segunda-feira, 18 de maio de 2015

Preparo admite complementação posterior à interposição do recurso




O recolhimento apenas das custas ou do porte de remessa e retorno ou de alguma outra taxa recursal representa preparo insuficiente, admitindo-se a complementação. Esse foi o entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento de um recurso especial que teve como relator o ministro Antonio Carlos Ferreira.

O colegiado entendeu que a abertura do prazo de cinco dias para complementar o valor insuficiente do preparo, prevista no artigo 511, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil (CPC), foi instituída para viabilizar a prestação jurisdicional. Por isso, a possibilidade de complementação deve se dar em concepção ampla, de acordo com o ideal do acesso à Justiça.

O ministro relator esclareceu que o preparo recursal compreende o recolhimento de todas as verbas previstas em norma legal, indispensáveis ao processamento do recurso, como custas, taxas, porte de remessa e retorno etc.

De acordo com o ministro Antonio Carlos, houve o recolhimento apenas do porte de remessa e retorno (integralmente), ato comprovado na interposição do recurso. Intimada para complementar o preparo (pagamento das custas locais), a parte fez o recolhimento adicional dentro do prazo de cinco dias.

Antonio Carlos Ferreira lembrou que, antes da Lei 9.756/98, a jurisprudência do STJ já admitia a complementação do preparo em hipóteses de mera insuficiência, sobretudo quando a diferença entre o valor devido e o recolhido fosse irrisória.

Com a edição da Lei 9.756, o CPC passou a permitir a complementação no prazo de cinco dias, desde que recolhida uma das verbas e não recolhidas as demais.

No caso julgado, o porte de remessa e retorno foi recolhido integralmente, enquanto as custas judiciais devidas na origem para o processamento do recurso especial não foram pagas. Segundo o relator, foi correto o posterior recolhimento das referidas custas a título de complementação de preparo, na forma do artigo 511, parágrafo 2º, do CPC, o qual se aplica, também, aos recursos dirigidos ao STJ.

Mérito

No mesmo julgamento, ao analisar o mérito do recurso, a Corte Especial entendeu que, nas antigas regras do processo de execução (alteradas pela Lei 11.382/06), só era possível o oferecimento de embargos do devedor depois de prévio depósito da coisa (veja aqui).Leia o voto do relator.
Fonte: STJ

sexta-feira, 15 de maio de 2015

PROCESSO ELETRÔNIO - TJMG - Execução de Alimentos e Embargos à Execução Fiscal pelo PJe


Execução de Alimentos e Embargos à Execução Fiscal pelo PJe

Processos | 14.05.2015


A Corregedoria Geral da Justiça avisa aos magistrados, servidores, advogados públicos e privados, representantes do Ministério Público, Defensores Públicos e demais interessados que a distribuição das Ações de Execução de Alimentos, relativas a feitos que já se encontram arquivados em meio físico, deverão ser realizadas eletronicamente no sistema Processo Judicial eletrônico (PJe), conforme Aviso nº 31/CGJ/2015.


Os Embargos à Execução Fiscal deverão ser distribuídos em meio eletrônico, no sistema PJe, ainda que a Execução Fiscal tramite em meio físico.


O Aviso nº 31/CGJ/2015 foi disponibilizado na edição do DJe de 11/05/2015.



Consultar as ações que já tramitam por meio eletrônico em Processos » Processo Eletrônico TJMG » Peticionamento obrigatório.



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Fonte: TJMG

Eventual erro de julgamento não pode ser corrigido por embargos de declaração



O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão nesta quinta-feira (14), deu provimento a embargos de divergência em Recurso Extraordinário (RE 194662) para restabelecer decisão no sentido de que a convenção coletiva dos empregados do Pólo Petroquímico de Camaçari (BA) deveria prevalecer sobre a Lei 8.030/1990, que instituiu o Plano Collor e definiu reajustes menos favoráveis aos trabalhadores. Os embargos de divergência foram opostos pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias e Empresas Petroquímicas, Químicas Plásticas e Afins do Estado da Bahia (Sindiquímica) contra decisão posterior da Segunda Turma do STF que, ao apreciar embargos de declaração, havia reformado o acórdão inicial.

O julgamento do RE foi retomado com o voto-vista do ministro Teori Zavascki, que não conhecia dos embargos. Segundo o ministro, em casos excepcionais, o STF admite que embargos de declaração tenham efeitos infringentes. Em seu entendimento, a decisão da Turma teria contrariado a jurisprudência do Tribunal, o que configuraria a excepcionalidade. Ele foi seguido pelo ministro Luiz Fux.

O ministro Celso de Mello, em voto pelo provimento dos embargos, observou que, embora a jurisprudência do STF aceite embargos de declaração com efeitos infringentes, eles não são cabíveis para corrigir eventual erro de julgamento, mas apenas nos casos em que haja premissa equivocada, com reconhecimento de erro material ou de fato. Votaram no mesmo sentido as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia.

Por maioria de votos prevaleceu o entendimento do relator dos embargos de divergência, ministro Sepúlveda Pertence (aposentado), que votou no sentido de conhecer e dar provimento aos embargos de divergência para anular o acórdão da Segunda Turma do STF no julgamento dos primeiros Embargos de Declaração. Segundo ele, os embargos não poderiam ter sido providos para a correção de possível erro de julgamento.

Como se trata de reafirmação de jurisprudência do Tribunal, os ministros acolheram proposta formulada pelo ministro Luís Roberto Barroso para fixar tese em acórdão de que “embargos de declaração não se prestam a corrigir possíveis erros de julgamento”.

PR/FB

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Fonte: STF

7ª Turma decide: é possível cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade




A 7ª Turma do TRT mineiro, acompanhando voto de relatoria da juíza convocada Martha Halfeld Furtado de Mendonça Schmidt, entendeu ser possível a acumulação do adicional de periculosidade com o adicional de insalubridade, em interpretação evolutiva do artigo 193, parágrafo 2º, da CLT.

Segundo explicou a magistrada, essa possibilidade estimula o empregador na melhoria das condições do meio ambiente de trabalho, ou seja, em sua atuação preventiva, que tem preferência sobre a reparação dos prejuízos. E a prevenção, como lembrou, está no centro das normas de proteção à saúde do trabalhador, em todo o mundo. "Saúde não se vende e a monetização dos riscos é medida insuficiente para a prevenção de doenças e acidentes no trabalho. Mais efetivas são medidas preventivas, destinadas a assegurar o ideário da preservação da dignidade da pessoa humana e do avanço que deve permear as relações de trabalho", ponderou a julgadora.

Na sua visão, o recebimento cumulado dos adicionais parece ser a solução que melhor atende aos valores positivados nos princípios constitucionais e à necessidade de concretizar, com o máximo de efetividade possível, os direitos fundamentais ligados à remuneração de atividades penosas, insalubres ou perigosas, à vedação do retrocesso social, à proteção à saúde do trabalhador e à dignidade da pessoa humana. Ademais, como acrescentou, também constitui aplicação de preceitos do Direito Internacional do Trabalho, como a Convenção 155 da OIT, ratificada pelo Brasil. Destacou, ainda, que as normas gerais trabalhistas permitem a cumulação de outros adicionais decorrentes da exposição do trabalhador a situações de maior penosidade, como por exemplo, a cumulação do adicional de horas extras com o adicional noturno. Diante disso, a julgadora ponderou acerca da necessária cautela ao se analisar as condições dos trabalhadores submetidos a condições insalubres, perigosas ou penosas, sob pena de se diminuir a importância dos riscos que envolvem a profissão.

No caso analisado, a juíza convocada entendeu que, além do adicional de insalubridade já deferido ao trabalhador, ele também tinha direito ao pagamento do adicional de periculosidade, pois, no exercício de suas atividades, permanecia próximo a bombas de combustível e reservatórios de inflamáveis. Ele colocava gasolina no tanque dos veículos de coleção do empregador, em torno de 5 litros, em média, uma vez por semana. A gasolina era armazenada numa bombona de 50 litros. A magistrada ressaltou ser irrelevante a verificação da quantidade do produto, por se tratar de armazenamento de líquido inflamável.

Por fim, ela esclareceu que, nos termos da norma regulamentadora, "considera-se grave e iminente risco toda condição ou situação de trabalho que possa causar acidente ou doença relacionada ao trabalho com lesão grave à integridade física do trabalhador" (item 3.1.1 da NR 03). Assim, considerando a natureza da operação realizada, ela pontuou ser descabido falar que a consumação do risco depende necessariamente do tempo de exposição, já que a periculosidade é inerente ao exercício da atividade. Sendo habitual, a Turma deferiu ao trabalhador o adicional de periculosidade, com os reflexos cabíveis.

Fonte: TRT3

JT não reconhece culpa da empresa, mas determina reintegração e readaptação de empregado acidentado




Um trabalhador ajuizou reclamação contra a sua empregadora, uma empresa de construção, e contra a empresa para a qual prestava serviços na função de pedreiro. Alegou que foi admitido em janeiro de 2014 e que sofreu acidente de trabalho típico em fevereiro de 2014. Por isso, requereu a condenação solidária das duas rés ao pagamento de indenização por danos materiais e moral, de pensão vitalícia, indenização substitutiva da estabilidade provisória ou a reintegração ao emprego.

Ao analisar o caso, a juíza Jéssica Grazielle Andrade Martins, em sua atuação na 47ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, ressaltou ser incontroverso que o reclamante sofreu acidente de trabalho em 06/02/2014, conforme CAT emitida pela empregadora. Mas observou que houve divergência quanto à existência ou não de responsabilidade das rés quanto ao acidente do empregado.

Segundo esclareceu a juíza sentenciante, em regra, o Direito do Trabalho consagra a responsabilidade civil subjetiva, na qual se verifica a existência de uma conduta antijurídica, a ocorrência de um dano e o nexo de causalidade entre um e outro. Já a teoria da responsabilidade objetiva, consagrada no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, é medida excepcional e decorre do risco inerente à atividade. Mas, no seu entendimento, esse dispositivo é plenamente aplicável à responsabilidade civil do acidente de trabalho, nos termos do inciso XXVIII do artigo 7º da Constituição Federal.

No caso, a julgadora constatou que, embora o reclamante tenha sido contratado por uma construtora para prestar serviços de pedreiro para outra empresa, a lesão sofrida por ele nas dependências desta não decorreu do risco inerente à atividade de pedreiro, tendo em vista que ele estava transitando pela empresa tomadora de serviços, no início da jornada de trabalho, quando sofreu a queda em uma escada interna. Por essa razão, a responsabilidade civil das reclamadas depende da verificação de sua culpa, do nexo causal e dano, com respaldo na teoria subjetiva.

O laudo médico pericial, por seu turno, concluiu que houve nexo de causalidade entre o acidente e o dano sofrido pelo reclamante, uma vez que ele está totalmente inapto para o trabalho, por tempo indeterminado, em decorrência de lesão no joelho direito desencadeada pelo acidente de trabalho. Porém, em seu depoimento, o reclamante afirmou que a escada na qual ocorreu o acidente é permanente, possui corrimão e é feita de piso, fato esse confirmado pelo depoimento dos prepostos das rés e pela prova testemunhal, que revelou a existência de recomendação para utilizar o corrimão, além de atestar o bom estado de conservação dos degraus, que até têm antiderrapante.

No entender da magistrada, as provas demonstraram a ausência de culpa das reclamadas no acidente, uma vez que não foram identificados os requisitos da responsabilidade civil subjetiva. Por isso, indeferiu o pedido de indenização.

No que diz respeito à estabilidade e à reintegração do trabalhador no emprego, a juíza sentenciante frisou que, em face da incapacidade do reclamante por tempo indeterminado, ele tem direito à estabilidade provisória, nos termos do artigo 118 da Lei nº 8.213/1991, por estarem presentes os dois requisitos legais ensejadores desta garantia: o afastamento do serviço por prazo superior a 15 dias e o recebimento de auxílio doença-acidentário.

Diante dos fatos, a juíza determinou a reintegração imediata do reclamante nos quadros da empresa de construção, devendo ser observada a devida readaptação do empregado em função compatível com a sua capacidade atual, sem prejuízo de eventuais vantagens pessoais. O reclamante interpôs recurso ordinário, mas a decisão de 1º Grau foi mantida na íntegra.

Fonte: TRT3

Moro exerce "direito ao silêncio" durante lançamento de livro em São Paulo


Moro exerce "direito ao silêncio" durante lançamento de livro em São Paulo




Protagonista de um livro sobre o médico Roger Abdelmassih, a estilista Vana Lopes aguardava interessados em ouvir a história de como ela investigou por conta própria o paradeiro do homem que estava foragido depois de condenado à prisão por estuprar clientes. Mas a maioria da imprensa e do público esperava na tarde desta quinta-feira (14/5) a chegada do juiz federal Sergio Fernando Moro, que assinou o prefácio da obra junto com a mulher, a advogada Rosângela Wolff Moro.

Foram cerca de 30 minutos sem saber se ele iria mesmo aparecer no segundo andar da Livraria Cultura, na Avenida Paulista. “Ainda não foi confirmada [a presença]”, respondeu uma assessora, já espremida por fotógrafos e equipes de TV. Até que uma aglomeração apontou a chegada do convidado, que foi recebido com aplausos, flores brancas, gritos de “fora PT” e a primeira parte do Hino Nacional.

Moro sorriu e preferiu ficar num canto afastado, longe da mesa que reunia Vana Lopes, os autores de Bem Vindo ao Inferno — Claudio Tognolli e Malu Magalhães — e autoridades policiais que atuaram na prisão de Abdelmassih. Vana disse que não via problemas em dividir a atenção com o juiz responsável pelos processos da operação “lava jato”.

“Não acho que tira o brilho do lançamento nada que se fale em termos de Justiça. Porque o livro é uma história de autoajuda e justiça. Se todos estiverem buscando isso, tudo bem. O livro pode ser um lema disso sim.”

Rosângela Moro também respondeu a algumas perguntas. Só sobre o prefácio, na qual ela e o marido afirmam que, “ao se passar por outra pessoa, sempre mirando consequências cidadãs, Vana adotou o que se chama de dolus bonus: aquele bom dolo a objetivar (e buscar) o bem social supremo”. 

Moro saiu do evento cerca de 20 minutos depois de chegar, sem aceitar tirar retratos com fãs e seguido pelos próprios e por profissionais da imprensa no caminho até o elevador. Quando desceu, o grupo correu pelas escadas para encontrá-lo no térreo.

Ao ver a movimentação na saída da livraria, uma jovem perguntou para a amiga: "Quem é?". Recebeu a resposta prontamente: “Ah, é o juiz do mensalão!”

O juiz federal continuou sendo seguido porta afora, pela avenida Paulista. Ouviu gritos de “obrigado!” e “1, 2, 3, 4, 5 mil... queremos Sergio Moro presidente do Brasil!”. Entrou num táxi que estava parado no semáforo, sob o olhar surpreso do motorista idoso. Um manifestante abriu a carteira e disse que pagaria a corrida do taxista. Moro rejeitou. O carro virou pela rua Augusta, sentido Jardins, e a multidão começou a se dispersar.

Na livraria, já sem tumulto, personagens e responsáveis pelo livro continuaram os autógrafos. Alguns manifestantes tiraram fotos da mulher de Moro, que continuava ali. No fim da festa apareceu ainda o cantor Lobão.

Poucas palavras
Na coletiva de imprensa, Moro falou pouco:

ConJur - Em relação ao prefácio que seu marido assina junto, em que ponto ele ajudou a senhora a escrever [o texto]?
Rosângela Moro — Ele é sempre um grande parceiro meu em todas as decisões que tomei.

ConJur – O senhor escreve no prefácio sobre a existência do “bom dolo” para combater um monstro. Existe “bom dolo” para o combate à corrupção?
Sergio Moro — [Gesto de que não responderia]

Repórter 2 – O que o senhor achou dessa recepção tão calorosa?
Sergio Moro — Olha, é o seguinte: o evento hoje é o lançamento do livro. Eu vim só prestigiar isso e acho que vocês têm que prestigiar o lançamento, então vou pedir a compreensão de vocês.

ConJur – Mas tem um amplo público que veio prestigiá-lo, o que o senhor diz para essas pessoas?
Sergio Moro — Eu acho que é importante ter o apoio da população, é relevante. Mas realmente não vou fazer mais comentários.

Repórter 3 - Como o senhor viu esse ato?
Sergio Moro — Olha, como eu disse. O foco hoje é o lançamento do livro. Claro, a gente fica gratificado por ter uma recepção tão calorosa e atribuo a isso a simpatia das pessoas.

Repórter 4 - O senhor se considera um herói nacional?
Sergio Moro — Não.

Repórter 5 – Como foi ser recebido com status de herói?
Sergio Moro — Olha, o evento é sobre o lançamento do livro, eu só vim prestigiar. A gente fica feliz com essa recepção, mas eu não quero ser o foco da atenção.

Repórter 6 - Mas o senhor escreveu o prefácio, né?
Sergio Moro — Não, foi escrito pela minha esposa.

Repórter 6 - O senhor ajudou?
Sergio Moro — Eu sou um figurante.

Repórter 7 - O senhor pode falar um pouco sobre o livro?
Sergio Moro — Não, não vou comentar.

Obra
A protagonista de Bem Vindo ao Inferno (Editora Matrix), Vana Lopes, narra que pensou em suicídio depois de ter sido estuprada durante uma consulta, passar por problemas de saúde e separar-se do marido. Quando se pensava que o ex-médico estava no Líbano, ela decidiu investigar a localização de Abdelmassih. A estilista estudou Direito e até criou perfil falso em uma rede de relacionamentos para conseguir informações, depois repassadas às autoridades. Roger foi preso no Paraguai.

Segundo ela, todo o lucro com o livro será encaminhado para a ONG Vítimas Unidas, que reúne outras mulheres vítimas do ex-médico e planeja atender mais pessoas que passem por abusos sexuais. “Ninguém pode ganhar dinheiro com dores, nem eu com a minha própria vida”, afirmou.



Felipe Luchete é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 14 de maio de 2015, 21h44

quinta-feira, 14 de maio de 2015

Razão cínica: o livre convencimento que afaga é o mesmo que apedreja!




Duas cenas de uma peça
A dona de uma bodega (bolicho) se felicita pela prosperidade de seu negócio no meio da guerra. Ela também ganha dinheiro nessa guerra injusta e criminosa transportando bombas de uma base militar à outra. O nome dela é Mãe Coragem. Ela contempla a miséria em que a guerra transforma a tudo e a todos. Perdem-se os filhos nessa guerra. Perde-se tudo. Porém ela repete: a guerra não é todo um mal e, ademais, é meu meio de vida.

Outra cena: no começo da oitava parte de Madre Coraje, um jovem camponês chega a um acampamento de guerra com sua mãe para vender cobertores. É o décimo quarto ano da guerra. Vender cobertores já é algo habitual. É o seu único meio de sobrevivência. A mãe olha para o saco de cobertores. Seu filho baixa do ombro o saco. Que fará e o que dirá seu filho quando souber que foi firmado um tratado de paz e agora não mais venderá cobertores? Como vão sobreviver?

Eis duas passagens da peça de Brecht, Mutter Courage und ihre Kinder (Mãe Coragem e seus filhos). Das duas podemos retirar lições e fazer leituras de nossa situação. Eis a guerra “do insaciável apetite por cargos”, tão bem descrita por Valdo Cruz na Folha de S.Paulo (ler aqui). Para aprovar o ajuste fiscal, vale tudo (no direito, já fizeram um ajuste epistêmico de há muito! — basta ver o livros que estão sendo usados nas faculdades e o nível das publicações). Vender e comprar cobertores. E levar bombas de uma base à outra. “Cerca de 200 cargos — 50 federais e 150 estaduais — estarão sendo distribuídos nos próximos dias, num ritmo nunca visto na história do governo Dilma. Entre eles, de 15 a 20 de diretorias de agências reguladoras”. Bingo! 

Eis também a guerra do e no direito e da dogmática jurídica que o instrumentaliza. Contemplamos a miséria que é a aplicação do direito na cotidianidade. Brecht usava as peças para mostrar a alienação. Para ele, os personagens não sabiam que não sabiam. Pois olhando para as nossas práticas cotidianas, tenho dúvida de que não sabemos que não sabemos. Há um caminho do meio. Um misto entre alienação e razão cínica. O problema é que não sabemos quem é quem nessa “guerra”.

Em um determinado nível, parece haver uma razão cínica. Peter Sloderdijk, no livro Crítica da Razão Cínica, pega a frase de Marx, pelo qual esse dizia Sie wissen das nicht, aber sie tun es (eles não sabem o que fazem, mas fazem mesmo assim), numa crítica ao pensamento da burguesia de então. Sloterdijk inverte a frase para tratar de sua crítica da razão cínica, para dizer: eles sabem o que fazem e continuam a fazer do mesmo modo. Ele trata o cinismo em duas partes. Primeiro o kynismos, que era visto como uma crítica e depois mudou de sentido, ou seja, de uma força crítica passa, aos poucos, a assumir a "lógica dos senhores", a lógica da dominação e da justificação dessa dominação. Como bem diz Rodrigo Petrônio, a dinâmica ambivalente entre kynismos-cinismo apaga as fronteiras entre liberdade e domesticação. E essa última palavra parece ser fulcral para analisarmos o estado da arte do direito de terrae brasilis. A partir do que diz Sloterdijk, cabe a pergunta: até que ponto estamos a tratar de um senso comum multiplicador de um dado imaginário ou estamos diante de uma certa razão cínica (zynischen Vernunft) que tomou conta do ensino jurídico, da doutrina e da aplicação stricto sensu do direito?

Nessa interpretação das coisas, penso que estamos mergulhados mesmo em uma razão cínica, pela qual sabemos de tudo o que acontece, sabemos que está errado e fazemos assim mesmo. Sabemos que há um deficit de democracia quando deixamos um poder discricionário ou um poder “produto de livre convencimento” para o judiciário (em Pindorama isso acaba sendo a mesma coisa). Há até quem, na doutrina jurídica, cinicamente diz que a “simples” retirada da expressão “livre convencimento” em nada alterará o “livre convencimento”. Isso: continuemos a vender cobertores aos combatentes. E transportando bombas de um campo a outro. Afinal, todos vivemos disso, certo?

O episódio de São Paulo relatado na coluna Diário de Classe de sábado (ler aqui) marcou profundamente. Ele é o simbólico de um imaginário prevalente em uma república decadente. E de uma classe — a dos advogados —abandonada a sua própria sorte, fazendo o papel de mero coadjuvante no espetáculo em que se transformou a justiça. Sabemos que isso se repete cotidianamente. Sabemos que as alegações finais não s(er)ão lidas. E sabemos que, mesmo a juíza e o Tribunal de SP fazendo tudo o que (não) fez— ainda assim aparecerão milhares de torcedores para dizer que “isso é assim mesmo” (e que, afinal, ela tem livre convencimento...!). Guerra é guerra, diria o torturado(r). Sabemos que o direito é refém de um imaginário solipsista (Selbstsüchtiger, i.é, viciado em si mesmo), em que cada um pensa e diz o que quer e a decisão acaba sendo o resultado de uma loteria. Mas, dizemos, intimamente: “— isso tudo não é todo mal; e, ademais, é o nosso meio de vida...”. Como a dona da bodega. Eis a fórmula que justifica a razão cínica.

Do mesmo modo: o que faremos quando soubermos que foi “firmado um tratado de paz”? O que faremos quando não mais poderemos vender cobertores nessa guerra? Um dia a guerra terá fim. A raposa vai ao moinho e perde o focinho, diz a fábula. Mas vamos empurrando com a barriga a crise do direito (do mesmo modo como o governo empurra com a barriga a crise econômica e social).

Puxadinhos e gambiarras: eis os elementos “hermenêuticos” para a “superação” das crises que nos assolam. Um dos sintomas disso é a PEC da Bengala. Uma grande atrapalhada jurídica. Misturaram alhos e bugalhos. Luis Alberto dos Santos desnuda a PEC (leia aqui). A gambiarra colocada de forma antirregimental que trata das “condições do artigo 52” é digna de uma comédia do Monty Python (algo como A Vida de Brian). Quer dizer que se faz uma emenda para estender a permanência dos ministros do STF e congêneres e, ao mesmo tempo, coloca-se uma cláusula de “reconfirmação”? Como assim? Por que ninguém no mundo pensou em algo tão genial? Isso é tão inconstitucional que o porteiro do Supremo Tribunal despacha a liminar para não incomodar o ministro.

Vender cobertores na guerra é modo de sobrevivência. Por isso é que, nesta pós-modernidade midiática em que não há mais fatos e, sim, somente interpretações, ninguém se surpreende — mais do que no período entre 24 e 48 horas — com uma sucessão de acontecimentos. E tudo fica escondido atrás da próxima notícia. É como na ConJur. Saiu da capa e, puff, sumiu. Já não se fala do assunto. As redes sociais são assim. Testem o seu feicibuk. A foto de hoje é o esquecimento de amanhã. Já notaram como uma notícia rarissimamente volta a ter destaque? É a pós-modernidade. Lê-se apenas o que vem daqui para a frente. Bom, diriam, isso não é todo mal. Afinal, todos temos de vender cobertores.

Assim, as coisas somem e raramente retornam. Logo, mas logo mesmo, esqueceremos que o Procurador-Geral da República propôs projeto para relativizar a proibição de prova ilícita; que os juízes federais Moro e Bochenek escreveram um artigo no maior jornal do país dizendo que o problema do combate a impunidade é o processo penal, propondo relativizar o direito recursal; que a doutrina pindoramense aceitou passivamente a LINDB — uma lei com nome de chocolate, que apenas demonstra o fracasso da teoria do direito de um país de terceiro mundo (na verdade, já ninguém fala disso); que a doutrina e a juris(sem)prudência sepultaram a clareza do artigo 212 do CPP que estabelecia o acusatório no sistema processual penal (e que eu fui chamado de positivista porque queria apenas que se cumprisse “a letra clara da lei”); que o Tribunal de Justiça do Maranhão concedeu metade da herança a concubina adulterina com base no “princípio da afetividade” (ou algo dessa espécie pan-principiologista); que uma juíza da Bahia, em processo eleitoral, cassou um prefeito dizendo: não há provas mas eu testemunhei os fatos (com base em artigo da Lei Eleitoral que autoriza julgar por “presunções” — uma jabuticaba típica terceiro-mundista); já ninguém mais fala que na operação "lava jato", um dos réus, diretor de empresa, é defendido por Defensor Publico; em Minas Gerais, em um júri, o promotor pediu a absolvição e o assistente da acusação pediu a condenação; que inventaram os principíos (sic) da coloquialidade e da simplicidade (e mais 65 “princípios” desse jaez); que nos 27 tribunais dos estados da federação existem órgãos fracionários que utilizam a inversão do ônus da prova para condenar autores de furto, estelionato e trafico de drogas; que o Ministério Público em segundo grau não se importa se, no primeiro grau, seu colega ditou as alegações finais e o juiz já veio com a sentença pronta sem ler as respectivas peças (e o Tribunal de Justiça fez o mesmo);que pouco se cita fontes ou originalidade de ideias em Pindorama: só quem cita fonte mesmo é água mineral.[1] Onde estão essas notícias? Um bug tecnológico as comeu!

Numa palavra final: a terceirização da ciência e o “pacote de ajuste epistêmico”.
Não é preciso coadunar com as distorções da pós-modernidade. Não por mera escolha (ironia), mas porque não se pode dar o luxo de. Seria um suicídio jurídico-epistêmico. Nesse sentido, o direito aparentemente abdicou da tradição em prol de uma espécie de “carpe diem” de significações, deste modo, a própria construção do saber, que constitui historicamente o sujeito, resta ameaçada diante da plurivocidade de sentidos. 

Parece que perdemos o senso que o Direito em terra brasilis deveria serre(s)publicano. Isto é, ao invés de uma amontoado de decisões particularistas, deveria espelhar nossa comu(m)nidade jurídica e social. Alguns não despertam para realidades como esta, pois vivem alienados na/pela dogmática, outros sabem, mas fingem que não sabem, por que de alguma forma isto lhe é oportuno. Outros, como eu — ou seja, estas preocupações são compartilhadas com muitas pessoas! — ao saber que sabem, preferem assumir uma postura crítica. Ou seja, ainda que outrora vendêssemos cobertores, com o fim da guerra esta prática tornou-se sem sentido, e aí reconfiguramos nosso itinerário. Ou, mesmo que desde antes já não vendêssemos cobertores para guerra, não seria agora que acobertaríamos a crise do Direito, talvez por que de vez em quando é necessário passar um pouco frio para passar saber que existe vida lá fora.

Afinal, a discricionariedade que afaga é a mesma que apedreja. O direito não é espelho da natureza, muito menos um devaneio-onírico-idealista. Muito embora a “verdade” contida nos resumos de Direito “prêt-à-porter” nos dizer o contrário. Mas por hoje é só. Quem não conseguiu chegar até o final da leitura é porque já deve estar por aí vendendo cobertores.



[1] Por favor, não vamos (re)discutir os itens exemplificativos; sobre eles já escrevi. Apenas fiz um elenco rápido “de memória”. Para demonstrar a nossa inserção nessa guerra de venda de cobertores.


Lenio Luiz Streck é jurista, professor, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.



Revista Consultor Jurídico, 14 de maio de 2015, 8h00

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...