segunda-feira, 21 de setembro de 2015

"Somente o novo CPC não vai ser suficiente para resolver morosidade do Judiciário"






Para o advogado Antonio Carlos de Oliveira Freitas, sócio do Luchesi Advogados, por mais que o novo Código de Processo Civil traga avanços à prestação jurisdicional brasileira, não tem condições de resolver, sozinho, os problemas da morosidade da Justiça. O que resolverá serão mudanças administrativas e de infraestrutura no Judiciário e transformações culturais gradativas na população.

O novo CPC demorou alguns anos para ficar pronto. Foi elaborado por uma comissão de juristas chefiada pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, e depois tramitou por quase quatro anos no Congresso. Foi aprovado em março deste ano e entra em vigor em março de 2016.

Antonio Freitas comemora algumas das mudanças. Por exemplo, a extensão de alguns prazos e as novas regras para honorários, que permitem o pagamento das verbas por etapas, e não apenas ao final do processo. Ele também elogia a obrigação de fundamentar as decisões, que estimulará a busca por decisões de mérito, em vez de liminares.

O novo Código de Processo Civil, que entra em vigor em março de 2016, auxiliará na normatização de jurisprudências consolidadas, beneficiará advogados com as novas regras sobre honorários e prazos, limitará a tentativa de impedir a jurisprudência defensiva e facilitará a busca de decisões de mérito, em vez de liminares.

Mas ele ressalva que a importação de sistemas jurídicos estrangeiros sem a devida adequação e a falta de planejamento para o uso de sistemas, como processo eletrônico, prejudicam a Justiça brasileira.

"Escuto dizer que é um código da advocacia, mas não é. Escuto que é um código dos que vão ao Judiciário buscar o seu direito e tem o direito de ver que o Estado e o juiz decidam de forma pragmática, e não colocando obstáculos para deixar de analisar o mérito da questão", diz, em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico.

O advogado analisa que a Constituição de 1988 chamou a população a lutar por seus direitos, mas reclama que o Estado não deu ferramentas para isso. "Não tinha infraestrutura suficiente e precisou colocar barreiras de contenção para que fosse possível uma análise mais correta de cada caso."

Especialista em recuperações judiciais, Freitas critica as lacunas existentes nas leis do setor, como as que permitem o “calote” institucionalizado aos credores por meio de incongruências relacionadas ao quórum necessário para a convocação da assembleia de credores. Também reclama de seções judiciárias com pouca infraestrutura que acabam por inviabilizar todo o procedimento de recuperação da companhia ou de efetivação de sua falência.

Segundo ele, não se pode prejudicar credores e outras companhias para tentar salvar uma empresa que já apresenta sinais claros de falência. Freitas diz ainda que sem ajustes na Lei e Recuperação Judicial, o Brasil continuará a ter poucas empresas obtendo sucesso no processo de reestruturação. De acordo com dados do Instituto Nacional de Recuperação de Empresarial (Inre), esse total é de 6%. "É tão raro que vira até notícia", afirma.

Leia a entrevista:

ConJur — Em uma conferência sobre agronegócio, o senhor mencionou a tentativa de impedir a jurisprudência defensiva. Como isso ocorre?
Antonio Carlos de Oliveira Freitas — Hoje em dia, tanto no Superior Tribunal de Justiça quanto no Supremo Tribunal Federal, as análises excessivamente detalhistas têm aumentado. Tivemos um caso recentemente em que, milagrosamente, o próprio tribunal deve ter achado que a situação passava dos limites. Recolhemos as custas de preparo para o recurso e, nesse meio tempo, houve uma mudança no provimento que mudou o tipo da guia. Mas as informações necessárias estavam ali: o valor estava correto, foi pago dentro do prazo, foi apresentado junto com o recurso, enfim, tudo certo. Mas o recurso não foi conhecido. Depois saiu até no próprio site do STJ que alguns recursos seriam revistos porque essa mudança de guia não poderia prejudicar o jurisdicionado. Então, nós vemos há muito tempo um forte aumento de formas para não analisar o mérito do recurso. É isso o que a gente chama de jurisprudência defensiva.

ConJur — O novo CPC trata disso?
Antonio Freitas — No novo CPC o intuito é que isso não ocorra. Você vai atrás de uma decisão de mérito, que é o correto. Você não pode pegar e colocar para o jurisdicionado uma série de obstáculos sem que tenha, do Estado, do juiz, a devolutiva da análise do caso em questão.

ConJur — A obrigação de se analisar o mérito pode aumentar a morosidade do Judiciário?
Antonio Freitas — A questão da argumentação é positiva para todo mundo. O advogado poderá exercitar seu conhecimento jurídico e haverá um refinamento da técnica jurídica, necessária para elaborar uma boa argumentação. Para os juízes, a argumentação exigirá base para refutar ou aceitar pedidos. O problema é que existem algumas jurisprudências consolidadas no sentido de que o juiz não é obrigado a responder ponto a ponto das questões que foram debatidas se ele estiver convencido em outra linha. É ruim falarmos sobre isso, mas essa questão necessita de uma mudança cultural, que não é tão simples de ser feita. Não é porque o Código passará a vigorar em março do ano que vem, que tudo vai mudar como num passe de mágica. Isso leva todo um tempo, um processo de maturação, até que a gente consiga, ou não, viabilizar esses anseios da população.

ConJur — Não é muito esperar de um código a celeridade do Judiciário?
Antonio Freitas — O que se divulga é que esse código vai trazer mais celeridade, que é um pouco do anseio da população em geral. Mas é preciso separar celeridade de rapidez. Uma coisa não pode, e não tem como, ser confundida com a outra. Senão, o devido processo legal e o Estado de direito serão violados. É importante definir que isso é uma questão administrativa. Seria necessário estruturar o Judiciário de tal forma que ele absorva as demandas. Ou fazer uma projeção para os próximos cinquenta anos, por exemplo, de quanto essa demanda pode aumentar ou não, para, com base nisso, você propiciar uma infraestrutura para absorver. Mas isso não existe.

ConJur — Por quê?
Antonio Carlos de Oliveira Freitas — O que acontece é que primeiro são promulgadas as leis para depois serem analisados os resultados. Os exemplos são diversos, não precisa ir muito longe. O processo eletrônico é uma ideia fantástica, mas não pode passar toda uma tradição contenciosa do meio físico para o eletrônico do dia para a noite. Não vai funcionar. A mesma coisa aconteceu na época das transações bancárias. Quando surgiu ointernet banking, a população toda se assustou, só que não foi algo top down, foi um negócio opcional, justamente para você ter uma infraestrutura inicial, ver como que isso vai conseguir acompanhar a demanda e ir estruturando, aumentando, investindo.

ConJur — E com o processo eletrônico não tem sido assim?
Antonio Freitas — O que foi feito foi deixar cada estado criar seu sistema. São mais de 45 sistemas diferentes que não se comunicam. No estado da Bahia, por exemplo, há três sistemas diferentes. As coisas precisam ser feitas com um pouco mais de parcimônia e planejamento, com todo mundo conversando, indo atrás de buscar infraestrutura. Não basta só a ideia boa, tem que ter um alicerce para que essa ideia boa realmente vingue e se torne produtiva para toda a sociedade.

ConJur — Em relação à Lei de Recuperação Judicial, quais são os principais fatores que mais prejudicam os credores, além da demora para a insolvência ser declarada e o período de carência concedido?
Antonio Carlos de Oliveira Freitas — Na lei existe um artigo que fala da suspensão das ações pelo prazo improrrogável de 180 dias. Depois desse prazo, as ações podem tomar o seu curso independente do estágio em que se encontre a recuperação judicial. Às vezes a complexidade e o tamanho da recuperação judicial impedem que a situação se coloque dentro desse prazo. Então, começou a ser solicitada a prorrogação dessa suspensão.

ConJur — E isso é ruim?
Antonio Freitas — No início, a jurisprudência era bastante radical e se entendia que não havia margem para dúvidas. Com o passar do tempo, essa questão começou a se tornar mais flexível. Isso até que é válido, mas para situações absolutamente pontuais. Mas a exceção passou a se tornar regra. Atualmente, você entra com uma petição simples pedindo prorrogação e o juiz concede. Outro ponto importante surgiu ao longo desses dez anos da Lei envolve cooperativas pedindo recuperação judicial. Várias conseguiram deferimento em primeira instância, então o tema é levado aos tribunais, que negam o pedido. No agronegócio, há casos de produtores rurais, pessoas físicas, pedindo recuperação judicial.

ConJur — Pode fazer isso?
Antonio Freitas — Pode, porque existe um artigo no Código Civil que permite essa situação, mas desde que o produtor rural se declare empresário registrado em junta comercial. O que acontece também é que várias empresas entram com pedido de recuperação judicial, conseguem o deferimento e, depois, solicitam a extensão dos efeitos da recuperação aos sócios e pessoas físicas dessa empresa. E tem sido deferido. Isso é muito ruim, porque você tem total insegurança jurídica.

ConJur — Há algum ponto positivo?
Antonio Freitas — Quando a recuperação judicial é solicitada, as pessoas ficam desesperadas, porque, quando vigorava a antiga lei, na época da concordata preventiva, solicitava-se a concordata ou pedia-se a falência e a pessoa já sabia que nunca receberia o valor devido e só acompanhava para "cumprir tabela". Era muito, muito, muito raro receber. Hoje, esse é um dos poucos pontos positivos. Há expectativa de realmente reaver o seu crédito. Mas você tem um grande trabalho. Os prazos são curtos, em especial no começo. Então, às vezes, você não consegue obter cópia, ou os autos não estão no cartório e fica um inferno. Também há lacunas estruturais.

ConJur — Quais?
Antonio Carlos de Oliveira Freitas — Há possibilidade de alterar a sede da empresa e colocá-la num local com infraestrutura mínima. Fazer isso em uma recuperação judicial de proporções violentas é instalar o caos. Outro problema é a questão da composição do quórum para a assembleia de credores.Temos um caso em que o cliente está com um crédito declarado como credor com garantia real de R$ 5 milhões e mais R$ 2 milhões com outra denominação. Essa divergência foi apresentada ao administrador judicial, mas o segundo edital foi publicado sem a correção do quadro. Tivemos que ir até o juiz para explicar a situação, dizer que houve um equívoco e que nós precisamos que isso seja julgado rapidamente, devido à proximidade da assembleia e à impossibilidade de se suspender os prazos da reunião com essa justificativa. Também é ruim deixar o juiz apenas como um mero homologador de plano. Toda essa sistemática de composição de quórum, de não suspensão da assembleia em razão de divergências ou de habilitações que possam impactar de forma violenta nesse contexto precisa ser alterada porque dá margem para que se caracterize um "calote institucionalizado".

ConJur — Quais seriam as condições ideais?
Antonio Carlos de Oliveira Freitas — Não podemos responsabilizar só uma das partes, todos têm que cumprir com suas responsabilidades. Existe uma previsão para formação do comitê de credores, mas isso deveria ser resolvido logo no início da ação e não deveria ser uma opção. Os credores é que devem chamar a responsabilidade da situação, em conjunto com o administrador judicial, e conduzir isso. Mas não precisa envolver todos os credores, porque pode inviabilizar. Deveria envolver os maiores credores de cada classe, compondo esse comitê para efetivar a recuperação judicial. A partir daí é que seria feita a análise de todo o fluxo, da viabilidade.

ConJur — Isso não afastaria os pequenos credores do processo?
Antonio Freitas — O princípio da preservação da empresa que o legislador buscou não é preservar a companhia a qualquer custo, mas sim de uma maneira viável. Seguindo esse raciocínio, a partir do momento que se verifica que essa empresa não é viável, tem que se decretar a quebra, mesmo com os inúmeros postos de trabalho que serão fechados. Tem que tirar essa empresa do mercado para dar chance de outras, saudáveis, tomarem esse espaço. Não podemos, em detrimento de uma empresa que não é viável, prejudicar outras companhias e os credores para tentar dar sobrevida a essa empresa que já está completamente destruída. Essas questões precisam ser alteradas, ou nós vamos continuar com apenas 6% de recuperação de empresas. É tão raro que vira até notícia, como no caso da Delta, quando deveria ser algo normal.

ConJur — Em relação à carência para pagamento das dívidas, o período de dois anos não seria perigoso para os credores?
Antonio Freitas — Eu acho, e por isso é que é necessário haver uma revisão. Se, logo no início, após a análise de todos os documentos fornecidos pela empresa que pediu a recuperação judicial for detectado que a companhia não tem condição de sobrevida, deve ser feito um relatório para informar o juiz para que ele decrete a quebra. Nesse caso, cada um também olha um pouco para o seu lado. O bom dessa análise é que desde o início todos já sabem o que enfrentarão. Por que postergar e deixar isso para daqui a dois, três, quatro, cinco anos para descobrir uma coisa que você poderia ter descoberto no início? O mesmo vale para a questão do encerramento. 

ConJur — Como assim?
Antonio Freitas — Há na lei o prazo de dois anos de processado — se cumpridas todas as etapas e demonstrado que o que foi estipulado começou a ser cumprido, o que foi homologado no plano de recuperação judicial — para pedir a extinção da recuperação judicial sem prejuízo de continuar. Isso é muito ruim, porque, às vezes, você tem recursos ainda pendentes, e o provimento desse recurso pode anular tudo porque vícios gravíssimos foram ocorrendo desde o início. Você está “salvando uma empresa”, mas passando por cima de algumas previsões que estão na lei. Isso mina a credibilidade de uma lei importante para o país e traz uma insegurança jurídica tremenda.

ConJur — Como o senhor vê a definição de prioridades no pagamento dos credores?
Antonio Freitas — Normalmente é feita uma planilha com todas as classes de credores, contabilizando quem são e quais os valores devidos. Com isso em mãos, a empresa em recuperação judicial define quais são os fundamentais, formaliza o acordo e o resto vai acabar engolindo o plano na forma que ele foi apresentado e vai ser homologado. Não tenho a menor sombra de dúvida da importância de haver um acordo, pois é uma forma de viabilizar a empresa — você vai precisar de mão de obra, de capital de giro, de insumos etc. —, mas você não pode acabar prejudicando outros credores para manter uma empresa que, talvez, não seja viável.

ConJur — Toda legislação precisa de ajustes. Há alguma lei em algum país que possa servir como molde para as alterações que a Lei de Recuperação Judicial possa sofrer um dia?
Antonio Freitas — Sou um pouco reticente a isso. Temos que analisar as nossas peculiaridades, não dá para compararmos o Brasil com a França, por exemplo. A questão é a adequação. Muitas vezes, esses mecanismos acabam sendo trazidos para cá e normatizados, mas sem modulação. Como é que eu vou fazer uma adequação para todos os ramos de atividade produtiva do país e para cada setor e para cada região? Por isso é que é necessária uma com normas mais abertas, passíveis de interpretação. 

ConJur — Mas essa interpretação não prejudicaria a celeridade do procedimento? O processo não se transformaria em um debate de teses?
Antonio Freitas — Essa é uma questão que se busca no novo Código de Processo Civil. Na teoria, buscar precedentes, consolidá-los e ter uma jurisprudência efetivamente vinculante é excelente. Houve uma tentativa com algumas alterações no Código ainda em vigor, mas surtiram efeito em situações pontuais. Nós não temos essa cultura no nosso país. Essa busca pelo fortalecimento dos precedentes é importante, mas é uma questão cultural, não vai ser do dia para a noite e, talvez, nem ocorra.

ConJur — Pode ser que a população não se adapte?
Antonio Freitas — Os operadores do direito criam obstáculos tremendos. Existe aquela concepção de “eu estudei tanto tempo para conseguir entrar na magistratura e agora sou obrigado a decidir dessa forma mesmo não concordando”. Por causa de situações como essas, é necessário um período de maturação, para que, aos poucos, as coisas sejam colocadas nos eixos. Tem que ser algo mais suave. Algo radical enfrenta muitos obstáculos. A mudança é importante, mas precisa tentar, ainda que se busque em outros ordenamentos jurídicos estrangeiros, fazer essa modulação.

ConJur — Por que o processo de falência é tão demorado e por que o empresário espera chegar até o último momento para pedir a recuperação judicial?
Antonio Freitas — Sobre a falência, volto a dizer que é uma questão cultural. Na lei antiga, qualquer empresário que acenasse com a possibilidade de pedir autofalência ou concordata, ou no caso de alguém entrar com pedido de falência contra ele, a credibilidade do empresário no mercado era aniquilada. Hoje não é mais tão forte assim, mais ainda existe essa pecha. Se sai uma notícia ou há um burburinho sobre um empresário entrar com pedido de recuperação judicial, os bancos não vão fornecer crédito e os fornecedores vão fechar as torneiras. Isso acaba potencializando a crise. Aí voltamos à questão cultural: o empresário fica com receio e vai forçando até o momento em que não há outra alternativa.

ConJur — É mais difícil fazer a recuperação judicial de uma empresa que trabalha com agronegócio?
Antonio Freitas — O problema ocorre não por ser uma empresa do agronegócio, mas porque os pedidos são feitos em regiões com infraestrutura precária. Esse sim é um empecilho à celeridade desse tipo de processo.

ConJur — O senhor chegou a comentar que as empresas sucroalcooleiras estão sempre baseadas em cidades do interior, sendo polos de emprego e de fomento para o desenvolvimento desses municípios. O governo não deveria elaborar uma política para recuperar esse setor mais rápido?
Antonio Freitas — Deveria ter uma política bem clara e linear, saindo dos planejamentos pontuais. Mas o melhor, não só para o setor sucroalcooleiro, mas para o agronegócio, é que haja uma política regulatória, principalmente em relação às questões envolvendo o mercado de capitais. O financiamento público é importante, mas não dá conta, então você precisa buscar o setor privado, as empresas de insumos e os mercados financeiro e de capitais. Mas para é preciso haver regulação. É preciso sair um pouco só do Plano Safra, porque é aquela política pontual. Na realidade, grande parte desse valor do Plano Safra é voltado para rolagem de dívida. Então, o “dinheiro novo” para formação de lavouras e propiciar as novas safras é muito menor do que o que é anunciado.

ConJur — Até o momento, o único auxílio concedido pelo governo em relação aos mercados financeiro e de capitais manter zerada a alíquota de PIS e Cofins sobre o hedge – ou fundo de proteção. Não?
Antonio Freitas — Sim, mas, em contrapartida, o agronegócio vive uma situação terrível desde 2010, o que acaba inviabilizando uma série de investimentos. Isso vem da imposição de obstáculos para aquisição de terra brasileiras por estrangeiros. Esse ponto é politizado, ideológico. Existem poucos produtores estrangeiros no país, os investimentos vêm mais de empresas que financiam produtores. Mas, por exemplo, uma multinacional fornece insumos para um produtor brasileiro viabilizar sua lavoura e ele não consegue pagar a conta. A melhor maneira de resolver a situação é recebendo terra. Mas não é isso que a empresa quer, pois foge de seu ramo. Mesmo assim, ela precisa daquilo para receber o que investiu. Porém, o espaço não será usado para produzir, será posto à venda. Esse tipo de situação bloqueia uma série de negócios.

ConJur — Mas não há uma lei sobre o assunto?
Antonio Freitas — A lei que modifica essa regra voltou a tramitar no Congresso. Há também uma discussão no Supremo Tribunal Federal. Nos últimos tempos, questões pontuais melhoraram, mas havia chegado ao absurdo de ser proibido constituir hipoteca. Agora tem uma discussão em relação à alienação fiduciária. Apesar disso tudo, as empresas não vão correr risco, elas buscam segurança jurídica. Enquanto não houver evolução, bilhões de dólares continuarão sem ser investidos no país.

ConJur — A permissão de aquisição de terras por estrangeiros será concedida?
Antonio Freitas — Nessa questão, devemos levar em consideração pareceres de técnicos e de pessoas que lidam com a área. Não adianta darmos ouvidos só à emoção popular ou a uma ou outra organização político-partidária. Temos que ser apartidários. Isso tem que ser em benefício do país, que é é livre e que tem de ter livre concorrência para deixar o mercado se regular, se adequar. Pois o argumento vigente é que não existe proibição de terra para o estrangeiro, mas um procedimento que deve ser seguido. Se alguém descobrir qual é esse procedimento vai ficar milionário, porque nem o pessoal do Incra sabe.

ConJur — É uma proibição velada?
Antonio Carlos de Oliveira Freitas — É, e tem até uma parte que você precisa pedir autorização ao Congresso Nacional. Então é uma limitação/proibição. Durante uma conversa com alguns empresários, perguntei sobre como eles estão fazendo para investir no Brasil. Eles responderam: “Voltamos a investir nos Estados Unidos, porque aqui não investimos mais”. Mesmo assim, o que esses empresários investiram aqui tem trazido uma série de problemas. Estão há dez anos discutindo uma autuação do Ministério Público numa ação civil pública.


Brenno Grillo é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 20 de setembro de 2015, 8h00

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