, uma vez que faziam parte da rotina normal de trabalho.
Esse procedimento, que passou a ser adotado por várias empresas, é conhecido como "controle de ponto por exceção". Mas será que a adoção desse sistema possui validade? Há quem entenda que não, mas e se houver norma coletiva autorizando essa prática?
Embora haja ainda entendimentos divergentes sobre o tema em outros Tribunais Regionais do Trabalho, observa-se que a matéria já foi praticamente pacificada no TRT de Minas, com exceção do posicionamento diferente manifestado pela 9ª Turma.
Nesta Notícia Jurídica Especial veremos os fundamentos que embasaram os posicionamentos dos julgadores que atuam na Justiça do Trabalho mineira, no sentido de ser válida ou inválida a adoção do sistema de controle de ponto por exceção.
Conceito Ao julgar um processo em que se discutiu a matéria, o juiz convocado Vitor Salino de Moura Eça pontuou que o sistema de controle de ponto por exceção é aquele "pelo qual se presume o fiel cumprimento da jornada de trabalho, ficando a cargo do empregado anotar os atrasos, as ausências e as horas extras prestadas". (Processo nº 0000551-80.2014.5.03.0098. Acórdão em 24/08/2015).
Em outras palavras, essa modalidade de marcação de ponto por exceção, geralmente prevista em norma coletiva, consiste na pré-assinalação da jornada normal de trabalho e das horas extras pela empregadora, as quais, em tese, poderiam ser alteradas pelo empregado em casos especiais de faltas, licenças, férias, saídas antecipadas, horas extras, afastamentos e outros motivos previstos em lei.
Se não existirem nos controles de ponto as anotações do que "foge ao normal", presume-se que o empregado realizou a jornada contratual prevista, nos moldes da lei vigente.
Referências legais e súmula aplicávelSe a empresa tem mais de dez empregados, a lei determina que mantenha controle de ponto, com anotação da hora de entrada e saída, em registros manuais, mecânicos ou eletrônicos (artigo 74, §2º, da CLT). Esse controle tem dupla finalidade: para a empresa saber quantas horas o empregado trabalhou e para o empregado checar se o seu salário corresponde às horas efetivamente trabalhadas.
Em 1995, o Ministério do Trabalho e Emprego editou a Portaria 1.120/95, que, depois, foi substituída pela Portaria nº 373, de 25/02/2011. Essa Portaria, que facultou aos empregadores a adoção de sistemas alternativos de controle da jornada de trabalho, estabelece o seguinte:
"Art. 1º - Os empregadores poderão adotar sistemas alternativos de controle da jornada de trabalho, desde que autorizados por Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho. § 1º - O uso da faculdade prevista no caput implica a presunção de cumprimento integral pelo empregado da jornada de trabalho contratual, convencionada ou acordada vigente no estabelecimento. § 2º - Deverá ser disponibilizada ao empregado, até o momento do pagamento da remuneração referente ao período em que está sendo aferida a frequência, a informação sobre qualquer ocorrência que ocasione alteração de sua remuneração em virtude da adoção de sistema alternativo. Art. 2º - Os empregadores poderão adotar sistemas alternativos eletrônicos de controle de jornada de trabalho, mediante autorização em Acordo Coletivo de Trabalho. Art. 3º - Os sistemas alternativos eletrônicos não devem admitir: I - restrições à marcação do ponto; II - marcação automática do ponto; III - exigência de autorização prévia para marcação de sobrejornada; e IV - a alteração ou eliminação dos dados registrados pelo empregado. § 1º - Para fins de fiscalização, os sistemas alternativos eletrônicos deverão: I - estar disponíveis no local de trabalho; II - permitir a identificação de empregador e empregado; e
III - possibilitar, através da central de dados, a extração eletrônica e impressa do registro fiel das marcações realizadas pelo empregado. (...)".
É importante destacar, ainda, o entendimento consolidado na Súmula 338 do TST:
"I - É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2º, da CLT. A não-apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário. (ex-Súmula nº 338 - alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003) II - A presunção de veracidade da jornada de trabalho, ainda que prevista em instrumento normativo, pode ser elidida por prova em contrário. (ex-OJ nº 234 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001) III - Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir. (ex-OJ nº 306 da SBDI-1- DJ 11.08.2003) ".Existe uma portaria ministerial que autoriza o controle de ponto por exceção? Este é um dos argumentos utilizados por muitas empresas que recorrem à Justiça do Trabalho mineira: a adoção do sistema de ponto por exceção encontra-se autorizada pelo Ministério do Trabalho, mediante a Portaria 373/2011.
Entretanto, no que se refere a esta modalidade de controle de jornada, apesar de a Portaria 1.120/95, do MTE, revogada posteriormente pela Portaria 373/2011, dispor que "os empregadores poderão adotar sistemas alternativos de controle da jornada de trabalho, desde que autorizados por convenção ou acordo coletivo de trabalho", a jurisprudência dominante do TRT mineiro tem se consolidado no sentido de que os registros de ponto por exceção são nulos, por violarem normas referentes à fiscalização do trabalho, em especial o art. 74, §2º, da CLT.
Nesse contexto, os julgadores que atuam na JT mineira, em sua maioria, aplicam ao caso o entendimento contido na Súmula 338, I, do TST, segundo o qual "a não apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário".
Na interpretação do juiz convocado Carlos Roberto Barbosa, a Portaria ministerial em questão não autoriza o sistema de ponto por exceção. "Ao contrário, a Portaria 373/2011 do MTE, expressamente, não admite marcação automática de ponto (art. 3º, II) e determina que os sistemas alternativos possibilitem "através da central de dados, a extração eletrônica e impressa do registro fiel das marcações realizadas pelo empregado" (art. 3º, §1º), o que vai de encontro com a marcação por exceção promovida pela ré", pontuou o relator do recurso da empresa. (Proc. PJe nº 0010380-93.2015.5.03.0084-RO).
São válidas as normas coletivas que autorizam o controle de ponto por exceção? Outro argumento utilizado por muitas empresas que recorrem à Justiça do Trabalho mineira é o fato de existirem normas coletivas que autorizam a adoção do sistema de ponto por exceção.
Os magistrados que atuam na Justiça do Trabalho mineira, em sua maioria, enfatizam que a Constituição da República, no art. 7º, XXVI, assegura a eficácia das convenções e acordos coletivos de trabalho legitimamente celebrados pelas entidades sindicais representativas das categorias profissional e econômica, os quais devem ser reconhecidos e observados, por se tratar do fruto da negociação coletiva em que as partes fazem concessões mútuas, sempre visando o interesse específico de determinada categoria. Entretanto, segundo o entendimento dominante, não se admite a negociação e a redução dos direitos indisponíveis, como aqueles destinados a proteger a saúde e a segurança do trabalhador.
Em outras palavras, as negociações coletivas encontram limites nas garantias, direitos, princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais instituídos e que são intangíveis à autonomia coletiva, tais como as normas de proteção à saúde e segurança do trabalhador. Sob essa ótica, no âmbito do Direito do Trabalho é pacífico o entendimento de que as normas devem ser interpretadas no sentido de ampliar - e não de restringir - a proteção e as conquistas do trabalhador, que é o elo mais frágil na relação de emprego. Assim, de acordo com a jurisprudência dominante do TRT de Minas, embora o art. 7º, XXVI, da Constituição da República, prestigie os acordos e convenções coletivas, é certo que não ampara a possibilidade absoluta e ilimitada de se transacionar direitos trabalhistas consagrados na mesma Constituição, principalmente no que se refere às normas relativas à duração da jornada de trabalho.
Dessa forma, na visão da maioria dos julgadores que atuam na JT mineira, é destituída de qualquer validade a cláusula normativa que desconsidera a regra geral de anotação, pelo empregador que possua mais de dez empregados, do início e término da jornada efetivamente trabalhada pelo empregado, através de registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme estabelecido no artigo 74, § 2º, da CLT.
Um exemplo que ilustra esse entendimento pode ser encontrado no processo nº 0000183-88.2014.5.03.0060. No caso, o empregado, que exercia a função de técnico de mina e geologia na empresa Vale, alegou que, durante todo o contrato de trabalho, invariavelmente, iniciava e/ou terminava sua jornada de trabalho fora do horário a que estava legalmente obrigado, sem receber as horas extras e reflexos correspondentes. Salientou que a empresa exigia a antecipação do início de seu turno de trabalho para as 15 horas, quando, na realidade, a sua jornada teria início às 18 horas.
A Vale, em sua defesa, aduziu que os acordos coletivos de trabalho firmados com o sindicato da categoria preveem o registro automático da frequência ao trabalho, por meio de controle de exceções, sendo perfeitamente válida essa previsão. Afirmou ainda que eventual hora extra realizada está devidamente registrada no controle de frequência, como exceção. Salientou que os ACTs vigentes permitem a compensação de eventuais horas extras.
Ao analisar o conjunto de provas, o desembargador relator Sércio da Silva Peçanha concluiu que, embora não fosse exigência da empresa, ficou comprovado nos autos que o reclamante chegava antes e saía depois do horário contratual sem registrar as entradas e saídas e sem receber ou compensar as horas extras não anotadas. Na ótica do relator, os depoimentos das duas testemunhas ouvidas a convite do reclamante são suficientes para comprovar que os técnicos chegavam às 15h quando o turno começava às 18h e também saíam mais tarde. Isso porque, segundo as testemunhas, mesmo nos períodos de horário de verão, era necessário fazer uma espécie de vistoria na mina para ver, à luz do dia, se havia alterado alguma área.
O desembargador não deu razão à ré quanto à alegação de que os ACTs firmados com o sindicato da categoria preveem o registro automático da frequência ao trabalho, controle de exceções, e que tal previsão é válida. "Adoto o entendimento de que as normas coletivas que preveem a adoção de sistema de ponto por exceção, carecem de validade, pois afrontam a previsão constante do art. 74, § 2º da CLT, em relação ao controle da jornada de trabalho para as empresas que contam com mais de dez empregados. Trata-se de matéria de ordem pública, não se admitindo transação por meio de negociação coletiva", completou.
Nesse contexto, o relator concluiu que não merecem guarida os fundamentos apresentados pela Vale no sentido de que se deve conferir validade a controles de jornada marcados por exceção, principalmente quando constatado, no caso analisado, que a própria testemunha da ré informou que a antecipação da jornada de trabalho e a participação em reuniões não eram computadas. Assim, foi confirmada a sentença que fixou a jornada com base na prova oral colhida e a condenação ao pagamento das horas extras, assim consideradas as excedentes à 6ª diária, por todo o período não atingido pela prescrição, bem como os reflexos correspondentes.
Corrente minoritáriaNo TRT-MG, apenas os desembargadores que compõem a 9ª Turma assumem um posicionamento distinto sobre o tema, no sentido de ser possível e legal a marcação de ponto por exceção, desde que haja previsão em norma coletiva, isto é, prévia negociação com o sindicato da categoria profissional.
Exemplo desse posicionamento pode ser encontrado no proc. PJe nº 0010910-13.2014.5.03.0091, no qual o desembargador relator João Bosco Pinto Lara enfatizou: "Inicialmente deve ficar claro que, efetivamente, os empregadores poderão adotar sistemas alternativos de controle da jornada de trabalho, desde que autorizados por Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho. (Portaria nº 373/2011 do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE ".
Mas, nesse caso, a empresa não foi absolvida da condenação ao pagamento de horas extras, justamente por causa da prova documental juntada ao processo, inclusive as normas coletivas, que determinaram, para os estabelecimentos com mais de 10 empregados, a obrigatoriedade da anotação da hora de entrada e saída em registros mecânicos ou não, devendo ser assinalados os intervalos para repouso. As normas coletivas estabeleceram que o registro da jornada extraordinária deveria ser feito no mesmo documento em que se anotava a jornada normal (exemplo: cláusula 13ª, § 1º, da CCT 2010/2011).
Em outro processo, a desembargadora relatora Maria Stela Álvares da Silva Campos analisou o recurso da Unimed, que não se conformou com a sua condenação ao pagamento de uma hora extra por dia e correspondentes reflexos. A relatora observou que os ACTs da categoria dispuseram expressamente que os empregados sujeitos ao regime de plantão 12x36 horas fariam jus ao intervalo de uma hora para descanso, a ser gozado de acordo com sua conveniência (cláusula 8ª). Autorizou-se, também, àqueles que trabalhavam em jornada especial, 12x72 horas, o mesmo intervalo, fruído, igualmente, de acordo com a "conveniência destes e a compatibilidade do serviço em execução, ressalvados os casos de jornadas regulamentadas por legislação específica em razão da atividade". A cláusula décima, por seu turno, prevê a "marcação de ponto por exceção", ou seja, permitiu-se a "adoção de marcação de ponto por exceção para preenchimento, pelo empregado, do seu cartão de ponto para marcação dos intervalos intra-jornada".
A desembargadora apurou que os empregados da ré tinham assegurada a pausa de uma hora para alimentação e os cartões de ponto continham a pré-assinalação desse intervalo. Para a julgadora, o conjunto de provas demonstrou que as horas extras eram registradas e pagas e os intervalos fixados no ACT eram fruídos de acordo com a conveniência dos empregados. Ficou claro também que era a própria reclamante quem anotava suas pausas em seus cartões. Diante desse quadro, a relatora concluiu que o intervalo para refeição era efetivamente fruído e, em consequência, deu provimento ao recurso patronal para afastar a condenação ao pagamento de uma hora extra por dia e correspondentes reflexos. (Proc. nº 0000239-49.2015.5.03.0008-ROPS).
ConclusãoPelos casos julgados na Justiça do Trabalho mineira, que bem retratam o entendimento prevalente na jurisprudência, é prudente que se continue a adotar a marcação regular do horário de entrada e saída no controle de ponto mecânico, eletrônico ou manual, a fim de se evitar a nulidade do controle de ponto por exceção ou eventual consideração de inexistência do controle de jornada do empregado.


Notícias Jurídicas anteriores relacionadas ao registro da jornada de trabalho do empregado:

26/02/2016 06:00h - Juiz considera válidos cartões de ponto sem assinatura

13/05/2013 06:03h - Turma concede horas extras a empregado que ficava esperando transporte da empresa para retorno do trabalho

17/08/2011 06:00h - Ônus de provar é de ambas as partes no processo

11/05/2011 06:01h - Atividades preparatórias antes e depois do expediente integram jornada

08/11/2010 06:04h - Empresa é condenada a restituir dias de faltas apuradas por sistema inadequado

19/05/2010 05:59h - Marcação de ponto por exceção é inválida

02/04/2009 06:05h - Controle eletrônico da jornada de maquinistas só vale se acompanhado de registro manuscrito


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Fonte: TRT3


segunda-feira, 14 de março de 2016

NJ Especial - Súmula nº 48 do TRT-MG: Multa do parágrafo 8º do art. 477 da CLT só se aplica em caso de verbas rescisórias não quitadas no prazo



Em ofício ao TRT-MG, o Tribunal Superior do Trabalho informou que o Ministro Luiz Philipe Vieira de Mello Filho determinou o sobrestamento e a devolução dos autos do processo nº 0001451-85.2013.5.03.0005, após suscitar Incidente de Uniformização de Jurisprudência para apreciação do tema: Multa do artigo 477, § 8º da CLT. Atraso na homologação da rescisão contratual. Isto porque identificou a existência de decisões atuais e conflitantes no âmbito do TRT de Minas sobre o tema, como as proferidas pela Nona Turma, nos autos 0011200-19.2014.5.03.0094, e pela Primeira Turma nos autos de número 01451-2013-005-03-00-2, o que gerou o sobrestamento do Recurso de Revista em trâmite no TST.
Assim, atendendo ao disposto no art. 896, parágrafo 3º, da CLT, e na Lei 13.015/2014, o Tribunal Pleno do TRT de Minas, em Sessão Ordinária realizada no dia 08/10/2015, conheceu do Incidente de Uniformização de Jurisprudência - IUJ e, por maioria de votos, cancelou a Orientação Jurisprudencial nº 30 das Turmas do TRT da Terceira Região, determinando a edição de Súmula de jurisprudência uniforme de nº 48, com a seguinte redação:
"MULTA DO § 8º DO ART. 477 DA CLT. FALTA DE PAGAMENTO DAS VERBAS RESCISÓRIAS NO PRAZO LEGAL. CABIMENTO. A aplicação da multa prevista no § 8º do art. 477 da CLT está restrita à falta de pagamento das verbas rescisórias no prazo fixado pelo § 6º". Histórico do IUJOs autos foram distribuídos ao desembargador Oswaldo Tadeu Barbosa Guedes, tendo a Comissão de Jurisprudência se manifestado apontando as correntes jurisprudências antagônicas. A conclusão alcançada pela referida Comissão foi a de que o entendimento contido na Orientação Jurisprudencial nº 30 das Turmas do TRT-MG condizia com iterativa jurisprudência do TST, por sua Subseção I Especializada em Dissídios Individuais.
Eis o conteúdo da referida OJ nº 30 das Turmas: "MULTA DO § 8º DO ART. 477 DA CLT. FALTA DE QUITAÇÃO DAS VERBAS RESCISÓRIAS NO PRAZO LEGAL. CABIMENTO. A aplicação da multa prevista no § 8º do art. 477 da CLT restringe-se à falta de quitação das verbas rescisórias no prazo fixado pelo § 6º".
Em seu parecer, o Ministério Público do Trabalho pronunciou-se pelo conhecimento do IUJ e conversão da OJ 30 das Turmas em súmula.
Teses divergentesA Comissão de Uniformização de Jurisprudência apurou existirem duas correntes contrapostas a respeito do tema no TRT de Minas: a primeira, no sentido de não ser devida a multa em caso de atraso na homologação, quando o pagamento ocorre no prazo estabelecido no § 6º do artigo 477 da CLT. A segunda, por sua vez, entendendo ser devida a multa quando a homologação da rescisão contratual ocorre em desacordo com o prazo previsto na alínea b do § 6º do artigo 477 da CLT ainda que as verbas rescisórias tenham sido quitadas tempestivamente.
Entendimento do RelatorPara o relator, o entendimento da primeira corrente deve prevalecer. "Tratando-se de cláusula penal, a interpretação deve ser restritiva, não se podendo elastecê-la, pois a regra legal se refere tão somente ao pagamento das verbas rescisórias", registrou, destacando ser esta também a conclusão do Ministério Público do Trabalho, que opinou pela conversão da tese consolidada na Orientação Jurisprudencial nº 30 em súmula.
"Efetivamente, ao dispor sobre a sanção ante a mora no pagamento das verbas rescisórias, o legislador teve em vista, exclusivamente, a necessidade do ex-empregado receber o pagamento, punindo o empregador que deixa de proceder à quitação no prazo legal, mas não em razão da mora na homologação, vez que esta não está adstrita ao arbítrio do empregador, dependendo de agendamento perante os órgãos competentes para homologar a rescisão", constou também da decisão.
O desembargador ainda citou parte do parecer do Ministério Público do Trabalho, ponderando que "a homologação da rescisão do contrato de trabalho depende de agendamento perante os órgãos competentes Sindicatos, MTE, etc., não se podendo imputar ao empregador a responsabilidade por sua efetivação fora do prazo legal estipulado para o pagamento das verbas rescisórias".
Com esses fundamentos, propôs o cancelamento da Orientação Jurisprudencial nº 30 das Turmas, determinando a edição de Súmula de Jurisprudência uniforme conforme o entendimento adotado, sendo acompanhado pela maioria dos votantes.
0001451-85.2013.5.03.0005 IUJ - (01451-2013-005-03-00-2 IUJ) 08/10/2015.

Notícias Jurídicas anteriores sobre a matéria:

24/01/2016 06:00h - Pagamento das verbas rescisórias no prazo é suficiente para afastar multa do artigo 477 da CLT
09/01/2016 06:00h - Reversão da justa causa atrai multa do artigo 477 da CLT
27/12/2015 06:00h - Demora na compensação do cheque não gera direito à multa do artigo 477 da CLT
10/11/2014 06:02h - Reversão de justa causa não autoriza a aplicação da multa do artigo 477 da CLT
24/02/2014 06:02h - Turma defere multa do artigo 477 da CLT em caso de reversão de justa causa
03/09/2013 06:03h - Multa do artigo 477 da CLT é devida mesmo se discutida em juízo a existência da relação de emprego
08/08/2012 06:04h - Pagamento no prazo não exime empregador da multa do parágrafo 8º do artigo 477 da CLT
21/06/2012 06:00h - Multa do artigo 477 da CLT é devida em relação de emprego reconhecida judicialmente
28/05/2012 06:02h - Atraso na homologação do acerto gera direito à multa do artigo 477 da CLT
05/03/2012 05:00h - Turma defere multa do artigo 477 por ausência de depósito do FGTS
24/03/2010 06:03h - Multa do artigo 477 da CLT é devida mesmo quando a relação de emprego é reconhecida em sentença
04/02/2010 05:59h - Justa causa revertida em juízo gera obrigação de pagar multa do artigo 477 da CLT
25/05/2007 06:01h - Prazo e multa do art. 477/CLT se aplicam às obrigações de fazer

Clique AQUI e confira o acórdão que deu origem ao IUJ

Clique AQUI e confira o acórdão que firmou a Súmula nº 48

Clique AQUI e confira a relação de todos os INCIDENTES DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA suscitados

Clique AQUI para ler decisões anteriores do TRT mineiro sobre a matéria 

Fonte: TRT3

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...