quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

ConJur estreia coluna sobre Direito do Consumidor nesta quarta-feira






A revista eletrônica Consultor Jurídico estreia nesta quarta-feira (9/12) a coluna Garantias do Consumo, com foco em Direito do Consumidor. O objetivo é estimular o debate jurídico e científico a respeito do tema, com opiniões que refletem profunda reflexão e análise acadêmica da doutrina e jurisprudência sobre o assunto. Os textos serão publicados quinzenalmente, às quartas.

A ideia é ir além da dicotomia entre consumidor e fornecedor. Admitindo a complexidade que o tema pode alcançar, a proposta é lançar um olhar acadêmico sobre as garantias que regem essas relações, sejam elas jurídicas, econômicas ou sociais.

Os textos serão assinados por membros do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), entre eles o advogado Bruno Miragem, professor e presidente do instituto; a advogada Claudia Lima Marques, professora e membro honorário; o juiz Héctor Valverde Santana, do Tribunal de Justiça do DF; a professora Amanda Flavio de Oliveira, da UFMG; o professor Adalberto Pasqualotto, da PUC-RS; e a juíza Clarissa Costa de Lima, do TJ-RS.

“A importância dos temas que envolvem o Direito do Consumidor na sociedade de consumo atual reforça a importância da coluna. Daí o acerto desta parceria entre o Brasilcon e a ConJur para promover o debate de questões essenciais sobre os desafios do Direito do Consumidor no Brasil”, afirma Bruno Miragem, que assina a coluna de estreia. O primeiro texto será sobre a aplicação do CDC nos contratos de transporte aéreo internacional.

Pé na academia
O instituto existe desde 1992 e foi criado pelos juristas que escreveram o anteprojeto de lei que, dois anos antes, deu origem ao Código de Defesa do Consumidor. Desde seu surgimento, o Brasilcon promove pesquisas e difusão de dados a respeito da proteção ao consumidor, em cooperação com entidades internacionais.

Sua principal atividade é a edição da Revista de Direito do Consumidor, altamente recomendada pelo índice Qualis, sistema brasileiro de avaliação de periódicos, mantido pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). O instituto também participou ativamente de ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, como a ADI dos Bancos (ADI 2.591/2001).


Revista Consultor Jurídico, 8 de dezembro de 2015, 18h45

Justiça proíbe propaganda irregular de escritório de advocacia do RN






Por considerar que a publicidade feita por um escritório de advocacia tratava-se de captação ilegal de cliente, a juíza federal Gisele Maria da Silva Araújo Leite, da 4ª Vara Federal do Rio Grande do Norte, proibiu que a banca faça publicidade em desconformidade com a Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) e determinou que retire do ar todo o material de publicidade que faça referência a seus serviços advocatícios, seja em rádio ou na internet.

A decisão atende a um pedido da seccional potiguar da Ordem dos Advogados do Brasil, que denunciou o escritório M. M. Filhos — Advogados Associados, acusando-o de captação agressiva e ilegal de clientela, com publicidade fora dos padrões estabelecidos.

De acordo com a OAB, o escritório tem se utilizado do sitewww.coisapublica.org, supostamente de utilidade pública, para, na verdade, fazer publicidade de seus serviços profissionais, indicando seu escritório de advocacia e de seu parceiro, Logos Advocacia Lógica e Chronos Advocacia Lógica, para consulta sobre a matéria jurídica tratada no site.

Conforme a OAB-RN, a propaganda irregular orientava os professores aposentados a buscarem o endereço eletrônico da Coisa Pública, direcionando-os, em seguida, para os sites dos escritórios Logos Advocacia Lógica e Chronos Advocacia Lógica, mencionando inclusive o telefone do suposto portal de informações, que é o mesmo cadastrado na seccional como pertencente à sociedade advocatícia.

O escritório também fez publicidade em rádio, veiculada na CBN Natal (AM 1.190), mediante anúncio no qual indicava o site Coisa Pública como site de utilidade pública, induzindo a erro os interessados e ampliando a captação irregular de clientes, bem como fornecia o telefone do próprio escritório para contato, denotando a prática irregular que se quer coibir.

Ao analisar o mérito, a juíza Gisele Leite concluiu com base nas provas apresentadas que "ficou nítido o intento de dissimular a irregular captação de clientes, com a criação de página que aparenta noticiar questões jurídicas de interesse de algumas categorias, mas, que, na verdade, visa encaminhar os frequentadores a determinados escritórios de advocacia".

“À luz do disposto no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, da Lei 8.906/64, não há dúvida da ilegalidade da publicidade desenvolvida pelo referido escritório de advocacia e seus membros”, concluiu.

Além de determinar a suspensão das publicidades que não estão em conformidade com as regras da OAB, a juíza determinou que o escritório adeque o conteúdo do site Coisa Pública, conforme a legislação.

Ao comentar a decisão, o presidente da OAB-RN, Sérgio Freire, destacou que a entidade tem combatido a propaganda irregular. “A decisão judicial demonstra que estamos atentos a todo e qualquer método ilegal de captação indevida de serviços inerentes à advocacia”, afirmou. Com informações da Assessoria de Imprensa da OAB.

Clique aqui para ler a decisão.
0805003-19.2015.4.05.8400



Revista Consultor Jurídico, 8 de dezembro de 2015, 16h01

Fachin suspende instalação de comissão de impeachment na Câmara






Fachin suspendeu comissão para evitar atos que poderão ser invalidados pelo STF. Carlos Humberto/SCO/STF

O ministro Edson Fachin suspendeu, em decisão monocrática, a instalação da Comissão Especial que vai analisar o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Segundo o ministro, a medida é necessária para evitar atos que poderão ser invalidados pelo Supremo Tribunal Federal.

A decisão se deu na ação de descumprimento de preceito fundamental apresentada pelo PCdoB, na qual pede que o Supremo defina “o que, da Lei 1.079, passados mais de 65 anos de sua edição, remanesce compatível com a ordem constitucional”. 

“Com o objetivo de (i) evitar atos que poderão eventualmente ser invalidados pelo Supremo Tribunal Federal; (ii) obstar aumento de instabilidade jurídica com profusão de medidas judiciais posteriores e pontuais e; (iii) apresentar respostas céleres aos questionamentos suscitados, impende promover, de imediato, debate e deliberação pelo Tribunal Pleno, determinando, nesse curto interregno, a suspensão da formação e a não instalação da Comissão Especial, bem como a suspensão dos eventuais prazos, inclusive aqueles, em tese, em curso, preservando-se ao menos até a decisão do Supremo Tribunal Federal prevista para o dia 16 de dezembro, todos os atos até o momento praticado”, justificou o ministro.

A ação em que o Supremo Tribunal Federal vai analisar cautelarmente a constitucionalidade da lei do impeachment foi incluída na pauta do dia 16 de dezembro. O caso não foi pautado nesta semana porque alguns dos citados para prestar informações têm até sexta-feira (11/12) para responder.

Nesta terça-feira (8/12), a Câmara dos Deputados havia definido — em meio a brigas, gritaria e acusações de manobras regimentais — que a comissão especial seria composta pela chapa formada em sua maioria por deputados da oposição e dissidentes da base aliada.

Como a comissão deve ter 65 integrantes e o grupo vencedor é composto por 39 deputados, a Câmara havia marcado para esta quarta-feira (9/12) uma eleição suplementar para definir os outros 26 membros que vão compor a comissão.

Clique aqui para ler a decisão.

ADPF 378



Tadeu Rover é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 8 de dezembro de 2015, 23h35

Pesquisa Pronta: novos temas para consulta




Já estão disponíveis para consulta seis novos temas da Pesquisa Pronta, serviço oferecido pela Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. São eles:

Em relação ao primeiro tema, Interposição de Recurso em Habeas Corpus por advogado sem procuração nos autos, o STJ já julgou inexistente o recurso em habeas corpus assinado por advogado sem procuração ou substabelecimento nos autos.

Quanto ao segundo tema, Análise da legalidade da fixação, mediante decreto, dos graus de risco de atividade empresarial para fins de contribuição ao Seguro de Acidente de Trabalho (SAT), o tribunal já consignou que o enquadramento via decreto das atividades de risco leve, médio ou grave desenvolvidas pela empresa objetivando fixar a contribuição para o Seguro de Acidentes do Trabalho (SAT) não viola o princípio da legalidade.

Já em Análise da legitimidade da Defensoria Pública para a propositura de Ação Civil Pública, a corte já decidiu que a Defensoria Pública tem legitimidade para propor ações coletivas em defesa de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos.

No que diz respeito ao quarto tema, Termo a quo do prazo prescricional para a cobrança judicial de multa de natureza administrativa, o STJ apresenta entendimento no sentido de que, tratando-se de multa de natureza administrativa, o termo inicial da prescrição coincide com o momento da ocorrência da lesão ao direito.

No caso de Análise da ocorrência de cerceamento de defesa em razão do indeferimento de provas,: o Tribunal da Cidadania já decidiu que, caso o julgador tenha entendido que há elementos suficientes para o julgamento da causa em virtude das provas já produzidas no processo, não há que se falar em cerceamento de defesa pelo indeferimento da produção de prova pericial claramente desnecessária para apurar a consumação do crime.

Por fim, emRecolhimento e comprovação de preparo por meio de comprovante extraído da internet, o STJ entende que é possível o recolhimento e a comprovação do preparo processual realizado pela internet.


Conheça a Pesquisa Pronta

A Pesquisa Pronta foi criada para facilitar o trabalho de interessados em conhecer a jurisprudência do STJ. O serviço é on-line e está totalmente integrado à base de jurisprudência do tribunal.

Como sugere o nome, a página oferece consultas a pesquisas prontamente disponíveis sobre temas jurídicos relevantes, bem como a acórdãos com julgamento de casos notórios.

Embora os parâmetros de pesquisa sejam predefinidos, a busca dos documentos é feita em tempo real, o que possibilita que os resultados fornecidos estejam sempre atualizados.

Como utilizar a ferramenta

A Pesquisa Pronta está permanentemente disponível no portal do STJ. Basta acessar Jurisprudência > Pesquisa Pronta, na página inicial do site, a partir do menu principal de navegação.

As últimas pesquisas realizadas podem ser encontradas emAssuntos Recentes. A página lista temas selecionados por relevância jurídica de acordo com o ramo do direito ao qual pertencem.

Já o link Casos Notórios fornece um rol de temas que alcançaram grande repercussão nos meios de comunicação.

Ao clicar em um assunto de interesse, o usuário é direcionado a uma nova página com os espelhos de acórdãos do tribunal que dizem respeito ao tema escolhido.

Quem preferir pode clicar diretamente no link com o nome do ramo do direito desejado para acessar os assuntos que se aplicam a ele.

Fonte: STJ

Justiça gratuita: sem despesa processual também para recurso que pede o benefício




Em decisão unânime, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, quando um recurso discute se uma pessoa tem direito à justiça gratuita, não pode ser exigido o pagamento das despesas judiciais relativas ao pedido, chamadas de recolhimento de preparo recursal.

O relator, ministro Raul Araújo, reconheceu que em decisões anteriores o STJ entendeu que o pagamento era necessário, mas defendeu uma visão mais sensível do tribunal em relação ao tema. Para o ministro, não há lógica em se exigir que a pessoa pague a despesa judicial se ela está justamente procurando a Justiça gratuita.

“Percebe-se, logo de início, a completa falta de boa lógica a amparar a exigência. Se o jurisdicionado (cidadão que participa do processo) vem afirmando, requerendo e recorrendo no sentido de obter o benefício da assistência judiciária gratuita, porque diz não ter condição de arcar com as despesas do processo, não há lógica em se exigir que ele primeiro pague o que afirma não poder pagar para só depois a corte decidir se realmente ele precisa ou não do benefício. Não faz sentido”, disse o ministro.

Petição avulsa

Os ministros também decidiram que a pessoa que busca os serviços da justiça gratuita poderá fazer o pedido ao entrar com recurso no STJ, e não de forma avulsa e em outro momento, como determina o artigo 6º da Lei 1.060/50. A Corte Especial aplicou um princípio que possui o objetivo de dar velocidade ao trabalho da Justiça.

“É recomendável dispensar-se o excesso de formalismo, dando maior efetividade às normas e princípios constitucionais e processuais”, disse Raul Araújo.

Se a pessoa tiver negado, em definitivo, o pedido para ter acesso à Justiça gratuita, ela terá que fazer os devidos pagamentos no prazo estabelecido. Caso isso não ocorra, o processo não será analisado nem julgado pelos ministros.

Fonte: STJ

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

PEC das Domésticas - Direitos e Deveres Entre Patrões e Empregados




Autor:
TRINKEL, Josiane



A Lei complementar 150, sancionada em 01/06/15 que regulamentou a PEC das Domésticas (Emenda Constitucional 72/2013) teve como objetivo central alterar o § único do art. 7º da CF/88 com a finalidade de estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os domésticos e demais trabalhadores urbanos e rurais.

Importante esclarecer que o empregado doméstico é aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal a uma pessoa/família por mais de 02 dias na semana. Assim, desde que o serviço seja prestado no âmbito familiar sem fins lucrativos, vários são os cargos enquadrados como doméstico. Além da própria empregada doméstica, como o motorista, jardineiro, vigia, cozinheira, cuidador de crianças ou idosos, enfermeira, dentre outros.

É certo que a Lei 5.859/72 já estabelecia alguns direitos trabalhistas aos domésticos, mas faltavam alguns pontos a serem esclarecidos. A carga horaria de trabalho, jornada extraordinária, piso mínimo para a categoria, enfim alguns direitos que outras categorias tinham e os domésticos não.

Assim, com a PEC promulgada em abril/13, passaram a valer alguns dos direitos ali previstos, como piso de um salário mínimo ao mês ou o piso regional para os estados que o possuem, a jornada de 8 horas diárias e 44 semanais, horas extras, o cumprimento das normas de higiene, saúde e segurança do trabalho, bem como das convenções coletivas.

Outros, somente passaram a valer a partir de junho/2015 (com a sanção presidencial da PEC), conforme a seguir relacionado e com uma rápida abordagem sobre cada um deles. Vejamos:

- Adicional noturno: aplica-se tal adicional àquele que trabalha das 22h de um dia às 05h do outro. Considera-se para fins de cálculo, a hora noturna como de 52'50"(cinquenta e dois minutos e trinta segundos) e com acréscimo de 20% sobre a hora diurna;

- Adicional de viagem: quando previamente acordado entre as partes e o empregado é deslocado do seu local de trabalho e residência para atender as necessidades do patrão, tem direito a receber 25% sobre a hora normal. Existe a opção do empregado em converter este tempo para o banco de horas.

- Controle obrigatório do ponto: o controle da jornada pode ser feito de forma eletrônica ou manual. O portal "Doméstica Legal" disponibiliza um serviço gratuito de "Folha de Ponto Inteligente". O patrão se cadastra e imprime uma folha, que será anotada diariamente pelo empregado. Ao final do mês insere os horários registrados no sistema, que por sua vez vai contemplar se houve hora extra, desconto por atraso ou falta não justificada, etc.

- Utilização do banco de horas: as primeiras 40 horas extras devem ser pagas em pecúnia ao empregado, juntamente com o salário. Somente o que passar disso pode ir para o banco de horas, cuja compensação tem que se dar no prazo máximo de 01 ano. Na hipótese de rescisão, sem tempo hábil para compensação, o empregado faz jus ao pagamento das horas extras existentes no banco.

Finalmente, inseridos na aludida PEC, os direitos que passaram a valer a partir de outubro/15, conforme rápida abordagem abaixo:

- INSS patronal de 8%: a alíquota devida pelo empregador antes era de 12%. Até 2019, o empregador que optar pelo modelo completo na Declaração Imposto de Renda, poderá deduzir o valor recolhido ao INSS. Por parte do empregado continua valendo o percentual de 8, 9 ou 11% a ser recolhido, dependendo da faixa salarial recebida no mês;

- FGTS: era opcional desde 2001. Com a PEC a contribuição previdenciária passou a ser obrigatória e equivale a 8% da remuneração do empregado.

- Antecipação multa do FGTS: os empregados conquistaram o direito ao recebimento da multa de 40% do FGTS. Para o empregador doméstico, por não ter fins lucrativos, é pago de forma antecipada, à razão de 3,2% sobre o salário do empregado. Caso o vínculo se encerre por parte do empregado (pedido de demissão) ou por demissão por justa causa, a multa acumulada será ressarcida ao empregador;

- Seguro desemprego: o empregado demitido sem justa causa e que tenha trabalhado no mínimo por 18 meses, tem direito a um salário mínimo por um período máximo de 3 meses. Atenção patrões: para que o empregado tenha tal direito, as contribuições com o FGTS precisam estar em dia;

- Seguro acidente do trabalho: representará ao empregador um custo mensal de 0,8% sobre o salário do empregado. Considera-se como acidente do trabalho os casos de morte ou lesão corporal, que provoquem no empregado a perda ou a redução, temporária ou permanente, de sua capacidade para o trabalho. Caso o empregado sofra um acidente de trabalho, o patrão tem que comunicar a ocorrência no prazo máximo de 48 horas ao CAT (Cadastramento de Comunicação de Acidente do Trabalho).

- Salário Família: é uma remuneração complementar para empregados que possuem filhos até 14 anos ou portadores de deficiência de qualquer idade. Hoje o valor por filho é de R$ 26,20 para quem ganha até R$ 1.089,72. O patrão paga ao empregado junto com o salário, mas é estornado na guia do INSS do respectivo mês.

De modo a facilitar os recolhimentos devidos pelos empregadores, foi criado o SIMPLES DOMÉSTICO, um sistema elaborado pela CEF, que reúne em um único boleto os valores devidos a título de INSS, FGTS, fundo para demissão sem justa causa, seguro de acidente do trabalho e imposto de renda (para aqueles que se enquadrem no desconto).



Como se pode constatar, a referida lei trouxe direitos e deveres melhor definidos na relação entre patrão e empregado, representando o início de uma nova era para o empregado doméstico.

Fonte: Editora Magister

"Há um vasto campo para cooperação entre União Europeia e a Justiça brasileira"





Em 1981, o jurista português José Luís da Cruz Vilaça assumiu o cargo de secretário de Estado para a Integração Europeia. No entanto, foi cinco anos depois que ele participou do órgão que considera o mais essencial para a real integração do continente: o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias — hoje chamado de Tribunal de Justiça da União Europeia.

Com 28 Estados-membros e mais de 500 milhões de habitantes — falando 24 línguas oficiais —, a União Europeia depende do tribunal para uniformizar a aplicação do Direito. Sua função é garantir "o respeito do Direito na interpretação e aplicação dos tratados”, que são regras fundamentais que estão na base de todas as medidas tomadas pela UE.

“O Tribunal de Justiça da União Europeia é acionado sempre que uma norma ou um princípio do Direito da União Europeia é invocado perante um tribunal nacional e há dúvidas sobre a sua interpretação ou até sobre a validade da norma”, explica Vilaça, que foi o primeiro presidente da corte. Desde outubro de 2012, ele é juiz do tribunal.

Juiz, professor e árbitro, Vilaça tem doutorado em Economia Internacional e já foi deputado em Coimbra (1983) e Braga (1986). Sua vivência na área jurídica, política e econômica dá a ele uma visão completa sobre a Europa. Para ele, as medidas aprovadas por Portugal para fugir da crise, em 2011, foram muito severas, mas valeram a pena. Para a União Europeia funcionar de forma harmoniosa e estável, “é preciso regras — e respeito a essas regras — de disciplina financeira”, diz.

Membro do conselho consultivo da Academia de Direito Europeu, o juiz veio ao Brasil para dar início a um protocolo preparativo de cooperação entre o Tribunal de Justiça da União Europeia e o Supremo Tribunal Federal, que pode abrir as portas da academia — que fica na cidade alemã de Trier — para os profissionais brasileiros. Ele veio ao Brasil depois de receber os advogados brasileiros Nelson Wilians e Luiz Roberto Sabbato, junto com o presidente do Tribunal de Justiça da União Europeia, Koen Lenaerts, em almoço na sede do tribunal, em Luxemburgo.

Leia a entrevista:

ConJur — Como é a convivência, hoje, da justiça da União Europeia com as justiças dos Estados-membros?
José Luís da Cruz Vilaça — É pacífica e funciona como uma cooperação. Isso é um suporte indispensável para a estrutura e o funcionamento da ordem jurídica da União Europeia. Essa ordem, sobretudo o sistema jurisdicional da União Europeia, baseia-se na cooperação entre os tribunais de Luxemburgo, em particular o Tribunal de Justiça, e os tribunais dos Estados-membros. Em virtude do efeito direto das normas do Direito da União Europeia e do princípio do primado do Direito da União Europeia sobre o Direito nacional dos Estados-membros, em caso de contradição, os tribunais dos Estados são os órgãos jurisdicionais comuns de aplicação do Direito da União Europeia.

Nós somos apenas um tribunal especializado, criado pelo tratado para aplicar e promover uniformidade na aplicação do Direito da União em todo o seu território. Mas não somos a primeira linha de aplicação do Direito da União Europeia.

ConJur — Onde o Direito da União Europeia é aplicado primeiro, então?
José Luís da Cruz Vilaça — Os cidadãos podem invocar diretamente o Direito comunitário para fazer valer os direitos que para eles decorrem das normas da União Europeia, perante os tribunais nacionais competentes. Só que isso, obviamente, gera problemas em uma união de 28 Estados e mais de 500 milhões de cidadãos. Como aplicar da mesma forma em Lisboa, na República Checa, na Polônia ou na Ilha de Malta? Se não aplicarmos da mesma maneira, os cidadãos acabam por não ser tratados da mesma maneira. Assim, o Tribunal de Justiça da União Europeia é acionado sempre que uma norma ou um princípio do Direito da União Europeia é invocado perante um tribunal nacional e há dúvidas sobre a sua interpretação ou até sobre a validade da norma. O tribunal vai dar, inclusive, elementos de interpretação do Direito que permitam resolver o problema de forma rápida e eficaz.

ConJur — Os brasileiros têm uma relação privilegiada com Portugal. O Tribunal já analisou se o brasileiro tem alguma prerrogativa na Europa, por conta dessa relação?
José Luís da Cruz Vilaça — O brasileiro é um cidadão de um país de fora da União, um país terceiro. Em princípio, se aplicam as regras que se aplicam aos cidadãos de países terceiros. O Brasil tem uma posição especial, em primeiro lugar, porque há uma ligação não só afetiva e histórica, mas também econômica e jurídica com Portugal. Através dessa relação com Portugal, o brasileiro tem algumas facilidades em penetrar na Europa e no mercado de trabalho europeu. Além disso, a União Europeia tem acordos especiais com o Brasil, seja com o Brasil bilateralmente, seja no quadro do Mercosul, que permite conceder aos brasileiros direitos, eventualmente, obrigações, também, que não são reconhecidos, necessariamente, a cidadãos de outros países, como Afeganistão ou Síria.

ConJur — Quais são os limites de atuação do advogado de um Estado-membro em outro Estado-membro? Ele pode fazer qualquer coisa?
José Luís da Cruz Vilaça — Uma das liberdades fundamentais do tratado é que os profissionais de um Estado têm livre acesso ao mercado do outro. É um mercado interno com liberdade de circulação. E tem livre acesso para exercer uma profissão como trabalhador assalariado ou como trabalhador independente. Para certas profissões, não vai haver grandes problemas, porque os diplomas podem ser facilmente reconhecidos. Em Direito, é diferente. Pela diferença do ensino do Direito em cada país, é preciso fazer algumas exigências suplementares. Para evitar que cada Estado-membro imponha as suas próprias regras, a comunidade europeia, primeiro, e a União Europeia, depois, votaram regras para harmonizar ou mesmo uniformizar as condições de acesso ao mercado da prestação de serviços jurídicos nos vários Estados.

ConJur — O Reino Unido ficou famoso como muito independente e apresentou ressalvas para o seu ingresso na União Europeia. É no ano que vem que vencem aquelas concessões que a União Europeia fez para viabilizar o ingresso do Reino Unido?
José Luís da Cruz Vilaça — O Reino Unido sempre teve uma posição ambígua em relação à comunidade europeia. Eu acho que é a presença do Reino Unido na União Europeia é fundamental, por razões de caráter econômico, relacionadas ao dinamismo da economia britânica e com o dinamismo do seu setor financeiro. Do ponto de vista jurídico, o funcionamento do Tribunal de Justiça beneficiou muito a entrada da Grã Bretanha, em 1972, e devo dizer que os advogados britânicos são dos melhores que vêm apresentar alegações, com um profissionalismo, savoir-faire e know-howfantásticos. Além disso, têm uma grande criatividade na maneira de apresentar os seus argumentos. O primeiro-ministro britânico, David Cameron, fez uma aposta arriscada, organizar um referendo sobre a participação da União Europeia, a manutenção, a continuação ou não da Grã Bretanha na União Europeia. E o referendo vai ter lugar em 2017, mas para convencer o povo britânico a dizer que sim, porque ele percebe, inteligentemente, que é importante para o Reino Unido e a Grã Bretanha estar dentro da União Europeia e influenciar o que se passa lá dentro.

ConJur — Caso a Irlanda do Norte se qualifique como um Estado autônomo, ele pode vir a requisitar o ingresso na União Europeia?
José Luís da Cruz Vilaça — Não há um problema, neste momento, com a hipotética independência da Irlanda do Norte. Essas coisas estão pacificadas com os acordos que foram feitos ainda no tempo do ministro [Tony] Blair. Há um problema mais imediato com a Escócia, que fez um referendo no qual escoceses e o governo regional da Escócia fizeram campanha a favor da saída do Reino Unido. O resultado foi, “não vamos sair do Reino Unido, queremos continuar”, mas com margem muito pequena. Se houver no futuro sua independência do Reino Unido, ela será reconhecida pela comunidade internacional. Assim, torna-se um país independente, mas que não é membro da União Europeia. Se os escoceses, cidadãos escoceses quiserem continuar a beneficiar do estatuto de cidadãos europeus, a Escócia tem que pedir adesão, negociar a adesão e ser admitida por todos os outros membros, por unanimidade. Isto é aplicável a qualquer região autônoma de um Estado membro que venha, eventualmente, a declarar a independência.

ConJur — A relação privilegiada a advogado e cliente tem sido flexibilizada. Recentemente, alterou-se a questão da confidencialidade. Em alguns países, se o advogado souber que o cliente pratica atividades como lavagem de dinheiro ou atos relacionados a terrorismo, a tráfico ou crimes conexos, deve informar às autoridades. Como está isso, hoje, na Europa?
José Luís da Cruz Vilaça — A Europa tem uma diretiva que se aplica especificamente a essa situação. No início, não abrangia os advogados, nas relações com seus clientes, depois passou a abranger os advogados nas relações com seus clientes, mas salvaguarda os deveres de lealdade e de confidencialidade do advogado nas relações de defesa dos seus clientes. Na defesa dos seus clientes, o advogado tem de beneficiar aquilo que os ingleses chamam de legal privilege. Tudo aquilo que o cliente diga para assegurar a sua defesa está coberto por essa confidencialidade. Mas isto se aplica quando o advogado é chamado a defender um cliente que é acusado de atividades delituosas. Não se aplica quando o advogado é chamado, solicitado por um cliente a colaborar nas suas atividades delituosas e aplica-se, como falamos, na defesa do cliente em juízo ou preparação da defesa do cliente em juízo. Essa garantia não abrange quando o advogado é, por exemplo, solicitado a assessorar o cliente em certas operações financeiras ou caráter imobiliário entre as quais ele possa suspeitar ou ter conhecimento de que há atividades de caráter ilícito, designadamente de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo.

A diretiva não resolve tudo, não diz exatamente como é que essa comunicação deve ser feita e a quem. O legislador buscou um equilíbrio, mas deixou de fora dúvidas de interpretação, que, quando houver um pleito num tribunal, o Tribunal de Justiça poderá ser chamado a clarificar e a dar a interpretação conveniente.

ConJur — Já houve algum caso de advogado enquadrado junto com o cliente, pelo crime que o cliente praticou, já que o advogado não comunicou a ninguém?
José Luís da Cruz Vilaça — Sim. Em vários Estados-membros. A própria diretiva resulta da interpretação que o Tribunal de Justiça fez dos deveres profissionais dos advogados que, neste ponto, entram, de certa maneira, em conflito. O conflito da prevenção da criminalidade grave e séria, por um lado, e, por outro, os deveres antológicos dos advogados, de segredo profissional e de colaboração na defesa dos seus clientes.

ConJur — Há poucos anos, para sair de uma crise parecida com a que o Brasil vive hoje, o governo português chegou a reduzir a remuneração dos servidores públicos, assim como cortou pensões e aposentadorias, o que foi convalidado pela Corte Constitucional Portuguesa. O sacrifício valeu a pena?
José Luís da Cruz Vilaça — Eu digo não como juiz, mas como cidadão português, afirmo que valeu a pena. De fato, estávamos numa situação muito delicada, muito difícil, ainda em 2011, com nível de endividamento interno e externo do Estado brutal. Com déficit orçamental enorme, que ultrapassava os limites fixados no quadro da criação da União Econômica e Monetária da introdução do euro. Para uma zona destas funcionar de forma harmoniosa e estável, é preciso regras — e respeito a essas regras — de disciplina financeira. E foi preciso, portanto, reequilibrar, reestruturar e fazer resgates. A Alemanha tem sido um exemplo, a meu ver, de equilíbrio, às vezes parece mesmo um pouco demasiado rígida, mas a solidariedade que a Alemanha tem praticado também tem de andar lado a lado com a responsabilidade. Portugal aceitou suas responsabilidades de maneira rigorosa, custosa para o cidadão, sobretudo para aqueles que têm mais dificuldades e ganham menos, mas o cidadão aceitou essa aposta e deu provas de grande sentido de responsabilidade cívica. E, em Portugal, funcionou também porque os sindicatos, em geral, deram provas da mesmo sentido de responsabilidade cívica, não houve desacatos.

ConJur — Nem greve geral?
José Luís da Cruz Vilaça — Não houve greve geral, motins populares ou violência, e ultrapassamos o mais difícil da crise. Estamos, agora, em uma reta ascendente, em Portugal. Essa reta ascendente faz com que, nos últimos tempos, tenhamos crescido economicamente, as exportações estão aumentando, temos uma moeda estável e, portanto, grande esperança para o futuro. Eu desejo, como português, que saia uma solução de governo estável, responsável, respeitadora das disciplinas orçamentárias e da União Europeia. E que continuemos uma política de crescimento da economia, de apoio aos mais necessitados, dentro dos limites dos recursos de que dispomos. Nós não somos um país rico e não podemos ignorar isso.

ConJur — O Tribunal de Justiça tutela as chamadas cinco liberdades fundamentais. Como é isso?
José Luís da Cruz Vilaça — São os pilares do funcionamento do mercado interno, que se chamava mercado comum. As cinco liberdades fundamentais são: liberdade de circulação de mercadorias; de pessoas; de capitais; de estabelecimento; e de prestação de serviços. No princípio, quando a comunidade europeia era, sobretudo, uma comunidade de natureza econômica e comercial, era livre circulação de trabalhadores, as pessoas enquanto trabalhadores. Hoje em dia, essa noção foi se ampliando, sobretudo após a introdução da cidadania europeia. Portanto, o grande princípio é livre circulação de pessoas que estejam em situação regular.

ConJur — Que tipo de cooperação pode haver entre a União Europeia e o Brasil, em matéria jurídica e judicial?
José Luís da Cruz Vilaça — Há um campo largo para relações de cooperação entre o Tribunal de Justiça da União Europeia e o sistema judicial da União Europeia e o Judiciário brasileiro. Em primeiro lugar, há o interesse dos dois lados de conhecer a experiência do outro. O Brasil é um grande Estado Federal, com uma dimensão continental. A União Europeia não é um Estado Federal, mas é uma União com elementos de tipo federal, hoje em dia com 28 Estados-membros. É muito importante que possamos intercambiar informações, experiências, para podermos buscar soluções para problemas que também são semelhantes.

ConJur — Existe a possibilidade de brasileiros advogados, juízes ou promotores fazerem curso na Academia Europeia de Direito de Trier?
José Luís da Cruz Vilaça — Sim. A Academia de Trier não está vinculada ao Tribunal de Justiça. É apoiada pelo governo da República Federal da Alemanha, mas é uma instituição de Direito privado. Há outras em vários Estados membros, mas essa tem uma vantagem por ficar muito próxima do Tribunal de Justiça e, portanto, há um intercâmbio natural entre a Academia de Direito Europeu de Trier e o Tribunal de Justiça. Ela presta apoio e cooperação na generalidade dos países da União Europeia e, sobretudo, para a formação de juristas, advogados e juízes. Todos são chamados a aplicar o Direito da União Europeia.

Márcio Chaer é diretor da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 6 de dezembro de 2015, 7h14

Cliente é chamada de "mal- educada" em fatura da Vivo



Fonte: O Globo 


Juiz determinou indenização de R$ 8 mil por danos morais

Uma mulher que recebeu uma fatura da Vivo contendo ofensa será indenizada em R$ 8 mil por danos morais. O documento, uma conta de celular, chamava a cliente de “mal-educada”. O caso ocorreu no Espírito Santo, na cidade de Serra. Caso volte a enviar cobranças acompanhadas de insultos, a empresa poderá pagar multa de R$ 200 por fatura enviada.

A sentença é do 2° Juizado Especial Cível da Serra, e foi mantida pela 1ª Turma do 1° Colegiado Recursal dos Juizados Especiais de Vitória, que negou recurso da empresa.

De acordo com o processo, a empresa onde a mulher trabalha teria solicitado um comprovante de residência para que pudessem atualizar seus dados cadastrais, uma vez que a mesma estava contratada há apenas um mês. A mulher decidiu levar uma fatura da operadora de telefonia, mas um funcionário de Recursos Humanos (RH) da empresa percebeu que havia algo errado. O nome da requerente estava antecedido pelo termo: “mal-educada.”

“O funcionário de RH chegou a ligar para a mulher avisando do acontecimento insólito, momento em que a requerente teria se sentido muito constrangida diante da situação apresentada”, informa o Tribunal de Justiça do Espírito Santo.

De acordo com o processo, por ser uma funcionária nova, a mulher sentiu que teve a imagem prejudicada na empresa, “sendo que a impressão que dava é de que ela não era uma pessoa idônea.”

A mulher afirma ainda ter enfrentado uma situação vexatória, uma vez que teria sido alvo de piadas de colegas. Ela argumenta que o fato que se tornou público e que vem causando “tremendo transtorno e abalo psicológico.

Cuidados ao alugar imóvel para temporada



Fonte: Diário do Grande ABC 


Seja para quem pretende aproveitar o calorão típico do verão ou mesmo pegar uma praia, alugar um imóvel para a temporada pode ser uma boa opção. Afinal, para quem viaja em família ou grupo de amigos, locar uma casa geralmente sai mais barato que ficar em hotéis e pousadas. Mas é preciso tomar alguns cuidados para que o seu “lar” por uns dias não se torne uma dor de cabeça.

As precauções começam por buscar informações em imobiliárias idôneas ou amigos, checando tudo o que for oferecido. Verifique a localização do imóvel, as condições de acesso ao local, a infraestrutura da região – padarias, açougues, supermercados – bem como as condições de segurança.

É recomendável também visitar a casa sempre que possível. O consumidor tem o direito de vistoriar o imóvel em companhia do proprietário ou representante e deve relacionar as condições gerais em que ele se encontra para evitar o pagamento de eventuais danos que não tenha causado.

Outro cuidado é confiar exclusivamente na oferta feita pela internet ou em anúncios de jornal na hora de locar um imóvel. Mesmo que haja fotos, não dá para se certificar sobre a situação da casa e muito menos conhecer as redondezas.

O Idec ainda orienta fazer um contrato que discrimine o que foi tratado verbalmente, como as datas de entrada e saída do imóvel, nome e endereço do proprietário, preço e forma de pagamento, local de retirada e entrega das chaves etc. O prazo máximo de uma locação por temporada é de 90 dias e o pagamento do aluguel pode ser exigido antecipadamente e de uma só vez. Exija sempre o recibo.

É importante ressaltar que o fornecedor é obrigado a cumprir com a oferta feita. Assim, se as condições da casa não se equipararem com o prometido pela imobiliária ou pelo proprietário, o locatário tem o direito de exigir a devolução do valor pago, como garante o artigo 35 do Código de Defesa do Consumidor.

Se houver problemas, o Idec orienta resolver amigavelmente com o fornecedor e, caso não obtenha sucesso, o consumidor pode procurar o Procon ou o JEC (Juizado Especial Cível).
Fonte: IDEC

Lewandowski assina protocolo de cooperação entre CNJ e Centro de Estudos de Justiça das Américas






O presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Ricardo Lewandowski, e o secretário executivo do Centro de Estudos de Justiça das Américas (CEJA), Jaime Arellano Quintana, assinaram neste sábado (5), no Chile, memorando de entendimento para cooperação entre o CNJ e o CEJA, organismo do Sistema Interamericano sediado naquele país. O memorando pretende estabelecer um marco geral de cooperação entre os dois órgãos, visando ao desenvolvimento e cumprimento de seus respectivos programas de atividades.

O CEJA foi criado em 1999 pelas instituições do Sistema Interamericano, integrado por todos os países membros da Organização dos Estados Americanos (OEA). O órgão surgiu no contexto posterior às profundas reformas nos sistemas judiciais da maioria dos países do continente. A proposta é de dar novo impulso a essa modernização e apoiar os Estados da região em seus processos de reforma judicial, por meio de atividades de capacitação, estudos e investigações empíricas.

O memorando assinado entre o CNJ e o CEJA leva em conta o papel que a Constituição da República atribui ao CNJ, sobretudo no âmbito da administração do sistema judicial. A cooperação prevê a promoção conjunta de conferências, seminários, oficinas e encontros acadêmicos ou eventos sobre Justiça, democracia e temas afins que possibilitem espaços para debates e intercâmbio de experiências.

Comissão de Veneza

O ministro Lewandowski cumpriu agenda oficial no Chile para participar da Conferência “Proteção Constitucional de Grupos Vulneráveis: Um Diálogo Judicial”, aberta na sexta-feira (4) em Santiago, realizada pelo Tribunal Constitucional do Chile em conjunto com a Comissão de Veneza e o Conselho da Europa. Na tarde do primeiro dia da programação, o ministro participou de painel sobre a proteção de minorias e povos originários em nível nacional, falando sobre o Brasil e a jurisprudência do STF a respeito da matéria.

Neste sábado, ele participou, ainda, de reunião da Subcomissão para a América Latina da Comissão de Veneza. A reunião da subcomissão, em 2016, será realizada em Cartagena, Colômbia, com o tema "Execução de sentenças e resoluções de organismos internacionais de direitos humanos".

CF/EH
Fonte: STF

Justiça Gratuita: empresas também podem ter direito




A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que as pessoas jurídicas (empresas) podem ter direito à Justiça gratuita. O colegiado negou recurso em que a União contestava decisão que havia concedido a uma empresa gaúcha o benefício da assistência judiciária gratuita. Seguindo o voto do relator, ministro Herman Benjamin, a turma reafirmou o entendimento da Corte Especial de que, independentemente do fato de se tratar de pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos, a concessão do benefício está condicionada à demonstração da impossibilidade de a empresa arcar com os custos de um processo na Justiça.

O caso teve origem no Rio Grande do Sul e diz respeito a uma execução fiscal da dívida ativa relativa a créditos do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins). A empresa, que atua na área de consultoria empresarial, embargou a execução (contestando valores) e pediu ao juiz federal a concessão de assistência judiciária gratuita.

Balanço negativo

O juiz negou, pois entendeu que não haveria nos autos da execução “elementos capazes de comprovar a impossibilidade de a empresa arcar com as despesas processuais”. A empresa recorreu (por meio de agravo de instrumento – recurso cabível no caso de decisão interlocutória do juiz) ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

O benefício foi concedido em decisão unipessoal do desembargador e posteriormente confirmado pelo colegiado do TRF4. Para tanto, os desembargadores levaram em conta que a empresa é de pequeno porte, com apenas um funcionário. O balanço patrimonial da empresa teria encerrado negativo no ano anterior, no valor de R$ 93 mil.

Em novo recurso, dessa vez endereçado ao STJ, a União insistiu na tese de que o benefício da Justiça gratuita é apenas para pessoas físicas, e não pessoas jurídicas, menos ainda para aquelas com fins lucrativos. As alegações foram rejeitadas no julgamento da Segunda Turma. A decisão foi unânime.

Fonte: STJ

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Tempo gasto no percurso para o refeitório e na fila do almoço não gera hora extra





"O tempo gasto pelo trabalhador até o local em que ele vai se alimentar - seja no refeitório da empresa, num restaurante ou em sua própria casa -, assim como o de retorno, não é considerado como tempo à disposição do empregador. O mesmo se diga em relação ao tempo em que ele aguarda a refeição - seja na fila do refeitório ou à mesa de um luxuoso restaurante a la carte.". A decisão é da juíza Sandra Maria Generoso Thomaz Leidecker, titular da 2ª Vara do Trabalho de Formiga-MG, ao analisar a ação ajuizada por um trabalhador contra uma empresa do ramo da construção civil, rejeitando o pedido de horas extras pelo suposto desrespeito ao intervalo para refeição.

O reclamante reconheceu que tinha 60 minutos de intervalo, mas que parte desse tempo era destinado ao deslocamento até o refeitório e à espera na fila, o que, no entender dele, representa desrespeito ao intervalo intrajornada. Por isso, ele requereu o pagamento do período como hora extra. Mas, ao examinar o caso, a juíza constatou que não houve prova de que o trabalhador permanecia à disposição da empregadora enquanto esperava na fila do refeitório, recebendo ou executando ordens.

Além disso, uma testemunha ouvida declarou que, se quisesse, o empregado poderia fazer a refeição em outro local diferente do refeitório, "desde que fosse respeitado o intervalo de 60 minutos". Dessa forma, concluiu a julgadora que o período concedido para refeição e descanso era respeitado pela empregadora, que não exigia prestação de serviços dos empregados, estivessem eles no refeitório da empresa ou em local diverso.

Por essas razões, a juíza indeferiu as horas extras pretendidas pelo trabalhador, assim como os seus reflexos. Não houve recurso ao TRT-MG.
Processo nº 0000274-38.2015.503.0160. Data de publicação da decisão: 30/07/2015
Fonte: TRT3

PPE amplia prazo da crise e traz mais dificuldades para as empresas






A Presidente Dilma sancionou no último dia 19 de novembro a Lei 13.189, que institui o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), uma reedição da Medida Provisória 680. Em linhas gerais, a lei repete a proposta inicial, mas recebeu na casa legislativa alguns retoques que sinalizam previsão de crise mais longa do que a anunciada inicialmente e, além disso, traz restrições para as empresas e desestimulam qualquer iniciativa para sua implantação.

O documento jurídico que vai tratar do assunto é o acordo coletivo de trabalho específico negociado no âmbito da empresa por meio do sindicato representativo da categoria da atividade econômica preponderante da empresa (artigo 5º). Chama atenção a forma de representação sem apego à categoria a que pertençam os trabalhadores, revelando que quando se trata de local de trabalho prevalecerá outra legitimidade representativa. Exemplificativamente, motoristas, telefonistas, secretárias serão todos representados pelo sindicato dos comerciários se a atividade empresarial for de comércio.

O prazo da crise, que na Medida Provisória 680, publicada em 6 de julho de 2015, era de 12 meses, com adesão até dezembro de 2015, passou a contemplar no artigo 2º, parágrafo 1º, prazo de até dezembro de 2016 e, além disso, se antes a previsão da crise era de 12 meses, prazo que definia a redução de salário e jornada, agora o prazo previsto é de 24 meses, com preferência para as empresas que observarem a cota de pessoas com deficiência (artigo 2º, parágrafo 2º).

Neste sentido, se na época da publicação da Medida Provisória 680 dizíamos que o tempo de crise era imprevisível e estava sendo tratada com prazo definido, agora parece que houve um choque de realidade para esclarecer e adequar com mais transparência que não sairemos da crise em tão pouco tempo. Seguindo a proposta da lei, se o prazo de adesão é até dezembro de 2016 e o prazo máximo é de dois anos, algumas empresas podem chegar até 2018 enfrentando redução de salário e de jornada.

A crítica que já fizemos quanto ao período de garantia de emprego da Medida Provisória e que funcionava como uma ameaça para as empresas, com a Lei 13.189, fica ainda mais grave. 

Retomemos o que tínhamos na Medida Provisória: nos termos do artigo 5º, as empresas estavam obrigadas a assegurar para os empregados atingidos garantia de emprego equivalente a 1/3 do período de redução de salário e de jornada: “As empresas que aderirem ao PPE ficam proibidas de dispensar arbitrariamente ou sem justa causa os empregados que tiverem sua jornada de trabalho temporariamente reduzida enquanto vigorar a adesão ao PPE e, após o seu término, durante o prazo equivalente a um terço do período de adesão”.

A redação atual trouxe a novidade de compromisso ainda maior, obrigando as empresas a uma avaliação mais elaborada da conveniência de aderir ao PPE. Assim o período escolhido para a adesão ao programa deverá ter a consistência de que a levará à saída da crise. Assim, o parágrafo 1º, do artigo 5º, estabelece que o acordo coletivo deverá conter dentre outros aspectos, que o período de garantia no emprego deve ser equivalente, no mínimo, ao período de redução de jornada acrescido de um terço. Estamos diante, portanto, de garantia mínima que amplia o prazo original da Medida Provisória.

De outro lado, no artigo 6º, a Lei nº 13.189 proíbe a empresa que aderir ao PPE de “dispensar arbitrariamente ou sem justa causa os empregados que tiverem sua jornada de trabalho temporariamente reduzida enquanto vigorar a adesão ao PPE e, após o seu término, durante o prazo equivalente a um terço do período de adesão”.

Há aparente conflito entre os dois dispositivos: de um lado, um que impõe condição à negociação o prazo mínimo de garantia de emprego equivalente ao período de redução acrescido de 1/3 e de outro lado, um dispositivo que de modo expresso proíbe a empresa de dispensar trabalhadores durante o período de adesão ao PPE mais um terço do período de adesão.

Ora, no primeiro aspecto é exigência mínima da negociação coletiva que a garantia de emprego poderia sugerir uma extensão além do período de redução de salário e jornada por igual tempo acrescido de um terço e, no segundo caso, do artigo 6º, fica assegurada a garantida de emprego pela lei enquanto houver adesão ao programa pela empresa que, ainda que se recupere ou não suporte as condições econômicas, não poderá dispensar trabalhadores enquanto vigorar o prazo de previsão de adesão mais um terço posterior.

São duas obrigações distintas às quais as empresas que fizerem a adesão deverão estar atentas: a condição legal para negociação coletiva válida dentro do modelo proposto e a garantia da lei. Claro está que em qualquer situação, a possibilidade de a empresa denunciar o PPE, de acordo com o disposto no artigo 7º, não a desobrigará da manutenção da garantia de emprego integral mais um terço. Trata-se de dúvida da forma de adoção da garantia de emprego trazida pelo texto.

Há, entretanto, novidades como a inserção de comissão paritária, sem fazer referência a participação sindical, para fiscalização do cumprimento do acordo coletivo, bem como acordo coletivo múltiplo de trabalho, por meio de sindicato representativo da categoria econômica preponderante e que poderia contemplar várias empresas.

A indefinição da situação econômica do país, aliada à instabilidade política talvez criem dificuldade para que as empresas sejam motivadas ao programa que, repetindo o que dissemos anteriormente, traz meios de negociações dispensáveis porque a legislação trabalhista já contemplava formas de flexibilização para momentos críticos e caberia às negociações coletivas a adequação de acordo com as necessidades da empresa e dos trabalhadores.



Paulo Sergio João é advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Fundação Getulio Vargas.



Revista Consultor Jurídico, 4 de dezembro de 2015, 8h01

Cabe à Justiça comum julgar contrato de trabalho que não é celetista




Como não se trata de um contrato de trabalho de regime celetista, é a Justiça comum que deve processar e julgar ação movida por um de portaria que trabalhou para o estado da Paraíba durante 40 anos, por meio de contrato de trabalho temporário, sem aprovação em concurso público. A decisão, do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, se deu no Conflito de Competência 7.931, suscitado pelo juízo comum diante do Tribunal Superior do Trabalho. Assim, o caso irá para o juiz de Direito da 2ª Vara da comarca de Princesa Isabel (PB).

A ação foi ajuizada na Justiça do Trabalho pedindo o ressarcimento de verbas trabalhistas. O trabalhador, que prestou serviços de 1979 a 2009, alega não ter situação salarial regulamentada e que deixou de receber diversas verbas indenizatórias pela falta do recolhimento do FGTS, um terço de férias e 13º salário, entre outras.

Após o trânsito em julgado, o estado da Paraíba ajuizou ação rescisória, e o Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região anulou a sentença, por reconhecer que a competência seria da Justiça comum estadual. Essa decisão foi mantida pelo TST em recurso ordinário.

Ao decidir pela competência da Justiça comum, o ministro Dias Toffoli assinalou que o STF, no julgamento da ADI 3.395, deferiu medida cautelar para suspender interpretações do inciso I do artigo 114 da Constituição Federal que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, o julgamento de feitos em que a relação seja de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo.

“Não há contrato de trabalho firmado entre as partes sob o regime celetista”, esclareceu. “O estado da Paraíba, em sua defesa, afirmou expressamente que a contratação temporária se deu por meio de relação jurídica administrativa, e que a contratação havia sido em caráter temporário.”

A decisão cita diversos precedentes nos quais, em situação semelhante, o STF tem afastado a competência da Justiça do Trabalho. “Não compete à Justiça do Trabalho processar e julgar causas fundadas em relação de trabalho com a administração, inclusive as decorrentes de contrato temporário, ainda que a contratação seja irregular em face da ausência de prévio concurso público ou da eventual prorrogação indevida do vínculo”, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

CC 7.931



Revista Consultor Jurídico, 4 de dezembro de 2015, 11h44

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

A Constituição não é o que STF diz que ela é ou quer que ela seja




* Texto produzido pelos professores do Programa de Pós-Graduação em Direito da UNICAP.

No último dia 25 de novembro, o país acordou com a notícia de que o Supremo Tribunal Federal, através de sua 2ª Turma, decretara a prisão do senador Delcídio do Amaral. Sem dúvida, é um fato emblemático. Muitos aplaudiram a decisão da Corte, que foi vista como um importante gesto de combate à impunidade em relação aos delitos cometidos por importantes atores da classe política. Alguns ministros vocalizaram o que há muito tempo está na garganta de muitos brasileiros. O ministro Celso de Mello foi enfático ao afirmar: “É preciso esmagar e destruir com todo o peso da lei esses agentes criminosos que atentaram contra as leis penais da República e contra os sentimentos de moralidade e de decência do povo brasileiro”. Por sua vez, a ministra Cármen Lúcia bradou: “Quero avisar que o crime não vencerá a Justiça. A decepção não pode vencer a vontade de acertar no espaço público. Não se confunde imunidade com impunidade. A Constituição não permite a impunidade a quem quer que seja”.

Ainda no mesmo dia, por uma esmagadora maioria, o Senado confirmou a prisão, mantendo a decisão do STF. A respeito desse singular episódio de nossa história político-constitucional, convém destacar alguns aspectos que nos parecem relevantes. Antes de tudo, é preciso deixar claro que os crimes imputados ao senador Delcídio do Amaral são gravíssimos e devem ser apurados. Uma vez comprovada ocorrência desses crimes e sua culpa, assegurando-lhe o devido processo legal, o senador deve ser responsabilizado conforme nossa legislação. Nem mais, nem menos.

É de amplo conhecimento que a Constituição estabelece um conjunto de regras que compõem o chamado “Estatuto dos Congressistas”. Dentre elas, encontram-se a inviolabilidade, as imunidades e a prerrogativa de foro, tidas como garantias institucionais para assegurar independência do membro do Congresso Nacional no exercício do mandato parlamentar. Historicamente, tais prerrogativas visam resguardar os representantes eleitos de perseguições, investidas ou retaliações, especialmente perpetradas pelo Governo, as quais pudessem comprometer a adequada realização das atribuições inerentes ao cargo eletivo. Nesse sentido, a Emenda Constitucional 35/2001 criou a imunidade formal quanto à prisão, pela qual “os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.” (artigo 53, §2º, CF).

A única exceção a tal regra diz respeito à prisão decorrente de decisão condenatória transitada em julgado. Afora esta situação, a Constituição veda, taxativamente, qualquer modalidade de prisão, a não ser aquela proveniente de flagrante de crime inafiançável. Exige-se, portanto, a presença de dois requisitos: flagrância e crime inafiançável. Isso não significa que um parlamentar não venha a responder criminalmente durante seu mandato. Aliás, muitos dos congressistas eleitos para o exercício do presente mandato encontram-se atualmente na posição de réus em ações penais. Não podem, contudo, em decorrência das imunidades, sofrer prisões processuais, respondendo ao processo judicial em liberdade. Logo, aplicar a regra da imunidade formal quanto à prisão não é sinônimo de impunidade, pois ela não representa qualquer obstáculo ao andamento da ação penal e, caso o parlamentar venha a ser condenado, deverá cumprir a pena estabelecida. Apenas não podem ser presos preventivamente e tampouco temporariamente.

Por essa razão, a decisão do STF causou estranheza a boa parte dos professores de Direito Constitucional e de Ciências Criminais, acostumados a ensinar aos seus alunos que deputados e senadores apenas podem ser presos em flagrante delito de crime inafiançável. Diante de perguntas dos alunos, esses docentes estavam habituados a explicar que a regra visava impedir que prisões processuais pudessem ser usadas para desestabilizar ou impedir a representação e que era um custo que a democracia assumia. Não há, na Constituição, qualquer espaço para prisões cautelares de parlamentares. O texto é enfático na restrição e não deixa margem para interpretações extensivas. Ao contrário, a Constituição determina que a imunidade subsiste, inclusive, durante uma situação excepcional como o Estado de Sítio (artigo 53, § 8º, CF), o que demonstra ser temerária qualquer relativização da garantia constitucional em época de normalidade institucional.

É evidente que a imunidade, na dimensão em que foi constitucionalizada, pode ser usada de forma distorcida, assim como outras garantias também podem. A crítica, no entanto, em relação às imunidades, precisa resultar em propostas de alteração do texto constitucional e em pressão política para que o texto seja revisto. E isto já ocorreu em relação à outra modalidade de imunidade parlamentar. De fato, inicialmente, a Constituição previa que o STF apenas poderia iniciar ação penal contra parlamentar no curso do mandato mediante licença prévia da Casa Legislativa. Na prática, porém, essa prerrogativa levou a um sem número de episódios, muitas vezes impulsionados por razões corporativistas, em que o Parlamento simplesmente silenciava diante do pedido feito pela Corte para iniciar alguma ação penal. O tribunal ficava de mãos atadas, pois nada podia fazer sem a autorização do Parlamento. A distorção da imunidade parlamentar, à época, não serviu de justificativa para o STF ignorar o preceito constitucional ainda vigente. Ao contrário, a crítica severa ao instituto fez com que a exigência de licença prévia fosse posteriormente revogada pela EC 35/2001, que deu nova redação ao artigo 53, § 3º. Portanto, se a imunidade formal quanto à prisão, outrora justificada para proteger a liberdade de locomoção do parlamentar contra prisões arbitrárias, perdeu sua razão de existir em um ambiente de estabilidade democrática, nada impede que seja modificada pelo processo de reforma constitucional. Porém, até que isso ocorra, a regra não pode ser ignorada, não devendo ser decretada prisão preventiva contra congressista. Cuida-se, tão-somente, de respeito à legalidade constitucional.

Outrossim, poder-se-ia pensar fazer uso do conhecido método da ponderação para afastar a aplicação do artigo 53, §2º , da CF, em nome de algum princípio constitucional. Todavia, a ponderação, quando adequadamente utilizada, pressupõe um conflito entre princípios, o que não é o caso, pois o preceito constitucional que proíbe a prisão preventiva de parlamentar é uma norma-regra, submetida não a sopesamentos e sim à logica do tudo ou nada. É dizer, ou estão presentes os requisitos constitucionais que autorizam a prisão, e esta pode ser decretada, ou não estão presentes, e, neste caso, não são legítimos giros hermenêuticos para promover interpretações extravagantes. Curiosamente, a corte possui precedentes que reconhecem a aplicação da citada imunidade mesmo para obstar prisões civis por descumprimento de pagamento de pensões alimentícias, situação que sequer guarda relação com a atividade pública de parlamentar. E, não obstante, a regra é aplicada também a esses casos, pois apenas pode haver prisão em caso de flagrante de crime inafiançável. Portanto, o que se deve evitar aqui é a utilização equivocada do método da ponderação para criar uma falsa justificação buscando afastar a aplicação de comando constitucional vigente. Infelizmente, muitos têm sido os casos em que a ponderação é empregada como válvula de escape para que o juiz decida com base em preferências pessoais, configurando um decisionismo que deve ser combatido com veemência.

Na presente situação, um crime afiançável — no caso, o de organização criminosa (artigo 2°, § 1° da Lei 12.850/2013) — foi, com a decisão, transformado em inafiançável com uma errônea e indevida aplicação de dispositivos processuais penais e sob o argumento de que “o tom absolutista de proibição da prisão cautelar [...] não se coaduna com o modo de ser do próprio sistema constitucional. Se não são absolutos sequer os direitos fundamentais, não faz sentido que seja absoluta a prerrogativa parlamentar de imunidade à prisão cautelar”. Os delitos caracterizados como inafiançáveis são apenas aqueles dispostos na Constituição e no Código de Processo Penal: racismo, tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos e crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. O senador Delcídio do Amaral foi preso pelo delito de organização criminosa, afiançável, portanto, já que fora do rol antes mencionado. O artigo 324, que serviu de alicerce à decisão do STF, apenas informa que, no caso de delitos afiançáveis, a fiança não será concedida quando cabível a prisão preventiva — por óbvio!

Em suma, o senador foi preso em flagrante pela prática de um delito afiançável, violando frontalmente a regra proibitória constitucional.

É compreensível que, a partir de todo um clamor social e de uma sensação de descontentamento da opinião pública diante de sucessivos escândalos de corrupção, faz crescer, em certa medida, a ânsia pela punição exemplar daqueles que ocupam importantes cargos na vida política do país e que protagonizam a instrumentalização das instituições para fins privados. A crença no caráter exemplar da reação punitiva, aliada ao problema de perpetuação de um Estado patrimonialista, nos leva a aceitar um discurso legitimador de decisões como a que foi tomada pelo STF. Todavia, a punição, a qualquer custo, e passando por cima das leis e da própria Constituição, antes de ser o remédio para o problema, pode se transformar em perigoso veneno em desfavor das liberdades públicas. A missão institucional do STF, o que vale para o Poder Judiciário em geral, não é atuar como uma espécie de “justiceiro”. Ser o “guardião da Constituição” pressupõe um compromisso em defendê-la, seja em seus elementos virtuosos , seja em tantos outros que merecem aperfeiçoamentos. Porém, sob o pretexto de “fazer justiça”, o Poder Judiciário não pode ir de encontro precisamente àquilo que lhe compete defender e seguir intransigentemente: a Constituição.

E nesse caso, a manipulação política de preceitos fundamentais não é admissível no Estado de Direito. A lógica é a mesma para o que se busca denominar de punição exemplar em casos de corrupção, assim como para os mais comuns clientes desse sistema — negros e negras, pobres e periféricos. O fato é que essa punição moralizadora assumida pelo sistema punitivo acaba por eleger bodes expiatórios, independente da ideologia político-partidária que a inspire. Esta cautela busca afastar o estigma da seletividade do Sistema de Justiça Criminal, revitalizando-o em sua perspectiva retributiva, seja para a definição do punitivismo comum, aquele que recai sobre os mais vulneráveis, seja para os próprios atores das agências de poder criminalizante.

Por isso, a indignação não pode ser seletiva. Ainda nesse mês de novembro, o STF relativizou a garantia constitucional da inviolabilidade de domicílio, autorizando a invasão em residências sem ordem judicial, para posterior validação judicial (RE 603.616). Nesse caso, a maleabilidade constitucional recaiu sobre o pedido de um cidadão pobre, acusado de tráfico de entorpecentes.

A decisão causou também espécie em criminólogos e defensores de direitos humanos, que vêm denunciando as chamadas ‘entradas forçadas’ ou ‘franqueadas’ por parte das forças de segurança nas casas de moradores e moradoras das periferias brasileiras. Naqueles bairros, certo “estado de exceção permanente” parece se perpetuar no métier da segurança pública e o que o STF fez foi, tão-somente, reforçar e autorizar essas práticas.

Ante o cenário de perpetuação de um Estado de Polícia, o direito positivo é uma barreira de contenção possível, inobstante frágil, dado o certo de grau de indeterminação semântica que possui. Porém, ele não é totalmente indeterminado. A Constituição não pode ser vista pelo intérprete, sobretudo pelo STF, como um repertório de palavras vazias aguardando construções de sentido arbitrariamente formuladas. O direito legislado, incluindo o próprio texto constitucional, não é um cheque em branco dado ao juiz constitucional. Em uma Democracia Constitucional, a Constituição não é o que STF diz que ela é ou quer que ela seja. Do contrário, somos forçados a reconhecer que não dispomos de parâmetros minimamente objetivos e racionais para identificar o direito democraticamente produzido, pois tudo é reduzido ao que juiz pensa sobre o direito.

Além disso, e, desta feita, seguindo o que determina a CF, o STF comunicou sua decisão ao Senado dentro do prazo de vinte e quatro horas. Quando a CF afirma que cabe ao Senado resolver sobre a prisão, isso significa que ele possui autonomia para deliberar sobre manutenção ou não da prisão. Trata-se de uma avaliação acentuadamente política, como não seria diferente, em se tratando de uma Casa Legislativa. De forma curiosa, alguns Senadores, na sessão em que se resolvia sobre a prisão, defenderam que não poderiam ir de encontro à decisão do STF. Ora, é razoável que, por razões as mais diversas, o Senado optasse por manter a prisão, alinhando-se à decisão da corte. Porém, afirmar que deve seguir a decisão do STF é renunciar à própria função de contrapeso que a Constituição lhe atribuiu, o que represente uma diminuição institucional da casa.

Também causa estranheza quando uma corte da envergadura do STF se utiliza de expedientes retóricos para transmitir lições à sociedade. O uso de frases impactantes, com conteúdos de elevado apelo moral e ético, busca apenas criar uma imagem perante o senso comum de que o tribunal se encontra num patamar moral superior às demais instituições e que pode, lá do alto, apontar, implacavelmente, os desvios dos outros. Essas fundamentações maximalistas poucos acrescentam à consistência e legitimidade de seus acórdãos, até porque não integram sua ratio decidendi.

Melhor seria que o STF reafirmasse seu papel de defensor da ordem constitucional, decidindo com base na constituição, e não apesar dela. E para qualquer cidadão que dele demande, seja o senador da República, na prerrogativa constitucional da imunidade parlamentar; da seja o pobre periférico, na garantia da inviolabilidade de domicílio. Já terá feito muito. E terá dado sua real e significativa contribuição para a nossa democracia.

Portanto, entendemos que a decisão da corte é frágil, porque destoa da literalidade do texto constitucional, ignora toda a construção doutrinária em torno da imunidade formal e surpreende a própria narrativa de seus precedentes. Aceitar, de forma tranquila, que decisões como essa sejam isentas de crítica é tornar a Academia caudatária dos pronunciamentos judiciais. E pior: é reconhecer o fracasso do projeto político de Estado Democrático de Direito, pois a hegemonia política dos monarcas e presidentes teria sido devidamente substituída pela elegante hegemonia dos Tribunais. E isso é um supremo equívoco.

* Este texto foi produzido pelos seguintes professores do Programa de Pós-Graduação em Direito da UNICAP do Grupo Recife de Estudos Constitucionais (REC/CNPQ) e do Grupo Asa Branca de Criminologia (CNPQ): Adriana Rocha Coutinho; Carolina Salazar; Érica Babini Machado; Fernanda Fonseca Rosenblatt; Flávia Santiago Lima; Glauco Salomão Leite; Gustavo Ferreira Santos; Helena Rocha Castro; João Paulo Allain Teixeira; José Mário Wanderley Gomes Neto; Luiz Henrique Diniz Araújo; Marcelo Casseb Continentino; Marcelo Labanca Corrêa de Araújo; Marília Montenegro P. de Mello e Stéfano Toscano.


Revista Consultor Jurídico, 3 de dezembro de 2015, 6h43

O nome que o STF dá é o nome que fica? Eis o busílis do caso Delcídio!







Abstract: O caso Delcídio suscita vários questionamentos. A coluna de hoje busca discutir este caso de forma não ortodoxa, não dogmática, com a intenção de refletir. Mais sobre o futuro do que sobre o “agora”.

Calvo Gonzalez e eu discutimos dias destes, em seminário em Málaga, sobre como os primeiros gregos “disseram o mundo”. Na aurora da civilização, houve um dia em que alguém tinha de nominar. Platão, pela boca de Sócrates, escreveu o primeiro livro de filosofia da linguagem, o Crátilo. O capítulo mais bonito: Da justeza dos nomes. Por que uma coisa tem o nome x e não y? Não vou contar a história, até porque em meus livros falo disso amiúde.

Sigo. No início, o homem era a medida de todas as coisas. Aliás, Protágoras foi quem disse essa frase: o homem é a medida de todas as coisas. Claro. Seu corpo “media tudo”. Interessante é que, até hoje, usamos as primeiras formas de nomear: pé da árvore, pé direito dos prédios, medimos a altura em pés, palmos, polegadas; falamos do ventre da montanha, da garganta da serra; do olho do furacão, do céu da boca, da pele da fruta, do corpo de baile etc.. Para dizer “instante”, o primeiro grego disse “num piscar de olhos” (em alemão é Augenblick, para se ter uma ideia do valor da semântica). E assim por diante.

Protágoras... Quase poderia dizer que protagonismo vem de Protágoras (mas vem de Protos + agonistes; principal lutador). Por que estou falando (d)isso? Para lembrar as circunstâncias e contingências pelas quais passa o Supremo Tribunal Federal. Sim. Por vezes, o STF está como o primeiro grego: tem de nomear. Assume o papel de protos agonistes. Só que, quando nomina, repercute. Para retomar os gregos: o STF, para o bem e para o mal, funciona (às vezes e em raríssimas exceções) como o nomoteta. E quem era onomoteta? Era o “dador de nomes”. Na verdade, era o “grande legislador”, como se vê na obra Crátilo. Não é por nada que, em alemão, legislador se chame Gesetzgeber, que quer dizer, literalmente, o que dá as leis (logo, legislador). Bingo.

Assim, o “nome” (a decisão) que o STF dá repercute. Protago...niza. Ele acaba sendo mesmo uma espécie de Protágoras, porque, excepcionalmente — diante de uma contingência — diz o direito “pela primeira vez”. Por causa disso, por vezes, ele, o STF, acaba sendo a “medida de todas as coisas”, quer dizer, “do direito”. Por isso, suas nominações (sim, quem decide “dá nome àquele caso”) têm — sempre — efeitos colaterais. Por vezes, indesejados. Os casos têm filhotes. São reproduzidos. E, em algumas ocasiões, a origem se esfumaça. O “nome” dado adquire vida própria. E perde o DNA.

Dois episódios sobre “nominação”
Dois episódios merecem ser colocados no contexto de nominação protagonizado pela Suprema Corte. Como diria o Pequeno Príncipe, se tivesse uma causa no STF, “a Suprema Corte é responsável pelas causas que cativa”, quer dizer, que nomina.

O primeiro episódio é o da ADI 3.943, pela qual o STF disse que a Defensoria pode patrocinar ações civis públicas. OK. Decisões do STF valem. São definitivas. Só que o “nome dado” pelo STF, nesse caso, ficou ambíguo, porque não disse, com todas as letras necessárias, quem seriam os destinatários desta nova forma de atuação. Quaisquer pessoas, ou apenas aquelas que a Constituição (que nomina as coisas antes do STF) indicou, os tais carentes de recursos (artigo 5º, LXXIV)? Resultado: uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (EREsp 1.192.577) — interpretando o “nome” dado pelo STF à coisa “carentes de recursos” — permite a existência de um outro nome para os “carentes” (lá, no STJ, falou-se em vulnerabilidade existencial); já no Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça estadual disse que a Defensoria podia patrocinar a causa de uma Delegada de Polícia, porque decidiu que a expressão necessitados, empregada pela Constituição (artigo 134), abrangeria os hipossuficientes organizacionais. Não bastasse, mais recentemente, a Defensoria Pública do RS postulou em Juízo que a Uber fosse autorizada a trabalhar no Brasil. Sim, a UBER, esse giganteorganizacional, para usar a linguagem cara à Defensoria, com o novo nome que se dá ao que é “carente de recursos”, poderá se beneficiar desse protagonismo. Uber vale bilhões. Pagou os melhores pareceres dos maiores juristas (a ConJur publicou os pareceres, por certo não dados pro bono). Qual será o novo nome a ser dado à expressão “carente de recursos”?

Eis, portanto, o problema das repercussões dos “nomes dados”. A cada nomeação/nominação que o STF faz (e nem é necessário discutir o mérito), o sistema reage. Como foi na aurora da civilização, uma ADI é, hoje, a aurora epistêmica do sentido da lei. O STF funciona como o Sinngeber (o dador de sentidos, isto é, o atribuidor de sentidos). Por isso é que ele deve dar o nome bem simples e claro ao que seja “carente de recursos”. Deve dizer se carentes de recurso é carentes de recursos, carente organizacional, carente existencial, carentes de afetos... Para o bem e para o mal. Antes que a Vale do Rio Doce seja beneficiada por alguma ação da Defensoria... Afinal, por trás da Vale existem milhões de hipossuficientes... Como no caso da Uber, que transportará... hipossuficientes e hipersuficientes. Ou Übersuficientes, se me permitem a ironia (Über, em alemão, é acima, sobre, super). Eis o problema.

Claro, a Defensoria não admite patrocinar a causa da Uber (ver aqui), mas, sim, a dos “motoristas particulares” e dos “consumidores do serviço”, estes “grupos em situação de vulnerabilidade”. Mas, sejamos francos: os interesses desta gente são, ou não, confluentes com os da própria Uber? E a Uber já não está devidamente assistido, em Juízo e fora dele? Qual é o argumento original, inovador, que a Defensoria trouxe para o debate processual a respeito dessa questão (que ocupa a ordem do dia em Porto Alegre)? E o pior — e isso deve ser dito — é que este clima de anything goesestá sendo de algum modo, permitido/provocado pelo próprio STF. Por quê? Por causa da nominação. Como falei acima, a Suprema Corte deve dar o nome certo à coisa. Entendem o que quero dizer? Como dizia Stephen Georg, que nada seja onde falta a palavra (Kein Ding sei wo das Wort gebricht).

O segundo episódio é o da prisão do senador Delcídio do Amaral. Como é a primeira vez que um senador é preso, tem-se, evidentemente em face das particularíssimas circunstâncias do caso — uma vez que todos os “demais gregos” tinham até então, um determinado sentido de flagrante e inafiançabilidade — a aurora do sentido do que seja “flagrante” e “crime inafiançável”. O STF esteve diante de uma situação inusitada, como quando alguém diz “não tenho palavras para dizer tal coisa...”. E fê-lo.

Ocorre que, na medida em que não podemos sair por aí trocando o nome das coisas, essa “nominação” do STF tem/terá repercussões imensuráveis. Veja-se: não preciso traçar uma linha de elogio ou crítica à decisão. Não é a intenção desta reflexão. Ademais, prefiro não me precipitar, uma vez que o próprio STF terá em breves dias uma rediscussão da matéria, quando chegar para seu exame a denúncia (peça ovo criminal) contra Delcídio e os demais. Provavelmente o PGR denunciará Delcídio também por organização criminosa (outra questão — o que é isto — a organização criminosa? Qual é o “nome” dessa coisa?).

Por isso, o que mais deve nos preocupar não é fato em si, isto é, se a Suprema Corte acertou ou errou ao dar o sentido do alcance da expressão “flagrante”, estendendo-o até caber no conceito de crime permanente, ou se crimes inafiançáveis não são apenas o racismo, o tráfico, a tortura, o terrorismo, a ação armada contra o Estado e os crimes hediondos. Não. O que mais deve preocupar a comunidade greco-forense (permito-me a alegoria) é o dia seguinte: já que o STF deu o nome a essas coisas novas(afinal, nunca um senador fora preso), teremos que passar a chamá-las agora por esse nome (faço, de novo, uma alegoria com a filosofia).[1] Não esqueçamos, como dizia Saussure — lembro de minhas aulas de semiologia nos anos 80 do mestre Warat —, que a atribuição de sentido possui quatro caracterizações: 1) o sentido é, primeiramente, convencional (como o primeiro grego fez); 2) surge, então, a imutabilidade (nome dado, nome “ficado”); 3) exsurge a mutabilidade (passa o tempo, mudam os fatos... e os sentidos podem ser alterados); 4) por último, a linearidade (um sentido não ocupa o mesmo “espaço” do outro). Eis, pois, o busílis da questão do caso Delcídio: quais serão as repercussões dos sentidos atribuídos pelo Supremo Tribunal?

Se pensarmos, por exemplo, que a jurisprudência deve ter estabilidade, coerência e integridade, talvez o grande problema do STF seja o “de que modo ele tratará os próximos casos”. Não parece que o caso Delcídio possa ser entendido como o estabelecimento provisório de um Estado de Exceção Hermenêutico, algo que o jornalista-filósofo da Folha de S.Paulo, Hélio Schwartsman, chamou de “Decisão forçada” (leia aqui). Como referi, prefiro ser mais cauteloso e aguardar os próximos acontecimentos. A matéria ainda passará por mais discussões, com as complexidades de coisas como a Súmula 606, que impede HC contra decisão colegiada do STF (mas isso é assunto para outro dia, uma vez que existe o HC 127.483/PR – Rel. Min. Dias Toffoli, em que houve empate e o paciente foi beneficiado). O próprio PGR está com um “pepino” nas mãos, porque terá que oferecer denúncia e justificar tudo o que pediu antes (sem considerar que, cá para nós, o PGR deveria explicar por que razão a mais alta autoridade do MP faz um pedidocontra legem, que, fosse o STF interpretá-lo de forma mais ortodoxa, não o teria conhecido; afinal, se não existe prisão processual de parlamentar, como requerer a sua preventiva? Sim, exatamente com esse nome?).

O quero dizer é que, assim como o homem era a medida de todas as coisas na aurora da civilização, também o STF acaba assumindo o papel de ser a medida do direito (veja-se: não estou me rendendo, nem de longe, ao aforisma de que “o direito é o que o judiciário diz que é”; quero dizer que, institucionalmente, o STF tem o poder de dizer por último – e em alguns casos, por primeiro, o sentido — dar o nome — do direito). Obviamente, esta situação se torna cada vez mais rara diante do aumento da complexidade do sistema jurídico com o passar do tempo.

Então qual é ponto central? O busílis é que nos resta saber qual é a régua (régua = medida, lembrando de Protágoras) que o STF usará nas causas que vem por aí tratando de prisão em flagrante e sua respectiva extensão a partir do critério da permanência da atividade criminosa. Nome dado, nome que fica? Do mesmo modo, terá que definir qual a medida que usará para definir a prisão preventiva em casos de inafiançabilidade. Claro: reconheço que os gregos tinham uma vantagem. É que depois de Protágoras, vieram Platão, Aristóteles e, no medievo, Agostinho, Aquino, Ockham para só depois chegarmos à filosofia da consciência. No caso do Supremo, é tudo com ele mesmo. Ele é que decide em última ratio a matéria para o qual a Constituição lhe atribui a primeira e a última palavra (eis o paradoxo), podendo errar ou acertar, ou um pouco das duas coisas simultaneamente. O Supremo é, ao mesmo tempo, Protágoras, a antiguidade, a modernidade, a viragem linguística. Eis a especificidade do direito: a fala, o discurso, a decisão jurídica institui; estabelece; fixa. Vincula. O STF terá que dizer qual é a força normativa da Constituição. Os limites semânticos importam? Não tenho dúvida de que sim, eis que até de positivista exegético sou “acusado”. O STF é que tem a responsabilidade política do ônus argumentativo. Ou seja: é como se perguntassem para Protágoras porque nominou a distância em braças, pés e passos. A diferença é que Protágoras não tinha que dar explicações.

Numa palavra reflexiva.
Quando se lida com o Direito, lida-se com conceitos interpretativos. Digo isso para deixar claro que o que quero discutir não é com quantos centavos se faz um necessitado (ou carente) e nem bem qual o conceito de flagrante ou deinafiançáveis, atribuído de forma convencional. Quero, isto sim, debaterconteúdo. O argumento jurídico é sempre um argumento substantivo.

Qual o estatuto, por assim dizer, das chamadas imunidades parlamentares? Muito genericamente, poderíamos dizer que as tais imunidades são prerrogativas de que o mandato parlamentar seja exercido de forma livre de coação. É uma garantia da independência da atuação do parlamentar. A ideia é, por um lado, garantir a livre expressão de opinião, palavras e votos; e, por outro, proteger o congressista contra restrições arbitrárias à privação de sua liberdade. Com alguma licença, para me fazer entender: o que não se quer é proibir o político de fazer... política. Sim: política e não outras coisas. Aliás, foi graças aos nossos maus antecedentes que incluímos imunidades no texto constitucional. Trata-se de proteger a democracia.

Com isso em mente, e deixando de lado o debate sobre se inafiançáveisseriam apenas aqueles crimes referidos no próprio texto constitucional, temos que discutir o “nome” dado à prisão em flagrante nesse caso e suas repercussões para o futuro. Qual é a relação entre flagrante e permanência? Mas, mais do que o “nome” dado à flagrância, temos que discutir se o STF fez uma interpretação relativizando a imunidade ou se fez uma interpretação devidamente justificada pelas circunstâncias.

Por óbvio, não estou sugerindo uma interpretação teleológica da Constituição. Todos sabem que não sou consequencialista. Não estou dizendo que o texto pode ser subvertido quando “um valor mais alto se alevanta” (sic). Não é isso. Mas uma coisa parece certa: em alguns casos muito excepcionais, se inaugura, institucionalmente, uma nova cadeia interpretativa (eis a característica da “mutabilidade” que parece ter ocorrido com a nominação de que falei). Mas, atenção: daí exsurge um ônus, representado pelo fato de que os nossos olhos não devem apenas voltar-se para o agora, mas sobretudo, para os próximos capítulos que se estão a suceder. Um nome que é dado é um nome que fica? Para todos os “greco-brasileiros”? Esse é o busilis.


[1] Só para registrar: adoro discutir Protágoras; adoro discutir também Ockham (que de certo modo faz algo parecido ao dizer que só existem coisas particulares). Mas, é claro, como hermeneuta, sou adepto do giro linguístico-ontologico, em que os sentidos se dão em um a priori compartilhado.


Lenio Luiz Streck é jurista, professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do Escritório Streck, Trindade e Rosenfield Advogados Associados:www.streckadvogados.com.br.



Revista Consultor Jurídico, 3 de dezembro de 2015, 8h00

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