DIREITOS COLETIVOS LATO SENSU: A DEFINIÇÃO CONCEITUAL DOS 
DIREITOS DIFUSOS, DOS DIREITOS COLETIVOS STRICTO SENSU E DOS DIREITOS 
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. 
Sumário: Introdução: atualidade e importância do tema; 1 - 
Direitos difusos, coletivos (stricto sensu) e individuais homogêneos: o advento 
do Código de Defesa do Consumidor brasileiro e sua conceituação; 2 - Direitos ou 
“interesses”; 3 - Critérios para caracterização dos direitos coletivos lato 
sensu; Conclusões.  
Hermes Zaneti Junior
Mestre e doutorando em Processo Civil pela Universidade 
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor da graduação e pós-graduação na 
UFRGS, ULBRA e  na  FESMP/RS. Coordenador Executivo do curso de 
Especialização Processo e Constituição da UFRGS. Advogado.
Introdução
A escolha do tema mostra-se oportuna, pois o momento atual do 
direito revela a necessidade de efetiva proteção de posições jurídicas que fogem 
a antiga fórmula individual credor/devedor.
O Anteprojeto de Código Processual Civil Coletivo Modelo para 
Ibero América , que nos cabe comentar, é a prova desta preocupação e esperança 
de progresso nas legislações nacionais. 
Destacamos do Código Modelo o seu  artigo 1° para o nosso comentário, o que 
porém não nos limitará a análise, vez que também em outros momentos este rico 
projeto traz tópicos de relevância para o nosso objetivo: lançar luzes e 
questionamentos sobre o conceito de direitos e/ou interesses coletivos.
Em verdade procuraremos abordar o tema explicitando o que se 
entende hoje no Brasil por direitos coletivos lato sensu, subdividindo este em 
direitos difusos, direitos coletivos stricto sensu e direitos individuais 
homogêneos.
Esta, aliás, é a subdivisão feita pelo artigo em comento, que 
traz nos seus incisos: I - interesses ou direitos difusos; II - interesses ou 
direitos coletivos; III - interesses ou direitos individuais homogêneos.    
Obrigatório advertir que a Lei 8.078/90, o Código Brasileiro 
de Defesa do Consumidor (CDC), em seu artigo 81, parágrafo único, regulamenta a 
matéria exatamente da mesma maneira que o Código Modelo.
Metodologia de abordagem. O trabalho será desenvolvido na 
perspectiva da legislação brasileira (CDC) em comparação com o Código Modelo 
(CM). No primeiro tópico abordaremos os conceitos, no segundo faremos uma breve 
crítica à equívoca denominação “interesses”, que no nosso entender pode prestar 
desserviço à tutela coletiva; por último, trataremos da caracterização destes 
direitos na prática, ou seja, como identificar se no caso concreto se tutela um 
direito difuso, coletivo stricto sensu ou individual homogêneo. Ao final 
traremos as conclusões  principais para 
facilitar ao leitor o acesso ao nosso entendimento.            
1.       Direitos Difusos, Coletivos (Strictu Sensu) e 
Individuais Homogêneos: O Advento do Código do Consumidor Brasileiro e sua 
Conceituação
Quando a doutrina passou a enfrentar o problema das ações 
coletivas, viu-se inicialmente com sérias dificuldades para definir conceitos 
para os novos direitos que lhe estariam na base, o que levou alguns juristas a 
afirmar que estes se tratavam de “personagens misteriosos” 3. Apesar de certa 
homogeneidade obtida com relação aos direitos difusos e coletivos, vistos sob o 
aspecto subjetivo como direitos transindividuais e, no aspecto objetivo como 
indivisíveis, sua conceituação sempre foi objeto de dúvida.  Porém, com o advento do CDC, esta 
problemática restou resolvida no direito brasileiro. O Código estabeleceu, no 
art. 81, § único, as categorias em que se exerce a defesa dos direitos coletivos 
lato sensu. São elas: os direitos difusos, os direitos coletivos (stricto sensu) 
e os direitos individuais homogêneos. A mesma solução foi adotada pelo Código 
Modelo (CM).
Assim, tem-se por direitos difusos (art. 81, § único, I, do 
CDC e art. 1°, I, do CM) aqueles transindividuais (metaindividuais, 
supraindividuais, pertencentes a vários indivíduos), de natureza indivisível (só 
podem ser considerados como um todo), e cujos titulares sejam pessoas 
indeterminadas (ou seja, indeterminabilidade dos sujeitos, não há individuação) 
ligadas por circunstâncias de fato, não existe um vínculo comum de natureza 
jurídica, v.g., a publicidade enganosa ou abusiva, veiculada através de imprensa 
falada, escrita ou televisionada, a afetar uma multidão incalculável de pessoas, 
sem que entre elas exista uma relação jurídica-base.
Já os direitos coletivos stricto sensu (art. 81, § único, II 
do CDC, e art. 1°, II do CM) foram classificados como direitos transindividuais, 
de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de 
pessoas (indeterminadas, mas determináveis, frise-se, enquanto grupo, categoria 
ou classe) ligadas entre si, ou com a parte contrária, por uma relação jurídica 
base. Nesse particular cabe salientar que essa relação jurídica base pode se dar 
entre os membros do grupo “affectio societatis” ou pela sua ligação com a “parte 
contrária”. No primeiro caso temos os advogados inscritos na Ordem dos Advogados 
do Brasil (ou qualquer associação de profissionais); no segundo, os 
contribuintes de determinado imposto.
Cabe ressalvar que a relação-base necessita ser anterior à 
lesão (caráter de anterioridade). No caso da publicidade enganosa, a “ligação” 
com a parte contrária também ocorre, só que em razão da lesão e não de vínculo 
precedente, o que a configura como direito difuso e não coletivo stricto sensu 
(propriamente dito).
O elemento diferenciador entre o direito difuso e o direito 
coletivo é, portanto, a determinabilidade e a decorrente coesão como grupo, 
categoria ou classe anterior à lesão, fenômeno que se verifica nos direitos 
coletivos stricto sensu e não ocorre nos direitos difusos. 
Portanto, para fins de tutela jurisdicional, o que importa é 
a possibilidade de identificar um grupo, categoria ou classe, vez que a tutela 
revela-se indivisível, e a ação coletiva não está disponível aos indivíduos que 
serão beneficiados. 
 O legislador foi além 
da definição de direitos difusos e coletivos stricto sensu e criou uma nova 
categoria de direitos coletivos (coletivamente tratados) a qual denominou 
direitos individuais homogêneos (art. 81, § ún., III, do CDC, e art. 1°, III,do 
CM). A gênese dessa proteção/garantia coletiva tem origem nas class actions for 
damages norte-americanas. 
A importância desta categoria é cristalina. Sem sua criação 
pelo direito positivo nacional não existiria possibilidade de tutela “coletiva” 
de direitos com natural dimensão coletiva, decorrentes da 
massificação/padronização das relações jurídicas e das lesões daí decorrentes. 
Assim, “Tal categoria de direitos representa uma ficção criada pelo direito 
positivo brasileiro com a finalidade única e exclusiva de possibilitar a 
proteção coletiva (molecular) de direitos individuais com dimensão coletiva (em 
massa). Sem essa expressa previsão legal, a possibilidade de defesa coletiva de 
direitos individuais estaria vedada”. 
O CDC conceitua os direitos individuais homogêneos como 
aqueles decorrentes de origem comum, ou seja, os direitos nascidos em 
conseqüência da própria lesão ou ameaça de lesão, em que a relação jurídica 
entre as partes é post factum (fato lesivo).
Para evitar equívocos na interpretação transcreve-se a 
precisa lição de Watanabe: “Origem comum’ não significa, necessariamente, uma 
unidade factual e temporal. As vítimas de uma publicidade enganosa veiculada por 
vários órgãos de imprensa e em repetidos dias ou de um produto nocivo à saúde 
adquirido por vários consumidores em um largo espaço de tempo e em várias 
regiões têm, como causa de seus danos, fatos com homogeneidade tal que os tornam 
a ‘origem comum’ de todos eles.”, ou seja, o que têm em comum é a procedência, e 
a gênese na conduta comissiva ou omissiva da parte contrária.
O fato de ser possível determinar individualmente os lesados, 
não altera a possibilidade e pertinência da ação coletiva. Permanece o traço 
distintivo: o tratamento molecular das ações coletivas em relação à fragmentação 
da tutela (tratamento atomizado), nas ações individuais. É evidente a vantagem 
do tratamento uno da pretensão em conjunto para obtenção de um provimento 
genérico. Como bem anotou Antonio Gidi as ações coletivas garantem três 
objetivos: proporcionar economia processual, acesso à justiça e a aplicação 
voluntária e autoritativa do direito material.  
Não por outra razão se determinou em ambos os códigos em 
comento (no CDC, art. 103, III, e no CM, art. 26, III) que a sentença terá 
eficácia erga omnes. Os titulares dos direitos individuais serão “abstrata e 
genericamente beneficiados”.  
Nessa perspectiva, o pedido nas ações coletivas será sempre 
uma “tese jurídica geral” que beneficie, sem distinção, aos substituídos.  As peculiaridades dos direitos individuais, 
se existirem, deverão ser atendidas em liquidação de sentença a ser procedida 
individualmente.
Como corolário desse entendimento — e ainda da lição de que 
os direitos coletivos lato sensu têm dupla função material e processual e foram 
positivados em razão da necessidade de sua tutela jurisdicional — para fins de 
tutela os direitos individuais homogêneos são indivisíveis e indisponíveis até o 
momento de sua liquidação e execução.
Como exemplo da abstração e generalidade dos direitos 
individuais homogêneos pode-se referir a ação coletiva de responsabilidade civil 
pelos danos individualmente causados. Nessa ação somente ocorrerá a determinação 
dos indivíduos lesados quando ingressarem como assistentes (art. 94, do CDC, e 
art. 19, do CM)  ou no momento em que 
exercitarem o seu direito individual de indenização, em decorrência da 
habilitação para a liquidação da sentença (art. 97, do CDC, e art. 22, do CM). A 
condenação também poderá ser executada (abrangendo as indenizações já fixadas em 
sentença de liquidação) pelos legitimados processuais sem prejuízo do 
ajuizamento de outras execuções individualmente movidas (art. 98, do CDC, e art. 
23, do CM). 
A idéia de unicidade no tratamento dos direitos individuais 
homogêneos é clara no CDC e no CM. A lei brasileira (art. 100) e o CM (art. 25) 
determinam expressamente que no caso de passado um ano sem a habilitação de 
interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os entes 
legitimados propor a liquidação e execução da indenização devida. Nesse caso, 
reverte-se o produto para um fundo governamental (no Brasil criado pela Lei 
7.347/85 - Lei da Ação Civil Pública - no art. 13, denominado Fundo de Direitos 
Difusos; e no CM inserto no art. 6°)16. Ao legislador interessa a compensação 
integral do prejuízo; concede-se assim primazia ao interesse público na 
regulação da conduta ilícita.
Como particularidade inovadora, o Código Modelo exige em seu 
art. 1°, § 1°, para a tutela dos direitos individuais homogêneos, a necessidade 
de se reconhecer “também a necessária aferição da predominância de questões 
comuns sobre as individuais e da utilidade da tutela coletiva no caso concreto.” 
Este detalhamento corresponde à adequação da ação coletiva à tutela de direitos 
individuais homogêneos. No dizer de Ada Pellegrini Grinover (também autora do 
Anteprojeto), revela-se imprescindível a demonstração da prevalência das 
questões comuns (sobre as individuais) e da superioridade da tutela coletiva “em 
termos de justiça e eficácia da sentença”.17  
Por último, cabe mencionar o entendimento de parte da 
doutrina de que os direitos individuais homogêneos não seriam direitos 
coletivos, mas sim direitos coletivamente tratados (sic.).18
Esta visão mostra-se excessivamente restritiva e afastaria 
tal categoria do rol expressamente criado pelo CDC, referendado agora pelo 
Código Modelo, relegando-a a personagem de segunda categoria na proteção 
coletiva. Em sentido contrário, contudo, posicionou-se o pleno do Supremo 
Tribunal Federal brasileiro, em julgamento unânime, no RE 163231-SP, pela 
admissão destes direitos como subespécie de direitos coletivos. Transcrevemos 
trecho da ementa: “4. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma 
origem comum (art. 81, III,da Lei 8.078, de 11.09.1990), constituindo-se em 
subespécie de direitos coletivos”19. Esta leitura jurisprudencial pelo principal 
tribunal brasileiro, somada ao que antes foi exposto, parece afastar a 
inadequada “capitis diminutio” daqueles direitos coletivos.
As categorias de direito antes mencionadas (difusos, 
coletivos stricto sensu e individuais homogêneos) foram conceituadas com vistas 
a possibilitar a efetividade da prestação jurisdicional; são, portanto, 
conceitos interativos de direito material e processual, voltados para a 
instrumentalidade, para a adequação da teoria geral do direito à realidade 
hodierna e, dessa forma, para a sua proteção pelo Poder Judiciário20. Assim, sua 
conceituação tem caráter explicitamente ampliativo da tutela dos direitos. 
2.      Direitos ou 
“Interesses”
Na legislação brasileira revela-se comum a denominação 
conjunta “direitos e interesses” referindo-se a direitos difusos e direitos 
coletivos (art. 129, inc. III da    
CF/88, 23 CDC, LACP, 21 etc.). O Código Modelo seguiu a mesma orientação 
(art. 1°).
Contudo, em nosso entender, o termo “interesses” é expressão 
equívoca22, seja porque não existe diferença prática entre direitos e 
interesses, seja porque os direitos difusos e coletivos foram 
constitucionalmente garantidos (v.g., Título II, Capítulo I, da CF/88). Ao que 
parece, deu-se mera transposição da doutrina italiana, um italianismo decorrente 
da expressão “interessi legitimi” e que granjeou espaço na doutrina nacional e, 
infelizmente, gerou tal fenômeno não desejado.
Cabe, por dever de precisão, afastar a erronia. Vale lembrar, 
não se trata de defesa de interesses e, sim, de direitos, muitas vezes, 
previstos no próprio texto constitucional.
Exemplo de conseqüência não pretendida pelo legislador está 
na limitação imposta por parte da doutrina ao “mandado de segurança coletivo”.24 
Os primeiros textos sobre o mandado de segurança coletivo traziam uma 
advertência séria a respeito da impossibilidade de serem tutelados pelo writ 
“meros interesses”. Nesse sentido manifestavam-se, por exemplo, as vozes 
autorizadas de José Cretella Junior25 e Celso Neves, como demonstra a crítica 
abaixo.
Afirmando que “interesses” não são tuteláveis por mandado de 
segurança coloca Celso Neves a noção clássica de direito subjetivo como poder da 
vontade vinculado a um interesse pessoal ou individual ao qual o Estado, 
mediante o ordenamento jurídico, confere coercibilidade como forma de atuação. 
Afirma, ainda, que “interesses simples” ou até mesmo “interesses juridicamente 
protegidos” não podem ser tutelados pelo mandado de segurança ou qualquer outra 
ação porque justamente estão desprovidos da coercibilidade, não têm os seus 
titulares o “poder de vontade para a prevalência de seu interesse” que 
configuraria direito subjetivo.26 
Podemos opor as seguintes considerações críticas: 1) não se 
trata de tutela de interesses e sim de direitos subjetivos coletivos; 2) Os 
titulares desses direitos subjetivos são aqueles indicados no art. 81, § único 
do CDC e no art. 1°do CM,27 sendo sua legitimação ad causam, nas ações coletivas 
brasileiras, atribuída às entidades expressamente elencadas na legislação.
Baseado na perspectiva de direito processual “moderno” 
conclui Celso Neves: “A autonomia do direito de ação não se compadece com tal 
extremo, porque ineliminável o binômio direito-processo, mormente num momento em 
que a instrumentalidade essencial da relação processual volta a ser proclamada, 
com redobrado vigor, pelos doutrinadores contemporâneos.”28 Aqui, também, devem 
ser feitas certas considerações. A instrumentalidade consiste, justamente, em 
fornecer um instrumento hábil e eficaz para a defesa dos direitos. O processo é 
instrumento (meio) de realização do direito. A autonomia do direito de ação, 
nesse sentido, é primordial para que sob a égide de “preconceitos” de direito 
material, ou interpretações “fixas” não se evite a apreciação pelo Poder 
Judiciário da lesão ou ameaça ao direito afirmado pelo autor. Assim, ocorre um 
abrandamento do “ineliminável” binômio substância-processo, sempre orientado 
pelo fim: o processo existe para a ordem jurídica justa.
No sentido do até agora exposto, contra a concepção estreita 
e excludente de “interesses”, e voltados para a correção da erronia legislativa 
esforçaram-se os juristas brasileiros. Calmon de Passos, por exemplo, chama 
atenção para o “conteúdo de direitos, inclusive em sua dimensão subjetiva” com 
que se revestem os “interesses” coletivos, como também, para a inaplicabilidade 
do conceito de “interesses legítimos” na atual realidade democrática. Assim, 
“Trazer-se para o direito brasileiro categorias já sem funcionalidade como a dos 
interesses legítimos, para colocá-los ao lado dos direitos subjetivos, ou 
pretender excluir os interesses transindividuais da categoria dos direitos 
subjetivos é insistir numa visão do direito, do Estado, da organização política 
e da sociedade já ultrapassada.”29
Carlos Alberto Alvaro de Oliveira assevera que o legislador 
teria agido com melhor técnica no art. 6º, ao mencionar apenas “direitos básicos 
do consumidor” ao invés de “interesses e direitos” como fez no Tít. III.30 A 
lição revela-se ainda mais vantajosa por esclarecer, adiante, que a distinção 
entre o direito subjetivo e o interesse, na doutrina nacional, assenta, 
justamente, na coercibilidade posta à disposição da “vontade autônoma” do 
indivíduo frente a um interesse seu tutelado pela norma. Comentando a distinção 
entre interesse legítimo e direito subjetivo, na doutrina estrangeira, o mesmo 
autor salienta o seu caráter quantitativo e acidental segundo a “maior ou menor 
proeminência do interesse individual objeto da tutela normativa”, o que em outro 
ordenamento pode determinar a “atribuição da cognição a órgãos distintos”, mas 
não lhes altera a categoria de direitos submetidos a jurisdição e a sua 
imperatividade.31 Por óbvio, o que se salienta na lição acima, é que mesmo nos 
sistemas que distinguem os direitos subjetivos e os interesses legítimos, esses 
não ficam desprotegidos ou submersos em subcategorias intangíveis e, portanto, 
não tuteláveis.
Mas qual o escorço histórico necessário para se afastar a 
erronia apontada? O ordenamento jurídico brasileiro, respeita o princípio da 
unidade de jurisdição e da inafastabilidade da apreciação, pelo Judiciário, da 
lesão ou ameaça de lesão a direito (rectius: afirmação). Os direitos subjetivos, 
no Brasil, se subdividem em direitos subjetivos privados e direitos públicos 
subjetivos.32 Contudo, o mesmo não ocorre com o sistema italiano que prevê uma 
separação de órgãos jurisdicionais (dualidade de jurisdição). Assim, a doutrina 
italiana construiu dois conceitos distintos, um referente aos direitos 
subjetivos e outro, aos chamados interesses legítimos. Os primeiros são julgados 
pela justiça civil (relações entre particulares); os outros, perante órgãos da 
justiça administrativa (relações entre particulares e administração pública ou 
de interesse social relevante).
A nota essencial na distinção, para este estudo, é que 
enquanto o direito subjetivo se vincula diretamente ao indivíduo, protegendo seu 
interesse individual, os interesses legítimos se dirigem ao interesse geral e 
favorecem o indivíduo apenas como componente, como “membro do Estado.”33 Porém, 
diferenças à parte, tanto os direitos subjetivos como os interesses legítimos 
(na doutrina italiana) se tornam concretos como direitos à tutela 
jurisdicional;34 percebe-se que se trata, assim, de uma distinção histórica e 
peculiar ao sistema italiano, que não tem qualquer aplicação ao direito 
brasileiro, em que os conceitos de interesse legítimo e direito subjetivo se 
reduzem à categoria por nós conhecida como direitos subjetivos (que aqui podem 
ser públicos ou privados).
Tanto o direito subjetivo quanto o interesse legítimo são, 
portanto, direitos. A distinção da doutrina italiana pode fazer sentido na 
Itália, mas não se justifica no ordenamento brasileiro, que prevê a unidade da 
jurisdição. Ocorre que o legislador brasileiro foi fortemente influenciado pelo 
direito italiano, porque a doutrina brasileira é fortemente influenciada pela 
doutrina italiana, onde as categorias de direitos coletivos e direitos difusos 
encontram-se em território cinzento, a meio caminho entre o público e o privado, 
sendo constantemente referidas como “interessi diffusi” e “interessi collettivi” 
até mesmo pela sua aproximação, por vezes, do que se entende por “interessi 
legitimi”. Como visto, tal não pode prosperar em nosso sistema que não admite a 
categoria de interesses legítimos, e onde a categoria de “interesses” não tem a 
menor operacionalidade prática.
Como já havia advertido Dinamarco, verifica-se uma “sutil 
distinção entre os direitos subjetivos e interesses legítimos” que, em conjunto 
com a discricionariedade do poder administrativo, decorre da idéia fascista de 
liberdade política da administração (Poder Executivo), e que foi “usada como 
escudo” para evitar a censura jurisdicional35 em regimes totalitários (v.g., o 
de Mussolini).
Na esteira do exposto supra, Antonio Gidi considera mais 
correto e adequado o termo “direitos” e não “interesses” para o ordenamento 
jurídico brasileiro. Sua visão expõe a resistência à ampliação do conceito de 
direito subjetivo. Assim, esta lhe parece mais um “ranço individualista” 
decorrente de um “preconceito ainda que inconsciente em admitir a 
operacionalidade técnica do conceito de direito superindividual” e da 
dificuldade de enquadrar um direito com características de “indivisibilidade” 
quanto ao objeto e “impreciso” quanto à titularidade no direito subjetivo, 
entendido como “fenômeno de subjetivação” do direito positivo. Portanto, o 
legislador chamou “...‘interesse’ essa situação de vantagem.” E conclui: “...não 
utilizamos (e mesmo rejeitamos) a dúplice terminologia adotada pelo CDC. Este 
trabalho se referirá, indiscriminadamente, a ‘direito difuso’, ‘direito 
coletivo’ e ‘direito individual homogêneo”.36 Subjetivação, para o processo 
tradicional, significa individualização, daí a dificuldade. 
Uma última nota. Parte da doutrina insiste na necessidade de 
aceitar a denominação “interesses” porque esta configuraria uma maior amplitude 
de tutela também para situações não reconhecidas como direitos subjetivos (tendo 
em vista a própria “novidade” dos direitos coletivos lato sensu).37(sic.).
Esta preocupação é válida e coerente com os valores a serem 
tutelados (principalmente se pensarmos no direito ao meio ambiente e nos 
direitos do consumidor), contudo a melhor solução passa, não por admitir a 
categoria dos “interesses” tuteláveis pelo processo, mas sim pela ampliação do 
conceito de direito subjetivo, para abarcar as diversas “posições jurídicas 
judicializáveis” que decorrem do direito subjetivo prima facie (portanto, não 
expressas) e que merecem igualmente guarida pelo Judiciário.38
A superação do problema pela doutrina brasileira fica óbvia 
nas palavras de Watanabe: “Os termos ‘interesses’ e ‘direitos’ foram utilizados 
como sinônimos, certo é que, a partir do momento em que passam a ser amparados 
pelo direito, os ‘interesses’ assumem o mesmo status de ‘direitos’, 
desaparecendo qualquer razão prática, e mesmo teórica, para a busca de uma 
diferenciação ontológica entre eles.”39
3.      Critérios para 
Caracterização de Direitos de Natureza Coletiva
A natural proximidade entre os direitos de natureza coletiva 
pode levar a situações (não raras) em que uma mesma lesão, v.g., publicidade 
enganosa ou abusiva, mereça tutela por ação visando direito (afirmado) difuso, 
coletivo ou individual homogêneo.
 Nesse sentido já 
decidiu o Conselho Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo: “Em 
caso de propaganda enganosa, o dano não é somente daqueles que, induzidos a 
erro, adquiriram o produto, mas também difuso, porque abrange todos os que 
tiveram acesso à publicidade.”, presentes estariam elementos para propositura de 
uma ação civil pública em defesa de direitos difusos e de uma ação civil pública 
em defesa de direitos individuais homogêneos.40
Qual seria, então, o critério para distinção e classificação 
do direito na demanda? Antonio Gidi entendeu, de modo pioneiro, que o caminho 
mais adequado seria identificar “o direito subjetivo específico que foi violado” 
(rectius: afirmado). Para ele, a associação comum entre a lesão decorrente de 
publicidade e o direito difuso da comunidade não é necessária. De um mesmo fato 
lesivo podem nascer “pretensões difusas, coletivas, individuais homogêneas e, 
mesmo, individuais puras, ainda que nem todas sejam baseadas no mesmo ramo do 
direito material.”
Supondo a hipótese de uma publicidade enganosa, onde o 
anunciante pratica falsidade ideológica ao induzir o consumidor a confundir o 
seu produto com outro de uma marca famosa, afirma que “diversas pretensões podem 
surgir e diversas ações (civis e criminais; individuais e coletivas) podem ser 
propostas em função desse ato ilícito.” Para exemplificar aduz a ação criminal 
estatuída no art. 66 do CDC, as ações coletivas para defesa de direitos difusos 
da comunidade requerendo a retirada dos produtos, a contra-propaganda ou a 
indenização devida pelo dano já causado (a reverter para o fundo de recomposição 
criado pela LACP). Havendo lesão a direitos individuais de consumidores que já 
adquiriram o produto influenciados pela publicidade ilícita, seria igualmente 
cabível ação para recompor esses prejuízos movida molecularmente, por um dos 
legitimados do art. 82 do CDC, visando a condenação genérica, art. 95 do CDC. E, 
ainda, não se pode esquecer da ação individual da empresa concorrente 
lesada.41
Concluindo, Antonio Gidi, reafirma que o “critério 
científico” na identificação do direito coletivo lato sensu “não é a matéria, o 
tema, o assunto abstratamente considerados, mas o direito subjetivo específico 
que foi violado” (rectius: que se afirma violado); e continua: “Nesse ponto 
dissentimos ligeiramente da tese de Nelson Nery Júnior quando conclui ser o tipo 
de tutela jurisdicional que se pretende obter em juízo o critério a ser 
adotado.”42 Atribui, assim, extrema relevância ao direito material, na sua 
fundamentação, “Primeiro, porque o direito subjetivo material tem a sua 
existência dogmática e é possível, e por tudo recomendável, analisá-lo e 
classificá-lo independentemente do direito processual. Segundo, porque casos 
haverá em que o tipo de tutela jurisdicional pretendida não caracteriza o 
direito material em tutela. Na hipótese acima construída, por exemplo, a 
retirada da publicidade do ar e a imposição de contrapropaganda podem ser 
obtidas tanto através de uma ação coletiva em defesa de direitos difusos como 
através de uma ação individual proposta pela empresa concorrente, muito embora 
propostas uma e outra com fundamentos jurídicos de direito material diversos.”43 
Para Nery Junior, de outra banda, revela-se freqüente o “erro 
de metodologia” da doutrina e jurisprudência na classificação do tipo de direito 
coletivo: “Vê-se, por exemplo, a afirmação de que o direito ao meio ambiente é 
difuso, o do consumidor seria coletivo e que o de indenização por prejuízos 
particulares sofridos seria individual.”. Adiante complementa, “A afirmação não 
está correta nem errada. Apenas há engano na utilização do método para a 
definição qualificadora do direito ou interesse posto em jogo.” Nery Junior, 
entende ser preponderante “o tipo de pretensão material e de tutela 
jurisdicional que se pretende”.44 Assim, para o autor, “Da ocorrência de um 
mesmo fato, podem originar-se pretensões difusas, coletivas e 
individuais.”45
O jurista traz o exemplo de um acidente ocorrido no Brasil 
com um navio turístico, o Bateau Mouche IV. Este acidente possibilitaria várias 
ações distintas: “ação de indenização individual por uma das vítimas do evento 
pelos prejuízos que sofreu (direito individual), ação de obrigação de fazer 
movida por associação das empresas de turismo que têm interesse na manutenção da 
boa imagem desse setor da economia (direito coletivo), bem como ação ajuizada 
pelo Ministério Público, em favor da vida e segurança das pessoas, para que seja 
interditada a embarcação a fim de se evitarem novos acidentes (direito difuso).” 
Concluindo, “Em suma, o tipo de pretensão é que classifica um direito ou 
interesse como difuso, coletivo ou individual.”46
Ora, o CDC e o CM conceituam os direitos coletivos lato sensu 
dentro da perspectiva processual, com o objetivo de possibilitar a sua 
instrumentalização e efetiva realização.
Do ponto de vista do processo, a postura mais correta, a 
nosso juízo, é a que permite a fusão entre o direito subjetivo (afirmado) e a 
tutela requerida como forma de identificar, na “ação”, de qual direito se trata 
e, assim,  prover adequadamente a 
jurisdição. Não por outro motivo reafirmamos a característica híbrida ou 
interativa de direito material e direito processual intrínseca aos direitos 
coletivos, um direito “a meio caminho”. Nesse particular, revela-se de 
preponderante importância a correta individuação, pelo advogado, do pedido 
imediato (tipo de tutela) e da causa de pedir, incluindo os fatos e o direito 
coletivo aplicável na ação. Portanto, propõe-se a fusão entre o pensamento de 
Antonio Gidi e Nery Junior, que em verdade se completam e complementam 
reciprocamente.
Por exemplo, em determinada ação onde se afirma a lesão 
cometida por veiculação de publicidade enganosa o autor da ação deverá descrever 
os fatos que justificam a demanda e embasam sua pretensão afirmando que a 
publicidade foi ao ar nos dias x e y, através da mídia televisiva, atingindo um 
universo de pessoas circunscritos em determinada região. Deverá afirmar, ainda, 
que existe uma extensão possível de várias pessoas atingidas pela publicidade 
que adquiriram o produto em erro e que foram lesados em seus direitos 
individuais, e que estes direitos, pela característica de origem comum, se 
configuram como individuais homogêneos. Requererá, assim e ao final, “a 
condenação genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados” 
(art. 95, do CDC, e art. 20 do CM). 
No exemplo acima temos, 1) fatos (causa de pedir mediata ou 
remota), que originam lesão de direitos individuais; 2) um direito afirmado 
(causa de pedir imediata ou próxima), que pode ser configurado (em tese) como 
direito individual homogêneo por ter origem comum e se estender a vários 
titulares de direitos individuais hipotéticamente lesados; e, 3) um pedido 
imediato de condenação genérica, de acordo com o direito afirmado. Assim, 
trata-se claramente de uma ação para tutela dos direitos individuais 
homogêneos.
Conclusões
A importância da conceituação dos direitos coletivos lato 
sensu relaciona-se de forma direta com a efetividade que se pretende dar à sua 
proteção. Esclarecido o conceito, facilita-se o trabalho dos operadores do 
direito e diminui aquela equívoca fenda existente entre o direito material e o 
direito processual, tudo com vistas a que o Direito se realizecom Justiça. 
Como o art. 21 da Lei da Ação Civil Pública (com a redação 
dada pelo art. 117 do CDC) e o art. 90 do CDC estabelecem, estas idéias poderão 
ser aplicadas no ordenamento brasileiro em todas as ações coletivas. Portanto, 
não há que se falar, dogmaticamente, em distinção: todas as ações coletivas 
estão sujeitas ao mesmo conceito de direito coletivos lato sensu. Roga-se que 
esta saudável dogmática se aplique no Brasil e nos países que adotarem o CM como 
modelo de seu ordenamento interno em ações coletivas.     
Repetindo as idéias já expostas ao longo do texto, mas 
dando-lhes congruência e síntese, seguem as principais conclusões:
1 - O Código Modelo segue a mesma conceituação utilizada pelo 
Código de Defesa do Consumidor Brasileiro.
2 - São direitos coletivos lato sensu os direitos difusos, os 
direitos coletivos stricto sensu e os direitos individuais homogêneos.
3 - Os direitos difusos caracterizam-se pela 
transindividualidade, indivisibilidade, indisponibilidade, indeterminabilidade 
dos titulares e ligação por circunstâncias de fato anteriores à lesão.
4 - Os direitos coletivos stricto sensu se distinguem dos 
direitos difusos pela determinabilidade de seus titulares, que são os grupos, 
categorias ou classes de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por 
uma relação jurídica-base (que preexiste ao fato ilícito).
5 - Os direitos individuais homogêneos são vagamente 
definidos pelo projeto de Código Modelo, seguindo a diretriz já traçada pela 
legislação brasileira. O que define estes direitos é a origem comum ligada à 
circunstância danosa ou potencialmente danosa aos direitos individuais que 
apresentam características de homogeneidade. 
6 - São características dos direitos individuais homogêneos a 
sua coletivização, a sua indisponibilidade, a sua indivisibilidade, a 
titularidade é aferida através da afirmação de lesão a direitos individuais 
abstrata e genericamente considerados, conseqüentemente não há individuação dos 
titulares no processo.
7 - Sendo direitos novos, a categoria dos direitos subjetivos 
coletivos lato sensu implica em atribuir ao seu tratamento as seguintes 
características comuns: transindividualidade, indivisibilidade, 
indisponibilidade, titularidade e legitimidade em lei. Isso porque se tratam de 
direitos criados para garantir a sua efetividade através do processo, sua 
justicialidade.
8 - Os direitos coletivos lato sensu são direitos, não 
devendo ser adotada a denominação “interesses”. A erronia decorre de uma 
transposição de conceitos e categorias estranhas aos ordenamentos/sistemas 
jurídicos latino-americanos e causam desnecessária confusão.
9 - É mais efetivo e acertado dogmaticamente adotar os 
desdobramentos do direito subjetivo coletivo prima facie (v.g., direito 
ambiental e direito do consumidor) em posições jurídicas judicializáveis, do que 
pretender a tutela de “interesses” ainda não positivados nos ordenamentos 
jurídicos nacionais.
10 - Do mesmo fato podem surgir pretensões para tutela de 
direitos difusos, direitos coletivos stricto sensu e direitos individuais 
homogêneos. São incorretas as afirmações de que o direito ao meio-ambiente seria 
difuso e os direitos dos consumidores seriam coletivos stricto sensu.  
11 - A caracterização do direito tutelado se dará pela fusão 
entre o direito subjetivo coletivo afirmado e a tutela processual requerida 
(tipo de pretensão material  e de tutela 
jurisdicional que se pretende).
12 - Cabe aos operadores do direito, nesse particular, 
identificar bem a causa de pedir e o pedido na ação coletiva. Vale advertir o 
papel importante que a titularidade afirmada assume como elemento característico 
do direito coletivo lato sensu indicado. Assim, se os beneficiários forem 
pessoas indeterminadas (quer pela impossibilidade de determinação, quer ainda 
pela ausência de interesse nesta determinação) teremos um direito difuso; se for 
individualizado um grupo, categoria ou classe de pessoas com vínculos entre si 
ou com a parte contrária que se lhes seja atribuível como relação jurídica-base 
e tutelados nesta relação base como um todo, teremos um direito coletivo stricto 
sensu, por fim, a afirmação de titularidade abstrata e genérica de direitos 
individuais com características específicas que lhes atribuam prevalência de 
questões comuns e superioridade no tratamento coletivo demonstrará a existência 
de um direito individual homogêneo afirmado.
Portanto, de lege ferenda, sugerimos a supressão no 
anteprojeto de Código Modelo do termo “interesses” e pela indicação, no caput do 
art. 1o. do CM, de que os direitos que serão qualificados nos incisos são 
direitos coletivos lato sensu, portanto com características comuns. Seria de 
todo conveniente, ainda, a inclusão de uma justificativa, a título de “exposição 
de motivos”, onde questões referentes ao critério para caracterização dos 
direitos coletivos lato sensu e sua evidente criação para fins de tutela 
judicial (principalmente de situações antes desconhecidas pelo Judiciário) seja 
aclarada, permitindo o correto entendimento do “sistema de proteção” coletivo 
que se propõe.   
Esperamos de alguma forma, mesmo que modestamente, ter 
contribuído, com nossas dúvidas e questionamentos, ao belo trabalho que 
representa este Anteprojeto de Código Modelo.     
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