terça-feira, 19 de março de 2013

DIREITO DO CONSUMIDOR - O EMPRÉSTIMO DO CARRO AO FILHO POR SI SÓ NÃO CONSTITUI AGRAVAMENTO DO RISCO DO SEGURO


SÉRIE DECISÕES JUDICIAIS

 

TJMG - Embargos Infringentes Nº 1.0525.10.010536-6/002 - rel. Des. Sebastião Pereira de Souza – Dje 15/3/2013[i] – Área do Direito: Consumidor

 

AGRAVAMENTO DO RISCO. NÃO OCORRÊNCIA. EXCLUSÃO DA COBERTURA. INADMISSIBILIDADE. Não caracteriza intencional agravamento de risco a entrega de veículo a terceiro até então sóbrio, que após, já na posse do veículo, ingeriu bebida alcoólica e, em estado de embriaguez,  envolveu-se em acidente. Comprovado nos autos que o filho do segurado estava em perfeitas condições de dirigir quando recebeu o veículo, devida a indenização securitária, visto que o estado de embriaguez não pode ser imputado ao segurado. Embargos acolhidos.

 

 

Resenha

 

Trata-se de acórdão em embargos infringentes versando sobre a pretensão do consumidor ao recebimento de cobertura securitária contratada para o veículo de sua propriedade. Os autos dão conta de que o contratante/segurado emprestou o carro, objeto do seguro, ao filho, maior e devidamente habilitado, que, no retorno para casa, após ingerir bebida alcoólica, acabou colidindo com um muro de proteção de uma avenida, provocando inúmeros danos ao veículo, causando-lhe “perda total”. Com fundamento no artigo 768, do Código Civil e com base em cláusula limitativa de direito, prevista nas Condições Gerais do seguro, a seguradora negou pagamento do sinistro.

 

Em primeiro grau, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes, para condenar a seguradora a efetuar o pagamento do seguro contratado. Inconformada, a seguradora apelou da decisão. Por ocasião do julgamento da apelação, o então relator do processo, Desembargador Wagner Wilson Ferreira, negava provimento ao recurso da seguradora, afirmando que o fato de emprestar o veículo ao filho por si só não agrava o risco do seguro, sobretudo porque, no momento do empréstimo, o filho ainda não havia ingerido bebida alcoólica.

O revisor, Desembargador José Marcos Rodrigues Vieira, abriu a divergência salientando que, no mínimo, a relação de pai e filho constituía um ato de preposição, sendo o pai responsável pelos atos do filho. Salientou, ainda, que o fato de o filho ter feito uso de bebida alcoólica somente após o empréstimo do veículo não afastava o agravamento do risco. Com este fundamento, dava provimento à apelação da seguradora. Seu voto foi seguido pelo vogal, desembargador Francisco Batista Abreu.

 

Considerando que o acórdão não foi unânime e que houve reforma do mérito da sentença, o contratante/segurado interpôs embargos infringentes, o qual, por maioria de votos foi provido para resgatar o voto vencido do Desembargador Wagner Wilson Ferreira e restabelecer os efeitos da sentença de primeiro grau.

 

O acórdão dos embargos infringentes está em perfeita consonância com o entendimento do c. STJ. Em que pese a divergência ter mantido seu posicionamento, a presunção de que o contratante/segurado tem por obrigação não permitir que o veículo segurado seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida e esgota-se, efetivamente, até a entrega do veículo a terceiro (REsp 995.861/SP ).

 

Se fizermos uma leitura mais atenta do artigo 768, do Código Civil, perceberemos que o legislador não teve outra intenção senão afastar a cobertura nos casos em que o segurado agrava intencionalmente o risco do seguro, o que não é o caso dos autos. O referido artigo dispõe que: “O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato”.

 

O condutor do veículo não era o segurado, mas seu filho. Também não existe prova de que ele havia ingerido bebida alcoólica antes de receber o carro de seu pai, logo, não há que falar que o segurado (pai) teve intenção de agravar o risco do seguro.

 

Neste sentido, o acórdão dos embargos infringentes não merece reparos, até porque, este é o entendimento já consolidado do c. Superior Tribunal de Justiça. Confira os seguintes julgados: AgRg no REsp 1196799/MG; EDcl no REsp 995.861/SP; REsp 578.290/PR; STJ; AgRg-REsp 1.149.460; RESP 1097758/MG.

 

Luiz Cláudio Borges

Mestrando e Direito Constitucional e Democracia, pela FDSM, Especialista em Direito Civil e Processo Civil, CPG-FADIVA. Professor da Unilavras e Unifenas. Advogado.

 

 


Não caracteriza intencional agravamento de risco a entrega de veículo a terceiro até então sóbrio, que após, já na posse do veículo, ingeriu bebida alcoólica e, em estado de embriaguez,  envolveu-se em acidente.

Comprovado nos autos que o filho do segurado estava em perfeitas condições de dirigir quando recebeu o veículo, devida a indenização securitária, visto que o estado de embriaguez não pode ser imputado ao segurado.

Embargos acolhidos.

 

Embargos Infringentes Nº. 1.525.10.010536-6/002 – Pouso Alegre – Embargante: Vitor Antônio Caetano

Embargado: Indiana Seguros S.A.

 

 

A C Ó R D Ã O

 

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos em  ACOLHER OS EMBRAGOS INFRINGENTES, VENCIDOS O 2º E 3º VOGAIS.

DES. SEBASTIÃO PEREIRA DE SOUZA

Relator.


 

Des. Sebastião Pereira de Souza (RELATOR)

V O T O

Conheço do recurso, pois presentes os pressupostos de admissibilidade.

Colhe-se dos autos que o embargante emprestou seu veículo, segurado pela embargada, ao seu filho que, após estar na posse do automóvel, ingeriu bebida alcoólica e, sob efeito de álcool, envolveu-se em acidente no dia 17/05/2009, fato que ensejou a recusa da cobertura securitária.

 

Pretende o embargante resgatar o voto minoritário do Relator, Des. Wagner Wilson, que decidiu pela manutenção da sentença, considerando que “não restou demonstrado o agravamento do risco apto a afastar a cobertura sucuritária”, pois no momento em que o embargante entregou o veículo para seu filho, este estava sóbrio.

 

Cediço que o estado de embriaguez constitui agravamento do risco capaz de afastar a obrigação da seguradora em indenizar os prejuízos resultantes do sinistro, conforme prescreve o art. 768 do Código Civil, in verbis: 'O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato'.

 

Ocorre que, no caso dos autos, o condutor do veículo não era o segurado, mas seu filho, o qual estava sóbrio no momento em que recebeu de seu pai o automóvel, conforme comprova o depoimento testemunhal de f. 117, que revelou que três horas antes do acidente o rapaz, já de posse do veículo segurado, ainda não havia ingerido bebida alcoólica.

 

Logo, não houve um agravamento intencional do risco por parte do segurado.

 

O STJ firmou entendimento de que a presunção de que o contratante-segurado tem por obrigação não permitir que o veículo segurado seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida e esgota-se, efetivamente, até a entrega do veículo a terceiro:


“CIVIL. AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. SEGURO. EMBRIAGUEZ DE TERCEIRO CONDUTOR. FATO NÃO IMPUTÁVEL À CONDUTA DO SEGURADO. EXCLUSÃO DA COBERTURA. IMPOSSIBILIDADE.- A culpa exclusiva de terceiro na ocorrência de acidente de trânsito, por dirigir embriagado não é causa de perda do direito ao seguro, por não configurar agravamento do risco provocado pelo segurado. Precedentes.- Agravo não provido”.(AgRg no REsp 1196799/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/08/2012, DJe 10/08/2012)

 

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA.CONTRATO DE SEGURO DE VEÍCULO. EMBRIAGUEZ DE TERCEIRO CONDUTOR (PREPOSTO). FATO NÃO IMPUTÁVEL À CONDUTA DO SEGURADO. EXCLUSÃO DA COBERTURA. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.1. A perda do direito à indenização deve ter como causa a conduta direta do segurado que importe num agravamento, por culpa ou dolo, do risco objeto do contrato. A presunção de que o contratante-segurado tem por obrigação não permitir que o veículo segurado seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida e esgota-se, efetivamente, até a entrega do veículo a terceiro.Precedentes.2. Da leitura das razões expendidas na petição de agravo regimental, não se extrai argumentação relevante apta a afastar os fundamentos do julgado ora recorrido. Destarte, nada havendo a retificar ou acrescentar na decisão agravada, deve esta ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos.3. Agravo regimental desprovido”.(EDcl no REsp 995.861/SP, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 18/08/2009, DJe 31/08/2009)

 

Assim, restando comprovado que no momento em que o segurado entregou o veículo ao seu filho este estava em perfeitas condições de conduzir o veículo, tem-se por indevida a negativa de cobertura securitária.

 

CONCLUSÃO

 

Com estes fundamentos, pedindo vênia aos ilustres colegas prolatores do voto majoritário, acolho os embargos infringentes, para resgatar o voto minoritário do Des. Wagner Wilson. Em conseqüência, nego provimento ao primeiro recurso de apelação interposto pela ora embargada, mantendo a r. sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais da ação de cobrança de indenização securitária ajuizada pelo embargante.

 

Custas recursais, pela embargada.

 

É como voto.

 

 

Des. Otávio de Abreu Portes (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).

Des. Wagner Wilson Ferreira

V O T O

De acordo com o relator, mantendo meu voto da maneira como exarado quando do julgamento do recurso de apelação.

 

Des. José Marcos Rodrigues Vieira

V O T O

Mantenho o posicionamento por mim esposado quando do julgamento da Apelação, pois a responsabilidade do segurado assumida na apólice de seguro não se interrompeu no momento em que transferiu o veículo para o seu filho. Aliás, estabeleceu-se aí uma nítida relação de preposição, conforme melhor explicitado no voto que proferi em sede de Apelação.

 

Assim, peço vênia ao Relator para dele divergir e rejeitar os embargos infringentes.

 

Des. Francisco Batista de Abreu

V O T O

<Nada a ser mudado no acórdão ora embargado, data venia.

Rejeito os embargos.

Custas pelo Embargante. >


 



[i] O acórdão encontra-se disponível no sitio do TJMG.

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