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quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Terceira Turma nega danos morais por defeito em cor de azulejos




Os ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram afastar a condenação de uma empresa por danos morais em razão de defeito de cor em azulejos. Por unanimidade, eles entenderam que a mera existência de vício em produto não é fator capaz de gerar, automaticamente, indenização dessa natureza.

Ao afastar a penalidade imposta à loja pela comercialização dos azulejos que apresentaram mudança na coloração após a instalação, a turma afirmou que a condenação por danos morais precisa ser embasada na existência de ofensa concreta à dignidade da pessoa.

A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, recordou que juristas defendem que a indenização por danos morais não pode ser banalizada. Ela destacou que essa espécie da reparação ainda é nova na jurisprudência nacional, e que é preciso haver critérios razoáveis para estabelecer uma condenação dessa natureza.

Vulgarização

“Nessa tendência de vulgarização e banalização da reparação por danos morais, cumpre aos julgadores resgatar a dignidade desse instituto, que, conforme nos ensina Cahali, foi penosamente consagrado no direito pátrio. Esse resgate passa, necessariamente, por uma melhor definição de seus contornos e parcimônia na sua aplicação, para invocá-lo apenas em casos que reclamem a atuação jurisdicional para o reparo de grave lesão à dignidade da pessoa humana”, disse a relatora.

Os ministros entenderam que situações como a do processo em julgamento são normais na vida cotidiana, e não devem servir de justificativa para a condenação “abstrata” por danos morais. A relatora destacou que tais situações são incapazes de afetar o âmago da dignidade humana, já que não é qualquer situação de incômodo que é capaz de configurar prejuízo moral.

“Em outra perspectiva, a dificuldade de se provar a dor oculta transforma as partes em atores de um espetáculo para demonstrar a dor que não se sente ou, diga-se ainda, para apresentar aquela dor que, além de não se sentir, é incapaz de configurar dano moral”, acrescentou a ministra.

Dano psíquico

Após iniciar a reforma de um imóvel, uma consumidora sentiu-se prejudicada pelo defeito apresentado nos azulejos instalados, que apresentaram mudança de coloração. Irresignada, ela ajuizou ação para cobrar danos materiais e morais da loja que revendeu o produto defeituoso.

Alegou que o defeito nos azulejos causou atraso na reforma, gerando ofensa à sua personalidade e “danos de natureza psíquica”. O pedido foi acolhido em primeira e segunda instância.

A decisão do STJ afasta a condenação por danos morais, mas mantém a condenação por danos materiais, já que ficou comprovada a falha no produto. Leia o acórdão.

Destaques de hoje
Terceira Turma nega danos morais por defeito em cor de azulejos
Cooperação entre STJ e Corte Europeia facilita intercâmbio de jurisprudência
Retransmissão ao vivo de programação de TV gera pagamento de direitos autorais
Negado habeas corpus a empresário acusado de pagar propina a agentes políticos


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1426710
Fonte: STJ
F

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Venda com fraude a credor não compromete negócio subsequente do mesmo bem



A anulação da venda de um imóvel em razão do reconhecimento de fraude contra os credores não implica a desconstituição automática da venda subsequente do mesmo bem. Esse foi o entendimento unânime da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Conforme narram os autos, uma empresa em situação de falência alienou o imóvel em que funcionava para uma compradora, que posteriormente promoveu uma segunda venda do imóvel. A massa falida ajuizou ação revocatória contra a primeira e a segunda compradoras, argumentando que a venda do imóvel foi efetivada em fraude aos credores.

A sentença declarou a ineficácia das duas alienações e considerou que o imóvel deveria retornar ao ativo da empresa para posterior arrecadação pelos credores.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) confirmou a sentença e afirmou que a primeira venda ocorreu em período “suspeito para os efeitos de fraude contra credores”, quando a empresa já possuía vários protestos em seu nome, ficando configurada a fraude. Com relação à segunda compradora, o TJRJ entendeu que não havia necessidade de se demonstrar sua má-fé, não se manifestando sobre a existência ou não de fraude em relação a ela.

Prova exigida

No STJ, o ministro Moura Ribeiro, relator do recurso, explicou que o artigo 53 do Decreto-Lei 7.661/45 prevê a possibilidade de revogação do ato praticado pelo falido com a intenção de prejudicar os credores, desde que seja provada a fraude. Já o artigo 55, parágrafo único, inciso III, alínea “a”, da mesma norma, dispõe que a ação revocatória pode ser proposta contra o terceiro adquirente se este tiver conhecimento da intenção do falido de prejudicar os credores.

O ministro afirmou que, revogada a primeira venda em razão da existência de fraude, “este efeito apenas alcança as partes que agiram em conluio contra os credores da massa falida”. Dessa forma, para que a segunda venda seja desconstituída, é necessária a prova de má-fé da compradora, “pois devem ser resguardados os interesses dos terceiros de boa-fé, já que aqui não se trata de uma simples declaração de ineficácia de negócio jurídico”, afirmou o ministro.

Moura Ribeiro esclareceu que o STJ não poderia se manifestar quanto à existência ou não de má-fé da segunda compradora, pois isso exigiria o exame das provas do processo, inviável em recurso especial. Assim, foi determinado o retorno dos autos para que o TJRJ, a partir do entendimento fixado pela Terceira Turma, verifique a eventual existência de fraude na segunda transação com o imóvel.Leia o acórdão.
Destaques de hoje
Venda com fraude a credor não compromete negócio subsequente do mesmo bem
Terceira Seção vai rever repetitivo sobre natureza da ação na Lei Maria da Penha
CDC não se aplica a disputa de empresas sobre dano de carga em transporte marítimo
Tribunal cria comissão gestora de precedentes

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1567492

Fonte: STJ

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

TJ-RS autoriza penhora de FGTS de homem que deve pensão alimentícia a filha



Por Jomar Martins


O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço foi criado para assegurar o futuro do trabalhador em caso de dispensa, mas pode sofrer penhora, excepcionalmente, se o seu titular for credor de alimentos e não dispor de outros meios para honrar sua obrigação legal. O entendimento levou a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a deferir o pedido de penhora do FGTS para quitar a dívida de pensão alimentícia de um pai inadimplente com a Justiça desde 2011.

No primeiro grau, o juiz da 1ª Vara Judicial da Comarca de Taquari, Rodrigo de Azevedo Bortoli, indeferiu o pedido de penhora dos valores existentes na conta de FGTS do pai, por se tratar de medida excepcional. Ele disse que a parte autora não demonstrou ter esgotado os meios de localização de bens passíveis de penhora. Nesse sentido, citou precedente no Agravo 70040172314. Segundo o acórdão, "embora possível a penhora sobre saldo de FGTS em se tratando de dívida de natureza alimentar, no caso é descabida penhora, tendo em vista existir outro meio para satisfação do crédito".

A procuradora de Justiça Veleda Maria Dobke opinou pelo provimento do Agravo de Instrumento, por entender que o devedor não dispõe de outros bens passíveis de constrição nem há previsão de quando e como poderá quitar o saldo credor. Logo, justifica, excepcionalmente, a penhora sobre eventual valor existente nas contas do FGTS. Afinal, o crédito alimentar é preferencial, por significar a subsistência da filha, embora tenha completado a maioridade.

O relator do Agravo, desembargador Ivan Leomar Bruxel, seguiu na mesma linha do parecer do Ministério Público. ‘‘Tem razão a agravante, quando alega que deve ser deferida a penhora sobre o FGTS, pois se trata de dívida alimentar, e que não há lógica em resguardar o futuro do devedor enquanto o presente da agravante [filha] está sendo ameaçado’’, escreveu no acórdão, lavrado na sessão de 13 de outubro.

Filho protegido
A Justiça brasileira também já entendeu que, para proteger o direito básico do filho de receber alimentos, é possível incluir o nome do devedor de pensão alimentícia em cadastros de restrição de crédito, como Serasa e SPC. A decisão foi tomada neste ano pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao aceitar um recurso movido pela Defensoria Pública de São Paulo.

O entendimento do colegiado é que a inclusão é uma forma de coerção lícita e eficiente para incentivar a necessária quitação da dívida alimentar. Segundo o relator do recurso especial, ministro Villas Bôas Cueva, há precedentes também no próprio STJ (4ª Turma) e que tal possibilidade de inclusão está expressa no novo Código de Processo Civil (artigos 528 e 782).

Clique aqui para ler o acórdão da 8ª Câmara Cível do TJ-RS.



Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.

Revista Consultor Jurídico, 10 de novembro de 2016, 10h10

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

JT-MG invalida norma coletiva que reduz horas de percurso dos cortadores de cana



Publicada originalmente em 05/10/2016


Um cortador de cana buscou na Justiça do Trabalho o pagamento de horas in itinere, afirmando que consumia 01h30min no percurso casa/trabalho e o mesmo tempo para volta, sendo o local de difícil acesso e não servido por transporte público. Para a empregadora, nada mais era devido a esse título, já que teria pagado devidamente as horas de percurso, conforme estipulado na convenção coletiva aplicável ao caso, na fração de uma hora diária.

Analisando o caso, o juiz Murillo Franco Camargo, em sua atuação na Vara do Trabalho de Monte Azul, deu razão ao trabalhador. Constatando que o cortador de cana comprovou que o tempo gasto para ir e voltar do trabalho era três vezes superior ao previsto na cláusula invocada pela empresa, o julgador considerou inaplicável esse dispositivo normativo. Isso porque, como esclareceu o magistrado, a cláusula em questão é completamente prejudicial ao interesse dos trabalhadores, já que há uma redução de 2/3 do valor devido a título de horas de percurso, sem qualquer benefício em contrapartida. No seu entender, a cláusula é manifestamente contrária ao artigo 7º, inciso XXVI da Constituição Federal, por não trazer qualquer vantagem ou compensação ao trabalhador ao limitar o tempo a ser pago como horas de percurso. Nesse sentido, inclusive, como registrou o julgador, é a súmula 41 do TRT da 3ª Região, que autoriza, sim, a flexibilização das horas itinerantes, mas desde que respeitado o mínimo de 50% das horas gastas, o que não ocorreu no caso.

Nesse quadro, o julgador determinou que as três horas diárias de percurso sejam computadas na jornada de trabalho do cortador de cana para fins de apuração de eventual realização de horas extras, caso haja extrapolação da jornada de 8 horas diárias e de 44 semanais. E, para evitar dúvidas futuras, esclareceu que as horas itinerantes são computadas na jornada do trabalhador como horas trabalhadas, já que se trata de tempo à disposição do empregador.

A empresa recorreu da decisão, que ficou mantida pelo TRT mineiro. ( 0001588-93.2014.5.03.0082 RO )



Fonte: TRT3

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Verba de plano de demissão voluntária não está sujeita à incidência de IR





As verbas vindas de plano de demissão voluntária não estão sujeitas à incidência de Imposto de Renda. Trata-se de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reafirmada pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que negou recurso da Fazenda Nacional e determinou a devolução do Imposto de Renda Retido na Fonte em decorrência da rescisão de contrato de trabalho de um metalúrgico, resultante de plano de demissão voluntária (PDV).

A União apelou ao TRF-3 argumentando não se tratar de rescisão voluntária, pois não houve adesão ao PDV, mas sim demissão do autor sem justa causa por decisão arbitrária da empregadora.

Sustentava ainda que o metalúrgico havia preferido não ingressar com ação própria para ser reintegrado à empregadora, optando pela conversão da reintegração em pecúnia. Nesse caso, trataria de remuneração com efetivo acréscimo patrimonial, passível de tributação pelo Imposto de Renda, na forma do artigo 43 do Código Tributário Nacional (CTN).

“A jurisprudência reiterada da Corte Superior, no sentido de que o ressarcimento pela despedida sem justa causa de empregado, legalmente contemplado com estabilidade provisória, configura, independentemente de PDV, indenização e não remuneração, não havendo que se cogitar, pois, de violação ao artigo 43 do CTN”, disse o desembargador federal Nelton dos Santos, relator do caso.

O autor era funcionário com estabilidade motivada por acidente de trabalho junto a uma metalúrgica, tendo aderido ao acordo coletivo de trabalho feito entre a empresa e o sindicato da categoria para seu desligamento.

“Considerando a natureza da verba rescisória, à luz da prova produzida nos autos e da jurisprudência consolidada, deve ser excluído da incidência do imposto de renda, uma vez que decorre da estabilidade acidentária e não de liberalidade do empregador, configurando assim nítido caráter indenizatório”, conclui.

Por fim, a 3ª Turma manteve a condenação da União ao pagamento das diferenças apuradas, sendo que a restituição dos valores retidos com correção deverá ser corrigida monetariamente. Além disso, deve arcar com o pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor dado à causa. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-3.

Apelação 0000830-71.2015.4.03.6126/SP


Revista Consultor Jurídico, 31 de outubro de 2016, 15h17

segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Trancada ação penal contra advogados que deram parecer favorável a contratação sem licitação




Em decisão unânime, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trancou ação penal movida contra dois advogados que produziram parecer técnico pela possibilidade da contratação direta – isto é, sem licitação – de uma empresa de consultoria pelo município de Rezende (RJ).

Os advogados são procuradores do município e redigiram o parecer a pedido da administração. O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) denunciou ambos, juntamente com outros quatro réus, pela conduta dolosa de não exigir licitação fora das hipóteses admitidas legalmente – crime previsto no artigo 89 da Lei 8.666/93.

Para o ministro Rogerio Schietti Cruz, relator do recurso da defesa, o MPRJ não caracterizou a conduta dolosa dos advogados, de modo que a denúncia apresentada contra eles não deve prosseguir.

Não vincula

“O Ministério Público estadual imputou-lhes a conduta delitiva alicerçado exclusivamente no desempenho da função pública por eles exercida – elaboração de parecer acerca da possibilidade de não realização de processo licitatório –, sem demonstrar a vontade de provocar lesão ao erário, tampouco a ocorrência de prejuízo”, argumentou o ministro.

Para Schietti, a função técnica exercida pelos advogados, servidores do município, por si só, não é suficiente para revelar dolo na conduta, já que o parecer é uma opinião profissional que pode ou não ser acatada pela administração, sem ter caráter vinculativo.

Os ministros acolheram os argumentos da defesa dos advogados, segundo os quais eles não poderiam ser responsabilizados apenas pelo exercício regular da advocacia, conforme previsto no artigo 133 da Constituição Federal. A defesa lembrou que o texto constitucional afirma que o advogado é inviolável por seus atos e manifestações durante o exercício da profissão.

Dolo específico

O ministro Rogerio Schietti comentou que a liberdade constitucional conferida ao advogado não é absoluta, pois encontra limites na lei.

O que deve ser analisado, na visão do magistrado, é se a conduta delituosa atribuída aos réus foi devidamente especificada. No caso em discussão, a imputação foi feita de forma genérica, sem demonstrar qualquer tipo de dolo na conduta profissional.

O relator destacou que o STJ já decidiu que o crime previsto no artigo 89 da Lei de Licitações exige, para ser tipificado, a presença do dolo específico de causar dano ao erário e a caracterização do prejuízo sofrido pela administração. Leia o voto do relator.

Destaques de hoje
Condomínio não pode utilizar medidas não pecuniárias para punir devedor
Ministro considera definitiva condenação de prefeito eleito de Gravataí (RS)
Trancada ação contra advogados que deram parecer favorável a contratação sem licitação
Espaço Cultural lança livro sobre improbidade administrativa


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): RHC 46102
 
Fonte: STJ

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Padre é condenado a pagar danos morais por impedir interrupção de gravidez


 
Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou um padre do interior de Goiás a pagar indenização de danos morais no valor de R$ 60 mil por haver impedido uma interrupção de gestação que tinha sido autorizada pela Justiça.

Em 2005, o padre Luiz Carlos Lodi da Cruz impetrou habeas corpus para impedir que uma mulher grávida levasse adiante, com auxílio médico, a interrupção da gravidez de feto diagnosticado com síndrome de Body Stalk – denominação dada a um conjunto de malformações que inviabilizam a vida fora do útero. No habeas corpus impetrado em favor do feto, o padre afirmou que os pais iriam praticar um homicídio.

Acompanhando o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, a Terceira Turma entendeu que o padre abusou do direito de ação e violou direitos da gestante e de seu marido, provocando-lhes sofrimento inútil.

Ao saber que o feto não sobreviveria ao parto, os pais, residentes na cidade de Morrinhos, a 128 quilômetros de Goiânia, haviam buscado – e conseguido – autorização judicial para interromper a gravidez.

Durante a internação hospitalar, a gestante, já tomando medicação para induzir o parto, foi surpreendida com a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás, que atendeu ao pedido do padre e determinou a interrupção do procedimento.

A grávida, com dilatação já iniciada, voltou para casa. Nos oitos dias que se seguiram, assistida só pelo marido, ela agonizou até a hora do parto, quando retornou ao hospital. O feto morreu logo após o nascimento. O casal ajuizou uma ação por danos morais contra o padre, que preside a Associação Pró-Vida de Anápolis. Não obtendo sucesso na Justiça de Goiás, recorreu ao STJ.

Aterrorizante

Em seu voto, Nancy Andrighi classificou de “aterrorizante” a sequência de eventos sofridos pelo casal.

“Esse exaustivo trabalho de parto, com todas as dores que lhe são inerentes, dão o tom, em cores fortíssimas, do intenso dano moral suportado, tanto pela recorrente como pelo marido”, disse.

A ministra afirmou que o caso deve ser considerado à luz do entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, julgada em abril de 2012, quando se afastou a possiblidade de criminalização da interrupção de gestação de anencéfalos.

“É inegável que ambas as condições, anencefalia e síndrome de Body Stalk, redundam, segundo o conhecimento médico atual, na inviabilidade da vida extrauterina”, comparou a ministra.

Embora o julgamento da ADPF tenha sido posterior ao caso, a ministra assinalou que a orientação manifestada pelo STF não tem limites temporais, e já em 2005 era a mais consentânea com as normas constitucionais, inclusive pela reafirmação do caráter laico do Estado brasileiro e pelo reconhecimento da primazia da dignidade da gestante em relação aos direitos de feto sem viabilidade de vida extrauterina.

Ação temerária

A relatora avaliou que o padre agiu “temerariamente” quando pediu a suspensão do procedimento médico de interrupção da gravidez, que já estava em curso, e impôs aos pais, “notadamente à mãe”, sofrimento inócuo, “pois como se viu, os prognósticos de inviabilidade de vida extrauterina se confirmaram”.

De acordo com a ministra, o padre “buscou a tutela estatal para defender suas particulares ideias sobre a interrupção da gestação” e, com sua atitude, “agrediu os direitos inatos da mãe e do pai”, que contavam com a garantia legal de interromper a gestação.

Andrighi refutou ainda a ideia de que a responsabilidade não seria do padre, que apenas requereu o habeas corpus, mas, sim, do Estado, pois foi a Justiça que efetivamente proibiu a interrupção da gestação.

Segundo ela, “a busca do Poder Judiciário por uma tutela de urgência traz, para aquele que a maneja, o ônus da responsabilidade pelos danos que porventura a concessão do pleito venha a produzir, mormente quando ocorre hipótese de abuso de direito”.

A turma condenou o padre ao pagamento de R$ 60 mil como compensação por danos morais, valor a ser acrescido de correção monetária e juros de mora a partir do dia em que a recorrente deixou o hospital.

Destaques de hoje
Padre é condenado a pagar danos morais por impedir interrupção de gravidez
Morre ministro aposentado do STJ Antônio Torreão Braz
Alteração de competência do juízo não prejudica legitimidade do MP
Corte Especial absolve desembargador do Amapá acusado de difamação 
 
Fonte: STJ

domingo, 23 de outubro de 2016

TJ-RS condena advogada a pagar R$ 20 mil para juíza ofendida em petição



Por Jomar Martins


A imunidade garantida constitucionalmente ao advogado não protege o profissional de excessos cometidos contra a honra das pessoas envolvidas no processo. Por isso, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve, na íntegra, sentença que condenou uma advogada a pagar R$ 20 mil de indenização moral à juíza Elisabeth Stefanello Scherer, da 1ª Vara Criminal de Tramandaí.

Nos dois graus de jurisdição, ficou claro aos julgadores que as manifestações ofensivas dirigidas à juíza, por meio de uma petição protocolada em agosto de 2013, tinham o propósito de ofendê-la, em afronta aos direitos de personalidade previstos no artigo 5º da Constituição.

Segundo o petição apresentada pela juíza, a advogada achou que houve demora na liberação de veículo de um cliente, apreendido numa operação de combate às drogas. Na petição, ao reiterar o pedido, a advogada colocou em dúvida a capacidade da juíza de interpretar o processo e acusou-a de descumprir a lei e de manipular a ação penal, para defender seu ponto de vista moral — leia abaixo alguns trechos.

Chamada a se defender na 13ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, a advogada afirmou nada saber sobre a capacidade da juíza de exercer com presteza seu trabalho em relação aos advogados e partes. Sustentou que os atos praticados estão dentro dos limites da legalidade.

Disse que a magistrada incorreu em "manipulação maliciosa dos fatos", pois ela só requereu a devolução do automóvel apreendido. Por fim, ajuizou reconvenção, exigindo reconhecimento de que a juíza colaborou para a situação narrada na petição, já que, com sua suposta negligência, incorreu nos crimes de prevaricação e improbidade administrativa. E tal enseja o pagamento de danos morais.

Sentença procedente
A juíza Fernanda Carravetta Vilande julgou totalmente procedente a ação principal. Ela entendeu que o conteúdo da petição protocolada extrapolou os deveres profissionais, pessoalizando a discussão e ultrapassando todos os limites de civilidade e urbanidade toleráveis.

Ao ir além do que é razoável, a parte ré atingiu os direitos de personalidade da autora, sobretudo no que diz respeito à dignidade. “É evidente que, ao questionar a capacidade da magistrada para atuar no processo, acusando-a de manipular a ação penal para defender seu ponto de vista moral, a procuradora teve a intenção de desabonar a demandante, atingindo a sua reputação profissional”, escreveu na sentença.

Para a titular da 13ª Vara Cível da Capital, a imunidade profissional do advogado — prevista no parágrafo 2º do artigo 7° do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei 8.906/94) — não é absoluta. Além disso, o próprio Estatuto da Advocacia, em seu artigo 32, não confere imunidade para os atos cometidos com dolo ou culpa.

Ela, no entanto, extinguiu a reconvenção sem análise de mérito por entender que a juíza é parte ilegítima na ação, já que a demanda deveria ser direcionado ao estado do Rio Grande do Sul, a teor do previsto no artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal. Também apontou não haver possibilidade legal de o Estado declarar a responsabilidade da juíza.

Intuito de ofensa
Relator da Apelação na corte, o desembargador Túlio de Oliveira Martins, disse que a petição foi redigida no único intuito de afrontar a pessoa da juíza. “Ora, a ré utilizou-se de termos fortes e fez acusações graves, atingindo a honra da magistrada, o que era totalmente desnecessário para sustentar suas teses ou para robustecer a defesa de seus clientes”, complementou em seu voto.

Para Martins, a atitude da advogada não só produziu “menoscabo espiritual interno” na autora como acarretou também reflexos na sua atividade jurisdicional. É que as acusações infundadas atingiram sua honra profissional no meio jurídico, seu reconhecimento entre os membros da profissão, além do grau de estima e confiabilidade indispensáveis à sua carreira.

Clique aqui para ler a sentença modificada.
Clique aqui para ler o acórdão modificado.

Leia abaixo os trechos considerados ofensivos:

“Mas de onde que Vossa Excelência retirou ‘embargos de declaração’ para despachar nesse sentido? Neste autos, processo nº 073/2013.0003797-0, que trata de um apenso de incidente de restituição de veículo, JAMAIS FOI AJUIZADO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. O que temos aqui é uma petição inicial de incidente que foi ajuizado a inúmeros meses e este juízo está amorcegando [sic!] o processo para não despachar a petição inicial conforme lhe foi apresentada.

A decisão publicada nestes autos de INCIDENTE DE RESTITUIÇÃO DE VEÍCULO é lamentável e demonstra que a prestação jurisdicional dada por este juízo é de tamanha falha jurídica que põe em dúvida a capacidade deste juízo quanto à leitura dos autos, interpretação dos fatos concretos, à aplicação dos princípios constitucionais de liberdade plena e de inocência máxima dos acusados até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória e do sistema processual penal vigente no território brasileiro, no sentido de ser o sistema acusatório (onde cabe ao MP fazer prova das acusações) e não o sistema inquisitório da época do império (onde o acusado era que tinha de provar sua inocência).”

(...)

“Assim, muito mal fundamentada está a decisão [n]o que se refere à nota de expediente acima transcrita, porque esse juízo não disse para que veio, para que está servindo nos autos. Vossa Excelência, como servidora pública igual a qualquer outro servidor, não tem a obrigação que cumprir com sua parte como servidora e, na sua função, assegurar um juízo de garantias? Presumo que Vossa Excelência saiba o que é um juízo de garantias!”

(...)

“Quer dizer: Vossa Excelência está mantendo uma versão mentirosa nos autos, contrário [sic!] às provas até então colhidas. Se os fatos são estes, são fatos que estão provados nos autos.”

(...)

“Vossa Excelência está manipulando o processo de tráfico em apenso com este incidente. Isso bem demonstra a desorganização da prestação jurisdicional que Vossa Excelência está prestando em nome do Estado.”

(...)

“A reclamação é pertinente porque, face o acontecido nestes autos e no apenso, cabe, sim, uma ação de improbidade administrativa, porque não se pode admitir que um servidor público, comum, como qualquer outro, venha descumprir a lei e manipular o sistema para defender ponto de vista moral ao invés de dizer o direito previsto no ordenamento jurídico como se o Estado fosse e para isso que serve o Estado.” O acórdão foi lavrado na sessão de 29 de setembro.





Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.

Revista Consultor Jurídico, 23 de outubro de 2016, 7h50

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Quarta Turma adota método bifásico para definição de indenização por danos morais


A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adotou o método bifásico para analisar a adequação de valores referentes a indenização por danos morais. A novo critério foi adotado em julgamento realizado no dia 4 de outubro.

Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, relator do processo, a aplicação desse método – que já foi utilizado pela Terceira Turma – uniformiza o tratamento da questão nas duas turmas do tribunal especializadas em direito privado.

O magistrado explicou que o método bifásico analisa inicialmente um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes que apreciaram casos semelhantes. Em um segundo momento, o juízo competente analisa as circunstâncias do caso para fixação definitiva do valor da indenização.

Salomão, em voto que foi acompanhado pelos demais ministros da turma, disse que na segunda fase do método o juiz pode analisar a gravidade do fato em si e suas consequências; a intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente; a eventual participação culposa do ofendido; a condição econômica do ofensor e as condições pessoais da vítima. Para o magistrado, o método é mais objetivo e adequado a esse tipo de situação.

“Realmente, o método bifásico parece ser o que melhor atende às exigências de um arbitramento equitativo da indenização por danos extrapatrimoniais, uma vez que minimiza eventual arbitrariedade de critérios unicamente subjetivos do julgador, além de afastar eventual tarifação do dano”, argumentou.

Razoabilidade

No caso analisado, os ministros mantiveram decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que fixou em R$ 250 mil uma indenização por danos morais decorrente da veiculação de entrevista falsa em rede nacional de televisão.

Os ofensores entraram com recurso e buscaram diminuir o valor da condenação. Para o ministro Luis Felipe Salomão, a valor foi fixado dentro de critérios razoáveis, sendo desnecessária qualquer alteração na decisão do TJSP. O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Destaques de hoje
Pesquisa mostra nível de satisfação do público com serviços do STJ
Quarta Turma adota método bifásico para definição de indenização por danos morais
Descumprimento de acordo de delação premiada pode restabelecer prisão preventiva
Ministro suspende ações sobre execução regressiva em empréstimo compulsório de energia elétrica

Fonte: STJ 

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Produtos na página do STJ contribuem para que jurisprudência seja conhecida e aplicada


Desde 2011, a Secretaria de Jurisprudência (SJR) do Superior Tribunal de Justiça (STJ) disponibiliza produtos que facilitam o acesso dos interessados ao entendimento da corte sobre os mais variados temas jurídicos. Todos esses produtos podem ser consultados na página do STJ na internet. Em 2015, o Informativo de Jurisprudência foi acessado 2.869.648 vezes. E, somente no primeiro semestre de 2016, já alcançou quase 1,7 milhão de visualizações.

A manutenção da base de dados do STJ pela SJR e a veiculação desses produtos contribuem para que juízes, membros dos tribunais, do Ministério Público e da advocacia conheçam e apliquem a jurisprudência pacificada no âmbito da corte.

A SJR zela pela organização e atualização dessa base de dados – que é composta de acórdãos, súmulas, decisões monocráticas e Informativos de Jurisprudência – para que as teses jurídicas sejam resgatadas de forma rápida e eficiente.

Informativo de Jurisprudência

Devido à repercussão dos temas no meio jurídico e à novidade das teses, o Informativo de Jurisprudência é o produto mais visualizado na página do STJ. Desde sua criação, em agosto de 2011, a publicação periódica (a cada 15 dias) tem tornado conhecidas as teses mais atuais dos diversos colegiados que compõem o STJ.

Em 2013, os informativos também passaram a ser organizados por ramos do direito. O usuário pode ainda conferir os documentos organizados por data de publicação.

Pesquisa Pronta

O segundo produto mais visto pelos usuários é a Pesquisa Pronta. No primeiro semestre deste ano, a página foi visitada quase 770 mil vezes. Com atualizações semanais, a publicação permite que o usuário obtenha, em tempo real, pesquisa sobre determinados temas jurídicos, que são organizados por ramos do direito ou por assuntos de destaque – assuntos recentes, casos notórios ou teses de recursos repetitivos.

O resultado da busca é sempre atualizado, pois o resgate é feito em tempo real. Todos os julgados referentes ao assunto podem ser visualizados, mesmo aqueles cujo entendimento não prevalece ou foi modificado ao longo dos anos.

A Secretaria de Jurisprudência disponibiliza links intitulados com os temas e, ainda, links que dão acesso a outros produtos relacionados.

Recursos repetitivos

A divulgação periódica dos recursos repetitivos tem contribuído de forma considerável para que as novas teses pacificadas no STJ sejam conhecidas por todo o Judiciário, pelos operadores do direito e demais interessados. No segundo semestre de 2011, ano de criação, a página teve 209.053 consultas. Neste ano, até julho, foi vista 488.798 vezes.

A base de dados dos repetitivos é composta pelos acórdãos dos recursos especiais julgados no STJ sob o rito dos artigos 1.036 a 1.041 do novo Código de Processo Civil (ou 543-C do código antigo).

Os acórdãos também foram organizados por ramo do direito, contudo, o usuário tem acesso à pesquisa livre, que permite indicar palavras relacionadas ao tema, número do processo, data, tipo de processo, ministro relator, entre outras informações.

Na página, há ainda links que direcionam para pesquisa, em tempo real, dos acórdãos posteriores aos julgados repetitivos e para acesso a outros produtos relacionados a esses acórdãos.

Legislação Aplicada

A Secretaria de Jurisprudência também oferece seleção de julgados com o entendimento do STJ acerca de leis específicas. A publicaçãoda Legislação Aplicada é semestral.

Em agosto deste ano, foi divulgado material contendo 550 mil documentos com a interpretação dada pelo STJ à parte geral do Código Civil (artigo 1º ao artigo 232). A página foi visualizada 174.055 vezes.

Por meio da ferramenta, o interessado pode verificar, em tempo real, o acervo de acórdãos referentes a cada dispositivo de lei selecionado (artigo, parágrafo, inciso ou alínea). A pesquisa pode ser feita por legislação, ou por outros critérios, como o número do dispositivo de interesse.

Súmulas Anotadas

Na página de Súmulas Anotadas, os enunciados das súmulas do STJ são anotados com trechos dos precedentes que lhes deram origem.

Além disso, o usuário pode conferir, em tempo real, os acórdãos posteriores à edição da súmula, bem como outros produtos relacionados aos assuntos sumulados. Há ainda as referências legislativas correspondentes.

Jurisprudência em Teses

Desde 2014, os usuários do site do STJ podem visualizar um conjunto de teses jurídicas sobre determinada matéria, com os precedentes mais recentes do tribunal selecionados até a data especificada na pesquisa. A página da Jurisprudência em Teses é atualizada de 15 em 15 dias. Somente neste semestre, a publicação temática teve 654.981 consultas.

Aedição 66, disponibilizada no dia 21 de setembro, traz 15 teses sobre o tema Apelação e recurso em sentido estrito. Ao clicar no texto de cada tese, é possível obter o resultado da pesquisa em tempo real.Além disso, os interessados podem conferir os destaques mais recentes apontados logo abaixo do texto da tese. São disponibilizados também links para acesso a outros produtos relacionados.
Destaques de hoje

Produtos contribuem para que jurisprudência seja conhecida e aplicada
Terceira Turma vê franquia como contrato de adesão e anula cláusula de arbitragem
Elevados honorários advocatícios em ação sobre direitos de transmissão do Atlético Mineiro
Criador não consegue ser indenizado com base no Estatuto da Terra
Fonte: STJ

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Terceira Turma autoriza quebra de sigilo bancário em ação de divórcio





A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu pedido feito por uma mulher para que fosse autorizada a quebra do sigilo bancário de pessoa jurídica que tem como um dos sócios o seu ex-marido.

O recurso teve origem em ação de divórcio com pedido de alimentos. Como o casamento foi celebrado sob o regime da comunhão universal de bens, no qual todo o patrimônio é comum ao casal, a ex-esposa alegou que, embora não fosse sócia da empresa, haveria copropriedade das cotas sociais.

O tribunal estadual negou o pedido sob o fundamento de que, como a mulher não ostenta a condição de sócia da empresa, seria “desaconselhável a violação do sigilo bancário de pessoa jurídica”. Além disso, o acórdão destacou que a apuração dos lucros e rendimentos poderia ser obtida por outros meios.

Pedido pertinente

No STJ, a decisão foi reformada. A relatora, ministra Nancy Andrighi, reconheceu a existência de limitações que impedem o ex-cônjuge de exercer o pleno direito de propriedade em relação a patrimônio constituído por cotas de sociedade limitada, mas destacou a pertinência do pedido.

“Não é desarrazoado o pedido de acesso aos extratos das contas correntes da sociedade empresarial, porquanto ele se caracteriza como comedida e limitada salvaguarda da recorrente quanto ao efetivo patrimônio representado pelas cotas sociais do ex-casal”, disse a ministra.

Nancy Andrighi afirmou que o fato de a ex-esposa obter um retrato das transações econômicas da sociedade empresária em nada prejudicaria o patrimônio dos sócios nem os projetos da organização, mas seria medida necessária ao resguardo do patrimônio partilhado.

“É inarredável o fato de que essa circunstância, não raras vezes, também dá azo à manipulação patrimonial por parte do ex-cônjuge, sócio da sociedade empresarial, que, se valendo dessa situação ímpar, pode fazer minguar o patrimônio pessoal – imediatamente partilhável com a ex-cônjuge –, em favor da empresa, onde ele, a priori, fica indisponibilizado para o casal, mas que, sabe-se, pode ser indiretamente usufruído pelo sócio”, explicou a ministra.

Precedente

Nancy Andrighi também destacou o entendimento da turma, firmado em precedente, que entendeu possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica em caso no qual um ex-cônjuge empresário utilizou a pessoa jurídica por ele controlada para subtrair da mulher direitos decorrentes do casamento.

“Se é possível, em determinadas circunstâncias – e esta turma já confirmou essa possibilidade –, a desconsideração invertida da personalidade jurídica e toda a devassa nas contas, livros e contratos da sociedade que dela decorrem, qual a razão para que não se defira o pedido singular de quebra de sigilo bancário da pessoa jurídica, por óbvio, medida muito menos gravosa para a sociedade empresarial? ”, questionou a ministra.

A turma, por unanimidade, acompanhou a relatora e deferiu o pedido de quebra de sigilo bancário. O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Destaques de hoje
Terceira Turma autoriza quebra de sigilo bancário em ação de divórcio
Divulgação de imagens de estupro coletivo no Rio passa para a Justiça Federal
Ação sobre qualidade de serviço de internet móvel retorna ao TJRJ para complementação de julgamento
Ministros reduzem valor da causa de meio bilhão atribuído a ação coletiva

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Rótulos de alimentos terão de informar sobre variação nutricional de até 20%



A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) terá de exigir dos fabricantes de alimentos a inclusão de advertência de que os valores nutricionais informados nos rótulos dos produtos podem variar em até 20%.

A decisão unânime foi tomada pela Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso apresentado pelo Ministério Público Federal (MPF) contra decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3).

Após apurar irregularidades na rotulagem de produtos light e diet, o MPF ajuizou ação civil pública para que a Anvisa, utilizando-se de seu poder de normatizar e fiscalizar os produtos alimentícios, exigisse essa advertência nos rótulos.

Nenhum prejuízo

Para o TRF3, a variação de 20%, relacionada com as matérias-primas utilizadas na fabricação dos alimentos, “não se caracteriza como informação relevante ou essencial, a justificar a inserção de advertência nos rótulos”.

No entendimento do tribunal regional, não há justificativa para determinar a advertência sobre a variação de 20% nas informações nutricionais dos rótulos de alimentos, “quer por não trazer qualquer prejuízo ao consumidor, quer pela possibilidade de criar dúvida maior do que eventual esclarecimento”.

Inconformado com essa decisão, o MPF recorreu ao STJ. O recurso foi relatado pelo ministro Herman Benjamin, da Segunda Turma, especializada em direito público.

Tolerância

Para o ministro, o consumidor tem o direito de ser informado no rótulo dos produtos alimentícios da existência dessa variação nos valores nutricionais, “principalmente porque existe norma da Anvisa permitindo essa tolerância”.

Por meio de atos normativos, a Anvisa regulamentou a informação nutricional e a rotulagem de alimentos, autorizando a tolerância de até 20% nos valores constantes da informação dos nutrientes declarados no rótulo.

Herman Benjamin ressaltou que o direito à informação é assegurado pela Constituição Federal (artigo 5º, XIV), só sendo possível “limitar tal direito quando contar com evidente e razoável justa causa, o que, obviamente, não é a hipótese” em julgamento.

Mudança ágil

“Cabe ainda ressaltar que, sobretudo nos alimentos e medicamentos, o rótulo é a via mais fácil, barata, ágil e eficaz de transmissão de informações aos consumidores”, disse o ministro. Segundo ele, os rótulos “são mudados diuturnamente para atender a oportunidades efêmeras de negócios, como eventos desportivos ou culturais”. O relator afastou ainda o argumento de que a inclusão da advertência sobre variação de 20% dos valores nutricionais das matérias-primas utilizadas na fabricação dos alimentos cause custo excessivo aos fabricantes.

Destaques de hoje
Rótulos de alimentos terão de informar sobre variação nutricional de até 20%
STJ suspende decisão que permitiu candidatura de Raul Filho à prefeitura de Palmas
Negado habeas corpus a Ricardo Najjar, suspeito de matar a filha Sophia
Suspensas ações sobre início do prazo recursal do MP após intimação em audiência


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1537571
Fonte: STJ 

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Terceira Turma reconhece multipropriedade como direito real e afasta penhora





A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria, que a multipropriedade imobiliária tem natureza jurídica de direito real e, no caso de penhora do imóvel objeto de compartilhamento (time-sharing), o coproprietário pode se valer de embargos de terceiro para proteger sua fração ideal.

Com esse entendimento, a turma reformou decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia admitido a penhora de uma casa no condomínio Praia das Caravelas, no município de Búzios (RJ). O imóvel, registrado em nome de uma incorporadora – executada em ação judicial –, é dividido em 52 cotas de propriedade no sistema time-sharing, as quais dão a seus titulares o direito de utilização em semanas específicas.

Após a penhora, uma das coproprietárias, titular de 2/52 do imóvel, interpôs embargos de terceiro para que fosse afastada a constrição judicial de sua fração.

O TJSP negou o pedido sob o fundamento de que a cessão de direitos referente aos 2/52 da casa não corresponderia a direito real de propriedade, mas a direito obrigacional, “uma vez que o imóvel foi registrado em nome da devedora, que figurou como centralizadora do contrato e organizadora da utilização periódica do bem”.

Para o tribunal paulista, no caso de multipropriedade, nada impede a penhora da totalidade do imóvel que consta no registro imobiliário em nome da devedora, a qual seria sua efetiva proprietária.

Direito pessoal

No STJ, o relator do recurso da coproprietária, ministro Villas Bôas Cueva, reconheceu que o regime da multipropriedade apresenta características de direito real e de direito obrigacional, o que dificulta seu enquadramento em uma das categorias.

O relator, no entanto, ao ponderar que o ordenamento jurídico brasileiro adota o princípio de que os direitos reais são apenas aqueles previstos expressamente em lei, votou no sentido de que o contrato de time-sharing “não garante direito real, mas mero direito pessoal”, razão pela qual considerou possível a penhora do imóvel sobre o qual incide a multipropriedade, como decidiu o TJSP.

Voto vencedor

O ministro João Otávio de Noronha apresentou entendimento divergente e foi acompanhado pela maioria da turma. Segundo ele, a natureza jurídica da multipropriedade imobiliária – “que detém as faculdades de uso, gozo e disposição sobre fração ideal do bem, ainda que objeto de compartilhamento pelos multiproprietários de espaço e turnos fixos de tempo” – é mais compatível com a de um direito real.

Além disso, assinalou o ministro, o Código Civil não traz nenhuma vedação nem faz qualquer referência à inviabilidade de se consagrarem novos direitos reais.

“A questão sobre ser possível ou não a criação de novo instituto de direitos reais – levando-se em conta a tipicidade e o sistema de numerus clausus (rol taxativo) –, em circunstâncias como a dos autos, nas quais se verifica a superação da legislação em vigor pelos fatos sociais, não pode inibir o julgador de, adequando sua interpretação a recentes e mutantes relações jurídicas, prestar a requerida tutela jurisdicional a que a parte interessada faz jus”, disse Noronha.

O colegiado reconheceu procedentes os embargos de terceiro e declarou insubsistente a penhora sobre a totalidade do imóvel.

Destaques de hoje
Seguradora deve indenizar consumidora por demora em reparo de veículo
Companhia Athletica consegue impedir academia gaúcha de utilizar marca semelhante
Homologação de falta grave após decreto presidencial não impede vedação de indulto e comutação
Terceira Turma reconhece multipropriedade como direito real e afasta penhora


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1546165
 
Fonte: STJ

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Não cabe reexaminar tempestividade de agravo de instrumento no julgamento do recurso especial




Quando do julgamento de um recurso especial, não cabe reexaminar de ofício a tempestividade do agravo de instrumento anteriormente aceito, uma vez que o juízo de admissibilidade, nesse momento, é apenas do próprio recurso especial.

O entendimento foi reafirmado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao acolher embargos de divergência interpostos pelo Ministério Público Federal (MPF) para reformar uma decisão da Quinta Turma.

O relator dos embargos de divergência, ministro João Otávio de Noronha, ressaltou no voto que essa questão já foi pacificada pelo STJ quando do julgamento do EREsp 218.863, de relatoria do ministro Teori Zavascki (hoje no Supremo Tribunal Federal).

Naquele julgamento, entendeu-se que é cabível a interposição de agravo regimental contra decisão do relator que dá provimento ao agravo de instrumento para determinar a subida do recurso especial, quando a irresignação apresentada referir-se à admissibilidade do próprio agravo.

Noronha salientou ainda que, sobre essa mesma questão, a Corte Especial, no julgamento do EREsp 171.499, consolidou a orientação de que, "exaurido o agravo, não há rever a decisão específica no instante da apreciação do recurso especial".

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Destaques de hoje
Apesar de eficaz, CTN precisa de ajustes, avaliam coordenadores de seminário
Não cabe reexaminar tempestividade de agravo de instrumento no julgamento do recurso especial
Reconhecida possibilidade de fixação de honorários em liquidação de sentença coletiva
Demora na notificação do sinistro não acarreta perda do seguro de forma automática

Fonte: STJ

Falta de convencimento do julgador não justifica extinção do processo, diz STJ





Não é por não ter se convencido com as perícias apresentadas que uma corte pode extinguir uma liquidação de sentença para apuração de lucros cessantes. O entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que em julgamento de recurso especial cassou decisão da Justiça de São Paulo.

No caso, uma empresa alegava ter deixado de lucrar devido ao atraso na entrega de equipamentos fundamentais para a fabricação de capacetes. O TJ-SP considerou que as provas apresentadas não seriam suficientes para a determinação exata do valor da indenização.

Foram feitas três perícias judiciais. Apenas a última, determinada pelo juízo de primeiro grau em razão da discrepância entre a primeira e a segunda perícia, foi homologada. Contra a decisão foi interposto agravo de instrumento.

O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu pela extinção da liquidação judicial de sentença pois, segundo o acórdão, as perícias se basearam em meras presunções, “desprovidas de grau aceitável de certeza, de modo que seus resultados não podem ser aceitos”.

No STJ, o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, entendeu que a ausência de formação de convencimento pela corte estadual não poderia ser justificativa para a extinção da liquidação. Ele destacou o instituto do ônus da prova, que atribui às partes o dever de informar o juiz para que este firme a convicção quanto ao direito alegado — uma vez não comprovado esse direito, a parte à qual incumbe tal ônus sai perdedora no litígio.

O ministro também rechaçou a afirmação do acórdão sobre a inviabilidade de utilização de presunções no sistema probatório. “As presunções não apenas são toleradas pelo sistema processual, como lhe são fundamentais”, disse.

Para o relator, é impossível chegar a uma conta exata sobre quanto a empresa deixou de lucrar, mas exigir essa precisão seria o mesmo que negar o direito à reparação integral do dano judicialmente reconhecido. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

REsp 1.549.467


Revista Consultor Jurídico, 20 de setembro de 2016, 12h22

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC e tio que deve alimentos a sobrinho





Por José Fernando Simão


A semana foi bem agitada em termos de Direito de Família e das Sucessões. Dois temas de grande repercussão na impressa merecem algumas palavras em razão do impacto sobre o Direito de Família e sobre as famílias.

1. A declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC pelo STF
O julgamento não acabou, mas já foram SETE os ministros que reconheceram a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do CC. Trata-se do julgamento do RE 878.694/MG, com repercussão geral, que se iniciou em 31 de agosto. Dias Toffoli pediu vista.

Conforme antecipado a meus alunos em sala de aula, em conversa com o ministro Lewandowski na semana anterior ocorrida na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, este dissera uma frase que indicava o destino do dispositivo em questão: “O STF tem sido bem liberal em Direito de Família”.

O voto do ministro Barroso, relator do recurso, tem dois fundamentos basilares: 1) o Estado deve proteger a família não só constituída pelo casamento, mas qualquer entidade familiar que seja apta a contribuir para o desenvolvimento de seus integrantes; 2) o artigo 1.790, ao revogar as leis de 1994 e 1996, discrimina os companheiros, dando-lhes tratamento bem inferior ao dado aos cônjuges em contraste aos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da proporcionalidade, como vedação à proteção deficiente e da vedação do retrocesso.

Por fim, menciona que a decisão só se aplica aos inventários judiciais em que não tenha havido o trânsito em julgado da sentença e às partilhas extrajudiciais em que não tenha havido escritura pública.

A orientação do STF encontra base doutrinária sólida: Giselda Hironaka. Há 15 anos, ela vem afirmando a inconstitucionalidade do dispositivo e o faz de maneira contundente em sua tese de titularidade defendida no Largo São Francisco, posteriormente publicada com o título Morrer e Suceder. No ano passado, no Congresso Nacional do IBDFam, eu defendia a constitucionalidade do dispositivo, e Giselda, a inconstitucionalidade. Foi a doutrina dela que prevaleceu.

Entendo eu que o Código Civil pode tratar de maneira igual em termos sucessórios as famílias advindas do casamento e da união estável. Tratamento diferente não significa que certa modalidade familiar é “pior” ou “inferior”. Só significa que é diferente. A lei não está obrigada a tratar de maneira idêntica casamento e união estável.

O único ponto de efetiva afronta à proibição ao retrocesso diz respeito ao inciso III do dispositivo, que, diferentemente do que ocorreria com a Lei 8.971/94, coloca o companheiro em situação pior que a do colateral. Pela lei de 1994, o companheiro sobrevivo excluía os colaterais (artigos 2º, III), e pelo artigo 1.790 do CC há concorrência entre eles, recebendo o colateral 2/3 da herança, e o companheiro, apenas 1/3.

Contudo, para o STF, toda e qualquer distinção sucessória é discriminatória, logo, para os companheiros, aplicam-se todas as regras sucessórias referentes aos cônjuges. A decisão tem os seguintes efeitos:
aplica-se ao companheiro a ordem de vocação hereditária do artigo 1.829 e, como consequência, os artigos 1.832 (quinhão que recebe o companheiro em concorrência com descendentes), 1.837 (quinhão que recebe o companheiro em concorrência com o ascendente) e 1.838 do CC (companheiro exclui da sucessão os colaterais);
aplica-se ao companheiro o artigo 1.830 do CC, ou seja, se o companheiro estiver separado de fato, há perda da qualidade de herdeiro[1];
o companheiro tem direito real de habitação garantido nas mesmas condições que se garante ao cônjuge (artigo 1.831);
o companheiro passa a ser herdeiro necessário (artigo 1.845 do CC);
afastam-se as dúvidas quanto à declaração de vacância da herança em havendo companheiro, ou seja, a herança tocará por inteiro a ele (bens adquiridos a qualquer título, antes ou depois da união), e não ao ente público (artigo 1.844).

Em 2011, escrevi um artigo denominado Em busca da harmonia perdida[2], cujo objetivo era demonstrar como os tribunais rejeitavam a aplicação do artigo 1.790 do CC para equiparar a sucessão do companheiro à do cônjuge. O julgador, em várias decisões, demonstrava que não aceitou a desigualdade trazida pelo CCI (isso porque, pelo direito vigente anteriormente — leis de 1994 e 1996 —, a equiparação sucessória era total). Fui profético ao afirmar que o Direito sempre busca um caminho para se amoldar à realidade, assim como a natureza sempre dá uma solução[3]. A profecia se realizou cinco anos depois, com a decisão do STF.

Contudo, tenho que dizer que não concordo com a orientação do STF. Se ela é justa, pois retoma a equiparação existente até 2003, não se pode afirmar que o artigo 1.790 era como um todo inconstitucional. Respeitava-se a diferença entre as famílias e a liberdade de escolha dos modelos familiares. Não havia modelo pior ou melhor (isso seria discriminatório), mas apenas diferente. Com a decisão, o próximo passo que se dará será se reconhecer identidade de efeitos também para o Direito de Família com a total equiparação entre união estável e casamento.

Não é salutar retirar parcela de liberdade individual equiparando-se totalmente os modelos familiares. O Código Civil não pretendeu, nem a Constituição exigiu tal identidade de efeitos. Contudo, o assunto está encerrado com a decisão do STF. Casar ou se unir estavelmente produzem iguais efeitos sucessórios e, porque não, no âmbito familiar.

Há um ponto positivo: acabou a insegurança jurídica quanto ao tema.

2. Tio que paga alimentos a sobrinho?
O artigo 1.697 do CC é expresso: somente os colaterais de segundo grau (irmãos) podem pagar alimentos de maneira subsidiária, ou seja, se os ascendentes e descendentes não puderem suprir as necessidades do credor de alimentos.

Tio é colateral de terceiro grau, logo, nunca, de maneira alguma, é obrigado a pagar alimentos ao sobrinho. Em São Carlos, interior de São Paulo, o magistrado Caio Cesar Melluso proferiu uma decisão em sentido contrário, condenando-se o tio a pagar alimentos ao sobrinho (Processo 1007246-25.2016.8.26.0566).

O fundamento da decisão é a lição de Maria Berenice Dias: o tio é parente de terceiro grau, logo herdeiro, se tem os bônus deve ter também os ônus. “Os graus de parentesco não devem servir só para se ficar com os bônus, sem a assunção do ônus.”

Afirma a decisão de São Carlos que “o artigo 1.697 diz menos do que a intenção da norma jurídica e portanto deve ser interpretado de maneira extensiva, conforme a Constituição Federal”.

Entendo a situação do magistrado. Vendo uma pessoa que necessita de alimentos desamparada, o magistrado condoído se vale do que tem para não deixar um ser humano à míngua. É uma postura humanitária e com as melhores intenções. Frise-se que o autor da ação tem Síndrome de Asperger, o que comoveu enormemente o magistrado. Contudo, a decisão é perigosa e com bases fragilíssimas.

Perigosa, pois se levado ao extremo o princípio constitucional da solidariedade, negando vigência expressamente ao CC, poderia se concluir que toda a pessoa que pode deve pagar alimentos a quem precisa, pois, afinal, não se pode deixar um semelhante em situação de necessidade. A solidariedade se estenderia aos vínculos mais tênues: vizinhos, conhecidos, colegas de clube ou mesmo aos desconhecidos. Solidariedade contra legem não é solidariedade.

Frágil é a base técnica: “Quem tem os bônus tem que ter ônus”. Os colaterais são parentes. Ser parente é um estado. Não implica bônus nem implica ônus. No Direito Eleitoral, por exemplo, pode implicar impedimentos. Isso é ônus? Não, não é. É uma decorrência do parentesco. Em Direito, ônus e bônus existem, quando muito, em contratos bilaterais sob a forma de prestações.

E se o parentesco colateral bônus fosse, o tio não é herdeiro senão em tese. O colateral só herda se o falecido não tiver descendentes, ascendentes, nem cônjuge ou companheiro. Ademais, só herda o colateral de terceiro grau (tio) se o falecido não tiver irmãos (colateral de segundo grau) nem sobrinhos (colateral de terceiro grau — artigo 1.843).

No caso concreto, o credor dos alimentos tem seus ascendentes (pais e avós), logo o tio condenado à prestação alimentar sequer tem “bônus”. Se a sentença afirmasse: “Como o tio é herdeiro e, no caso concreto, tem os bônus”, seria menos ilógica. Mas, não, o tio condenado à prestação alimentar não tem qualquer bônus.

Os bônus são remotíssimos, mas o ônus atual. Nenhuma relação de família se pauta pela lógica de ônus e bônus. Há desequilíbrio em todas as relações de Direito Civil. O doador tem ônus, e o donatário, bônus, logo a doação fere a Constituição? O locatário tem proteção garantida por lei, e o locador, não, e os bônus geram ônus? E assim os exemplos se multiplicam.

A noção de família em sentido restrito é a utilizada pelo Código Civil para fins de alimentos. Ruim ou boa, certa ou errada, a lei deve ser aplicada ou alterada pelo Congresso Nacional. Transformar os alimentos em seguridade social é um perigo, pois a Justiça ganha contorno de Robin Hood: dar aos pobres, tirando dos ricos[4].

A lei é a reserva de segurança mínima. Seu desrespeito, mesmo por uma causa nobre, abre espaço para afronta a direitos e garantias em situações não tão nobres. E na história recente os regimes de exceção bem demonstraram isso...



[1] Não se discute o lapso de dois anos nem culpa após a Emenda 66/2010.
[2] SIMÃO, José Fernando. Em busca da harmonia perdida. In: LAGRASTA NETO, Caetano; TARTUCE, Flávio; SIMãO, José Fernando. (Org.). Direito de família: novas tendências e julgamentos emblemáticos. São Paulo: Atlas, 2011, v. , p. 111-136.
[3] Menção ao filme Jurassic Park e o fato de surgirem os dinossauros machos a partir de fêmeas apenas.
[4] Essa ideia agrada parte da civilística nacional.

José Fernando Simão é advogado, diretor do conselho consultivo do IBDFAM e professor da Universidade de São Paulo e da Escola Paulista de Direito.

Revista Consultor Jurídico, 11 de setembro de 2016, 8h00

Suspensas ações sobre cobrança de serviço de terceiros em contrato bancário


O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), determinou a suspensão do trâmite de todos os processos que discutam a validade da cobrança por registro de contrato, avaliação de bem ou qualquer outro serviço de terceiros em financiamentos bancários.

A suspensão, que alcança todas as instâncias judiciais em todo o território nacional, valerá até que a Segunda Seção do STJ julgue o REsp 1.578.526. Na decisão de afetar o recurso para julgamento sob o rito dos repetitivos, o ministro destacou que somente no STJ há 886 casos sobre a mesma controvérsia.

O assunto foi catalogado como Tema 958 (“Validade da cobrança, em contratos bancários, de despesas com serviços prestados por terceiros, registro de contrato e/ou avaliação do bem”) e está disponível para consulta na área de recursos repetitivos do site do STJ, que pode ser acessada aqui.

As cobranças questionadas são comuns, por exemplo, em contratos de financiamento de veículos ou imóveis, nos quais a instituição financeira cobra um valor para avaliar o bem ou para registrar o contrato, com a justificativa de que são serviços prestados por terceiros e representam custo extra.

No processo afetado, o autor da ação alegou violação ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), com o argumento de que tais cobranças são indevidas, mesmo que constem no contrato.

Em seu despacho, ao tratar da suspensão do trâmite dos processos, o ministro Sanseverino ressalvou que ficam excluídas “as hipóteses de autocomposição, tutela provisória, resolução parcial do mérito e coisa julgada, de acordo com as circunstâncias de cada caso concreto, a critério do juízo". Leia a íntegra da decisão.

Recursos repetitivos

O novo Código de Processo Civil (CPC/2015) regula no artigo 1.036 o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica.

No site do STJ é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.
Destaques de hoje
Suspensas ações sobre cobrança de serviço de terceiros em contrato bancário
Evento discute modelo para redução de conflitos entre empresas e clientes
Prorrogado prazo de inscrição para seminário sobre ombudsman e relações de consumo
Ministros avaliam que ombudsman bancário pode desafogar sistema judicial

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1578526
Fonte: STJ

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Tribunal rejeita pedido de anulação da marca “Sanybril”


Os ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitaram, por maioria, o pedido de anulação da marca “Sanybril”. Em recurso, a “Bombril” alegou que a marca da concorrente explora o seu prestígio ao se associar com um nome conhecido pelos consumidores.

O pedido foi negado em primeira instância, acolhido em segunda instância, mas posteriormente reformado nos embargos de declaração. Nas instâncias inferiores houve entendimento no sentido de que “bril” é o prefixo tanto do verbo brilhar como do substantivo brilho, termos evocativos que remetem à função dos produtos de limpeza e higiene inseridos nas marcas em questão, assim como “Sany” (que remete a sanear e sanitário) e “bom” são termos para ressaltar características de qualidade e finalidade dos produtos.

Inconformada com as decisões, a “Bombril” recorreu ao STJ. Para a empresa, a adição do prefixo “Sany” foi apenas uma forma de mascarar a tentativa de desfrutar do prestígio que os produtos com o nome “bril” obtêm no País.

O ministro relator do recurso, Villas Bôas Cueva, lembrou que o Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI - concedeu registro às marcas de ambas as partes sem direito de uso exclusivo. Ele destacou que a “Bombril” não buscou impugnar o registro feito pela “Sanybril” durante o trâmite do mencionado registro.

Villas Bôas Cueva apontou que o termo em conflito é o sufixo “bril” e não a marca mista registrada previamente (“Bom Bril”).

“A instância ordinária concluiu, com base nos documentos e na manifestação técnica do INPI, que o referido termo seria evocativo e de uso comum e, portanto, não registrável como marca. Concluiu também que o termo remete a brilho e a brilhar, características básicas dos produtos de ambas as partes em litígio: esponja de lã de aço (BOM BRIL) e desodorante sanitário (SANYBRIL)”.

Entre outros argumentos, o ministro explicou que o INPI reconheceu a “Bombril” como marca de alto renome após a propositura da ação. Assim, tendo a proteção desse direito efeitos futuros, entendeu ser impossível, no caso, aplicar tal imposição.

O ministro João Otávio de Noronha acompanhou no mérito o voto do relator, com o argumento de que as expressões de uso comum não ensejam a pleiteada exclusividade.

“Não há como concluir que a utilização do sufixo BRIL pela marca SANY BRIL levaria o consumidor a erro no sentido de estar adquirindo um produto da marca BOMBRIL. Consectariamente, não se evidencia na espécie usurpação, proveito econômico parasitário ou tentativa de desvio de clientela por parte da requerida”, argumentou Noronha.

O ministro Villas Bôas Cueva lembrou que o STJ não pode reavaliar as conclusões do tribunal de origem quanto às provas dos autos. Portanto, não seria possível chegar à conclusão diversa, de que o termo “bril” não seria meramente evocativo, conforme dispõe a Súmula nº 7 desta Corte. FS

Destaques de hoje
Ministro Noronha toma posse como corregedor nacional de Justiça
Pedido de vista suspende julgamento de acordo da Samarco na Primeira Seção
Tribunal rejeita pedido de anulação da marca “Sanybril”
Para fins de penhora, cotas de investimento variável não equivalem a dinheiro em espécie


Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1582179

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Estupro de vulnerável não exige contato físico entre agressor e vítima





Estupro de vulnerável pode ser caracterizado ainda que não haja contato físico entre o agressor e a vítima. Com esse entendimento, a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça confirmou decisão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que considerou legítima a denúncia contra um homem acusado de contratar, mais de uma vez, pessoas para levarem uma menina de dez anos a um motel, onde ela foi forçada a tirar a roupa, por R$ 400 mais comissão para a irmã da vítima.

No Recurso em Habeas Corpus, a defesa do acusado alegou que a denúncia é inepta, e, portanto, o réu deveria ser absolvido — até porque não há provas de sua conduta. Para o defensor, não é possível caracterizar um estupro consumado sem contato físico entre as pessoas.

Em seu voto, acompanhado pelos demais ministros da turma, o relator do processo, ministro Joel Ilan Paciornik, disse que, no caso analisado, o contato físico é irrelevante para a caracterização do delito.

Para o magistrado, a denúncia é legítima e tem fundamentação jurídica em conformidade com a doutrina atual. “A maior parte da doutrina penalista pátria orienta no sentido de que a contemplação lasciva configura o ato libidinoso constitutivo dos tipos dos artigos 213 e 217-A do Código Penal, sendo irrelevante, para a consumação dos delitos, que haja contato físico entre ofensor e ofendido.”

Dignidade sexual
O relator lembrou que a dignidade sexual é passível de ser ofendida mesmo sem agressão física, como no caso da denúncia, em que uma criança foi forçada a se despir para a apreciação de terceiro. Segundo Paciornik, a denúncia descreve detalhadamente o crime, preenchendo os requisitos legais para ser aceita.

Em seu parecer, o Ministério Público Federal opinou pela rejeição do pedido da defesa. O MPF considerou que o ato lascivo de observar a criança nua preenche os requisitos previstos na legislação brasileira para ser classificado como um caso de estupro, por se tratar de menor sem chances de defesa e compreensão exata do que estava ocorrendo.

O ministro Jorge Mussi, ao acompanhar o voto do relator, disse que o contexto delineado revelou “uma situação temerária de se discutir se teve contato ou não”, sendo suficiente, até o presente momento, a denúncia apresentada pelo Ministério Público.

Para o ministro Ribeiro Dantas, o conceito de estupro apresentado na denúncia (sem contato físico) é compatível com a intenção do legislador ao alterar as regras a respeito de estupro, com o objetivo de proteger o menor vulnerável. De acordo com ele, é impensável supor que a criança não sofreu abalos emocionais em decorrência do abuso.

O caso faz parte de investigação sobre uma rede de exploração de menores em Mato Grosso do Sul e envolve políticos e empresários de Campo Grande e região.

Para o advogado do réu, José Trad, a decisão deste julgamento foi contra jurisprudência pacificada do STJ, principalmente pelas 5ª e 6ª turmas. Ele destaca que a corte sempre entendeu que o estupro só é consumado com contato físico. “Os ministros se impressionaram com a denúncia”, justifica, destacando que compreende a preocupação dos ministros em tutelar a dignidade sexual dos menores de 14 anos.

Trad ressalta ainda que apesar do entendimento da corte em considerar o crime como estupro de vulnerável, os ministros fizeram ressalvas ao voto do relator, destacando a importância do tema no debate doutrinário por haver divergência. “A questão não está definitivamente fechada.”

O advogado diz estranhar o fato de seu cliente ser enquadrado no crime de estupro de vulnerável (217-A do Código Penal) por contemplação lasciva mesmo havendo o artigo 218-A, que trata de satisfação de lascívia na presença de criança ou adolescente e traz condutas mais graves do que a contemplação. “Mesmo assim, ele está sujeito a uma pena muito mais severa”, reclama.

Afirma que ainda estuda se irá apresentar recurso ao STJ ou levar a questão ao Supremo. “Não há lógica ou razoabilidade em se punir a contemplação lasciva pelo artigo 217-A e punir condutas mais graves pelo artigo 218-A”. “O precedente é perigoso”, complementa.

Na questão de mérito, onde a defesa alega falta de justa causa, José Trad destaca que há divergências entre a acusação e o depoimento prestado pela menina ao Ministério Público. “A história que a menor contou em depoimento no Ministério Público não foi bem assim. A história que ela conta dá a impressão de que esse encontro não se consumou por vontade do próprio acusado. Ela teria dito que, no motel, ele simplesmente olhou para a menina e ficou com medo ao ver que se tratava de uma menor de idade. Então ele teria mando a menina se vestir e ir embora”, finaliza.

O processo corre em segredo de Justiça. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

*Notícia alterada às 21h59 para inclusão de informações.


Revista Consultor Jurídico, 4 de agosto de 2016, 14h01

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Negada nomeação de candidatas aprovadas em concurso fora do número de vagas




Os ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negaram recurso em mandado de segurança de um grupo de professoras que buscava nomeação em concurso público do Estado de Minas Gerais. As candidatas foram aprovadas fora do número de vagas, e o colegiado, de forma unânime, entendeu não haver direito líquido e certo à nomeação.

No mandado de segurança, as professoras alegaram que obtiveram aprovação em concurso público para a carreira da educação básica de Minas Gerais em 2012, todavia em colocações além das 12 vagas oferecidas no certame.

Mesmo assim, na ação, as candidatas apontaram a existência de vagas para nomeação, pois as próprias professoras ocupavam alguns desses postos por meio de vínculo temporário com a Secretaria de Educação estadual.

Expectativa

Em primeiro julgamento, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) negou o mandado de segurança, sob o fundamento de que as professoras foram aprovadas fora do número de vagas e, assim, detinham mera expectativa de convocação, caso surjam novas vagas ao longo da validade do certame.

Em recurso ordinário, as professoras alegaram que os novos postos já existem, mas o Estado de Minas Gerais decidiu ocupar as vagas com servidores temporários.

Elas também defendiam que, no momento em que a administração pública abriu postos temporários, ficou constatada a existência de demanda por profissionais de ensino e, por consequência, surgiu o direito líquido e certo à nomeação.

Comprovação

O ministro relator do recurso, Humberto Martins, explicou que o STJ, de fato, adota o posicionamento da transformação da mera expectativa de direito pelo direito líquido e certo quando, dentro do prazo de validade do certame, há contratação de pessoal temporário para as vagas existentes, em preterição daqueles indivíduos aprovados em concurso.

“Todavia, [...] a alegação de existência de ilegal contratação temporária, a ensejar preterição e, portanto, a convolação de uma expectativa de direito em liquidez e certeza, precisa ser comprovada, o que não ocorreu no caso dos autos”, ressaltou o ministro ao negar o recurso.

O relator sublinhou que o certame tem validade até novembro de 2016 e, dessa forma, as candidatas ainda podem ser nomeadas.

RL
Destaques de hoje

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): RMS 47877
Fonte: STJ

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...