Mostrando postagens com marcador COMPORTAMENTO. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador COMPORTAMENTO. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Juízes e membros do MP também devem passar por detector de metais, decide CNJ


Juízes e membros do MP também devem passar por detector de metais, decide CNJ



Todas as pessoas que entram em prédios do Judiciário devem passar por detectores de metais e por outras medidas de segurança. Inclusive os juízes, desembargadores, ministros e membros do Ministério Público. Foi o que decidiu, nesta segunda-feira (1º/12), o Conselho Nacional de Justiça, em sua 22ª sessão extraordinária.

Os detectores de metais na entrada de prédios forenses vêm desagradando advogados desde que começaram a ser implantados, em 2010, a partir da edição das resoluções 104 e 124 do CNJ. Em julho de 2012 a possibilidade foi repetida na Lei 12.694/2012. E ela fala especificamente na “instalação de detectores de metais, aos quais devem se submeter todos os que querem ter acesso aos seus prédios”.

A reclamação dos advogados é que os detectores só foram instalados nas entradas comuns, que não são usadas pelos magistrados e membros do MP. Normalmente eles têm entradas especiais, ou podem acessar os prédios pelo estacionamento, o que não é permitido aos demais cidadãos. Ou seja, só advogados e “cidadãos comuns” é que são obrigados, hoje, a passar pelo detector de metais.

Com a decisão desta segunda do CNJ, foi aplicado o princípio da isonomia. Os detectores devem ser instalados em todas as entradas que o tribunal entender haver necessidade de maior controle de segurança.

O conselheiro Emmanoel Campelo, voto vencedor na discussão, entendeu que, se ficou decidido sobre a necessidade do uso de detector, todos devem se submeter a ele, não só advogados. “Quanto mais exceções, mais vulnerabilidade”, completou o conselheiro Flávio Sirangelo.

A discussão começou no CNJ em março de 2013, mas foi interrompida por pedido de vista dos conselheiros Campelo e Sirangelo. O caso foi levado ao CNJ em pedido de providências feito pelo advogado Marcos Alves Pintar começou a ser julgado. Ele reclamava da prática em fóruns de São José do Rio Preto (SP) e levou o caso ao conselho, onde foi apoiado pela Ordem dos Advogados do Brasil, que entrou no caso como terceiro interessado.

O relator original do pedido era o conselho Jorge Hélio. E os votos-vista discutidos nesta segunda seguiram seu entendimento, de que as medidas de segurança se aplicam a todos. Também votaram nesse sentido a vice-presidente do CNJ, ministra Cármen Lúcia, e os conselheiros Paulo Teixeira, Gilberto Valente, Guilherme Calmon, Maria Cristina Peduzzi e a corregedora nacional, ministra Nancy Andrighi. Além deles, os ex-conselheiros Bruno Dantas e Silvio Rocha.

A ministra Cármen Lúcia, ao final do julgamento, comentou que “não é possível, em uma República que tenha tantas falas sobre igualdade, desigualar justo em segurança pública, que é uma garantia de todos”. Ela presidiu a sessão desta segunda.

O presidente do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, considerou a decisão “acertada e contundente”. “Assim como os advogados, juízes e promotores de Justiça devem, por igual, serem submetidos a tratamento da mesma natureza para fins de segurança”, declarou.

Para Marcelo Knopfelmacher, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), a decisão é exemplar e assegura a justa aplicação do princípio da igualdade. "Não há hierarquia entre juízes, membros do Ministério Público e advogados como reza a lei ordinária. E a razão disso é a indispensabilidade do advogado à administração da justiça e, mais ainda, o princípio da isonomia previsto pelo artigo 5º da Constituição".

Pedido de Providências 0004482-98.2012.2.00.0000



Revista Consultor Jurídico, 1 de dezembro de 2014, 20h44

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

JEFERSON CARVALHO: A conduta do homem deve ser fundada na razão


Jeferson Carvalho: A conduta do homem deve ser fundada na razão


O homem é um ser que racionalmente vive em sociedade pois, por sua natureza, tem necessidade de convívio social. Para bem viver na relação interpessoal e na busca do bem comum o homem não pode dispensar os conhecimentos.

De tão imprescindível o conhecimento na vida humana surgiu a Teoria do Conhecimento, considerando-se seu fundador o filósofo inglês John Locke. Mas na filosofia continental, Immanuel Kant aparece como o verdadeiro fundador.

Das explicações de Johannes Hessen[1] podemos concluir que a obra de Kant não procura gênese psicológica do conhecimento, mas sua validade lógica. Preocupa-se como é possível o conhecimento, sobre quais fundamentos e sobre quais pressupostos ele repousa. É através dos vários métodos criados pelo homem, baseados sempre na auto-reflexão que há um evoluir constante para o conhecimento.

A palavra filosofia possui origem grega e significa de maneira simplista “amor à sabedoria”, aspiração ao saber. A essência da filosofia está voltada para o todo e não para uma especialidade, tendo um caráter universal, pois se preocupa com o conhecimento e não com particularidades. À partir da filosofia que podemos partir para outros conhecimentos.

Intuitivamente, o Direito aparece como agir conforme a lei, ou seja, é o que está inserido na lei. No entanto, este conhecimento intuitivo não satisfaz para se pensar em Filosofia do Direito.

Após afirmar a existência de dificuldades para conceituar os direitos do homem e que a expressão é sempre muito vaga, Noberto Bobbio afirma queDireitos do homem são aqueles cujo reconhecimento é condição necessária para o aperfeiçoamento da pessoa humana, ou para o desenvolvimento da civilização.etc.,etc..[2]

Direito, o jus romano, tem a idéia de proteção e salvação definidas como a arte do bom e do equitativo. Se apresenta com um conceito bem diverso do mostrado de forma simplista, que se resume no cumprimento de norma obrigatória.

Já a Filosofia do Direito na conceituação de Jacy de Souza Mendonça é a disciplina que busca a formulação da idéia universal do Direito, determina seu valor ou natureza e estuda sua origem e evolução através da História.[3]

Para Cabral de Moncada entende-se Filosofia do Direito como: É uma actividade mental ou ramo da Filosofia que se ocupa do direito; é uma parte, um capítulo particular, se quisermos assim chamar-lhe da Filosofia.[4]

Então, Filosofia do Direito é a auto-reflexão sobre o Direito concebido como a arte do bom e do equitativo. Possibilita o homem conhecer o dever ser em busca do bem comum que é também o bem individual. E, através das correntes filosóficas de conhecimento ao homem é permitido conhecer o Direito visto como um dever ser, visto como a arte do bom e do justo.

Dogmatismo significa doutrina estabelecida, para então aceitar a tese de que o homem passa a conhecer em função de algo já pré-estabelecido, o que afasta a necessidade de uma relação sujeito-objeto. Impõe o dogmatismo o conhecimento pela aceitação, que na verdade não significa conhecimento, mas sim uma simples apreensão sem que haja movimento racional de compreensão essencial. A critica que se pode fazer é que o dogmatismo elimina o trabalho intelectual, colocando o sujeito em mera posição de aceitante de algo pré-estabelecido.

Oposto ao dogmatismo, o ceticismo firma posição no sentido de que o sujeito não é capaz de apreender o objeto. O ceticismo, ensina Jacy de Souza Mendonça, duvida da possibilidade de o sujeito atingir o objeto através de uma imagem conforme ao objeto.[5] Em si é contraditório, pois se nada é possível conhecer, não se pode ter esta própria afirmativa, que conhece que nada é possível conhecer. 

Já para o subjetivismo a verdade existe e por isso o conhecimento é possível, mas há limitação restringida ao sujeito que conhece. Está o conhecimento atrelado a capacidade do sujeito que apreende, por isso a subjetividade. O relativismo está bem próximo porque admite a verdade e o conhecimento mas de forma relativa; isto é não há verdade absoluta. O que é para um sujeito pode não ser para outro.

Da mesma maneira que o ceticismo, o subjetivismo e o relativismo se contradizem. Se toda verdade é subjetiva ou relativa, a própria afirmação não pode ser aceita como absoluta. A contradição é imediata, para poder pensar que a verdade é, existe de forma absoluta. O juízo é verdadeiro para todos ou não. 

Para entender o criticismo é bom conhecer, ao menos superficialmente, a vida de seu verdadeiro fundador, Kant. Vida extremamente metódica, mas com movimento intelectual intenso, o que nos mostra suas idéias. Filósofo alemão, nascido em Koenigsberg (atual Kaliningrado), de família pobre de origem escocesa, quando adulto ele se afastou da religião, licenciou-se em Filosofia, Matemática e Física, teve uma vida extremamente regular, cada coisa tinha seu tempo certo. Toda sua vida foi dominada pelo método e reflexão. Consta que aos 22 anos decidiu: “Já tracei a linha que pretendo seguir. Vou começar minha carreira e nada me impedirá de continuá-la”. Trabalhou mais de 15 anos na sua obra filosófica: as duas Críticas. Consta que escrevia em folhas soltas e sem sequência, para depois juntá-las e formar e o todo.

Nos parece existir alguma contradição ter uma vida pessoal extremamente metódica e determinada e uma vida de escrever com a imaginação solta e método extremamente livre, no sentido de escrever partes e partes sem sequência e depois juntar. Isto mostra que para pensar e conhecer cada um pode e deve se socorrer de todos os meios possíveis, deixando principalmente a imaginação solta no universo.

A palavra tem o significado de examinar, por a prova ( krínein). Criticismolato sensu corresponde a um estudo metódico prévio do ato de conhecer e dos modos de conhecimento, ou uma disposição metódica do espírito no sentido de situar, preliminarmente, o problema do conhecimento em função da correlação “sujeito-objeto”.

A distinção do criticismo é a determinação a priori das condições lógicas da ciência. Declara que o conhecimento não pode prescindir da experiência, a qual fornece material cognoscível. De outro lado sustenta que o conhecimento na base empírica não pode prescindir de elementos racionais, pois só adquire validade universal quando os dados sensoriais são ordenados pela razão.

Para Kant há uma funcionalidade essencial entre aquilo que entende por a priori e os elementos da experiência, porque somente se pode afirmar algo a priori no ato mesmo de pensar, se essa asserção é feita em função da experiência, e só é possível experiência condicionada a conceitos admitidosa priori. Esse momento é visto como transcendente.

Compreende-se a explicação critico-transcedental quanto o pólo negativo (objeto ou elemento empírico) se encontra com o pólo positivo (entendimento), fechando o circuito de conhecimento.

Na Critica da Razão Pura partiu Kant da indagação acerca da possibilidade dos juízos sintéticos a priori.

O conhecimento está sempre conformado pela medida humana, é subjetivo. O sujeito configura a representação a partir de exigências inatas nele existentes, denominadas categorias a priori do conhecimento e formas a priori da sensibilidade. Está sempre subordinado a uma série de medidas que são, ou as formas a priori da sensibilidade, ou os conceitos ou categoriasa priori do entendimento.

Ao lado dos juízos analíticos, que são sempre a priori, e dos juízos sintéticos a posteriori, colocam-se como condição das construções cientificas, os juízos sintéticos a priori. Juízos analíticos são a priori, dotados de validade universal e necessária, independente da experiência. Sujeito e predicado são uma identidade. Juízos sintéticos, que são, naturalmente hic et nunc, são considerados sempre a posteriori, sendo sua validade particular e contingente.

Completando, Kant entende a existência dos juízos sintéticos a priori, que corresponde à possibilidade de formular juízos, com base na experiência, mas de uma validade que a transcende. O a priori, para Kant, corresponde ao que é independente da experiência individual. Representa ao mesmo tempo, a forma legal ou constitutiva da experiência mesma, pois é consciência cognoscente, criando de certa forma os objetos, segundo leis que são anteriores e próprias.

E ainda, para Kant, é o sujeito que constrói seu próprio objeto, não sendo a coisa em si algo realmente existente, embora incognoscível, mas sim mero limite negativo do conhecimento.

O conhecimento está sempre subordinado a medida do ser humano, sendo tudo subjetividade, até mesmo o espaço e o tempo, que não existem fora de nós, ao contrário, são formas de nossa sensibilidade interna ou externa. Tempo e espaço são condições do conhecimento do homem, que não pode perceber as coisas senão no espaço e no tempo, que são assim, de ordem transcendental.

O espírito humano quando, apreende as coisas, só pode fazê-los através de seus crivos espácio-temporais.

A doutrina do espaço e do tempo está desenvolvida na Critica da Razão Pura, na parte denominada Estética Transcendental. Assim, tempo e espaço são condições subjetivas da sensibilidade, imposições da consciência na natureza de todos os seres humanos.

Na Critica da Razão Prática, Kant indaga acerca da existência da lei moral. Deduz a lei moral, a norma fundamental de agir, da razão, despida de elementos concretos. Pretende fazer do conjunto das regras morais um sistema exclusivamente racional, unicamente fundado sobre princípios a priori e, portanto, universais e necessários.

Quando agimos tem-se em vista uma ordem, um imperativo. Há dois tipos de imperativo - um categórico e o outro hipotético. O imperativo categórico é ditado pela razão de forma universal: “Age segundo a máxima que possa converter em lei universal”. Daí a consequência de ser considerada justa toda ação compatível com o grau de liberdade de cada uma deve gozar, segundo a lei universal que regule sua medida conforme a natureza e ao destino do homem. Por sua vez o imperativo hipotético há uma ordem condicionada a uma hipótese.

Da Critica da Razão Prática pode-se deduzir quanto a lei moral que ela demonstra realidade e por isso dá realidade objetiva, vinculada a liberdade e a razão.

Direito para Kant, é uma série de condições que possibilitam a convivência dos homens, segundo um principio de liberdade. Justa, para ele, é a ação que, por si ou por sua máxima subjetiva, não seja um obstáculo à conformidade da liberdade de todos com a liberdade de cada um, segundo leis universais.

A questão de saber se o que uma lei prescreve é justo ou não, nunca será resolvida, segundo ele, a não ser que se deixe à parte esses princípios empíricos e se busque a origem desses juízos apenas na razão. Não se apreende a juridicidade, portanto na natureza do homem, porque esta é incognoscível, é inculcada no homem através do juízo ético e se afirma no imperativo categórico, que é aquele em que não há hipótese.

O Direito somente com conteúdo axiológico é fenômeno.

Saber o que é justo em uma prescrição legal exige não o conhecimento do conteúdo da lei nela mesma, mas sim a origem de justiça e injustiça na razão do homem.

A razão do homem voltada ao seu fim é que pode mostrar se o conteúdo de uma lei é justo ou não.

Para Del Vecchio o conceito criticista de Direito é formal, sem conteúdo ontológico, absolutamente neutro, não cabendo analisar se a ação é em si mesma boa ou má; basta à forma jurídica.

É impossível apreender a essência do Direito sem captar-lhe ao mesmo tempo o valor. O Direito seria a coordenação objetiva das ações possíveis entre os sujeitos, segundo um princípio ético que as determina, excluindo todos os impedimentos. O principio ético seria a presença do conteúdo valorativo

Segundo Gustav Radbruch, o conceito de Direito não se deriva, indutiva ou empiracamente, de fatos jurídicos; é antes, o conceito que permite conceber esses fatos como jurídicos. O Direito é formal, a experiência não entra em sua formação.

Por sua vez Kelsen reduz o Direito a mera exigência de pensar a realidade social.

O Direito expressa uma exigência de pensar a empiria social, uma categoria relativamente apriorística, um juízo hipotético e condicional com a seguinte estrutura: se A existe então deve existir B. Cria a norma jurídica vinculando a situação A com a sanção B, vinculação subjetiva e desprovida de juridicidade.

Para Kant, o direito são as condições para convivência fundadas na liberdade e conformando a liberdade individual com a coletiva. A justiça de cada ação será encontrada através da razão e não da simples natureza humana.

O criticismo se apresenta como um terceiro ponto de vista entre o dogmatismo e o ceticismo, na medida em que posiciona certo conhecimento, afastando-se do conhecimento por dogma e da impossibilidade de conhecimento.

A divergência está em que o dogmatismo aceita o conhecimento de forma impensável. A verdade existe e é, porque assim é. Para o criticismo, ao contrário, aceita o conhecimento, mas se exige o ato de pensar, e a possibilidade de conhecimento está limitada, por isso o homem conhece a aparência, isto é, como o objeto lhe aparenta ser.

O cético não admite a possibilidade de conhecimento, enquanto o criticista acredita nesta possibilidade, mas com desconfiança.

Para Kant, o ser em si mesmo é inacessível ao espírito, é incognoscível. Só conhecemos a aparência, o fenômeno das coisas, não sua essência. O conhecer é uma construção que o sujeito faz, impondo suas leis, suas condições de pensar aos dados da experiência. A conduta do homem depende de seu subjetivo, podendo agir conforme a lei moral, que seve ser fundada na Razão, observando sua vontade livre.

BOBBIO,Norberto – A Era da Direito, Editora Campus

CABRAL DE MONCADA,L – Filosofia do Direito e do Estado, Coimbra Editora

HESSEN, Johannes-Teoria do Conhecimento, Martins Fontes

JOLIVET, Regis, Agir.

KANT, Immanuel – Crítica da Razão Pura, Edições 70

Crítica da Razão Prática, Edições 70

Duas introduções à Crítica do Juízo, Iluminuras.

MENDONÇA, Jacy de Souza – O Curso de Filosofia do Direito do Professor Armando Câmara, Sergio Antonio Fabris Editor

RADBRUCH, Gustav – Introducción a la Filosofia del Derecho,Fondo de Cultura Económica

WALKER, Ralph – Kant e a Lei Moral, Unesp



[1] HESSEN, Johannes-Teoria do Conhecimento, Martins Fontes, 1999, SP, p.15


[2] BOBBIO, Norberto, A era dos Direito, Ed.Campus, 1990, SP, p.17


[3] MENDONÇA, Jacy de Souza- O Curso de Filosofia do Direito do Professor Armando Câmara, Sergio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre RS 199, p.31.


[4] MONCADA L. Cabral-Coimbra Editora, Vol.1º Portugal, 1995, p.1


[5] O.C. p.76
0


Revista Consultor Jurídico, 30 de novembro de 2014, 13h05

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Juízes não são deuses nem profetas, por óbvio!


Juízes não são deuses nem profetas, por óbvio!



Recentemente acordamos todos com um barulho espetacular: graças à colaboração de uma dedicada agente de trânsito, a imprensa brasileira, confirmando a sua vocação para os temas mais sérios, finalmente conseguiu demonstrar o que há muito se desconfiava: juízes não são deuses!

Seria, entretanto, necessário dar maior divulgação à boa nova, pois, como demonstram parte das pretensões cotidianamente deduzidas em juízo, muitos ainda se dirigem ao Judiciário convencidos de que os juízes têm poderes sobrenaturais. Para falar a verdade, as coisas andam bastante sérias. Equiparados a profetas de uma nova religião (como se o Brasil já não tivesse crenças em demasia), os juízes brasileiros são permanentemente confrontados com pedidos que vão muito além da multiplicação de pães ou da transformação da água em vinho. As demandas se sofisticaram e hoje envolvem a necessidade de multiplicar leitos (já ocupados) de UTI, vagas em universidade onde elas não existem, posse em cargos públicos para quem sequer foi aprovado em concurso e, se não fosse o bastante, não é incomum o pedido de aposentadoria rural para quem, entrevistado pelo magistrado, revela sincera dificuldade em distinguir um bovino de um equino.

Essa lista de demandas judiciais pode não ser caprichosa, como poderão demonstrar os interessados, mas certamente não tem similar em nenhum lugar do planeta e nada indica que terá um fim. Já não consiste, por exemplo, qualquer novidade o pedido individual ou coletivo para a dispensação pelo SUS de estimulantes sexuais (Viagra e similares). Há ainda pedidos de tratamentos experimentais no exterior, além de uma inabarcável lista de medicamentos de alto custo — alguns atingindo a cifra de R$ 1 milhão por ano — cuja importação ou produção no país sequer foi autorizada pela Anvisa.

O surpreendente em todos esses casos, insisto, não está propriamente nos pedidos em si, na maior parte das vezes absolutamente legítimos quando considerada a situação da parte que, em desespero, os formula. O problema é que passam ao largo da implementação de qualquer política pública governamental ou legislativa, além de não terem previsão orçamentária e nem mesmo se ocuparem de demonstrar a existência de fonte de custeio.

Desde que alguns teóricos passaram a professar o dogma de que, além de dizer o Direito, os juízes têm condições de produzir justiça perfeita e acabada para todos os casos concretos, fomos caminhando progressivamente para esse estado de coisas, onde já se encontra aqui e ali quem de fato acredite que, para além das maravilhas do artigo 6º da Constituição (educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados), já seria possível obter do Judiciário, em respostas certas e indiscutíveis (a quadratura do círculo da “única resposta correta”), entre outras maravilhas, honestidade na política, amor paternal e mesmo felicidade. (Tudo isso sem esforço pessoal ou custo coletivo.)

Como se vê, depois de certificada a condição terrena da magistratura nacional, devemos agora iniciar uma outra batalha, certamente mais difícil, considerada a resistência dos convictos, consistente em aceitar que os juízes também não são profetas, magos ou bruxos e, por isso mesmo, não dominam nenhuma ciência oculta que lhes permita, por mera habilidade hermenêutica, produzir coisas de palavras. O Judiciário não detém nenhuma pedra filosofal de onde possa operar milagres a partir do direito.

É certo que o direito, como sistema, pode influenciar o seu meio-ambiente, mas nem mesmo Kelsen, na mais bem sucedida tentativa de pureza metódica já alcançada pela ciência do direito, ousou desconsiderar que a realidade (social, política e moral) será sempre um limite intransponível para as decisões judiciais.

Como esse espaço de reflexão pretende harmonizar-se com o Direito Constitucional, alguém poderia nos confrontar legitimamente com a seguinte questão: se o sentido deste texto é que não existe atalho para a felicidade, então não seria correto afirmar que a Constituição de 1988 fez promessas em demasia?

A pergunta, contudo, é menos incômoda do que parece. De fato, a resposta tem menos a ver com o texto constitucional do que com aqueles que têm o poder-dever de implementá-lo. A Constituição brasileira de 1988 veio ao mundo como podia, isto é, paradoxalmente compromissória. Precisava veicular valores que representassem os mais variados grupos de interesses existentes em nossa sociedade, pois, do contrário, caso se identificasse ideologicamente com uma visão de mundo exclusiva, certamente atrairia a má vontade dos demais grupos de poder, o que certamente comprometeria a sua força normativa (Konrad Hesse).

Contudo, mais de 25 anos de sua promulgação, e nisso está o paradoxo, a vocação compromissória de nossa Constituição não deixou de revelar alguns efeitos deletérios, sendo o principal deles o fato de que sendo a Constituição “de todo mundo” muitas vezes é a Constituição “de ninguém”. Assim, uma das mais benfazejas virtudes de nossa Constituição tem se convertido num de seus mais difíceis e complexos problemas: precisamente por buscar representar o maior número de expectativas sociais, a Constituição não pode revelar identidade com nenhum dos grupos de interesses que conformam a nossa comunidade nacional e, com isso, acaba muitas vezes relegada à própria sorte.

Além disso, suspeito que por instituir em seu texto interesses e valores tão diversos como conflitantes, próprios de uma Constituição compromissória, especialmente voltada a uma sociedade complexa, a Constituição de 1988, infelizmente, conferiu às decisões judiciais uma péssima marca de distinção, que é a de parecer autorizar que quase tudo seja feito em seu nome. 

Os problemas, contudo, não são apenas de ordem prática e normativa. Do ponto de vista teórico, estamos numa névoa. Todos que se propõem a tarefa de estudar o Direito no Brasil ainda não conseguiram destacar da realidade jurídica que vivenciamos um sistema teórico minimamente coerente. Perguntas corriqueiras a qualquer experiência do direito comparado não conseguem aqui uma resposta adequada e direta. Aliás, não parecem alcançar nenhuma resposta. Por exemplo: quais os sinais ou características essenciais que de fato distinguem o Direito brasileiro? Quais os princípios e/ou métodos que o governam? Que lugar deve ocupar no Brasil os precedentes, nomeadamente num sistema que deveria ser de Direito estrito e escrito? Qual o papel que as regras e os princípios devem ter em nosso sistema de decisão judicial? Devemos mesmo, como já sustentam alguns e sem qualquer rubor, conferir prevalência às opções judiciais em detrimento das decisões políticas?

Não obstante, fosse necessário para a orientação dos atores jurídicos que essas questões recebessem dos tribunais e academia uma resposta minimamente coerente, para nada disso se tem encontrado respostas claras e diretas.

Num quadro de crescente e paradoxal indecisão sobre quem decide o quê, o Poder Judiciário vem assumindo com alegre desenvoltura o papel de tutor e às vezes de executor de algumas políticas públicas. Até mesmo a nossa Suprema Corte tem se curvado a essa novidade (vide o caso das prestações em matéria de saúde).

Apesar de assistir a tudo isso com indisfarçável admiração, busco eu próprio conferir alguma coerência à minha condição de magistrado e, não obstante a ressalva de meu ponto de vista pessoal, não considero justo negar ao jurisdicionado o que, considerada a jurisprudência predominante, ele encontraria em outros tribunais, especialmente quando se cuida de orientação jurisprudencial colhida das decisões dos nossos tribunais superiores.

Se o Poder Judiciário, contudo, quer um lugar de preponderância política, ele tem de assumir a responsabilidade por essa opção. O cidadão tem o direito de saber onde pode cobrar a responsabilidade — inclusive política — por suas alegrias e tristezas.

O judiciário não pode pretender o confortável lugar do bom mago, aquele que, nos contos de fadas, alcança a maravilha de produzir decisões que, parecendo não implicar custos ou dificuldades a ninguém, permite a todos viver felizes para sempre. Tem que aceitar que, ao assumir o poder das opções políticas primárias e das respostas que agradam/desagradam a população, deve também aceitar a responsabilidade pelo resíduo de dificuldade que implica e pressupõe toda escolha política. (Designo de política qualquer decisão que não se limita a aplicar uma decisão genérica e abstrata legalmente preexistente, mas que tem o sentido de inovar primariamente a ordem jurídica criando direitos e obrigações.)

A sociedade deveria aceitar, contudo, que o juiz, não sendo deus nem profeta, não pode revelar poderes mágicos para instituir ou predizer o paraíso entre nós. Onde quer que se atribua direitos a alguns, estar-se-á sempre pressupondo, ainda que isso não seja visível, custos e deveres a serem suportados por outros.

Se a Academia e parte da magistratura, por não aceitarem o lugar de coadjuvante do Poder Judiciário diante de políticas públicas, advogam uma espécie de juiz que, indo além do direito posto, deve realizar a mal explicada “justiça social” ou “justiça do caso concreto”, também não podem, para manter coerência, iludir o público, devendo prepará-lo para o incremento de técnicas e decisões que são, ainda que se negue, essencialmente políticas.

Quando a jurisdição desdenha o seu lugar de estrita e humilde aplicação dalegislação aos casos concretos, tem que fazê-lo com clareza de propósitos e honestidade institucional e, principalmente, tem que se submeter a um regime de responsabilidade política, isto é, de accountabiliy e aceitar submeter-se a algum crivo do eleitor/cidadão. A frontalidade é também uma virtude das instituições, não apenas dos indivíduos.

Entretanto, com Alexander Bickel, também creio que se pode esperar de uma instituição grave e serena como deve ser o Judiciário a virtude passivade quem deve reconhecer que alguns problemas e dificuldades da vida em sociedade ultrapassam em muito a esfera do direito para se situar em outros planos da ação e da comunicação humana, como é o caso da economia, da política, da moral, da arte, da educação e do amor (Niklas Luhmann).

Infelizmente, ao invés de incentivarmos a autocontenção da magistratura, tem-se assistido em nosso país a um discurso mal posto, que nasce na própria Academia, em que a “dificuldade contramajoritária” do Judiciário, de que falava Bickel, se transforma em “virtude”; e a “virtude passiva” dos juízes, defendida pelo mesmo grande jurista, vai sendo censurada como fraqueza institucional. Em termos mais simples, o juiz vai sendo convencido de que o seu déficit de representação democrática — a “dificuldade contramajoritária” referida por Bickel —, que deveria ser justificado com a autocontenção de suas “virtudes passivas”, é na verdade uma qualidade — uma virtude — que justifica a sua atuação ao largo das decisões e das políticas públicas democraticamente adotadas pelos que receberam o voto do eleitor (Executivo e Legislativo).

De fato, o que já não representa nenhum segredo, um vasto setor da Academia aceitou conjurar com a grande mídia, propugnado uma em tudo deletéria judicialização da política. Mas não se parou por aí. Como ninguém terá coragem de negar, é perfeitamente legítimo falar-se hoje de umajudicialização da saúde, judicialização da economia, judicialização da educação, judicialização moral e da família e até mesmo judicialização do amor[1]. Tudo isso exige, naturalmente, uma confiança em poderes verdadeiramente mágicos na atuação do Poder Judiciário. Contudo, a convicção de que exista uma inteligência última, uma teoria ou hermenêutica fundamental no direito, que permitiria ao magistrado, em cada caso concreto, com certeza e cientificidade, decidir pela única decisão correta em todos esses planos da vida (economia, administração da saúde, educação, moral, família e amor), apenas consegue nos tirar do chão da realidade, mas sem nos levar a lugar algum.

A única certeza de uma fantasia tão maravilhosa é, obviamente, a decepção. Isso certamente também explica por que o Poder Judiciário, não obstante a sua boa vontade e ânsia em responder a todos os azares da vida humana, ao contrário do que seria de esperar, vem, segundo pesquisas persistentes, perdendo legitimidade.

O Direito não pode dar lições para os outros subsistemas sociais. Não deveria ser difícil de compreender que onde a economia, a política, a ciência a moral e família, naquilo que é essencialmente seu, falharem, muito provavelmente o Direito não terá melhor sorte.

O código do direito (licitude/ilicitude) não é absoluto em relação aos demais códigos dos outros subsistemas da sociedade. Por isso, o Judiciário deveria se contentar com uma atuação residual, isto é, restrita ao que de fato, pela importância do conflito que não se resolveu naqueles outros sistemas, não pode permanecer sem decisão. Infelizmente, e não consigo entender por que, muitos enxergam no direito uma esfera de decisão total das dificuldades humanas.

Lembrando Richard Rorty e Milan Kundera, a verdade, hoje, de tão difusa e especializada em áreas distintas e diferenciadas, está muito mais para a narrativa de um romance, em que os personagens são aceitos e admirados precisamente por suas diferenças e idiossincrasias, do que para uma teoria filosófica sistematizada, lógica e totalizante.

No romance que cada sociedade escreve de si mesma, o juiz é apenas um personagem entre os muitos personagens existentes. Certamente, não é um deus nem profeta nem mago, e, na verdade, se a obra for bem estruturada, não deveria nem mesmo ter qualquer protagonismo. 

Alguns professores de direito, ou magistrados que pregam a predominância do papel do Poder Judiciário perguntariam: mas é só isso? Não. Se a tese das virtudes passivas de Alexander Bickel estiver, como penso, correta, quando o magistrado voltar a ocupar o seu lugar de prudente recato, é mais do que provável que a sociedade lhe reconhecerá a legitimidade da autoridade perdida.



[1] Recentemente, o respeitabilíssimo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decidiu prudentemente, a propósito de lide em que se discutia o tema dos danos morais por abandono afetivo, que “a obrigação civil de dar cuidado correspondente ao direito do filho à convivência familiar não se confunde com a obrigação de dar amor”. Contudo, aos fins a que se propõe essa distinção é de fato possível e mesmo desejável?



Néviton Guedes é desembargador federal do TRF da 1ª Região e doutor em Direito pela Universidade de Coimbra.



Revista Consultor Jurídico, 18 de novembro de 2014, 14h15

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Defensoria pede que Levy Fidelix pague R$1 milhão por declarações antigays



“DISCURSO DE ÓDIO”
Defensoria pede que Levy Fidelix pague R$ 1 milhão por declarações antigays

8 de outubro de 2014, 15h00


As declarações feitas por Levy Fidelix (PRTB) contra homossexuais geraram mais um questionamento na Justiça, dessa vez pelas mãos da Defensoria Pública de São Paulo. Uma Ação Civil Pública apresentada na última terça-feira (7/10) pede que o candidato à Presidência no primeiro turno e o partido dele paguem R$ 1 milhão de indenização por danos morais.

Em debate na Rede Record entre presidenciáveis, promovido em 28 de setembro, Levy (foto) foi questionado pela então candidata Luciana Genro (PSOL) sobre a aceitação de casais formados por pessoas do mesmo sexo. Ele respondeu que “aparelho excretor não reproduz” e defendeu a necessidade de que a maioria “enfrente” essa minoria.

“Este discurso de ódio é incompatível com o respeito à dignidade da pessoa humana, não só da pessoa, individualmente considerada, mas da dignidade de uma coletividade”, diz a petição inicial. A Defensoria quer que o dinheiro da indenização seja aplicado em ações de promoção da igualdade do público LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais). Também pede que Levy e seu partido banquem custos de um programa que promova os direitos dessa população.

“A fala do candidato nitidamente ultrapassou os limites da liberdade de expressão para incidir em absurdo discurso de ódio”, afirma a defensora Vanessa Alves Vieira, coordenadora do Núcleo de Combate à Discriminação, ao Racismo e ao Preconceito. “A externalização do preconceito, em especial por um meio de comunicação com ampla repercussão como a televisão, perpetua o tratamento discriminatório e pode produzir efeitos nocivos, como violações a direitos fundamentais e atos de violência”.

Levy nega ter feito declarações homofóbicas. Em entrevista ao Estado de S. Paulo, ele disse que apenas defende a “família tradicional”, mas “sem agressividade” a ninguém, e declarou-se vítima de perseguição por parte de algumas instituições.

Outras críticas
A Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasilchegou a pedir que o Tribunal Superior Eleitoral cassasse a candidatura de Levy Fidelix, mas a solicitação acabou prejudicada porque ele não passou para o segundo turno na eleição do último domingo (5/10). A comissão também enviou pedido de providências ao Ministério Público Eleitoral, ainda sem resposta.

Luciana Genro e o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) também apresentaram representação ao TSE. Com informações da Assessoria de Imprensa da Defensoria Pública de São Paulo.

Clique aqui para ler a petição.


Revista Consultor Jurídico, 8 de outubro de 2014, 15h00

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Cooperação inédita com TRTs contribui para melhora no desempenho do TST


Cooperação inédita com TRTs contribui para melhora no desempenho do TST






Ao encerrar o primeiro semestre judiciário de 2014, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Barros Levenhagen, ressaltou a melhoria no desempenho processual do Tribunal, que, apesar de ter recebido maior número de processos em relação ao mesmo período no ano anterior, conseguiu aumentar a quantidade de processos julgados. O presidente destacou que foram julgados 123.392 processos, o que representa 4,7% a mais que no primeiro semestre de 2013.

Parceria inédita

Parte deste desempenho é atribuída pelo ministro Levenhagen a uma parceria inédita firmada entre o TST e 16 Tribunais Regionais do Trabalho por meio de acordo de cooperação técnica pelo qual 16 desembargadores passaram a receber, a partir de 12 de maio, cem processos por semana cada um, totalizando, até agora, 11.200 agravos de instrumento distribuídos. O objetivo principal é o de baixar o número de agravos de instrumento em recursos de revista (AIRRs), classe processual mais numerosa no TST.

O ineditismo do acordo, esclarece o ministro, está no fato de os desembargadores permanecerem em seus estados de origem, deslocando-se para o TST apenas uma vez por mês para julgamento dos agravos. O trabalho à distância reduziu drasticamente a despesa do TST se este adotasse o sistema convencional de permanência de magistrados por 30 dias seguidos, mediante pagamento de diárias corridas e necessidade de obras para acomodação dos convocados. Com a medida, já há registro de diminuição de 47% dos processos autuados e distribuídos aos ministros.

Neste semestre, o TST recebeu 152.988 processos, 6,9% a mais que no mesmo período em 2013. Cada ministro recebeu, em média, 4.874 processos e julgou 4.788. No total, foram distribuídos 104.566 processos, 0,7% mais que em 2013.

Consistência

Para o ministro Levenhagen, o aumento na quantidade de julgados não significa prejuízo na consistência nas decisões. "Embora tenhamos consciência do nosso dever de imprimir celeridade aos julgamentos, não podemos perder de vista que as decisões têm que ser consistentes", afirmou. "Somos magistrados, e não é admissível que um magistrado imprima celeridade em detrimento da qualidade que sempre notabilizou as decisões do TST".

Ainda segundo o presidente, os dados estatísticos revelam que, em decorrência do esforço concentrado dos ministros e do aumento de AIRRs julgados pela Presidência, houve um desempenho processual maior no TST, se comparado ao do exercício anterior.

Compromisso

O ministro lembrou que assumiu a Presidência com o compromisso de dar ênfase à atividade fim do Tribunal, e que vem tomando as providências para aumentar a quantidade de julgamentos de AIRR de forma a reduzir o estoque de processos. O ministro informou que, no primeiro semestre, a Presidência julgou 42,3% mais AIRRs que no mesmo período de 2013 e afirmou que, no segundo semestre, o aumento na produtividade poderá ser ainda maior.

Dados da Coordenadoria de Estatística e Pesquisa apontam que o tribunal deverá julgar mais de 160 mil processos no próximo semestre, representando aumento de mais de 30% em relação ao primeiro semestre. "Esses dados são alvissareiros no sentido de que o TST terá um resultado positivo na diminuição do acervo processual existente no exercício de 2015", avalia o presidente.

PJe

Levenhagen informou que o Processo Judicial Eletrônico (PJE) poderá estar implantado em todos os órgãos fracionários do TST até fevereiro de 2015. Mas ressaltou que a transição será progressiva para que todos os ministros possam se inteirar do sistema. Segundo ele, os primeiros órgãos a adotarem o PJE serão a Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC), a Subseção 2 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) e o Órgão Especial. 

(Pedro Rocha e Carmem Feijó. Foto: Fellipe Sampaio)

Fonte: TST

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Um basta à perversidade da jurisprudência defensiva


Um basta à perversidade da jurisprudência defensiva

Por José Rogério Cruz e Tucci


Retorno ao tema atinente aos malefícios experimentados pelos jurisdicionados que são vítimas da famigerada jurisprudência defensiva. É certo que determinados óbices à admissão dos recursos aos tribunais superiores são fruto de construção engenhosa, que guardam certa coerência hermenêutica com as regras processuais em vigor.

Todavia, há, em significativo número, outras barreiras que mais se identificam à “perversidade pretoriana”, as quais não têm qualquer razão plausível para subsistirem no âmbito de um ordenamento jurídico civilizado, comprometido com a efetividade da tutela jurisdicional.

Dentre estas, descortina-se inconsistente a que aplica, por analogia, a Súmula 284/STF, para não conhecer recurso extraordinário ou especial, na hipótese de o recorrente deixar de apontar, de forma explícita, o permissivo constitucional em que lastreada a impugnação (v., p. ex. a recente decisão no Ag. em REsp. n. 390.160-SP: “... Correta a decisão agravada, porquanto, verifica-se que, quando da interposição do recurso especial, não foi indicado o permissivo constitucional que embasa o recurso, de modo a esbarrar, por analogia, no óbice constante da Súmula 284/STF”).

Ressalte-se que esta orientação, como ocorre na generalidade das vezes nas quais vem aplicada a denominada jurisprudência defensiva, evidencia que o direito material do recorrente não tem a menor relevância para o tribunal.

Entendo, com o devido respeito, que tal posicionamento representa inarredável denegação de jurisdição. Realmente, no que toca ao STJ — o autodenominado “Tribunal da Cidadania” —, a despeito de alguma flexibilização observada nos últimos tempos, continua ele se valendo de questiúnculas e estratagemas, no afã de afastar o julgamento do mérito do recurso, em detrimento de sua missão constitucional em prol da unidade da aplicação do direito federal.

E, ainda pior, é que na situação acima aludida, além de afastar-se da própria jurisprudência dominante no tribunal, delineia-se equivocada a incidência da Súmula 284/STF.

Com efeito, entre muitos outros (v. g.: EDecl no REsp n. 974.304-PR e AgRg no REsp n. 845.134-SP), importante julgamento da Corte Especial, nos Embargos de Declaração no Recurso Especial 72.075-RS, decidiu, de forma clara e precisa: “... Ainda que o recorrente não tenha mencionado expressamente que a pretensão recursal estava fundada na alínea ‘a’, restou inequivocamente demonstrado que a irresignação ventilada visava a atacar contrariedade a dispositivo de lei federal porventura existente no acórdão recorrido...”.

Ora, diante de tal contexto, no qual sobressai inarredável divergência intra muros, a duplicidade de entendimento quanto a esta questão infunde manifesta insegurança jurídica. Na verdade, a harmonia dos precedentes judiciais, além de constituir precioso elemento de confiança no Poder Judiciário, tem enorme repercussão na sociedade, porque uma conduta uniforme de julgar confere estabilidade aos conceitos e às relações jurídicas. Não há conspiração maior contra a previsibilidade e a segurança do direito do que as repentinas e inusitadas alterações da jurisprudência!

A respeito deste crucial problema, o saudoso ministro Humberto Gomes de Barros asseverou, em conhecido pronunciamento, que: “O STJ foi concebido para um escopo especial: orientar a aplicação da lei federal e unificar-lhe a interpretação, em todo o Brasil. Se assim ocorre, é necessário que sua jurisprudência seja observada, para se manter firme e coerente. Assim sempre ocorreu em relação ao STF, de quem o STJ é sucessor, nesse mister. Em verdade, o Poder Judiciário mantém sagrado compromisso com a justiça e a segurança. Se deixarmos que nossa jurisprudência varie ao sabor das convicções pessoais, estaremos prestando um desserviço a nossas instituições. Se nós — os integrantes da Corte — não observarmos as decisões que ajudamos a formar, estaremos dando sinal, para que os demais órgãos judiciários façam o mesmo. Estou certo de que, em acontecendo isso, perde sentido a existência de nossa Corte. Melhor será extingui-la” (Corte Especial, Agr. Reg. nos Emb. Div. no REsp. 228.432-RS).

Ademais, não há se confundir, por óbvio, fundamento legal com fundamentação jurídica dos arrazoados forenses, inclusive, por certo, das razões recursais. Vale aqui transcrever o enunciado da Súmula 284/STF: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.

Desse modo, dúvida não há de que a ausência de indicação da alínea em que lastreado o recurso (fundamento legal) não se confunde com a falta de alusão ao dispositivo reputado contrariado.

Na primeira circunstância, mesmo perante o STJ, sem embargo da eventual clareza das razões recursais, incide o princípio iura novit curia, o qual não se aplica na ausência de indicação da norma federal tida como contrariada.

Nesta segunda hipótese, o STJ tem jurisprudência consolidada, como se infere, por exemplo, do julgamento proferido no Recurso Especial 475.043-MG, de relatoria do ministro Hamilton Carvalhido, no qual o respectivo acórdão invoca corretamente a Súmula 284/STF, textual: “Não se conhece de recurso especial pela alínea ‘a’ do permissivo constitucional quando o recorrente restringe-se em afirmar que o acórdão teria violado lei federal, sem indicar, especificamente, qual o artigo da lei federal tido como violado”.

Tal situação, no entanto, como fácil de perceber, não se identifica com a hipótese supra mencionada, na qual o referido enunciado sumulado não pode ser aplicado.

Suponha-se que, deixando de explicitar o permissivo legal, o recorrente de forma enfática deduz, nas razões recursais, a violação a determinado artigo de lei federal infraconstitucional. É evidente que, neste caso, não há interpretação analógica que autorize a incidência da Súmula 284.

Importa lembrar que no prenúncio de um novel diploma processual, no qual, durante toda a sua respectiva tramitação legislativa, procurou-se exterminar, de uma vez por todas, o formalismo exagerado e as decisões surpresa, visando, em última análise, a valorizar o acesso à ordem jurídica justa.

Como bem frisado por Márcio Carvalho Faria (O novo CPC vs. A jurisprudência defensiva, Revista de Processo, v. 210, p. 264), “de nada adianta um intrincado sistema de garantias processuais e uma variada gama de instrumentos processuais se o direito material, principal escopo da ciência processual, não puder ser alcançado”.

Não é, por certo, pela dizimação heterodoxa — e até desesperada — do número de recursos que será atendido o princípio fundamental da duração razoável do processo!






José Rogério Cruz e Tucci é advogado. Ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo. Diretor e Professor Titular da Faculdade de Direito da USP.
Revista Consultor Jurídico, 24 de junho de 2014, 08:00h

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Acesso facilitado ao Supremo atrasa Justiça, diz Roberto Barroso

O acesso facilitado ao Supremo Tribunal Federal atrasa a Justiça do país. A opinião é de Luís Roberto Barroso, ministro da própria corte. "A gente perde muito tempo com coisas irrelevantes", disse, acrescentando que muitos casos deveriam ser julgados e encerrados em 2ª instância. As afirmações foram feitas ao jornalista Mário Sérgio Conti, em programa no canal GloboNews.
Ministro do STF há quase um ano, Barroso (foto) disse também que o fato de o país ser hierarquizado e dividido em classes reflete no comportamento do Judiciário. “A Justiça, sobretudo a Justiça Penal brasileira, é dura com os pobres e mansa com os ricos, embora ache que temos feito um esforço civilizatório relevante para sair deste atraso. Temos andado na direção certa, embora não na velocidade desejada”.
Sobre as manifestações que voltaram a ocupar as ruas das cidades brasileiras com maior intensidade, Barroso afirmou que elas nascem da incapacidade do Estado de atender demandas da população. “Ela [sociedade] quer serviços públicos de qualidade, mais ética na política, melhor perspectiva de futuro.”
Para Barroso, no entanto, não deveria haver espaço para violência nas manifestações. “Onde há democracia, e, apesar de todas as deficiências, nós somos uma democracia, a violência não se justifica”.

Revista Consultor Jurídico, 25 de maio de 2014, 15:12h

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Advogado faz perito levar choque para desmentir testemunho

Advogado faz perito levar choque para desmentir testemunho

 
No banco das testemunhas, o perito em eletricidade, identificado nos autos como Dr. A.P. Meliopoulos, prestava esclarecimentos técnicos em uma disputa de dez anos entre fazendeiros criadores de gado e uma companhia de eletricidade de Utah, nos EUA. Os fazendeiros acusam a companhia de fazer com que seu gado leiteiro tome choques constantemente, por causa da dispersão de corrente elétrica no solo, a partir de sua linha de transmissão.
Ao ser questionado pelo advogado dos demandantes, o perito da companhia de eletricidade ridicularizou o dano que qualquer dispersão de corrente elétrica no solo poderia causar ao gado leiteiro. “A corrente parasita é tão fraca que equivale à energia de uma pilha AAA, de apenas 1,5 volt. Ela não é sentida, nem mesmo por um ser humano”, testemunhou Meliopoulos.
O advogado Don Howarth, representando os fazendeiros, alegou que não é bem assim e propôs um teste. Mostrou a Meliopoulos uma caneta — uma espécie de caneta elétrica de brinquedo, inventada recentemente para emitir choques — durante o que foi descrito pelo juiz James Brady como “uma inquirição cruzada agressiva”:
“O senhor acabou de dizer aos jurados que, se fecharmos o circuito de uma pilha AAA, o senhor sequer sentiria qualquer choque, certo? Isso aqui é uma caneta, na qual eu coloquei uma bateria AAA. Se o senhor pressionar a parte de cima da caneta o circuito vai se fechar. O senhor gostaria de testá-la, para ver se sente o choque da bateria AAA?”, entregando a caneta ao perito. “Vá em frente, pressione o botão da caneta e diga ao júri se sentiu ou não um choque”, acrescentou.
O perito concordou, sem titubear. Levou um choque que o fez se mexer bruscamente na cadeira e deixar a caneta cair. Não precisou dizer aos jurados o que sentiu. Todos viram.
No entanto, havia um componente “perverso”, que o juiz descobriu mais tarde, ao examinar a atitude do advogado e as possibilidades de punição a ele. O juiz descreveu a caneta, na decisão em que mandou o advogado pagar uma multa de US$ 3 mil — US$ 1 mil para o perito e US$ 2 mil para a outra parte, a companhia de eletricidade. Embora seja alimentada por uma pilha de 1,5 volt, a caneta elétrica tem um transformador interno que pode gerar até 750 volts. “Uma voltagem que pode até causar a morte de uma pessoa com saúde ruim”, escreveu.
Segundo o juiz, a embalagem da caneta declara que o dispositivo não é recomendado para adultos com mais de 60 anos e crianças com menos de 12 anos, e para qualquer pessoa com saúde ruim. Meliopoulos tem mais de 60 anos e Howarth não lhe fez perguntas sobre o estado de sua saúde.
O juiz levantou a questão da “agressão à testemunha” e afirmou que “o tribunal tem o poder de sancionar um advogado por contato nocivo ou ofensivo com a testemunha”.
Ele escreveu: “Uma testemunha tem o direito de estar segura e protegida contra agressões ou intimidação física. Se o senhor Howard tivesse informado à corte que iria aplicar um choque no Dr. Meliopoulos, isso não seria permitido. Testemunhas são chamadas para responder a perguntas, podendo ser testadas suas qualificações, memória e credibilidade. E também para conferir seus depoimentos anteriores e explicar quaisquer inconsistências”.
E continuou: “Acrescentar a exigência de que façam isso, em um ambiente hostil, onde podem se sujeitar a choques elétricos sem advertência prévia, está muito longe do decoro e do profissionalismo requerido dos advogados e não pode ter lugar em uma sala de julgamento”.
O advogado Jefferson Gross, de Salt Lake City, que também representou os fazendeiros, disse que Howarth vai recorrer, porque a decisão do juiz não faz sentido. “Essa caneta é um brinquedo de crianças”, ele disse ao jornal da ABA (American Bar Association). “Ela transmite apenas um choque leve. A única coisa forte nela é o elemento surpresa”, afirmou.
Os advogados da companhia elétrica pediram ao juiz que cancelasse a autorização especial que o tribunal concedeu a Howarth, que é da Califórnia, para atuar no caso em Utah. O juiz negou o pedido. Mas impôs limitações à atuação do advogado nas próximas inquirições cruzadas do julgamento.
 
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 15 de maio de 2014

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Ministro Roberto Barroso defende ativismo judicial na abertura de seminário no CJF

Na palestra de abertura do seminário Teoria da Decisão Judicial, realizada quarta-feira (23) na sede do Conselho da Justiça Federal (CJF), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Roberto Barroso (foto) defendeu o ativismo judicial e disse que a figura do juiz tradicional está historicamente superada.
 
Segundo o magistrado, a cada dia é mais importante que o julgador, ao tomar sua decisão, também observe fatores culturais, sociais e políticos, e não apenas a legislação vigente. A mesa da conferência foi presidida pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Villas Bôas Cueva, coordenador científico do evento.
 
“As pessoas enxergam o mundo de diferentes pontos de observação. As coisas têm a cor da lente de quem olha. E quem convive com o direito deve saber que não há verdade plena. A decisão judicial é um ato político, porque é uma escolha, dentro das possibilidades de julgamento existentes. O juiz tem o dever de prover uma solução justa e correta dentro da sua perspectiva. O juiz precisa estar atento aos precedentes, além de zelar pela coerência e integridade. As partes têm direito a juiz isonômico”, afirmou o ministro do STF.
 
Mudanças de paradigma
 
Para uma plateia formada por mais de 300 pessoas, Roberto Barroso apontou três grandes mudanças de paradigma que revolucionaram o direito nos últimos anos: a superação do formalismo jurídico, pois antes a lei era a expressão da justiça; o advento de uma cultura pós-positivista, que aproximou o direito da filosofia moral e política; e a passagem da Constituição para o centro jurídico, como efeito da publicidade dada ao direito na atualidade.
 
“Tudo isso produz um impacto na interpretação jurídica. A vida ficou mais rica, mais complexa e mais plural. Existe uma pluralidade de normas vigentes. Para lidar com esses fatos novos, o direito constitucional criou novas categorias. A norma já não traz mais em si a solução do problema, e sim apenas o início dela. Os fatos passam a fazer parte da norma. Por isso a argumentação jurídica se tornou tão importante. O direito perdeu muito da objetividade com a qual saiu do século 20”, disse Roberto Barroso.
 
Na opinião do ministro, há três causas para o surgimento de casos complexos e difíceis de julgar nos dias de hoje: a ambiguidade da linguagem jurídica; a existência de desacordos morais razoáveis na sociedade, já que as pessoas pensam de maneira diferente; e a colisão de direitos fundamentais. “Vivemos um fenômeno amplo de judicialização da vida”, completou o palestrante. De acordo com ele, por conta desse contexto, há uma transferência indireta de atribuições dos Poderes Legislativo e Executivo para o Judiciário.
 
Normatização
 
Roberto Barroso também destacou que esse fenômeno resulta da existência de uma Constituição ampla – que normatiza várias questões – e de um sistema de controle em que todos os juízes podem interpretá-la. “A judicialização e um grau moderado de ativismo judicial tem servido positivamente para o nosso país”, afirmou o ministro.
 
Para exemplificar essa situação, ele citou alguns dos casos mais complexos julgados pelo STF nos últimos anos que resultaram na normatização de questões não previstas na Constituição.
 
Nesse sentido, o ministro avaliou os julgamentos que colocaram em discussão os seguintes temas: união estável homoafetiva, aborto de anencéfalo, nepotismo, perda de mandato de parlamentar condenado judicialmente, financiamento de campanha política por empresas, entre outros assuntos. “O juiz não cria o direito. A ideologia do juiz também define a decisão”, concluiu Barroso.
 
Seminário
 
Promovido pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do CJF, em parceria com a Escola Nacional de Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e com a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), o seminário Teoria da Decisão Judicial acontece até sexta-feira (25), no auditório do CJF.
 
O evento tem o objetivo de propiciar a reflexão sobre a estrutura, a elaboração e o impacto das decisões judiciais, e sobre como os operadores do direito vêm tratando as questões que permeiam a construção das decisões judiciais.
 
Fonte: STJ

quarta-feira, 16 de abril de 2014

CRÍTICAS À DECISÃO NÃO DEVE SER RECEBIDA COMO ATAQUE AO JUIZ

Crítica à decisão não deve ser recebida como ataque ao juiz

 
A experiência revela que todos aqueles que de alguma forma estão comprometidos com a ciência jurídica — desde os juristas até os operadores do direito — são provavelmente os profissionais mais expostos à constante tensão dialética. O dia a dia destes é, em regra, marcado pela argumentação na defesa de um determinado ponto de vista, seja no âmbito científico, seja no da praxe forense.
É evidente que, em tais contextos, não raro, emergem do debate muitas teses e antíteses acerca de divergentes aspectos legais, baseados em diferentes exegeses e percepções.
A construção de boa doutrina pressupõe o exame analítico de teorias que, a seu turno, foram sendo sedimentadas ao longo do tempo, mas que, pela inexorável evolução do conhecimento, tendem a dar lugar a novos paradigmas. No ambiente acadêmico, diante das múltiplas opções hermenêuticas, é muito comum a existência de crítica construtiva, em prol do contínuo aperfeiçoamento da dogmática. Aduza-se que a dialética científica, ínsita à própria noção de universidade, é pautada pela mais absoluta liberdade de expressão, apenas encontrando limite no respeito mútuo que sempre se recomenda prevalecer, em prol do convívio harmônico dos atores da vida universitária.
A propósito, bem destacou Miguel Reale Júnior: “Só ao revelarmos respeito ao diálogo e à tolerância podemos reclamá-los do nosso interlocutor. E assim, iremos recolher o reconhecimento da comunidade científica, por mostrar que a coragem reside muitas vezes na prudência para abrir caminhos e não na temeridade de obstruí-los”!
Este mesmo fenômeno se passa na órbita da prática jurídica.
Além da argumentação colidente dos litigantes em todas as fases do processo, a sentença, a exemplo da lei e da doutrina, também pode ser alvo de crítica — às vezes veemente — nas razões de apelação. Ao prover o recurso, o tribunal, de forma explícita ou implícita, censura igualmente o ato decisório monocrático.
Situação análoga ocorre em relação aos tribunais, pelas cortes superiores. Até mesmo a decisão de presidente de tribunal, por exemplo, pode muito bem ser cassada pelo Superior Tribunal de Justiça. Como restou assentado em acórdão da 2ª Turma, no julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 1.264.053, proveniente do TJ-SP: “1. A matéria agitada no recurso especial, cuja caminhada foi obstada, merece ser reapreciada no âmbito desta Corte de Justiça. Diante disso, necessário se faz determinar a subida do recurso especial, sem prejuízo do juízo de admissibilidade definitivo que será oportunamente realizado neste tribunal. 2. Ademais, o despacho de admissibilidade negativo, exercido pelo tribunal de origem, é extremamente genérico. Este fato, por si só, prejudica o exercício do direito de defesa da parte, que fica impossibilitada de compreender quais os pontos específicos que obstaram a subida do apelo...”. De aduzir-se que, no corpo desse importantíssimo aresto, de relatoria do ministro Humberto Martins, lê-se que: “... Por fim, não custa lembrar que quando o tribunal de origem afirma que os fundamentos do recurso especial não são suficientes para infirmar as conclusões do acórdão, ele acaba por adentrar na questão de fundo e a exercer juízo de valor que compete a esta corte superior...”.
Ora, toda esta circunstância é perfeitamente compreensível em razão da estrutura hierárquica da organização judiciária desenhada em nossa Constituição Federal.
Esta é a regra do jogo! Qualquer que seja o fundamento da reforma do pronunciamento judicial, os magistrados inferiores convivem diuturnamente com o sistema, sem levar (ou não devendo levar) para o lado pessoal...
Ademais, a produção decisória dos tribunais — jurisprudência —, como importante fonte do direito, não está infensa à crítica social. Já tive oportunidade de escrever, em antigo ensaio, que o exame realizado difusamente pela sociedade sobre a fundamentação dos atos decisórios constitui a mais preciosa forma de controle externo do Poder Judiciário.
Invoco, a respeito, a grandiosa obra de Theotonio Negrão, verdadeira bússola dos operadores do direito, na qual mantido fecundo diálogo crítico com os precedentes judiciais, sem diminuir, sob a perspectiva subjetiva, qualquer tese pretoriana minoritária.
Ocorre que, mais recentemente, como tenho observado, a crítica científica formulada aos atos decisórios, monocráticos ou colegiados, tem ferido a suscetibilidade de alguns magistrados, tendendo a confirmar o dito popular de que: “assim como Deus, o juiz nunca falha”!
É interessante notar que, a despeito da elegância, da objetividade e do espírito construtivo do argumento antagônico à posição sustentada na decisão judicial, a retaliação do subscritor desta, em algumas ocasiões, é patente e até exagerada, visto que passa a considerar o autor da crítica como seu potencial inimigo!
Fruto de insegurança, sem dúvida, a resistência à crítica séria se traduz em ausência de humildade, a demonstrar falta de tirocínio, uma vez que, pelos motivos acima expostos, a atuação do juiz sempre se encontra exposta a adversidades inerentes ao crivo dos demais protagonistas do processo e, em geral, da sociedade.
Relembro, para finalizar, a arguta observação de Calamandrei, no artigo intitulado “O sono do juiz como motivo de nulidade do julgamento”. Enquanto na Alemanha, a questão teve de ser levada à Suprema Corte; na Itália, o senso prático acaba prevalecendo, de modo que o advogado, em sua sustentação oral, simplesmente aumenta o tom da voz: “o juiz logo se recompõe e saem do tribunal amigos como sempre”.
Não custa enfatizar: apesar da possível crítica à orientação adotada num julgado, em qualquer hipótese, a admiração e o respeito ao magistrado continuam intangíveis!
 
José Rogério Cruz e Tucci é advogado. Ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo. Diretor e Professor Titular da Faculdade de Direito da USP.
Revista Consultor Jurídico, 15 de abril de 2014

terça-feira, 15 de abril de 2014

DOUTRINA SE CONCENTRA EM LUTA DE INTERPRETAÇÃO E ARGUMENTOS

Doutrina se concentra em luta de interpretações e argumentos

 
O direito é o único campo do conhecimento em que o autor não é chamado de autor, mas de doutrinador. Mas por quê? O que está por trás desta diferença de nomenclaturas? Em que medida isso impacta na forma como o direito é concebido pelos diversos profissionais?
Não quero fazer uma digressão histórica sobre quando começou o uso do termo ou sobre as raízes jurídicas remotas dele. A análise histórica me ajudaria a entender a origem, mas não o motivo pelo qual ainda se reproduz a ideia de “doutrinador”. A minha análise se aproxima mais da sociologia do que da história, ao menos da história (mal) contada pelos juristas (que se aventuram em relatar fatos históricos a partir de outros juristas, e assim por diante).
O fato é que a palavra “doutrinador” traduz uma forte autoridade pelo que se escreve. Quem é doutrinador carrega uma doutrina, um dogma, isto é, um ponto de partida inquestionável. Sob a aura de um pretenso saber técnico que lhe permite afirmar o que pretende, o doutrinador é visto como uma pessoa quase sobrenatural. Pelo fato de escrever um livro ou publicar um artigo, é adjetivado como “ilustre”, “festejado”, “renomado”, etc.
Não é por acaso que a doutrina deve ser tradicionalmente exposta num esquema pré-existente, que reforça a validade do doutrinador em relação ao que ele escreve. Por exemplo, não é incomum encontrar um livro de direito que obedece à seguinte sequência: i) introdução; ii) evolução histórica; iii) conceitos; iv) fontes do direito; v) princípios; vi) conteúdo efetivo; vii) considerações finais. Trata-se de um paradigma que não ajuda muito a entender o direito atual!
Além do esquema quase sempre obedecer a esta sequência lógica, as teorias e a transformação social são frequentemente apresentadas nos textos a partir de uma dialética simplista tendente à consensualidade. Por exemplo, no direito penal existe a teoria objetiva do crime (teoria A) e, no lado diametralmente oposto, existe a teoria subjetiva do crime (teoria B). Além disso, após a formulação das teorias A e B, uma pessoa iluminada criou a teoria objetiva-subjetiva (teoria C ou teoria mista). E assim, de evolução em evolução, o mundo é apresentado como um caminho rumo ao consenso da teoria mista. Sem falar nos doutrinadores que chegaram atrasados, mas querem “doutrinar”, e escrevem a teoria D, que basicamente nega a existência de crimes nas sociedades contemporâneas.
Outra característica da doutrina jurídica é justamente o fato dela se concentrar num mero conflito de interpretações e argumentos. Toda interpretação e argumento têm interesses por trás, e todo interesse tem valores que lhes dá sustentação. Essa é a regra básica da negociação, por exemplo. Porém, ao se concentrar apenas na discussão superficial da ponta do iceberg (interpretações e argumentos), a doutrina jurídica não revela os verdadeiros interesses e valores que orientam a defesa de um lado ou de outro. Afinal, eu posso defender as pesquisas com células-tronco porque eu acredito que isso trará melhorias aos seres humanos, mas o meu interesse também pode ser porque a minha esposa tem um laboratório que lucraria muito com isso. Ao focar somente no lícito, ilícito, constitucional, inconstitucional, certo, errado, perde-se a grande chance de se pensar os problemas jurídicos de maneira mais aprofundada do que o mero conflito de opiniões. Interpretações e argumentos são importantes, mas não bastam. Precisamos saber os interesses por trás das posições.
Obviamente, este vício encontra ampla aderência no campo do direito. Ao se fundarem neste caráter sacro dos doutrinadores – assim como fazem com a famosa “intenção do legislador” -, os profissionais do direito tendem a reproduzir uma visão caricatural dos problemas jurídicos numa (falsa) confiança de que o doutrinador, em razão de sua suposta autoridade, pode ser a chave para a compreensão do mundo.
É inegável que há doutrinadores que buscam ir além disso e produzem um conhecimento realmente aprofundado, empírico e denso. Há outros que até se recusam a serem chamados assim e defendem que o conhecimento do direito deve superar a discussão sobre o “dever ser”. Assim, este artigo não tem qualquer pretensão de generalização e seria leviano de minha parte fazê-lo. Porém, torna-se especialmente relevante uma ruptura de paradigma no direito, em que o doutrinador seja visto e concebido como um humano-autor e que haja um maior senso de autonomia e coragem por parte dos profissionais do direito na produção do conhecimento.
 
Felipe Asensi é advogado e professor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV Direito Rio).
Revista Consultor Jurídico, 15 de abril de 2014

segunda-feira, 14 de abril de 2014

"NÃO EXISTE DEMOCRACIA COM INTOLERÂNCIA", DIZ CÁRMEN LÚCIA


"Não existe democracia com intolerância", diz Cármen Lúcia

 
A ministra Carmen Lúcia do Supremo Tribunal Federal conclamou sociedade a ser mais tolerante para assim ser possível exercer a democracia de fato. A afirmação foi feita durante conferência magna de encerramento das atividades do Congresso Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil. A conferência encerrou o evento que aconteceu no Cine-Theatro Central de Juiz de Fora nessa quinta e sexta-feira (10 e 11 de abril) e apresentou seis painéis sobre diversos temas ligados à advocacia. 
Segundo a ministra, “não existe democracia com qualquer tipo de intolerância. Precisamos amadurecer nossa democracia para, enfim, exercê-la de fato. É preciso que a sociedade se constitucionalize, com um movimento que demonstre que sabe quem é e para onde quer ir. É preciso trabalhar para se ter o Brasil que se merece”, afirmou.
Disse ainda que estamos vivendo um momento peculiar. “Cada geração quer o melhor para si e para as gerações que virão. O que era justo para meus bisavós, pode não ser para mim. Uma sociedade deve saber e buscar o que é justo para si. Os senhores me pagam, enquanto cidadãos, para que eu exerça essa justiça. Cada cidadão deve pensar sobre si mesmo, com o outro e sobre o outro, para amadurecer a ideia de que sociedade temos e qual queremos ter. E ainda devemos entrar no mérito de qual sociedade merecemos pelo que fazemos”, propôs.
No início do evento, foi exibido o vídeo oficial de promoção da XXII Conferência Nacional dos Advogados, que acontecerá de 20 a 23 de outubro de 2014 no Rio de Janeiro, e deve reunir mais de 20 mil profissionais e estudantes. Nesse intuito, o Congresso Nacional da OAB serviu para conferir os ajustes finais no temário da Conferência.
Carmen Lúcia ainda recebeu de Silva Chaves, em nome do presidente da OAB Nacional, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, uma placa em homenagem aos trabalhos jurídicos prestados ao país.
Compuseram a mesa os membros honorários vitalícios da OAB, Marcelo Lavenère e Roberto Antônio Busato; o presidente da seccional mineira, Luis Claudio Silva Chaves; o conselheiro federal pela OAB-MG, Paulo Roberto de Gouvêa Medina; o vice-presidente da Caixa de Assistência aos Advogados da OAB-MG, Wagner Parrot; a secretária-geral da OAB-MG, Helena Delamônica; e a presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-MG, Valquíria Valadão. Com informações da Assessoria de Imprensa do Conselho Federal da OAB.
Revista Consultor Jurídico, 14 de abril de 2014

quinta-feira, 3 de abril de 2014

5 ATITUDES PARA CONSEGUIR ESTUDAR MAIS EM MENOS TEMPO

atitudes para conseguir estudar mais em menos tempo

Perdendo tempo precioso de estudo com distrações? Veja as dicas para ajustar o foco e tornar as horas em frente aos livros bem mais efetivas

Size_80_camila-pati
,
 
 
 
Getty Images
homem estudando em biblioteca
Homem estudando: assuntos complexos forçam a mente a trabalhar mais, comece por eles, indica a especialista
São Paulo – Basta sentar-se à mesa rodeado de apostilas e livros para se dar conta de que a dedicação aos estudos para concursos públicos exige um poder de concentração para lá de afiado.

Na base da falta de foco estão velhos e novos vilões. O som hipnotizante da televisão, o toque repetitivo do celular, redes sociais e aplicativos de mensagens (como o WhatsApp) são alguns deles.

No entanto, vencê-los é apenas questão de (muita) força de vontade. Afinal, basta apertar o botão desligar para ter a certeza de não ser interrompido.
Mas e quando é o pensamento que insiste em voar longe levando o concurseiro a adiar a leitura de uma doutrina do Direito ou a resolução daqueles exercícios “cascudos” de raciocínio lógico?
Se a raiz da distração está fincada dentro da sua cabeça, algumas atitudes antes e durante o período de estudos podem ajudar. Veja o que Juliana Pivotto, sócia diretora da Nova Concursos, sugere para aumentar o poder de concentração e conseguir estudar mais em menos tempo.
Antes
1 Preste atenção ao fluxo de respiração
Sim, investir 2 minutos da sua atenção (apenas) no ritmo da respiração pode ser decisivo para baixar a ansiedade e melhorar a concentração.
“É um exercício simples, que dá para fazer em casa e baixar a adrenalina”, diz Juliana. Experimente alongar o tempo de inspiração e, sobretudo, o de expiração durante estes minutos.

2 Foque em um ponto estático

 

O esvaziamento da mente é um dos pressupostos da meditação cujo objetivo é conectar o praticante ao momento presente. Seus benefícios para ativar a capacidade de foco são propagados há milhares de anos.
Para se ter uma ideia, na época do julgamento do mensalão, o então ministro do STF, Ayres Britto, contou que 30 minutos diários de meditação bastavam para encarar com serenidade a pressão e a pesada carga de trabalho.
Nunca tentou? Para começar, imagine, por alguns minutos, a chama de uma vela e tente controlar o movimento com a mente. “O desafio é não pensar em mais nada, o que é bem difícil”, diz Juliana.
Durante
3 Vá logo ao limite da sua capacidade mental
Com mais tranquilidade, é hora de partir para os livros e apostilas. Mas não comece pelo caminho mais fácil, ou seja, aquela matéria que você já domina.
Na opinião de Juliana, assuntos complexos forçam a mente a trabalhar mais. “Quanto mais difícil, mais você terá que se concentrar e, assim, seu cérebro permitirá menos brechas para a distração”, recomenda.
4 Faça do estudo um jogo
Criar um esquema de “auto premiação” pode ser o empurrãozinho que faltava para continuar motivado, segundo Juliana.
Venceu um tópico daquela doutrina complicada? Gabaritou a lista de exercícios? Ponto para você.
Estabeleça uma lista metas, e à medida que elas forem cumpridas, dê a si mesmo pequenos “presentes”, como pausas e momentos para estudar sua matéria preferida, por exemplo.
Depois
5 Anote o que tira a sua concentração
Conhecer o “inimigo” é o primeiro passo para superá-lo. Por isso, Juliana indica também um exercício de autoconhecimento.
A ideia é verificar o que o tira do foco e criar suas próprias estratégias para não se deixar vencer pela distração.

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...