segunda-feira, 25 de junho de 2012

STF. RECURSO PREMATURO. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ PROCESSUAL. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO. ELOGIO

STF. RECURSO PREMATURO. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ PROCESSUAL. MUDANÇA DE ENTENDIMENTO. ELOGIO


Autores:
JR, Fredie D.
CUNHA, Leonardo J. C. da
No Informativo nº 665, que abrange o período de 07 a 11 de maio de 2012, o Supremo Tribunal Federal divulgou uma importantíssima decisão, cujo acórdão ainda pende de publicação.
Trata-se de acórdão proferido no HC nº 101.132/MA, cujo redator é o Ministro Luiz Fux. Eis a ementa da decisão:
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO INTERPOSTO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO. CONHECIMENTO. INSTRUMENTALISMO PROCESSUAL. PRECLUSÃO QUE NÃO PODE PREJUDICAR A PARTE QUE CONTRIBUI PARA A CELERIDADE DO PROCESSO. BOA-FÉ EXIGIDA DO ESTADO-JUIZ. DOUTRINA. RECENTE JURISPRUDÊNCIA DO PLENÁRIO. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E REJEITADO.
1. A doutrina moderna ressalta o advento da fase instrumentalista do Direito Processual, ante a necessidade de interpretar os seus institutos sempre do modo mais favorável ao acesso à justiça (art. 5º, XXXV, CRFB) e à efetividade dos direitos materiais (OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo. In: Revista de Processo, São Paulo: RT, n. 137, p. 7-31, 2006; DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2009; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2010).
2. A forma, se imposta rigidamente, sem dúvidas conduz ao perigo do arbítrio das leis, nos moldes do velho brocardo dura lex, sed lex (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Simplificação e adaptabilidade no anteprojeto do novo CPC brasileiro. In: O Novo Processo Civil Brasileiro Direito em Expectativa. Org. Luiz Fux. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 76).
3. As preclusões se destinam a permitir o regular e célere desenvolvimento do feito, por isso que não é possível penalizar a parte que age de boa-fé e contribui para o progresso da marcha processual com o não conhecimento do recurso, arriscando conferir o direito à parte que não faz jus em razão de um purismo formal injustificado.
4. O formalismo desmesurado ignora a boa-fé processual que se exige de todos os sujeitos do processo, inclusive, e com maior razão, do Estado-Juiz, bem como se afasta da visão neoconstitucionalista do direito, cuja teoria proscreve o legicentrismo e o formalismo interpretativo na análise do sistema jurídico, desenvolvendo mecanismos para a efetividade dos princípios constitucionais que abarcam os valores mais caros à nossa sociedade (COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: un análisis metateórico. Trad. Miguel Carbonell. In: Isonomía. Revista de Teoría y Filosofía del Derecho, nº 16, 2002).
5. O Supremo Tribunal Federal, recentemente, sob o influxo do instrumentalismo, modificou a sua jurisprudência para permitir a comprovação posterior de tempestividade do Recurso Extraordinário, quando reconhecida a sua extemporaneidade em virtude de feriados locais ou de suspensão de expediente forense no Tribunal a quo (RE nº 626.358-AgR/MG, rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, julg. 22.03.2012).
6. In casu: (i) os embargos de declaração foram opostos, mediante fac-símile, em 13.06.2011, sendo que o acórdão recorrido somente veio a ser publicado em 01.07.2011; (ii) o paciente foi denunciado pela suposta prática do crime do art. 12 da Lei nº 6.368/79, em razão do alegado comércio de 2.110 g (dois mil cento e dez gramas) de cocaína; (iii) no acórdão embargado, a Turma reconheceu a legalidade do decreto prisional expedido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão em face do paciente, para assegurar a aplicação da lei penal, em razão de se tratar de réu evadido do distrito da culpa, e para garantia da ordem pública; (iv) alega o embargante que houve omissão, porquanto não teria sido analisado o excesso de prazo para a instrução processual, assim como contradição, por não ter sido considerado que à época dos fatos não estavam em vigor a Lei nº 11.343/06 e a Lei nº 11.464/07.
7. O recurso merece conhecimento, na medida em que a parte, diligente, opôs os embargos de declaração mesmo antes da publicação do acórdão, contribuindo para a celeridade processual.
8. No mérito, os embargos devem ser rejeitados, pois o excesso de prazo não foi alegado na exordial nem apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça, além do que a Lei nº 11.343/06 e a Lei nº 11.464/07 em nada interferem no julgamento, visto que a prisão foi decretada com base nos requisitos do art. 312 do CPP identificados concretamente, e não com base na vedação abstrata à liberdade provisória, prevista no art. 44 da Lei de Drogas de 2006.
9. Embargos de declaração conhecidos e rejeitados".
Merecem destaque os itens 3, 4 e 7 da ementa.
No item 3, o STF deixa clara a relação entre o instituto da preclusão e o princípio da boa-fé. Esta relação, que nem sempre é feita, é imprescindível para que se dê a correta dimensão valorativa desta técnica processual, comumente relacionada apenas à razoável duração do processo e à segurança jurídica.
O item 4 consagra um obiter dictum importantíssimo: a extensão do princípio da boa-fé processual ao órgão jurisdicional. O Estado-juiz também deve agir em conformidade com a boa-fé objetiva. Esta afirmação, que é rara no pensamento jurídico mundial, merece divulgação e aplausos. Ratifica-se, aqui, o que se disse sobre o assunto já há alguns anos (DIDIER Jr., Fredie. Curso de direito processual Civil. 14. ed. Salvador: Juspodivm, 2012, v. 1, p. 74; Fundamentos do princípio da cooperação no direito processual civil português. Coimbra: Coimbra Editora, 2010).
Finalmente, no item 7, que corresponde a uma das razões de decidir do julgado, o STF revê antiga jurisprudência, para admitir como tempestivo recurso interposto antes da publicação da decisão, acolhendo a integralidade dos argumento da doutrina neste sentido - diga-se, inclusive, que se trata de uma também rara situação em que a doutrina fala em uníssono. Espera-se, sinceramente, que essa decisão ilumine o TST, que ainda recalcitra no particular - o STJ já havia adotado o entendimento ora encampado pelo STF desde 2004.
A decisão, enfim, merece a nossa saudação.
Fonte: Conjur

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