Por Sérgio Rodas
A Ordem dos Advogados do Brasil pedirá nesta sexta-feira (4/3) que o Supremo Tribunal Federal dê acesso ao suposto acordo de delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), noticiado pela revista IstoÉ. O presidente do Conselho Federal da entidade, Cláudio Lamachia, disse, que se forem confirmadas as acusações de que a presidente Dilma Rousseff tentou interferir no andamento da operação “lava jato”, os advogados poderão protocolar um novo pedido de impeachment dela na Câmara dos Deputados. Em nota, o senador disse não reconhecer a autenticidade do documento mostrado pela revista.
“Nós entendemos que os fatos que estão sendo noticiados dessa delação premiada, se confirmados, são gravíssimos, e que a sociedade brasileira precisa efetivamente saber o que está acontecendo. Pelo dever de informação, e por um princípio constitucional, nós temos agora a necessidade de informarmos à sociedade tudo que está acontecendo. (...) Se confirmados esses fatos, nossa instituição não faltará ao Brasil e tomará as medidas necessárias — até mesmo um pedido de abertura de um impeachment”, disse Lamachia a jornalistas nesta quinta (3/3), em São Paulo.
No entanto, ele deixou claro que tal medida só será tomada após “um exame aprofundado, técnico, crítico e jurídico da instituição”, e depois de ser aprovado pelo Pleno do Conselho Federal e pelo Colégio de Presidentes das seccionais da OAB.
Para Lamachia, a importância da Ordem confere peso ao caso e justificaria a liberação do acesso à suposta delação de Delcídio mesmo antes de ela ter sido homologada — em outras ocasiões na “lava jato”, a corte negou a liberação de documentos sigilosos.
“Não estamos falando de um terceiro — estamos falando de uma instituição que é a voz do cidadão brasileiro. A OAB tem um compromisso com a advocacia, mas também tem um compromisso com a cidadania. (...) Neste momento, se esses fatos forem confirmados, nós saímos do campo penal e entramos em outro campo, que é o campo moral, o campo ético, e é o campo de defesa da própria cidadania. Se isso que está posto nessa delação premiada for verdadeiro, nós estamos diante de uma verdadeira agressão ao Estado Democrático de Direito e às instituições brasileiras”, destacou.
“Estamos diante de situações que transbordam do âmbito do processo penal, e estamos diante de denúncias que ferem exatamente o princípio constitucional do devido processo legal. Ou seja, de forma inversa, se esses fatos se confirmarem, nós estamos diante de um trabalho feito para ferir o devido processo legal”, avaliou. Cláudio Lamachia e Marcos da Costa durante coletiva em São Paulo nesta quinta-feira.
José Luis da Conceição/OAB-SP
Cláudio Lamachia ainda classificou como “deboche” a volta de Delcídio ao Senado e a permanência do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na presidência da Câmara — nesta quinta, o STF aceitou a primeira denúncia contra ele por corrupção e lavagem de dinheiro. Ele ainda ressaltou que a entidade investigará denúncias de envolvimento do ex-ministro da Justiça e atual advogado-geral da União nas tentativas de interferir na “lava jato”.
A Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013) estabelece que os benefícios da delação premiada só serão concedidos se as informações fornecidas ajudarem a desvendar crimes e identificar autores. Assim, os depoimentos, isoladamente, não têm valor de prova.
Precedente favorável
No mesmo evento, o presidente da OAB de São Paulo, Marcos da Costa, manifestou confiança de que pedido de acesso à delação premiada de Delcídio do Amaral seja aceito pelo STF.
“Já tivemos uma hipótese como essa um ano e meio atrás, quando o Conselho Federal da OAB pediu ao STF para que a corte deixasse todas as denúncias apresentadas [contra políticos na “lava jato”] sem a imposição de sigilo. Isso permitiu que nós conhecêssemos todos os agentes públicos que estavam sendo denunciados. O caminho me parece o mesmo agora. Independentemente da delação ser ou não homologada, o fato é que ela já traz por si denúncias absolutamente graves, talvez únicas na história republicana brasileira”, afirmou.
Dilma e Lula
A revista IstoÉ informou nesta quinta que Delcídio afirmou, em delação premiada, que a presidente Dilma Rousseff e o antecessor dela, Luiz Inácio Lula da Silva, sabiam de crimes na Petrobras e agiram para evitar que eles fossem revelados.
Segundo reportagem da IstoÉ, o senador garantiu que Dilma tentou por três vezes interferir na operação “lava jato” com a ajuda do ex-ministro da Justiça e atual advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo. Em uma delas, a presidente teria tido uma reunião com Cardozo e com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, em Portugal, para pedir uma mudança nos rumos da “lava jato”. Contudo, o encontro teria sido um fracasso — e o ministro do Supremo teria se negado a participar do esquema.
Outra iniciativa citada pela revista teria sido indicar Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça com a intenção de que aceitasse os recursos de empreiteiros presos na operação. Navarro, no entanto, deixou a relatoria dos processos da “lava jato” na corte.
Já Lula seria acusado por Delcídio de ordenar a ele que tentasse convencer o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró de não implicar o fazendeiro José Carlos Bumlai em acordo de delação premiada.
A IstoÉ diz ainda que ex-presidente também agiu na operação zelotes para evitar a convocação do casal Mauro Marcondes e Cristina Mautoni para depor. A razão seria que o fundador do PT estaria com medo de que eles revelassem repasses irregulares à empresa de seu filho Luís Cláudio e confirmassem repasses para o governo aprovar a Medida Provisória 471/2009, que beneficiou o setor automobilístico.
Sérgio Rodas é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 3 de março de 2016, 20h21
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