sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Segunda Seção decide em repetitivo pela legalidade da pactuação da TAC e TEC até 2008



A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou na última quarta-feira (28) as teses que devem orientar as instâncias ordinárias da Justiça brasileira no que se refere à cobrança da tarifa de abertura de crédito (TAC), tarifa de emissão de carnê ou boleto (TEC) e tarifa de cadastro, e também ao financiamento do Imposto sobre Operações Financeiras e de Crédito (IOF).

A unanimidade dos ministros seguiu o voto da relatora, ministra Isabel Gallotti, no sentido de que atualmente a pactuação de TAC e TEC não tem mais respaldo legal; porém a cobrança é permitida se baseada em contratos celebrados até 30 de abril de 2008.

De acordo com os ministros, a cobrança de tarifas é legal desde que elas sejam pactuadas em contrato e estejam em consonância com a regulamentação das autoridades monetárias. Os ministros Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino, embora acompanhando o voto da relatora, ressalvaram seu ponto de vista.

A Seção julgou dois recursos repetitivos, interpostos pelo Banco Volkswagen S/A e Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A. A decisão deve orientar a solução de milhares de recursos que tratam do mesmo tema e ficaram sobrestados nos tribunais de segunda instância, à espera da posição do STJ.

Em 23 de maio deste ano, a ministra Isabel Gallotti, relatora dos recursos no STJ, determinou a suspensão de todos os processos relativos a TAC e TEC que tramitavam na Justiça Federal e estadual, nos juizados especiais civis e nas turmas recursais. A medida afetou cerca de 285 mil ações em todo o país, em que se discutem valores estimados em R$ 533 milhões.

Teses fixadas

Com o julgamento dos recursos repetitivos, o trâmite dos processos deve prosseguir nas instâncias ordinárias, segundo os parâmetros oferecidos pelo STJ.

A Segunda Seção definiu que os efeitos do julgamento no rito dos repetitivos alcançariam apenas as questões relacionadas às tarifas TAC e TEC, com quaisquer outras denominações adotadas pelo mercado, tarifa de cadastro e a questão do financiamento do IOF. Matérias relativas aos valores cobrados para ressarcir serviços de terceiros e tarifas por outros tipos de serviços não foram analisadas no âmbito de repetitivo.

A Seção aprovou à unanimidade as três teses que devem servir de parâmetro para análise dos processos paralisados, conforme o voto da ministra Gallotti.

A primeira tese é que “nos contratos bancários celebrados até 30 de abril de 2008 (fim da vigência da Resolução CMN 2.303/96), era válida a pactuação dessas tarifas, inclusive as que tiverem outras denominações para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame da abusividade em cada caso concreto”.

A segunda tese estabelece que, “com a vigência da Resolução 3.518/07, em 30 de abril de 2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizada expedida pela autoridade monetária”.

“Desde então”, acrescentou a ministra relatora, “não tem mais respaldo legal a contratação da TEC e TAC, ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a tarifa de cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira”.

A terceira tese fixada pela Seção diz que “as partes podem convencionar o pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras e de Crédito (IOF) por meio de financiamento acessório ao mútuo principal, sujeitando-o aos mesmos encargos contratuais”.

Os processos

Nos processos julgados pela Seção, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) havia declarado abusiva a exigência das tarifas administrativas para concessão de crédito e a cobrança parcelada do IOF. As instituições recorreram ao STJ com o argumento de que as tarifas atendem às Resoluções 2.303 e 3.518 mediante autorização concedida pela Lei 4.595/64, estando permitida a cobrança até 30 de abril de 2008.

As instituições financeiras sustentaram que o fracionamento do IOF é opção exercida pelo mutuário, porém o recolhimento é integral, no início da operação, pelas próprias instituições, o que não constitui abuso. A operação é um tipo de mútuo oferecido ao cliente para quitação do tributo no ato do contrato. Por isso o valor é superior ao valor devido ao fisco, já que ele mesmo constitui uma espécie de operação de crédito.

Atuaram nos processos como amicus curiae o Banco Central e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) apresentou memoriais.

Abuso comprovado

Durante o julgamento, o Banco Central defendeu a legalidade das tarifas e do parcelamento do IOF. O órgão esclareceu que, na vigência da Resolução 2.303, a cobrança pela prestação de quaisquer tipos de serviços era lícita, desde que efetivamente contratados e prestados, com exceção dos serviços definidos como básicos.

A conclusão da Segunda Seção é que não havia, até então, obstáculo legal às tarifas de abertura de crédito e emissão de carnê. Essas deixaram de existir com a edição da Resolução 3.518, que permitiu apenas a cobrança das tarifas especificadas em ato normativo do Banco Central.

“Reafirmo o entendimento no sentido da legalidade das tarifas bancárias, desde que pactuadas de forma clara no contrato e obedecida a regulamentação expedida pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central, ressalvado abuso devidamente comprovado, caso a caso, em comparação com os preços cobrados no mercado”, concluiu Gallotti.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Verbetes das Jornadas de Direito Civil (parte 2)

A prescrição não corre entre companheiros, na constância da união estável (Prova objetiva do concurso público para provimento de vagas e formação de cadastro de reserva para o cargo de Promotor de Justiça Substituto do Ministério Público do Estado do Piauí).
Dando seguimento à consolidação dos termos em que expostos os verbetes das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, cuidaremos hoje de finalizar a organização dos que se referem à Parte Geral.
Enunciado 286
Os direitos da personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos.
Enunciado 534
As associações podem desenvolver atividade econômica, desde que não haja finalidade lucrativa.
Enunciado 261
A obrigatoriedade de destinação do patrimônio líquido remanescente da associação à instituição municipal, estadual ou federal de fins idênticos ou semelhantes, em face da omissão do estatuto, possui caráter subsidiário, devendo prevalecer a vontade dos associados, desde que seja contemplada entidade que persiga fins não econômicos.
Enunciados 8 e 9
A constituição de fundação para fins científicos, educacionais ou de promoção do meio ambiente está compreendida no Código Civil, artigo 62, parágrafo único, segundo o qual “a fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência”. O preceito deve ser interpretado de modo a excluir apenas as fundações com fins lucrativos.
Enunciados 10 e 147
Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas. Se funcionarem no Distrito Federal, ou em Território, caberá o encargo ao Ministério Público Federal. Esta disposição, contudo, deve ser interpretada em sintonia com os artigos 70 (“Os Procuradores da República serão designados para oficiar junto aos Juízes Federais e junto aos Tribunais Regionais Eleitorais, onde não tiver sede a Procuradoria Regional da República”) e 178 (“Os Promotores de Justiça serão designados para oficiar junto às Varas da Justiça do Distrito Federal e Territórios”) da Lei Complementar 75/1993, em face do princípio da especialidade. Se estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles, ao respectivo Ministério Público. A expressão “por mais de um Estado” não exclui o Distrito Federal e os Territórios.
Enunciado 147
A atribuição de velar pelas fundações ao Ministério Público local – isto é, dos Estados, Distrito Federal e Territórios onde situadas – não exclui a necessidade de fiscalização de tais pessoas jurídicas pelo Ministério Público Federal, quando se tratar de fundações instituídas ou mantidas pela União, autarquia ou empresa pública federal, ou que destas recebam verbas, nos termos da Constituição Federal, da Lei Complementar 75/1993 e da Lei de Improbidade Administrativa.
Enunciado 408
A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. Para efeitos de interpretação da expressão “domicílio”, deve ser considerada, nas hipóteses de litígio internacional relativo a criança ou adolescente, a residência habitual destes, pois se trata de situação fática internacionalmente aceita e conhecida.
Enunciado 11
Não persiste no novo sistema legislativo a categoria dos bens imóveis por acessão intelectual, não obstante a expressão “tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente”, constante da parte final do artigo 79 do Código Civil (“São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente”).
Enunciado 288
Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária. Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico. A pertinência subjetiva não constitui requisito imprescindível para a configuração das universalidades de fato e de direito.
Enunciado 535
Nos termos do artigo 93 do Código Civil, são pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro. Para a existência da pertença, o preceito não exige elemento subjetivo como requisito para o ato de destinação.
Enunciado 287
São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem. Esse critério da classificação de bens não exaure a enumeração dos bens públicos, podendo ainda ser classificado como tal o bem pertencente a pessoa jurídica de direito privado que esteja afetado à prestação de serviços públicos.
Enunciado 289
Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no País. O valor de 30 salários mínimos, em referência à forma pública ou particular dos negócios jurídicos que envolvam bens imóveis, é o atribuído pelas partes contratantes, e não qualquer outro valor arbitrado pela Administração Pública com finalidade tributária.
Enunciado 409
Os negócios jurídicos devem ser interpretados não só conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração, mas também de acordo com as práticas habitualmente adotadas entre as partes.
Enunciado 12
Segundo o artigo 138 do Código Civil, são anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio. Na sistemática do preceito, é irrelevante ser ou não escusável o erro, porque o dispositivo adota o princípio da confiança.
Enunciado 148
O estado de perigo configura-se o quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa. Ao estado de perigo aplica-se, por analogia, o disposto no parágrafo 2º do artigo 157 do Código Civil, segundo o qual “não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito”.
Enunciado 410
Nos termos do artigo 157 do Código Civil, ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta. A inexperiência a que se refere o preceito não deve necessariamente significar imaturidade ou desconhecimento em relação à prática de negócios jurídicos em geral, podendo ocorrer também quando o lesado, ainda que estipule contratos costumeiramente, não tenha conhecimento específico sobre o negócio em causa.
Enunciado 149
Em atenção ao princípio da conservação dos contratos, a verificação da lesão deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial do negócio jurídico e não à sua anulação, sendo dever do magistrado incitar os contratantes a seguir as regras do artigo 157, parágrafo 2º, do Código Civil de 2002 (“Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito”).
Enunciados 150, 290 e 291
A lesão não exige dolo de aproveitamento, mas acarretará a anulação do negócio jurídico quando verificada, na formação deste, a desproporção manifesta entre as prestações assumidas pelas partes, não se presumindo a premente necessidade ou a inexperiência do lesado. Pode, contudo, o lesionado optar por não pleitear a anulação do negócio jurídico, deduzindo, desde logo, pretensão com vista à revisão judicial do negócio por meio da redução do proveito do lesionador ou do complemento do preço.
Enunciado 151
Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores cuja garantia se tornar insuficiente, como lesivos dos seus direitos. O ajuizamento da ação pauliana pelo credor com garantia real prescinde de prévio reconhecimento judicial da insuficiência da garantia.
Enunciados 151 e 292
Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários e pelos credores cuja garantia se tornar insuficiente, como lesivos dos seus direitos. Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles. A anterioridade do crédito é determinada pela causa que lhe dá origem, independentemente de seu reconhecimento por decisão judicial. O ajuizamento da ação pauliana pelo credor com garantia real prescinde de prévio reconhecimento judicial da insuficiência da garantia.
Enunciados 152 e 294
Toda simulação, inclusive a inocente, é invalidante. Sendo uma causa de nulidade do negócio jurídico, pode ser alegada por uma das partes contra a outra.
Enunciados 153 e 293

Na simulação relativa: a) o negócio simulado (aparente) é nulo, mas o dissimulado será válido se não ofender a lei nem causar prejuízos a terceiros; b) o aproveitamento do negócio jurídico dissimulado não decorre tão-somente do afastamento do negócio jurídico simulado, mas do necessário preenchimento de todos os requisitos substanciais e formais de validade daquele.
Enunciados 536 e 537
Nos termos do artigo 169 do Código Civil, o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo. Resultando do negócio jurídico nulo consequências patrimoniais capazes de ensejar pretensões, é possível, quanto a estas, a incidência da prescrição. A previsão contida no preceito, contudo, não impossibilita que, excepcionalmente, negócios jurídicos nulos produzam efeitos a serem preservados quando justificados por interesses merecedores de tutela.
Enunciado 13
Se o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade. O aspecto objetivo da convenção requer a existência do suporte fático no negócio a converter-se.
Enunciado 538
Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável, sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de 2 anos, a contar da data da conclusão do ato. No que diz respeito a terceiros eventualmente prejudicados, este prazo decadencial não se conta da celebração do negócio jurídico, mas da ciência que dele tiverem.
Enunciado 411
O descumprimento de contrato pode gerar dano moral quando envolver valor fundamental protegido pela Constituição Federal de 1988.
Enunciado 412
As diversas hipóteses de exercício inadmissível de uma situação jurídica subjetiva, tais como supressio, tu quoque, surrectio e venire contra factum proprium, são concreções da boa-fé objetiva.
Enunciado 413Comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, que possuem natureza subjetiva, destinada ao controle da moralidade social de determinada época, e objetiva, para permitir a sindicância da violação dos negócios jurídicos em questões não abrangidas pela função social e pela boa-fé objetiva.
Enunciado 414
A cláusula geral do artigo 187 do Código Civil (“Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”), tem fundamento constitucional nos princípios da solidariedade, devido processo legal e proteção da confiança, e aplica-se a todos os ramos do direito.
Enunciado 539
O abuso de direito é uma categoria jurídica autônoma em relação à responsabilidade civil. Por isso, o exercício abusivo de posições jurídicas desafia controle independentemente de dano.
Enunciado 14
Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os artigos 205[1] e 206[2] do Código Civil. A previsão diz respeito a casos em que a pretensão nasce imediatamente após a violação do direito absoluto ou da obrigação de não fazer. O início do prazo prescricional ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo.
Enunciado 415
Nos termos do artigo 190 do Código Civil, a exceção prescreve no mesmo prazo em que a pretensão. O preceito refere-se apenas às exceções impróprias (dependentes/não autônomas). As exceções propriamente ditas (independentes/autônomas) são imprescritíveis.
Enunciado 295
A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição. A revogação do artigo 194 do Código Civil (“O juiz não pode suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz”) pela Lei 11.280/2006, que determina ao juiz o reconhecimento de ofício da prescrição, não retira do devedor a possibilidade de renúncia.
Enunciado 154
O juiz deve suprir, de ofício, a alegação de prescrição em favor do absolutamente incapaz.
Enunciado 296
Não corre a prescrição entre os companheiros, na constância da união estável.
Enunciado 416
A propositura de demanda judicial pelo devedor, que importe impugnação do débito contratual ou de cártula representativa do direito do credor, é causa interruptiva da prescrição.
Enunciado 417
O artigo 202, inciso I, do Código Civil, segundo o qual a interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual, deve ser interpretado sistematicamente com o artigo 219, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (“A interrupção da prescrição retroagirá à data da propositura da ação”), de modo a se entender que o efeito interruptivo da prescrição produzido pelo despacho que ordena a citação é retroativo até a data da propositura da demanda.
Enunciado 418
O prazo prescricional de 3 anos para a pretensão relativa a aluguéis aplica-se aos contratos de locação de imóveis celebrados com a administração pública.
Enunciados 419 e 420
O prazo prescricional de 3 anos para a pretensão de reparação civil aplica-se tanto à responsabilidade contratual quanto à responsabilidade extracontratual, mas não é aplicável às pretensões indenizatórias decorrentes de acidente de trabalho, após a vigência da Emenda Constitucional 45, incidindo a regra do artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, que estabelece ser direito dos trabalhadores urbanos e rurais demandar os créditos resultantes das relações de trabalho, no prazo prescricional de 5 anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de 2 anos após a extinção do contrato de trabalho.
Enunciado 297
Salvo o negócio a que se impõe forma especial, o fato jurídico pode ser provado mediante: confissão; documento; testemunha; presunção e perícia. O documento eletrônico tem valor probante, desde que seja apto a conservar a integridade de seu conteúdo e idôneo a apontar sua autoria, independentemente da tecnologia empregada.
Enunciado 298
As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão. Os arquivos eletrônicos incluem-se no conceito de reproduções eletrônicas de fatos ou de coisas, aos quais deve ser aplicado o regime jurídico da prova documental.
Enunciado 299
Iniciada a contagem de determinado prazo sob a égide do Código Civil de 1916, e vindo a lei nova a reduzi-lo, prevalecerá o prazo antigo, desde que transcorrido mais de metade deste na data da entrada em vigor do novo Código. O novo prazo será contado a partir de 11 de janeiro de 2003, desprezando-se o tempo anteriormente decorrido, salvo quando o não-aproveitamento do prazo já vencido implicar aumento do prazo prescricional previsto na lei revogada, hipótese em que deve ser aproveitado o prazo já transcorrido durante o domínio da lei antiga, estabelecendo-se uma continuidade temporal.
Enunciado 300
A lei aplicável aos efeitos atuais dos contratos celebrados antes do novo Código Civil será a vigente na época da celebração; todavia, havendo alteração legislativa que evidencie anacronismo da lei revogada, o juiz equilibrará as obrigações das partes contratantes, ponderando os interesses traduzidos pelas regras revogada e revogadora, bem como a natureza e a finalidade do negócio.
A terceira parte da consolidação dos verbetes das Jornadas de Direito Civil promovidas pelo Conselho de Justiça Federal será publicada na próxima quinta-feira (5/9). Na oportunidade, trataremos de organizar os enunciados relacionados com o Direito das Coisas.

[1] A prescrição ocorre em 10 anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.
[2] Prescreve em 1 ano: i) a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de víveres destinados a consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da hospedagem ou dos alimentos; ii) a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo: a) para o segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, da data em que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador; b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão; iii) a pretensão dos tabeliães, auxiliares da justiça, serventuários judiciais, árbitros e peritos, pela percepção de emolumentos, custas e honorários; iv) a pretensão contra os peritos, pela avaliação dos bens que entraram para a formação do capital de sociedade anônima, contado da publicação da ata da assembléia que aprovar o laudo; V) a pretensão dos credores não pagos contra os sócios ou acionistas e os liquidantes, contado o prazo da publicação da ata de encerramento da liquidação da sociedade. Prescreve em 2 anos a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data em que se vencerem. Prescreve em 3 anos: i) a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos; ii) a pretensão para receber prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias; iii) a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações acessórias, pagáveis, em períodos não maiores de um ano, com capitalização ou sem ela; iv) a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa; v) a pretensão de reparação civil; vi) a pretensão de restituição dos lucros ou dividendos recebidos de má-fé, correndo o prazo da data em que foi deliberada a distribuição; vii) a pretensão contra as pessoas em seguida indicadas por violação da lei ou do estatuto, contado o prazo: a) para os fundadores, da publicação dos atos constitutivos da sociedade anônima; b) para os administradores, ou fiscais, da apresentação, aos sócios, do balanço referente ao exercício em que a violação tenha sido praticada, ou da reunião ou assembléia geral que dela deva tomar conhecimento; c) para os liquidantes, da primeira assembléia semestral posterior à violação; viii) a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial; ix) a pretensão do beneficiário contra o segurador, e a do terceiro prejudicado, no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório. Prescreve em 4 anos a pretensão relativa à tutela, a contar da data da aprovação das contas. Prescreve em 5 anos: i) a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular; ii) a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou mandato; iii) a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em juízo.
Aldo de Campos Costa exerce o cargo de assessor de ministro do Supremo Tribunal Federal. Foi professor substituto da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 29 de agosto de 2013

Verbetes das Jornadas de Direito Civil (parte 1)

Os direitos da personalidade da pessoa natural são intransmissíveis, irrenunciáveis, impenhoráveis e inexpropriáveis, entretanto, podem ser objeto de disposição por meio de contrato (Prova objetiva do concurso público para preenchimento de vagas e formação de cadastro de reserva para o cargo de analista do Serviço Federal de Processamento de Dados).
Por retratarem o pensamento médio de magistrados, professores, representantes das diversas carreiras jurídicas e estudiosos do direito civil brasileiro, os verbetes das Jornadas do Conselho da Justiça Federal vêm sendo cobrados com regularidade em processos seletivos e concursos públicos de todo o Brasil. A leitura dos enunciados, contudo, não raro é prejudicada pela forma como os textos são apresentados — por referência ou remissão aos preceitos do Código Civil. Daí a ideia de dedicar-se seis edições desta coluna à consolidação dos termos em que expostos os mencionados entendimentos. Iniciaremos hoje a organizaçao daqueles alusivos à Parte Geral.
Enunciados 1 e 2
Nos termos do artigo 2º do Código Civil, a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. A proteção deferida ao nascituro alcança o natimorto no que concerne aos direitos da personalidade, tais como: nome, imagem e sepultura. O dispositivo, entretanto, não é sede adequada para questões emergentes da reprogenética humana, que devem ser objeto de um estatuto próprio.
Enunciado 138
Segundo dispõe o artigo 3º, os maiores de 16 e os menores de 18 anos são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Sua vontade, contudo, é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que demonstrem discernimento bastante para tanto.
Enunciado 3
A menoridade cessa aos 18 anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. A redução do limite etário para a definição da capacidade civil aos dezoito anos não altera o disposto no artigo 16, inciso I, da Lei 8.213/1991, segundo o qual são beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependente do segurado, os menores de 21 anos, porquanto regula específica situação de dependência econômica para fins previdenciários e outras situações similares de proteção, previstas em legislação especial.
Enunciados 397 e 530
A incapacidade cessará, para os menores  pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 anos completos. A emancipação sujeita-se à desconstituição por vício de vontade e, por si só, não elide a incidência do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Enunciados 272 e 273
Não é admitida em nosso ordenamento jurídico a adoção por ato extrajudicial, sendo indispensável a atuação jurisdicional, inclusive para a adoção de maiores de dezoito anos. Na adoção bilateral e na adoção unilateral, quando não se preserva o vínculo com qualquer dos genitores originários, deverá ser averbado o cancelamento do registro originário de nascimento do adotado, lavrando-se novo registro. Sendo unilateral a adoção, e sempre que se preserve o vínculo originário com um dos genitores, deverá ser averbada a substituição do nome do pai ou mãe naturais pelo nome do pai ou mãe adotivos.
Enunciado 4 e 139
Excetuados os casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária. Ressalva-se a que não seja permanente nem geral, mesmo não especificamente prevista em lei.
Enunciado 139
Os direitos da personalidade não podem ser exercidos com abuso de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé objetiva e aos bons costumes.
Enunciados 144, 274 e 531
Os direitos da personalidade, regulados de maneira não exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da dignidade da pessoa humana, contida no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, que, na sociedade da informação, inclui o direito ao esquecimento. Em caso de colisão entre os direitos da personalidade, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação.
Enunciados 6, 276, 401 e 532
Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes. A expressão “exigência médica” refere-se tanto ao bem-estar físico quanto ao bem-estar psíquico do disponente, autorizando as cirurgias de transgenitalização, em conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina, e a conseqüente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil. É permitida, ainda, a disposição gratuita do próprio corpo com objetivos exclusivamente científicos e para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial. A cessão gratuita de direitos de uso de material biológico para fins de pesquisa científica não contraria os bons costumes quando a manifestação de vontade for livre, esclarecida e puder ser revogada a qualquer tempo, conforme as normas éticas que regem a pesquisa científica e o respeito aos direitos fundamentais.
Enunciados 5, 140, 275, 399 e 400
O cônjuge sobrevivente, o companheiro ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau, podem exigir, por direito próprio, de forma concorrente e autônoma, seja cessada a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Essa possibilidade refere-se às técnicas de tutela específica, aplicáveis de ofício, enunciadas no artigo 461 do Código de Processo Civil, devendo ser interpretada com resultado extensivo. Tem caráter geral e pode ser aplicada subsidiariamente, com relação ao cônjuge sobrevivente, o companheiro ou qualquer parente em linha reta, à divulgação de escritos, à transmissão da palavra, ou à publicação, à exposição ou à utilização da imagem de uma pessoa se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais, salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública. Essas disposições, instituídas no artigo 20 do Código Civil, têm a finalidade específica de regrar a projeção dos bens personalíssimos nas situações nele mencionadas. Os poderes conferidos aos legitimados para a tutela post mortem dos direitos da personalidade não compreendem a faculdade de limitação voluntária.
Enunciado 277
O artigo 14 do Código Civil, ao afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo, com objetivo científico ou altruístico, para depois da morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do artigo 4º da Lei 9.434/1997, segundo o qual “a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte” ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial doador.
Enunciado 402
Fundado no consentimento informado, o artigo 14, parágrafo único, do Código Civil, segundo o qual “o ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo”, não dispensa o consentimento dos adolescentes para a doação de medula óssea prevista no art. 9º, § 6º, da Lei 9.434/1997, que dispõe não poder o indivíduo juridicamente incapaz, com compatibilidade imunológica comprovada, fazer doação nos casos de transplante de medula óssea, salvo quando houver consentimento de ambos os pais ou seus responsáveis legais e autorização judicial e o ato não oferecer risco para a sua saúde, por aplicação analógica dos artigos 28, § 2º (“Tratando-se de maior de doze anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em audiência”) e 45, § 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (“Em se tratando de adotando maior de doze anos de idade, será também necessário o seu consentimento”).
Enunciado 403
O direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a tratamento médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de morte, em razão do tratamento ou da falta dele, desde que observada a capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo representante ou assistente; a manifestação de vontade livre, consciente e informada; e a oposição que diga respeito exclusivamente à própria pessoa do declarante.
Enunciado 533
O paciente plenamente capaz poderá deliberar sobre todos os aspectos concernentes a tratamento médico que possa lhe causar risco de vida, seja imediato ou mediato, salvo as situações de emergência ou no curso de procedimentos médicos cirúrgicos que não possam ser interrompidos.
Enunciado 278
Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial. A publicidade que divulgar, sem autorização, qualidades inerentes a determinada pessoa, ainda que sem mencionar seu nome, mas sendo capaz de identificá-la, constitui violação a direito da personalidade.
Enunciado 279
Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. A proteção à imagem deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa, biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações.
Enunciados 404 e 405
A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma. A tutela da privacidade da pessoa humana compreende os controles espacial, contextual e temporal dos próprios dados, sendo necessário seu expresso consentimento para tratamento de informações que versem especialmente o estado de saúde, a condição sexual, a origem racial ou étnica, as convicções religiosas, filosóficas e políticas. As informações genéticas também são parte da vida privada e não podem ser utilizadas para fins diversos daqueles que motivaram seu armazenamento, registro ou uso, salvo com autorização do titular.
Enunciado 141
Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado, isto é, as fundações públicas e os entes de fiscalização do exercício profissional, regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas do Código Civil.
Enunciado 142
Os partidos políticos, os sindicatos e as associações religiosas possuem natureza associativa, aplicando-se-lhes o Código Civil.
Enunciado 143
O fato de ser livre o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento, não afasta o controle de legalidade e legitimidade constitucional de seu registro, nem a possibilidade de reexame, pelo Judiciário, da compatibilidade de seus atos com a lei e com seus estatutos.
Enunciado 144
São pessoas jurídicas de direito privado: as associações, as sociedades, as fundações, as organizações religiosas, os partidos políticos e as empresas individuais de responsabilidade limitada. Essa relação não é exaustiva.
Enunciado 280
Os artigos 57 (“A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que assegure direito de defesa e de recurso, nos termos previstos no estatuto”) e 60 (“A convocação dos órgãos deliberativos far-se-á na forma do estatuto, garantido a um quinto dos associados o direito de promovê-la”), aplicam-se subsidiariamente às sociedades empresárias, exceto às limitadas, nos seguintes termos: i) em havendo previsão contratual, é possível aos sócios deliberar a exclusão de sócio por justa causa, pela via extrajudicial, cabendo ao contrato disciplinar o procedimento de exclusão, assegurado o direito de defesa, por aplicação analógica do artigo 1.085 (“Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa”) e ii) as deliberações sociais poderão ser convocadas por iniciativa de sócios que representem um quinto do capital social, na omissão do contrato. A mesma regra aplica-se na hipótese de criação, pelo contrato, de outros órgãos de deliberação colegiada.
Enunciado 145
Não afasta a aplicação da teoria da aparência o fato de os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo, obrigarem a pessoa jurídica.
Enunciados 7, 281, 285, 406 e 407
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica, descrita no artigo 50 do Código Civil (“Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”): a) só se aplica quando houver a prática de ato irregular e, limitadamente, aos administradores ou sócios que nela hajam incorrido; b) prescinde da demonstração de insolvência da pessoa jurídica; c) pode ser invocada pela pessoa jurídica, em seu favor; d) pode alcançar os grupos de sociedade quando estiverem presentes os pressupostos do preceito e houver prejuízo para os credores até o limite transferido entre as sociedades; e) pode alcançar as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou de fins não econômicos.
Enunciado 283
É cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada “inversa” para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros.
Enunciado 282
O encerramento irregular das atividades da pessoa jurídica, por si só, não basta para caracterizar abuso da personalidade jurídica.
Enunciado 146
Nas relações civis, interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica previstos no artigo 50 do Código Civil: o desvio de finalidade social ou confusão patrimonial.
A segunda parte da consolidação dos verbetes das Jornadas de Direito Civil promovidas pelo Conselho de Justiça Federal alusivos à Parte Geral do Código será publicada na próxima quinta-feira (29/8).
Aldo de Campos Costa exerce o cargo de assessor de ministro do Supremo Tribunal Federal. Foi professor substituto da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 22 de agosto de 2013

Emenda dos novos TRFs é inconstitucional, diz AGU

A Advocacia-Geral da União enviou nesta quarta-feira (28/8) manifestação ao Supremo Tribunal Federal em que defende a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional que cria quatro novos tribunais regionais federais.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi proposta pela Associação Nacional dos Procuradores Federais em julho deste ano. No mesmo dia em que a ADI foi ajuizada, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, concedeu liminar para suspender a emenda.
Segundo a AGU, a Emenda Constitucional 73/2013 sofrede inconstitucionalidade formal e material. Os vícios formais apontados são dois: violação do princípio da separação dos poderes e inobservância das regras de tramitação para propostas de emendas constitucionais.
Diz a AGU que a emenda decorreu de projeto de iniciativa parlamentar, e que apenas o Poder Judiciário pode propor a criação ou extinção de tribunais inferiores. "Não se deve permitir que o Poder Constituinte Reformador, mediante projeto de emenda à Constituição, usurpe prerrogativa reservada constitucionalmente a outro Poder da República".
A emenda que cria quatro novos tribunais foi aprovada em sessão conjunta do Senado e da Câmara dos Deputados em junho deste ano. Pelo texto, os TRFs terão sede em Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG), Salvador (BA) e Manaus (AM). A PEC foi proposta pelo senador Arlindo Porto (PTB-MG).
O segundo vício formal apontado pela AGU refere-se à tramitação da PEC. Diz a manifestação que a redação final da Emenda foi alterada pela Câmara dos Deputados e por isso deveria ter sido submetida ao Senado.
“A emenda sob invectiva padece de vício formal por inobservância ao processo legislativo contemplado pela Carta da República no que tange à edição de emendas constitucionais, devendo ser reconhecida a sua inconstitucionalidade também por esse motivo”, defende.
Na época em que a PEC estava para ser promulgada, o próprio presidente do Senado, Renan Calheiros, dizia que relutava em aprová-la devido à possibilidade de questionamentos jurídicos por conta da tramitação.
"A opção de não promulgar a Emenda Constitucional que criou novos tribunais regionais federais decorreu do entendimento de que a proposta contém erro formal, suscetível de questionamentos jurídicos, já que o texto aprovado pela Câmara dos Deputados sofreu alterações substanciais em relação ao que foi enviado pelo Senado Federal", disse o senador em nota.
Quando a proposta foi aprovada, Renan estava em Portugal em missão oficial e a sessão acabou presidida pelo deputado André Vargas (PT-PR), que aproveitou a situação para promulgar a EC 73.
O vício material apontado pela AGU diz respeito à obrigatoriedade de dotação orçamentária prévia para o custeio de despesas com pessoal e criação de cargos. Para a AGU, os novos tribunais trará impacto à advocacia pública e privada, à Defensoria Pública e ao Ministério Público, o que deveria implicar em um planejamento conjunto das instituições.
A criação dos novos tribunais é defendida pela OAB, Associação dos Juízes Federais do Brasil, Associação dos Magistrados Brasileiros e o estado do Paraná, que ingressaram no caso como amicus curiae defendendo a constitucionalidade da Emenda.
Clique aqui para ler a manifestação da AGU.
Elton Bezerra é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 28 de agosto de 2013

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Entrevista com Fredie Didier Jr. sobre o Projeto do Novo Código de Processo Civil

Fredie Didier Jr. - Projeto do Novo Código de Processo Civil

por José Marques
Livre-docente da Universidade de São Paulo (USP) e professor de Direito Processual Civil na Universidade Federal da Bahia (Ufba), Fredie Didier Jr. compôs a comissão de juristas que revisou o anteprojeto do novo Código de Processo Civil na Câmara dos Deputados. O texto inicial, elaborado e aprovado em curto período de tempo no Senado, passou, segundo ele, por “inúmeras mudanças” ao tramitar na outra Casa Legislativa do Congresso. A matéria, que ainda será apreciada em plenário pelos deputados para em seguida voltar aos senadores, é passiva de supressões, mas não pode ter o texto alterado por emendas parlamentares. Para Didier, a grande força do possível novo CPC é que “ele cria um sistema de força normativa dos precedentes judiciais de modo a garantir um tratamento igualitário entre pessoas que estão em situações parecidas”. “O código estrutura um sistema para que, uma vez consolidado um determinado entendimento nos tribunais superiores, esse entendimento tenha que ser seguido. Ou seja, evita decisões diferentes para situações iguais”, resumiu, em entrevista ao Bahia Notícias. O texto também trata de simplificações no sistema de decisões liminares, mudanças no Direito de Família e a conversão de ações individuais em coletivas. Apesar das pressões de setores jurídicos, políticos e da sociedade civil para que as mudanças no código coadunassem com seus propósitos, Didier assegura que “ouviu todo mundo” e “todos eles tiveram pelo menos algum dos interesses atendidos”. “Nenhum deles teve todos os interesses atendidos, mas todos tiveram ao menos um”, avaliou.
 

Fotos: Marcela Gelinski / Bahia Notícias
 
Bahia Notícias – Quando a Comissão de Juristas formada pela Câmara dos Deputados começou a trabalhar no projeto do Novo Código de Processo Civil?
 
Fredie Didier Jr. – Em 2009, o Senado montou uma Comissão de Juristas para fazer o anteprojeto do Novo Código; em 2010, a comissão apresentou o anteprojeto, que virou projeto e tramitou na Casa durante cinco meses e foi, em 2011, para a Câmara dos Deputados. Na Câmara, foi montada outra Comissão de Juristas para revisar o projeto tal como ele veio do Senado. Eu sou da Comissão Revisora.
 
BN – Quando o projeto foi apresentado no Senado?
 
FDJ – Em 8 de junho de 2010 e, acho importante colocar, já em dezembro foi aprovado pelo Senado. Ninguém conseguiu entender [como] isso [aconteceu de forma tão rápida]. Em um ano em que houve eleição para senador, presidente da República e governador.
 
BN – Como foi o ritmo na Câmara?
 
FDJ – Foi outro. Começou em março de 2011 e está lá até hoje. Deve ser votado nesta terça (27).
 
BN – Mas estava na Ordem do Dia da semana passada...
 
FDJ – Na terça-feira (20) à noite houve a votação dos vetos de Dilma, então o clima no Congresso era de uma animosidade política muito grande. Como o Código, hoje, na Câmara, é um consenso – porque todas as questões políticas já foram analisadas nesses dois anos –, eles querem que a votação seja feita em um clima ameno. Por isso, jogaram para terça-feira, porque não vai ter sessão do Congresso, só da Câmara. Tudo indica que será votado.
 
BN – Quando o projeto saiu do Senado e chegou à Câmara, quais os principais pontos revisados?
 
FDJ – Ah, foram inúmeras mudanças.
 
BN – Mas quais os pontos-chave?
 
FDJ – O que mudou não é tão interessante para o público em geral. Isso é muito técnico. Mais interessante é a versão atual, que tende a ser 95% aprovada. Temos que destacar as grandes novidades desse Código. Primeiro: ele cria um sistema de força normativa dos precedentes judiciais de modo a garantir um tratamento igualitário entre pessoas que estão em situações parecidas. Ou seja, evita decisões diferentes para situações iguais. Essa dispersão do entendimento é uma coisa que acontece muito. Ele estrutura um sistema para que, uma vez consolidado um determinado entendimento nos tribunais superiores, esse entendimento tenha que ser seguido. Nada obstante seja possível rever o entendimento, mas, enquanto não for revisto, ele tem que prevalecer. Isso trata as pessoas de maneira igual, acelera o processo, desestimula os recursos. É a grande revolução que o projeto traz. A impressão que eu tenho é que o projeto foi feito para isso. Esse é um sistema de respeito aos precedentes judiciais, que dá celeridade e previsibilidade...
 
BN – Hoje em dia, como são tratados os precedentes?
 
FDJ – Não há estruturação do nosso Direito para dar tratamento aos precedentes. Os precedentes vêm ganhando cada vez mais força, mas não há ainda um regulamento disso, o que dá margem a muita insegurança e imprecisão. O código disciplina o modo como se edita um precedente, se interpreta um precedente, se revoga um precedente, quem se submete a um precedente e quais são os efeitos de um precedente.
 
BN – No Novo Código, ações individuais podem se tornar ações coletivas. Queria que o senhor explicasse como isso vai ocorrer.
 
FDJ – Existe um instituto previsto chamado de conversão da ação individual em ação coletiva. O objetivo dele é regular as situações em que a ação individual – uma ação proposta por um indivíduo – seja, embora individual, essencialmente uma ação coletiva. Porque o eventual acolhimento do pedido que o autor formule necessariamente beneficia a coletividade. Se o acolhimento do pedido dele beneficia a coletividade, é conveniente que tramite como uma ação coletiva e não individual. Vamos pegar um exemplo de Salvador, um símbolo da minha geração: o Candyall Guetho Square, que parou de funcionar por conta de reclamação dos vizinhos de eventual barulho e confusão de trânsito etc. Imagine que um dos vizinhos, são milhares os que moram na Cidade Jardim, entrasse com uma ação contra o Candyall para parar o barulho. Qualquer vizinho pode fazer isso, mas o barulho para em benefício de todos. Embora individual, o acolhimento desse pedido necessariamente beneficia a todos. Para situações como essas, que a doutrina chama de ações pseudoindividuais, porque elas parecem individuais, mas não são, criou-se esse instituto.
 
BN – Mas qual o crivo para entender uma ação individual como coletiva?
 
FDJ – O crivo é esse. É o acolhimento do pedido individual repercutir na esfera coletiva. Tem que se pensar assim: acolhido o pedido desse indivíduo, a coletividade se beneficia? Porque, por exemplo, se eu entrar com uma ação de cobrança contra você, por algum dinheiro que porventura você esteja me devendo, se eu ganhar, isso atinge a coletividade de alguma maneira? Não. Minha vitória significa apenas que vou ganhar o “x” que você me deve. Então ela é puramente individual, essencialmente individual, estritamente individual. Mas quando o acolhimento do pedido do autor, necessariamente – não é opção do juiz – beneficia a coletividade, é melhor que essas ações tramitem como se fossem coletivas.
 
 
BN – O que muda em relação aos embargos infringentes?
 
FDJ – Os embargos infringentes, como recurso civil, desaparecem do Código de Processo Civil.
 
BN – Mas quando há acórdão não unânime de um tribunal superior o Novo Código não permite esse tipo de recurso?
 
FDJ – Não. O que existe no Código é que quando uma apelação – que é um tipo de recurso – for julgada por maioria e essa decisão tiver reformado a sentença, o processo prossiga com a convocação de dois julgadores, para que cinco julguem ao invés de três – porque a apelação é julgada por três. Então, se der dois a um reformando a sentença apelada, o projeto diz “não termine o julgamento, continue e ouça mais dois”. Isso não é recurso. A decisão não terminou, não se está recorrendo dela. Se está dizendo o seguinte: como teve um voto divergente, prossiga e colha mais dois votos.
 
BN – Em relação às liminares, o que será modificado?
 
FDJ – O que é uma liminar? Liminar é uma decisão provisória – porque ela precisa ser confirmada depois –  que o juiz dá sem ouvir o réu. O Código reestrutura o sistema das liminares do Brasil. De que maneira? Hoje, o sistema de liminares do Brasil é muito caótico. Existem várias regras tratando do mesmo assunto, às vezes com palavras diferentes, o que gera muita discussão na prática. O que se fez: se unificou o regime. Criou-se um regime único de decisões provisórias, com capítulo único, inclusive. Tecnicamente muito sofisticado. Do ponto de vista técnico é um dos grandes avanços do projeto.
 
BN – Praticamente, como funciona hoje e como funcionaria?
 
FDJ – Uma decisão liminar pode ter uma de duas naturezas. Pode ser uma liminar que satisfaz ou uma que assegura o direito. Assegurar é apenas tomar providências para que o direito possa ser efetivado depois. Satisfazer já é satisfazer logo. Me permita uma metáfora: imagine que duas pessoas disputem um pedaço de carne. Uma vai para o juiz e diz “seu juiz, preciso comer essa carne, não posso esperar o processo terminar para só então comer, senão eu morro”. O que essa pessoa precisa? Uma decisão provisória que permita a ela satisfazer o direito dela. Comer a carne, na pendência do processo, é satisfazer, ainda que provisoriamente, o direito dela. Mas e se ela pedisse para o juiz: “juiz, enquanto nós estivermos brigando, coloque essa carne na geladeira para quando terminar a briga eu possa comer a carne, ela não apodrecer fora da geladeira”? Perceba que essa medida é de asseguração do direito e não de satisfação. Ele está garantindo que, no terminar do processo, a pessoa possa comer. As pessoas chamam essa liminar de cautelar. Hoje, como funciona nosso sistema: temos uma regra para a liminar satisfativa e uma regra para a liminar cautelar. O que dá muita confusão na prática, porque essa diferença entre cautelar e satisfativa é muito sutil, muito técnica. Há situações-limite em que você tem dúvida se está satisfazendo ou apenas cautelando. Então, como são regras diferentes, há muita discussão na prática por um motivo que não deveria levar discussão. Então o que o projeto faz? Unifica. Qualquer liminar, seja satisfativa ou cautelar, vai se submeter ao mesmo regime jurídico, então acabam as discussões. Ao simplificar você elimina muitas discussõezinhas técnicas.
 

 
BN – Como foi a discussão da Comissão de Revisão com a sociedade civil? Houve também participação política?
 
FDJ – Houve. Foi um amplo processo de discussão democrática. Aquilo que a gente vê nos livros – como se deve discutir democraticamente e ouvir todo mundo – , eu vi acontecer. Eu vi a CNI [Confederação Nacional da Indústria] sendo ouvida e o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra] sendo ouvido no mesmo dia. Vi os advogados o Ministério Público sendo ouvidos. Professores de Norte ao Sul do Brasil, defensores públicos, os bancos, os cartórios, todos eles veicularam seus interesses. Todos eles tiveram pelo menos algum dos interesses atendidos. Nenhum deles teve todos os interesses atendidos, mas todos tiveram ao menos um.
 
BN – Quantos juristas compuseram a comissão?
 
FDJ – Os juristas que ficaram com o trabalho mais pesado, de reunir as informações, as contribuições e consolidar o texto foram quatro.
 
BN – Não haverá emendas parlamentares para alterar o texto?
 
FDJ – Não se pode colocar mais nada. Mas pode ser que saiam coisas, que coisas sejam suprimidas. Essa conversão da ação individual em coletiva pode ser que saia no Senado.
 
BN – Você chegou a conversar com os líderes das bancadas?
 
FDJ – Sim. Foram dois anos de trabalho intenso. Eu ia para Brasília toda semana. Ia participar de audiências públicas fora de Brasília, inclusive em Salvador. Tudo o que está ali foi fruto de consenso. Algumas pessoas criticam: “ah, por que não tem isso, por que não tem aquilo?”, mas é preciso deixar claro que esse não é um código da academia, mas da democracia, que é brasileira com suas qualidades e suas imperfeições. No fim das contas o saldo é muito positivo. Me sinto muito à vontade de dizer que embora eu tenha participação direta no resultado, tem muita coisa com a qual não concordo.
 
BN – O senhor pode externar?
 
FDJ – Por enquanto não. Acho que eticamente não posso fazer isso, porque, como participei da formação desse consenso, não quero que ele sofra nenhum tipo de arranhão. Estou guardando as minhas impressões para, quando o código sair, eu, nos meus escritos, diga o que concordo ou não. Mas agora não. Estou muito vinculado ao processo e sou um dos agentes que ajudou a construir esse consenso e não quero que nada do que eu diga possa comprometer o consenso.
 

 
BN – Vai haver mudanças no Direito de Família também, não?
 
FDJ – Muita, mas eu diria duas grandes mudanças. Primeiro, se cria um procedimento especial próprio para as ações de família. As ações de família tramitarão todas elas por um procedimento diferenciado do procedimento comum. A segunda mudança é no procedimento de interdição, que sofre profundas mudanças. Há toda uma atualização da interdição. Do jeito que está no código atual é a mesma forma que se interditavam pessoas na década de 10 do século passado.
 
BN – E como fica agora?
 
FDJ – Deixa-se clara a possibilidade de um curador provisório, regula-se qual a consequência da interdição para os atos praticados pelo interditado até então. Por exemplo: o sujeito está com demência e querem interditá-lo. Mas, daqui que interdite, demora. E os atos em que ele praticou nesse período? É um problema que o código atual não resolve, mas o projeto do novo código regula. Permite-se que os abrigos onde pessoas com problemas são abandonadas possam propor a ação de interdição. Porque normalmente a ação de interdição estava restrita à família, mas às vezes a própria família abandona o interditando.
 
BN – Em relação à separação judicial, houve uma discussão a respeito da necessidade de ela prevalecer no projeto do Novo Código...
 
FDJ – Houve. E acabou prevalecendo a ideia de que a separação ainda sobrevive no nosso sistema ao lado do divórcio.
 

 
BN – Há necessidade, para o senhor?
 
FDJ – Eu tenho muitas dúvidas. Há bons argumentos de ambos os lados. Em uma linha, capitaneada por juristas como Sérgio Barradas Carneiro (PT-BA), primeiro relator do projeto de novo CPC na Câmara, a Emenda Constitucional 66 teria acabado com a separação; de outro, há os que entendam que o Código Civil ainda a prevê e as pessoas têm o direito de poder optar em desfazer ou não o vínculo matrimonial – na separação, o vínculo matrimonial permanece.
 
BN – O senhor gostaria de fazer algumas considerações finais?
 
FDJ – Sim, obrigado. Gostaria de destacar o papel que a Bahia teve na tramitação do novo CPC. Em primeiro lugar, com o deputado Sérgio Barradas Carneiro, primeiro relator na Câmara, que ficou quase um ano peregrinando pelo Brasil, ouvindo as sugestões e apostando em um trabalho de aprimoramento técnico do projeto. Do mesmo modo, a minha participação na Comissão Revisora, um professor baiano e que dá aulas na Bahia, desde o início dos trabalhos e até agora, já sob nova relatoria. A audiência pública realizada na Bahia, em setembro de 2011, foi muito proveitosa, com várias sugestões acolhidas; professores baianos deram ainda excelente contribuição à redação do projeto: Salomão Viana, Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira foram responsáveis diretos por belos aprimoramentos no texto. Finalmente, talvez em reconhecimento a esse trabalho, Salvador foi escolhida como a cidade onde, em novembro próximo, processualistas brasileiros se reunirão para discutir o projeto – será o primeiro encontro, estritamente científico, deste porte, para tratar do novo Código. Tudo indica que até dezembro o novo Código seja publicado.
 
Fonte: BN justiça

terça-feira, 27 de agosto de 2013

“Meros aborrecimentos na relação de consumo não geram direito a indenização por danos morais”. Será? Depende!



Por Luiz Cláudio Borges
(artigo publicado no varginhaonline)
O presente estudo pretende discutir o problema dos produtos viciados, assim entendido como aqueles que o consumidor adquiri mas não consegue utilizá-lo, seja porque o vício (defeito) o torna impróprio ou inadequados ao consumo. Esta situação pode gerar danos morais? Estaria o fornecedor obrigado a reparar o dano?

Para responder a estas perguntas trabalharemos um caso real. Na última semana fiquei surpreso com uma decisão judicial, onde a Juíza do Juizado Especial Cível da Comarca de Campo Belo julgou improcedente (indeferiu) o pedido de indenização por danos morais, ao argumento de que meros aborrecimentos não geram direito à indenização por danos morais. Será que isto é verdade? Mas o que são “meros aborrecimentos”?

Entenda o caso.

O consumidor, em 9/10/2011, adquiriu da Eletrozema um computador, marca SEMP TOSHIBA. Poucos meses depois, mais precisamente em 1/3/2012, o produto apresentou um vício. Diagnosticado o vício (CPU travando), o produto foi encaminhado para a assistência técnica em 20/3/2012. Em 30 (trinta) dias vício foi sanado. Em 5/7/2012 o produto voltou apresentar o mesmo problema. Novamente fora encaminhado para a assistência técnica. Decorrido mais de 30 dias, o produto não foi devolvido. O consumidor, cansado de entrar em contato com a assistência técnica, procurou o PROCON local e fez uma reclamação. Notificada, a assistência técnica informou que a SEMP TOSHIBA forneceria outro computador novo em substituição àquele. Este comunicado ocorreu em 29/8/2012. O consumidor entrou em contado com o fornecedor inúmeras vezes. Sem sucesso, não restou alternativa senão o ajuizamento de uma ação pedindo o cumprimento do artigo 18, do Código de Defesa do Consumidor, bem como a condenação do fornecedor por danos morais. Somente após o ajuizamento da ação1 (14/12/2012) é que a SEMP TOSHIBA forneceu outro computador.

Uma análise simples do período decorrido entre a data da aquisição e a data da entrega do novo computador, soma-se, aproximadamente, 14 meses, dos quais o consumidor ficou privado de utilizar o produto por mais de 8 meses.

O consumidor teve mero aborrecimento?

O consumidor teve apenas uma mera insatisfação contratual?

É evidente que não!

Mas a Juíza entendeu que sim.

Na respeitável sentença a Julgadora salientou que “a situação dos autos se caracteriza como mera insatisfação contratual, uma vez que o autor se sentiu prejudicado por ter adquirido produto defeituoso”.

Mais adiante, argumenta que

“os transtornos causados estão dentro de uma linha de riscos de uma vida em sociedade, não decorrendo nenhuma dor moral, pelo menos que seja passível de indenização pecuniária. Tal fato, embora não desejável, é previsível na vida em sociedade. Sofreu o autor, no máximo, mero dissabor, incômodo, e, embora desagradável a situação experimentada, não houve, repita-se, lesão aos direitos da personalidade a ponto de embasar uma pretensão à indenização por danos morais.”

Em que pese o conhecimento jurídico da i. Magistrada, a situação narrada nos autos, contrário ao entendimento exarado na respeitável sentença, não constitui mero aborrecimento, isto porque, conforme mencionado a pouco, o consumidor esteve privado de utilizar o produto por mais de oito meses. Isto não pode ser considerado mero aborrecimento.

O artigo 18, §1, do CDC tem a seguinte redação:

“Não sendo o vício sanado no prazo máximo de 30 (trinta) dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeita condições de uso;

II – a restituição imediata da quantia paga monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III – o abatimento proporcional do preço”.

Observa-se que o legislador concede ao fornecedor, neste caso a SEMP TOSHIBA, o direito de sanar o vício no período de 302 dias . Não o fazendo deverá cumprir uma das situações previstas nos incisos apontados acima.

No caso do processo em análise, o fornecedor só substituiu o produto após o ajuizamento da ação, isto depois de ter decorrido mais de 4 (quatro) meses. Não fosse o ajuizamento da ação, talvez o produto não teria sido substituído até hoje!

Não se deve considerar que a atitude da SEMP TOSHIBA seja algo previsível dentro de uma linha de risco de uma sociedade; não deve considerá-lo como um fato comum imposto a quem vive em sociedade.

O direito do consumidor não teria sentido algum de existir não fosse o consumidor a parte mais frágil da relação jurídica de consumo. Vale lembrar que a proteção do consumidor é matéria de ordem pública, elevada como direito fundamental e princípio da ordem econômica.

José Afonso da Silva salienta que “com a inserção dessa cláusula de tutela entre os direitos fundamentais, os consumidores foram erigidos à categoria de titulares de direitos constitucionais fundamentais”3 .

Vale transcrever o desabafo do professor Cavalieri Filho:

“O Código de Defesa do Consumidor só existe porque o consumidor é vulnerável; porque o consumidor é o sujeito mais fraco da relação jurídica de consumo e, portanto, o que está exposto a ofensas e agressões – o que ocorria e ainda ocorre com indesejada frequência, principalmente naqueles segmentos em que fala alto o poder econômico, como o sistema financeiro. Não fosse isso, não precisaria o consumidor de uma legislação que o protegesse e defendesse. E o que deseja essa legislação? Ética, respeito, equilíbrio e harmonia nas relações de consumo. Como fazer? Mudando mentalidades; educando, orientando os sujeitos dessa relação jurídica. Mas isso leva tempo. [...]”4 . grifo inexistente no original.

O Código de Defesa do Consumidor só existe porque o consumidor é vulnerável!

E como tal, merece a devida e efetiva proteção!

Se uma situação envolvendo um consumidor que ficou privado de seu produto por um período (nada razoável) de 8 meses for considerada comum, normal na sociedade atual, para que serve as leis consumeristas?

Onde está o direito fundamental?

Não parece crível que uma situação dessas possa gerar apenas meros aborrecimentos. É certo que o simples vício no produto não gera danos morais, entretanto, o que se discutiu no processo em comento não é apenas o vício e sim a desídia, o descaso do fornecedor em cumprir o disposto no artigo 18, do Código de Defesa do Consumidor.

Neste caso, o professor Cavalieri Filho discorre que haverá dano extra rem, onde o dano está apenas indiretamente ligado ao vício do produto, na realidade decorre de causa superveniente, relativamente independente, e que por si só produz o resultado. Sendo assim, não é o vício do produto que causou o dano e sim, conforme já mencionado a conduta do fornecedor, posterior ao vício, por não dar ao caso a atenção e solução devida5 .

Em casos semelhantes os Tribunais têm condenado os fornecedores ao pagamento de indenização por danos morais, veja:

60009557 - CIVIL. DANOS MATERIAIS E MORAIS. DEMORA NO CONSERTO DO BEM. INDENIZAÇÃO DEVIDA. O comerciante responde pelo ressarcimento do valor pago pelo produto que não tem o seu vício sanado no prazo de legal, bem como, pelos danos causados oriundos da relação de consumo. Não sendo o vício sido sanado no prazo legal, gera o direito do consumidor em ser ressarcido no valor pago pelo produto viciado, além de configurar o abalo moral pelos transtornos gerados com a demora imotivada em sanar o problema. provado o dano, bem como o nexo causal entre esse e o evento danoso, surge o dever de indenizar a vítima. conhecimento e improvimento do recurso. (TJRN; RecCv 2009.900407-3; Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais; Relª Juíza Suely Maria F. Silveira; DJRN 17/04/2009; Pág. 549)

95581675 - BEM MÓVEL. COMPRA E VENDA. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEFEITO. DEMORA NA TROCA DO PRODUTO. DANOS MORAIS. AÇÃO INDENIZATÓRIA. 1. Sendo incontroverso nos autos que a fabricante do produto procedeu à substituição do bem adquirido pelos autores, reconhecendo o direito à troca, pressupõe-se o defeito ou vício que o tornava impróprio ao consumo, nos termos dos artigos 12 e 18 do Código de Defesa do Consumidor. 2. A demora da fabricante em proceder à troca do produto, ultrapassando em muito o prazo do artigo 18, §1º da Lei nº 8.078/90, configura ato negligente e desidioso a ensejar a compensação dos danos morais decorrentes da privação do uso do bem, que se revela de extrema necessidade ao consumidor. 3. A indenização por dano moral, inapta a quantificar a dor da vítima, mas cuja fixação deve ter o condão de configurar compensação pelo dano, deve ser arbitrada de forma moderada, atendendo-se ao binômio razoabilidade e proporcionalidade, sem configurar enriquecimento indevido da vítima. 4. Negaram provimento aos recursos, principal da ré e adesivo dos autores. (TJSP; APL 0005173-35.2010.8.26.0590; Ac. 6578941; São Vicente; Vigésima Quinta Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Vanderci Álvares; Julg. 13/03/2013; DJESP 26/03/2013)





94128301 - APELAÇÃO CÍVEL. DANO MORAL E MATERIAL. VÍCIO DO PRODUTO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO COMERCIANTE E DA EMPRESA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA. DEMORA NO CONSERTO DO PRODUTO. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. O comerciante é solidariamente responsável pelos vícios no produto, nos termos do art. 18 do CDC. Assim sendo, o comerciante é parte legítima. Tanto o fabricante, quanto o fornecedor são responsáveis pela garantia contratual. Sofre dano moral aquele que vê frustrada, por desídia do fornecedor, a legítima expectativa de utilização de bem de consumo durável adquirido, devendo a indenização ser fixada com proporcionalidade e razoabilidade. (TJMG; APCV 1.0145.11.061504-7/001; Rel. Des. Estevao Lucchesi; Julg. 30/08/2012; DJEMG 14/09/2012).

Houve uma relação jurídica de consumo, onde o consumidor (parte vulnerável) esteve impossibilitado de utilizar o produto, tendo sua expectativa frustrada ante a existência de um vício não sanado corretamente e a tempo.

Conclui-se que, não obstante o entendimento da MM. Juíza, o consumidor não foi exposto a meros aborrecimentos, ele foi privado de utilizar o produto por um período nada razoável; o fornecedor não cumpriu o disposto no CDC, extrapolando, em muito, o prazo para sanar o vício ou substituir o produto, gerando um dano, o qual deve ser reparado.




1 - Processo nº. 0112.12.008844-1 – JESP Cível – Campo Belo – MG.


2 - Por força do §2º, do artigo 18, do CDC, este prazo pode ser prorrogado por até 180 dias, mas deverá ser convencionado entre as partes.


3 - Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 261-262, item 27, 20. ed., 2002, Malheiros.


4 - Programa de direito do consumidor. 3. ed. – São Paulo: Atlas, 2011.
5 - Ibid.

"Cultura do litígio" é criticada por Desembargador em decisão

"Absolutamente infundada", "fadada ao fracasso" e "homenagem à cultura do litígio". Esses foram os termos usados pelo desembargador Fernando Foch para classificar uma ação de indenização por danos morais que teve recurso negado pela 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. No caso em questão, uma criança, representada por sua mãe, queria ser indenizada alegando uso de imagem sem autorização em reportagem veiculada no programa RJTV, da TV Globo, e no site do programa, em 16 de setembro de 2009. As imagens gravadas mostravam o estudante ao lado de colegas no portão de sua escola e foram usadas em reportagem sobre a falta de aulas na rede municipal por falta de professores.
O desembargador Fernando Foch, relator, observou em seu voto que não é necessário autorização para a veiculação de imagem de menor em reportagem sobre fato público e que não tenha relação a ato infracional ou processo judicial. Ele aponta que a emissora não cometeu qualquer ato ilícito e não há, portanto, o que ser indenizado. O pedido inicial já havia sido negado pelo juízo da  6ª Vara Cível do Rio de Janeiro e o Ministério Público deu parecer pela improcedência.
A apelação diz que a exibição da reportagem gerou para o menor e sua mãe “sensação de desconforto, invasão e desrespeito, sendo seu direito não querer que sua imagem seja divulgada nos meios de comunicação”. Afirma também que a matéria foi produzida sem autorização da diretora da escola. Além disso, sustenta que a reportagem violou os artigos 17 e 247 e o parágrafo 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.060/90).
O artigo 17 do ECA prevê que o direito ao respeito abrange a preservação da imagem do menor. Já o 247 considera crime a divulgação, sem autorização, de informações de procedimento policial, administrativo ou judicial relativos a atos infracionais de menores — o parágrafo 1º acrescenta que o mesmo vale para a exibição de fotografia de criança ou adolescente na mesma situação.
Ao negar o recurso, o relator do acórdão afirmou que não há dano moral praticado pela empresa porque a reportagem decorreu do exercício do direito-dever de informar e, nesse sentido, retrata a realidade. Ele também aponta que o menor sequer foi identificado.
“Ora, o que a matéria abordou foi fato público, de inegável interesse do Estado, da família e da sociedade, eis dizer respeito a tema relevantíssimo, qual seja a educação, no caso a educação de base de crianças, relegadas ao descalabro da falta de professores na rede pública. A imagem é ilustrativa dessa deplorável ocorrência: meninos sem aula na porta da escola”, escreveu o desembargador.
Ainda segundo Foch, enxergar ilicitude no fato de a reportagem ter sido feita sem autorização da diretora da escola “é pretender que a mídia se sujeite a censura prévia, no caso da Administração Pública, o que a Constituição da República repudia”.
O desembargador conclui que a ação mais parece fazer homenagem ao que chama de cultura do litígio, o que para ele, "assoberba o Judiciário com causas absolutamente inviáveis, propostas como se a Justiça comutativa fosse uma organização lotérica". Foch também diz que é papel do advogado contribuir para a prestação jurisdicional, sendo o primeiro a avaliar o que é possível nas causas que representa.
Clique aqui para ler o acórdão
Marcelo Pinto é correspondente da ConJur no Rio de Janeiro.
Revista Consultor Jurídico, 26 de agosto de 2013

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...