quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Indenização de R$68 mil por bombom estragado é enriquecimento ilícito


Indenização de R$ 68 mil por bombom estragado é enriquecimento ilícito




Encontrar objeto estranho em uma embalagem de alimentos não caracteriza, por sí só, a possibilidade de indenização por dano moral da empresa fabricante. Assim entendeu, por maioria de votos, a 4ª Câmara de Direito Privado de São Paulo, ao negar o provimento de ação indenizatória movida contra a empresa Chocolate Garotos. Na ação, a apelante queria uma indenização de R$ 67.800 por encontrar larvas de inseto em uma caixa de bombom de R$ 6,99, da qual ela não comeu nenhum bombom.

A decisão vai de encontro a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, que condenou a Coca-Cola a pagar quase de R$ 15 mil a uma moradora de São Paulo por ter encontrado um corpo estranho em uma garrafa de refrigerante. É que no caso dos bombons, a Justiça entendeu que o fabricante não pode ser responsabilizado pela armazenagem e venda de produto fora da validade pelo lojista.

Ao negar a continuidade da ação, o desembargador Carlos Teixeira Leite, relator do recurso no tribunal, apontou três razões fundamentais. Em primeiro lugar, o voto diz que a recorrente não provou que havia ingerido o bombom estragado. Segundo o acórdão, havia fotos da embalagem lacrada com detalhes dos insetos, mas não dos bombons consumidos. Não havia sequer pedido de testemunho em juízo do cunhado da apelante, que a teria presenciado comer o bombom.

A decisão afirma que a mera constatação de objeto estranho é “insuficiente para causar um abalo moral indenizável” e, se considerado que as empresas de produtos industrializados atuam em larga escala, “uma ou outra falha pontual [é] esperada e até mesmo tolerável”, diz o documento.

O voto afirma, também, que o defeito na embalagem foi “antes, uma falha na conservação do produto pelo comerciante, do que propriamente na fabricação”, o que inviabiliza a ação direta contra a fabricante do bombom.

No acórdão, o desembargador apontou como fato mais grave a tentativa de enriquecimento pela judicialização de uma questão. “Tanto é assim que sequer cuidou ela de requerer nos autos a substituição da caixa de bombons por uma nova ou mesmo ser ressarcida pelos R$ 6,99 despendidos, limitando-se a pleitear uma reparação no absurdo valor de R$ 67.800”.

Clique aqui para ler o acórdão.


Alexandre Facciolla é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 9 de outubro de 2014, 8h49

Direito penal do fato ou do autor? A insignificância e a reincidência


Direito penal do fato ou do autor? A insignificância e a reincidência



Machado de Assis tem um conto chamado Suje-se gordo. Não tem vírgula, não. Não é “suje-se, Gordo”. Trata de um julgamento do qual se tira a seguinte lição: vá fundo na “maracutaia”. Tem de valer a pena. Se é para se sujar, suje-se gordo. Quem praticou pequeno delito, lascou-se; quem “sujou-se gordo”, deu-se bem. Essa é a moral da história do conto de Machado de Assis.

Relendo o conto, dou-me conta das discussões sobre os critérios para aferir o que é bem jurídico relevante em terrae brasilis. Historicamente o direito penal tem sido feito para os que não têm e o direito civil para os que têm. Já disse isso várias vezes (afinal, sofro de LEER – Lesão por Esforço Epistêmico Repetitivo): o Código Criminal de 1830 foi feito para pegar escravos, o de 1890, para pegar ex-escravos e seus filhos, e o de 1940 para proteger nitidamente a propriedade privada contra os ataques da patuleia, a ponto de dobrar a pena no furto nos casos de escalada, chave falsa, etc. Elementar isso, pois não?

O problema é que, em pleno Estado Democrático de Direito, ainda continuamos com essa atribuição liberal-individualista de sentidos ao que seja bem jurídico. Isso salta aos olhos quando comparamos os tipos penais do furto qualificado com crimes como sonegação de tributos e lavagem de dinheiro (poderia fazer um quadro comparativo, mas o espaço não permite).

A todo o momento isso volta à tona. A falta de uma filtragem hermenêutico-constitucional na legislação penal continua fazendo vítimas cotidianamente. E quem mais sofre são naturalmente os componentes do andar de baixo da sociedade.

Digo isso para retornar à discussão sobre o sentido do princípio que vem salvando, em determinadas circunstâncias, a teoria do bem jurídico no tocante aos crimes contra a propriedade, especialmente o furto. O problema é a falta de uma universalização de sua aplicação. Ou, mais do que isso, posso afirmar que o problema é a ausência do critério da igualdade na sua aplicação pelos tribunais.

Explico. Recentemente o Superior Tribunal de Justiça voltou a enfrentar a questão da aplicação da insignificância no crime de descaminho, considerando para tal o valor de R$ 10 mil (artigo 20, caput, da Lei 10.522/02) e/ou a Portaria 75 do Ministério da Fazenda que, em seu artigo 1º, inciso II, fixou o valor mínimo de R$ 20 mil para execução de dívidas tributárias.

A problemática veio à baila no AgR no Recurso Especial 1.4.657-RS (2014/07126-). O caso concreto não apresenta relevância para ser discutido, porque o valor ilidido não chegou a R$ 100. Entretanto, o que é importante voltar a discutir é a (ausência de uma) criteriologia utilizada pelo Poder Judiciário para dizer se uma conduta é insignificante penalmente ou não.

Minha questão, aqui, não é enfrentar e/ou criticar a aplicação analógica da Portaria 75 do Ministério da Fazenda (veja-se a decisão do TRF-3) ou o valor pela metade determinada pela Lei. Tampouco quero questionar a aplicação do favor legis para a sonegação de tributos prevista pela Lei 10.684/03, que estabelece que o pagamento do valor sonegado antes do recebimento da denúncia é causa de extinção da punibilidade. Também não quero discutir ofavor legis dado no artigo 168-A, parágrafo 2º do Código Penal a quem sonega contribuições da previdência... Igualmente não vou questionar a aplicação de uma jurisprudência generosa para quem paga o tributo sonegado mesmo após a sentença transitada em julgado (caso, por exemplo, de Marcos Valério que, no Recurso Especial 942.769/MG, o STJ decidiu pela extinção da punibilidade do crime de sonegação fiscal pelo pagamento de parcelas não recolhidas em momento posterior ao recebimento da denúncia, consagrando o entendimento que o pagamento do tributo a qualquer tempo enseja o fim da possibilidade de responsabilização penal). Não é isso que está em causa.

Mas, então, o que quero discutir? Simples. Quero colocar em xeque a isonomia, a igualdade e a República. Ou existe igualdade, isonomia ou não somos republicanos (na verdade, não somos, mas como sou um otimista “como se”, a partir da filosofia do als ob de Hans Vaihinger...). Como explicar que juízes e tribunais da República se negam a aplicar os mesmos critérios para os crimes contra o patrimônio sem violência, como o furto, a apropriação indébita e o estelionato?

Dois problemas sérios. O primeiro é não aplicar o favor legis da sonegação de tributos para quem devolve a res furtivae nos casos de furto, apropriação indébita ou estelionato. Por que o sujeito que sonega é mais cidadão que o que furta? Por que alguém que ataca o patrimônio do povo é melhor visto pelo establishment que alguém que mete a mão no patrimônio de um particular?

Segundo: por que alguém que pratica descaminho é mais bem visto que alguém que furta? Ou seja, por que para quem pratica descaminho o valor da insignificância chega a valores que a maioria da malta leva um ano ou mais para ganhar e para o furto R$ 200 já é muito? Aliás, se pensarmos em alguns setores do Judiciário e do Ministério Público, o tal principio da insignificância nem existe (ver aqui). A questão do modus aplicativo da insignificância mostra-se extremamente problemática. Veja-se, a esse respeito, o HC 101.998 (Rel. Min. Toffoli, 1ª Turma do STF, j. 23-11-2010), envolvendo furto de barras de chocolate, sendo que a 1ª Turma do STF entendeu que não incidia o princípio da insignificância ao caso porque o agente seria reincidente específico em crimes contra o patrimônio. Ali, houve nítida violação do Direito Penal do fato, aplicando-se o vetusto Direito Penal do autor, a despeito da inexpressiva lesividade da conduta ao bem jurídico tutelado (no caso, nove barras do chocolate diamante negroavaliadas em R$ 45).

Aqui, novamente temos de lembrar a questão fulcral: igualdade, isonomia e aplicação por integridade e coerência. De um lado, R$ 10 mil para descaminho; de outro, R$ 10 negado para furto (ou outros valores para furtos que não tratem de reincidência). Também os pequenos crimes cometidos contra o meio-ambiente são vistos com mais simpatia por setores do Poder Judiciário, como, por exemplo, a absolvição de pessoas que pescaram um peixe dourado (sete quilos) recentemente (ver aqui). Registre-se, desde logo, a correção da decisão do 3ª. Turma do TRF 1ª. Região. O difícil é entender a movimentação de toda a máquina pelo Ministério Público Federal para ver condenados 3 patuléus que, de caniço e samburá, foram pescar alguns peixes. Interessante: naquele Habeas Corpus do caso Valério acima relatado, o parecer do MPF foi a favor da aplicação do favor legis da lei da sonegação, mesmo contra legis, porque já transitada em julgado a condenação do contador do mensalão. Dois pesos, duas medidas...

Sigo. Fui o primeiro a aplicar isonomicamente a lei da sonegação de tributos e o furto sem prejuízo (já tratei disso em outra coluna). Fui também o primeiro a aplicar o favor legis da lei da sonegação para o estelionato:


ESTELIONATO. ÔNUS DA PROVA.
No estelionato, mesmo que básico, o pagamento do dano, antes do oferecimento da denúncia, inibe a ação penal. O órgão acusador deve tomar todas as providências possíveis para espancar as dúvidas que explodam no debate judicial, pena de não vingar condenação (Magistério de Afrânio Silva Jardim).

Lição de Lênio Luiz Streck: os benefícios concedidos pela Lei Penal aos delinquentes tributários (Lei 9.249/95, artigo 34) alcançam os delitos patrimoniais em que não ocorra prejuízo nem violência, tudo em atenção ao princípio da isonomia. Recurso provido para absolver o apelante. (BRASIL. TARS. 2ª Câmara Criminal. Apelação criminal nº 297.019.937. Relator: Amilton Bueno de Carvalho. Data do julgamento: 25 de Setembro de 1997). (íntegra aqui)

E isso lá nos anos 90 do século passado. Aliás, escrevi sobre isso já um ano após a Constituição de 1988.

Passados tantos anos, ainda não conseguimos encontrar um ponto de estofo para a aplicação equânime (falo da fairness dworkiniana) do critério-principio da insignificância. Penso que, para isso, temos que nos desvestir da velha dogmática jurídica, carcomida pelo paradigma liberal-individualista de bem jurídico.

Ainda estamos inseridos no imaginário que albergou o Código de 1940. Somos, portanto, a-históricos. Perdemos o trem da história. Vivemos do passado. A doutrina penal, em boa parcela, continua utilizando os exemplos de Caio, Mévio e Tício, onde a vigência é igual à validade e o patrimônio individual é mais importante que o patrimônio de todos. Afinal, o que é isto — a teoria do bem jurídico-constitucional? Eis uma boa pergunta a ser respondida.

Enquanto não encontrarmos uma resposta adequada, vamos continuar a aplicar a insignificância de modo ad hoc. Do mesmo modo, vamos continuar a aplicar favores legais para um grupo social e deixar de aplicar para a maioria, que frequenta o andar de baixo de nossa sociedade estamental.

Numa palavra e como retranca: entre Hobbes e Rousseau, torço pelo Hobbes F.C., portanto, não tenho ilusões com o direito penal, com a sociedade de bem estar, com a bondade humana, etc. Não sou nem minimalista, nem maximalista: apenas a favor de um direito penal e uma teoria do bem jurídico constitucionalmente adequados. Nisso está o tratamento equânime (fairness) dos bens jurídicos a ser penalizados; nisso está a forma republicana de aplicar a lei: se um sonegador pode receber benesses ao devolver o valor sonegado, por que razão o cara do furto não pode fazer o mesmo? Ou arrumamos isso ou temos de dar razão ao personagem do conto de Machado: suje-se gordo!

Post Scriptum : o STJ rompe com o tabu da reincidência
Leio que a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, seguindo o voto do relator, ministro Sebastião Reis Júnior, trancou — de forma acertada — ação penal em um caso de furto de chocolate vindo de São Paulo (ler aqui). O paciente era reincidente. Esse assunto ainda era tabu, tanto é que o Supremo Tribunal Federal afetou ao plenário a discussão da aplicação ou não do princípio da insignificância nos casos de reincidência. Aqui também quero dizer que fui o primeiro a defender a tese de que a reincidência tem de ser discutida, mormente em termos de ser ou não inconstitucional. Trata-se de um bis in idem e uma violação da secularização que deve haver, no direito penal, entre direito e moral. O Estado não pode punir a sua própria incompetência. E nem pode pretender “melhorar” o indivíduo. Direito penal não é para isso. Durante um considerável período, a 5ª Câmara do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) aplicava minha tese. Perdi recentemente no Supremo Tribunal. Mas, pelo jeito, deixei algumas sementes.

Não será dito, por óbvio, que a reincidência é, “em si”, inconstitucional. Mas pode ser que será dito — como já o foi pela 6ª Turma do STJ — que, em determinados casos, ela não se aplica. Como venho sustentando, toda aplicação de princípio no processo penal é uma hipótese de nulidade parcial sem redução de texto. Mas esse é um assunto para outra coluna. 

Post Scriptum II: a dialética do concreto e o direito
Efetivamente, tenho de estudar mais. Minha ignorância não tem limites. Por isso, leio de tudo. E como aprendo coisas... Há pouco, li no ConJur um artigo em que se fazia uma ode a um tal Princípio da Livre Interpretação da Norma em Concreto (ler aqui). Simplesmente incrível. Ao saber da “existência” desse princípio (mais um para minha coleção) — coisas que se descobre aqui no ConJur — fiquei pensando em, efetivamente, estocar alimentos. O que seria “livre interpretar a norma em concreto”? Confiar na sapiência e na cognição do juiz? No seu sentimento do “justo”? Na sua liberdade de dizer o que é justo? Por favor. O que mais os juristas descobrirão e inventarão? By the way, não resisto em contar: Lembro-me de uma brincadeira com as palavras. Meu professor de filosofia no mestrado na década de 80 mandou ler o livro A Dialética do Concreto, de Karel Kosik. Fui à livraria da universidade. Lá, o moço me disse: “ — Dialética do Concreto? Concreto, concreto... Hum, hum. Vá na parte da física. Ali tem tudo sobre concreto, asfalto, pedras”. Pois é. Interpretar livremente a norma em concreto deve ser algo parecido. Sim... In concreto!


Lenio Luiz Streck é jurista, professor, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.



Revista Consultor Jurídico, 9 de outubro de 2014, 8h00

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Defensoria pede que Levy Fidelix pague R$1 milhão por declarações antigays



“DISCURSO DE ÓDIO”
Defensoria pede que Levy Fidelix pague R$ 1 milhão por declarações antigays

8 de outubro de 2014, 15h00


As declarações feitas por Levy Fidelix (PRTB) contra homossexuais geraram mais um questionamento na Justiça, dessa vez pelas mãos da Defensoria Pública de São Paulo. Uma Ação Civil Pública apresentada na última terça-feira (7/10) pede que o candidato à Presidência no primeiro turno e o partido dele paguem R$ 1 milhão de indenização por danos morais.

Em debate na Rede Record entre presidenciáveis, promovido em 28 de setembro, Levy (foto) foi questionado pela então candidata Luciana Genro (PSOL) sobre a aceitação de casais formados por pessoas do mesmo sexo. Ele respondeu que “aparelho excretor não reproduz” e defendeu a necessidade de que a maioria “enfrente” essa minoria.

“Este discurso de ódio é incompatível com o respeito à dignidade da pessoa humana, não só da pessoa, individualmente considerada, mas da dignidade de uma coletividade”, diz a petição inicial. A Defensoria quer que o dinheiro da indenização seja aplicado em ações de promoção da igualdade do público LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais). Também pede que Levy e seu partido banquem custos de um programa que promova os direitos dessa população.

“A fala do candidato nitidamente ultrapassou os limites da liberdade de expressão para incidir em absurdo discurso de ódio”, afirma a defensora Vanessa Alves Vieira, coordenadora do Núcleo de Combate à Discriminação, ao Racismo e ao Preconceito. “A externalização do preconceito, em especial por um meio de comunicação com ampla repercussão como a televisão, perpetua o tratamento discriminatório e pode produzir efeitos nocivos, como violações a direitos fundamentais e atos de violência”.

Levy nega ter feito declarações homofóbicas. Em entrevista ao Estado de S. Paulo, ele disse que apenas defende a “família tradicional”, mas “sem agressividade” a ninguém, e declarou-se vítima de perseguição por parte de algumas instituições.

Outras críticas
A Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasilchegou a pedir que o Tribunal Superior Eleitoral cassasse a candidatura de Levy Fidelix, mas a solicitação acabou prejudicada porque ele não passou para o segundo turno na eleição do último domingo (5/10). A comissão também enviou pedido de providências ao Ministério Público Eleitoral, ainda sem resposta.

Luciana Genro e o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) também apresentaram representação ao TSE. Com informações da Assessoria de Imprensa da Defensoria Pública de São Paulo.

Clique aqui para ler a petição.


Revista Consultor Jurídico, 8 de outubro de 2014, 15h00

ADI sobre efeito suspensivo de embargos à execução fiscal terá rito sumário


ADI sobre efeito suspensivo de embargos à execução fiscal terá rito sumário




A ação que questiona a proibição ao efeito suspensivo dos embargos à execução fiscal interpostos pelo contribuinte tramitará pelo rito sumário. Em despacho da quarta-feira (1º/10), a ministra Cármen Lúcia, relatora da ADI que discute a matéria no Supremo Tribunal Federal, deu prazo de dez dias para que a Presidência da República, o Senado e a Câmara dos Deputados se pronunciem sobre o assunto. Depois, a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria Geral da República terão cinco dias para se manifestar.

O caso foi levado ao Supremo pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade. Na inicial, a entidade questiona a interpretação dada pelo Judiciário de que a regra que veda o efeito suspensivo a execuções privadas, prevista no Código de Processo Civil, deve ser aplicada também aos casos de recursos do contribuinte contra a Fazenda, descritos na Lei de Execuções Fiscais (LEF).

De acordo com a OAB, esse entendimento veio quando o STJ permitiu a aplicação subsidiária do artigo 739-A do CPC em relação à LEF. O dispositivo do CPC é claro ao proibir o efeito suspensivo dos embargos, ao passo que a Lei de Execuções Fiscais não trata do assunto.

Mas a autarquia defende que essa regra não pode ser aplicada subsidiariamente às execuções fiscais, como decidiu o Superior Tribunal de Justiça em abril de 2013. Para a OAB, esse entendimento viola o princípio razoabilidade e da proporcionalidade.Também afirma que essa interpretação fere o princípio da isonomia, “pois conduz à expropriação de bens do contribuinte antes da confirmação da procedência do débito fiscal pelo Estado-juiz”.

No pedido, a OAB afirma que o caso é relevante o suficiente para que se conceda uma liminar suspendendo a aplicação subsidiária do 739-A do CPC. Também pede que sejam intimados, além da Fazenda Nacional, o Senado, o Congresso, a Presidência da República e a AGU.

A ministra Cármen Lúcia concordou com a OAB. Aplicou o rito descrito no artigo 12 da Lei 9.868/1999, que trata das ações de controle de constitucionalidade: “Havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação das informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessivamente, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação”.

Em outras palavras, o pedido de liminar feito pela OAB deverá ser julgado pelo Plenário do Supremo antes do fim do ano.

Clique aqui para ler o despacho.


Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.



Revista Consultor Jurídico, 8 de outubro de 2014, 9h14

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Código de Defesa do Consumidor se aplica a relações entre empresas, diz STJ


Código de Defesa do Consumidor se aplica a relações entre empresas, diz STJ



O Código de Defesa do Consumidor (CDC) também é aplicável às pessoas jurídicas que adquirem bens ou serviços, desde que seja para a satisfação de necessidades próprias, de forma que a empresa seja destinatária final do produto. Foi o que entendeu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar uma ação movida por uma empresa do ramo imobiliário contra uma companhia de táxi aéreo. O órgão decidiu adotar a legislação nesse caso por considerar que a relação era de consumo.

A Skipton, empresa do ramo imobiliário, comprou um avião da Líder Táxi Aéreo, vendedora exclusiva no Brasil das aeronaves produzidas pela Hawker Beechraft Corporation, para atender a demanda que tinha de transporte de seus diretores, funcionários e clientes. Em virtude de suposto inadimplemento por parte da Líder, a Skipton ajuizou ação de resolução contratual e pediu a devolução dos valores que antecipou à empresa.

A ação foi proposta em Curitiba, onde fica a sede da Skipton. O artigo 101, inciso I, do CDC diz que em caso de ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços, o autor poderá ajuizar o pedido no foro de seu domicílio.

Inconformada, a Líder arguiu exceção de incompetência. Argumentou que a relação discutida na ação possuía caráter paritário, pelo que não se poderia falar em relação de consumo. Por isso, a ação deveria ter sido movida em Belo Horizonte, onde fica a sede da companhia, conforme prevê a regra geral de competência do Código de Processo Civil.

A primeira instância rejeitou o pedido. O Tribunal de Justiça do Paraná, ao julgar agravo interposto pela Líder, também não acolheu os argumentos da companhia por considerar que a relação era de consumo.

A Líder, então, recorreu ao STJ. No recurso especial, a empresa reafirmou que o CDC não poderia ser invocado no caso específico para definir o juízo competente para decidir a demanda.

A companhia voltou a argumentar que não havia relação de consumo na relação com a Skipton, já que a empresa não se pode ser considerada hipossuficiente. “Tanto a doutrina quanto a jurisprudência afastam a aplicação da legislação consumerista nos casos em que o bem é utilizado para incrementar os negócios e as atividades comerciais do seu adquirente”, alegou companhia no recurso.

Os ministros da 3ª Turma, no entanto, não acolheram o argumento e aplicaram a jurisprudência já consolidada no STJ, que considera consumidor a pessoa física ou jurídica que adquire o produto como seu destinatário final — isto é, quem retira o bem de circulação no mercado para satisfazer sua própria necessidade e não para utilizá-lo no processo produtivo.

“Esta corte superior, adotando o conceito de consumidor da teoria finalista mitigada, considera que a pessoa jurídica pode ser consumidora quando adquirir o produto ou serviço como destinatária final, utilizando-o para atender a uma necessidade sua, não de seus clientes”, afirmou o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

“A aeronave foi adquirida para atender a uma necessidade da própria pessoa jurídica autora da demanda, não integrando diretamente — por meio de transformação, montagem, beneficiamento ou revenda — produto ou serviço por ela posto à disposição do mercado, motivo pelo qual se aplicam à relação em tela os ditames constantes da lei consumerista”, acrescentou o ministro Villas Bôas Cueva.

O colegiado, de forma unânime, acompanhou o voto do ministro Sanseverino e manteve a competência da Justiça do Paraná para o julgamento da ação. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.


Revista Consultor Jurídico, 6 de outubro de 2014, 19h38

Adicional de transferência só é devido em caso de mudança provisória do domicílio do empregado





Adicional de transferência só é devido em caso de mudança provisória do domicílio do empregado 


O adicional de transferência tem a finalidade de custear as despesas extras do trabalhador com a sua moradia provisória. A parcela é devida quando o empregado, em razão do trabalho, tem que mudar de domicílio e deve ser paga até que ele retorne à sua antiga residência. E o artigo 469 da CLT é expresso ao dispor que não se considera transferência a que não acarretar necessariamente a mudança do domicílio do empregado.

Com base nesses fundamentos, a juíza Adriana Farnesi e Silva, atuando na Vara de Trabalho de Monte Azul-MG, indeferiu a pretensão de um trabalhador de receber o adicional de transferência. Isto porque a magistrada constatou que ele prestava serviços em vários locais, em razão da natureza itinerante das atividades da empregadora. Mas permanecia em alojamentos fornecidos pela empresa, não chegando a estabelecer domicílio em nenhum desses locais. Assim, no seu entender, o reclamante não tem direito de receber o adicional de transferência.

Após examinar o estatuto social da empregadora, a juíza sentenciante observou que ela atua no ramo da geologia e engenharia, realizando sondagens, pesquisas minerais, levantamentos geológicos etc, sendo evidente a natureza itinerante dessas atividades. E, conforme constatou a julgadora, a prestação de serviços do reclamante ocorria em vários lugares, onde ele permanecia por curtos períodos e sempre em alojamentos fornecidos pela empregadora. As provas demonstraram que o reclamante jamais estabeleceu residência em nenhum desses locais e que a empregadora era quem arcava com todos os custos, incluindo, além da hospedagem, os deslocamentos e a alimentação.

No entender da julgadora, o desempenho das atividades fora do local da contratação do reclamante não caracterizou a transferência provisória de que trata o art. 469 da CLT, especialmente porque não houve a mudança do seu domicílio. Para ela, a prestação de serviços em diversas localidades ocorreu para atender às necessidades especiais das atividades, sendo condição indispensável para a execução do trabalho. Nesse contexto, indeferiu o adicional de transferência. Houve recurso, mas a decisão foi mantida pela 9ª Turma TRT de Minas.( 0001671-80.2012.5.03.0082 RO )

Fonte: TRT3ª Região

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

"Jurisprudência materializa o que é discutido na escola de magistratura"


“Jurisprudência materializa o que é discutido na escola de magistratura”




A Escola Paulista de Magistratura quer fazer os juízes se dedicarem mais aos estudos. Percebeu que um dos maiores obstáculos para isso é que falta tempo aos operadores do Direito. Em São Paulo, não é só o volume de trabalho a dificuldade. Sair de um ponto da cidade para estudar em outro exige planejamento e paciência.



Uma das soluções encontradas pela escola foi inverter a lógica: ir até o juiz. Todas as aulas e palestras oferecidas pela EPM agora são gravadas em vídeo. Todos os juízes e desembargadores receberam uma senha para assistir online, a hora que puderem e quiserem, os cursos que lhe interessarem.

A escola investe também em cursos rápidos, focados em temas controversos e recorrentes no dia a dia das varas. “A grande riqueza da escola é unir a doutrina com a parte prática”, explica o diretor da EPM, desembargadorFernando Maia da Cunha, em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico. E não deixa de lado quem prefere o modelo tradicional. Há cursos de pós-graduação e também núcleos de estudo, criados exclusivamente para juízes e desembargadores.

Desde julho deste ano, não há mais cobrança de mensalidade. “Desde que assumimos a diretoria da escola, nos incomodava cobrar dos juízes. Queríamos isentá-los em 100%. Fizemos isso com uma decisão do Conselho Consultivo. Hoje, o juiz não paga nada para estudar na EPM. A escola é dos magistrados, existe em função dos magistrados”, afirma o desembargador.

Maia da Cunha foi escolhido para dirigir a escola em dezembro de 2013, no mesmo dia em que foi eleita a nova direção do Tribunal de Justiça de São Paulo. Além da missão de tornar os cursos mais acessíveis aos juízes, tem de cuidar da formação dos magistrados e servidores do Judiciário paulista.

Em agosto, o presidente da corte, desembargador Renato Nalini, inaugurou a EJUS, escola criada para formar e capacitar os servidores. A partir de agora, quem chega para trabalhar na corte recebe um curso para conhecer as suas funções e aprender um pouco sobre Direito.

Fernando Maia da Cunha nasceu em Bauru (SP), tem 63 anos e está na magistratura desde 1980. É bacharel pela Faculdade de Direito de Alta Paulista e mestre em Direito Comercial pela PUC-SP, instituição em que é professor convidado. No TJ-SP, integra a 4ª Câmara de Direito Privado e a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial.

Leia a entrevista:

ConJur — O senhor já disse que uma de suas prioridades é trazer o juiz de volta para a EPM. Por que houve esse distanciamento?
Maia da Cunha — O juiz tem um problema muito sério para frequentar a escola: o tempo. Nenhum juiz hoje, de qualquer vara, de qualquer câmara, tem tempo para muita coisa além da própria atividade jurisdicional. Isso acaba afastando o juiz do estudo, da leitura, da reflexão, do debate.

ConJur — E como pretende contornar essa situação?
Maia da Cunha — Uma das nossas tentativas tem sido ampliar o número de núcleos de estudo, que são exclusivos para magistrados.

ConJur — O que é um núcleo de estudo?
Maia da Cunha — Cada núcleo se organiza de uma forma. Não têm um objetivo pré-definido, podem ser simplesmente núcleos de discussões. O de Direito Empresarial, do qual participo, escolheu dez temas e convidou para discuti-los o melhor professor em cada área. Então, o professor vem até a escola para um encontro de três horas. Fala durante uma hora e debate o tema com os juízes no restante do tempo. Isso proporciona uma rica interação entre a doutrina e a jurisprudência.

ConJur — E ajuda na hora de decidir.
Maia da Cunha — A grande riqueza da escola é unir a doutrina com a parte prática. Toda lei, toda doutrina, todo estudo, toda reflexão, toda parte filosófica de qualquer ramo do Direito visa a prestação jurisdicional. Visa orientar que determinado direito seja aplicado desta ou daquela maneira no caso concreto. Somar esses dois lados é muito interessante para quem julga.

ConJur — Os núcleos duram quanto tempo?
Maia da Cunha — Dez meses, no máximo. Os encontros costumam ser mensais e os grupos são normalmente formados por cerca de 15 juízes. Alguns têm até 30. Ao final, os integrantes têm várias opções: escrever um trabalho sobre os temas discutidos, apresentar enunciados como sugestões de futuras súmulas, ou até editar um livro. Esta foi a opção do Núcleo de Direito Civil, na época em que participei. Dividimos os temas e escrevemos uma obra coletiva, que é o pensamento da magistratura paulista sobre o negócio jurídico. Há grupos que preferem escolha uma obra e estudá-la durante dois, três meses. Depois disso, convidam o autor para participar. Não há obrigação de apresentar trabalho. É uma reflexão que o juiz faz e que, evidentemente, vai se materializar no julgamento. Esses julgamentos formam jurisprudência e vão orientar, de modo geral, todos os juízes. É interessante e a escola existe para isso.

ConJur — O senhor tem um projeto de intercâmbio para juízes. Como isso seria feito?
Maia da Cunha — Já existe muito intercâmbio de juízes brasileiros, principalmente com os Estados Unidos. Tanto que, recentemente, criamos o Núcleo de Direito Comparado Brasil/Estados Unidos. É uma experiência muito rica, mas que, atualmente, não é compartilhada com os colegas. Eles vão às próprias custas. Não vão pela escola nem pelo tribunal.

ConJur — O curso seria pago pelo tribunal?
Maia da Cunha — Um dia o tribunal e a escola terão que discutir um sistema de escolha de juízes para intercâmbios, desde que haja um feedback para toda a magistratura. Vou levar essa proposta ao Conselho Consultivo da EPM. A ideia é que a escola possa enviar juízes para fazer cursos no exterior de interesse da magistratura brasileira e do Tribunal de Justiça de São Paulo. Por que a escola auxiliaria nos custos? Porque quando o juiz voltar, ele vai escrever sobre o que estudou, e gravar um vídeo sobre os principais pontos do curso. A escola promoveria um debate sobre o tema do curso de modo a que todos os magistrados pudessem se beneficiar do intercâmbio.

ConJur — Como seria feita a escolha dos juízes?
Maia da Cunha — É fundamental que haja aprovação do Conselho Consultivo, que os critérios de escolha sejam democráticos e definidos em edital. Esse é um dos papéis da escola. Penso que interessa à magistratura saber como, há 10 ou 15 anos, os países mais avançados lidaram com situações que estamos vivendo hoje. Conhecer a evolução dessas experiências seria útil para que possamos corrigir aqui, saber qual caminho tomar ou entender porque tomamos caminhos diferentes. Particularmente, penso que seria importante trazer a experiência de outros países. Gostaria de começar a conversar sobre isso na EPM neste segundo semestre.

ConJur — Como a EPM define a abertura de novos cursos? Quem participa dessas escolhas?
Maia da Cunha — Os cursos são oferecidos com base no que é mais necessário e no que há mais interesse. Cursos de pós-graduação em Direito do Consumidor, Civil, Processo Civil, Penal e Processo Penal sempre têm muita procura. Mas, como são de longa duração, temos de oferecer com certo espaço de tempo para que o número de alunos não seja muito reduzido.

ConJur — Os cursos para juízes e desembargadores na EPM são gratuitos?
Maia da Cunha — Desde a presidência do desembargador Ivan Sartori, em 2012, os cursos são gratuitos para os servidores. Mas não para os juízes. Eles pagavam 40% do valor do curso. E, desde que assumimos a diretoria da escola, nos incomodava cobrar dos juízes. Queríamos isentá-los em 100%. Fizemos isso com uma decisão do Conselho Consultivo no dia 3 de julho. Hoje, o juiz não paga nada para estudar na EPM. A escola é dos magistrados, existe em função dos magistrados.

ConJur — O orçamento da escola é suficiente para dar gratuidade a todos os servidores e juízes?
Maia da Cunha — Na média, os cursos quase que se pagam com os alunos que vêm de fora do tribunal e pagam a mensalidade integral. Na pós-graduação há pouca frequência de juízes. Trinta por cento das vagas são preenchidas por quem não é servidor nem juiz. A preferência é sempre dos juízes e servidores, porque, de forma direta ou indireta, eles ajudam a aprimorar o Poder Judiciário. Só abrimos vagas para terceiros quando há remanescentes. De qualquer forma, a escola possui dotação orçamentária destacada no orçamento do tribunal, o que permite seu funcionamento normal ainda que se destine exclusivamente aos magistrados e servidores.

ConJur — Então, o juiz não precisa mais pagar pelo curso e nem é obrigado a apresentar trabalho de conclusão nos núcleos de debate. Há mais alguma mudança que o senhor pretende fazer para atraí-los para a escola?
Maia da Cunha — Estamos investindo mais em cursos rápidos, de 30, 50 e 60 dias. Por serem mais curtos, concentram-se em temas controvertidos e despertam mais interesse. Nesses casos, o juiz também não precisa apresentar trabalho no final. Passamos a gravar todas as palestras, inclusive dos cursos de pós-graduação, o juiz pode escolher o que assistir quando quiser. Fizemos uma adequação no sistema e entregamos uma senha de acesso ao material da EPM para cada juiz. Por exemplo, eu só quero assistir duas palestras de algum curso porque são temas do meu dia a dia. Eu posso ligar o computador no final de semana, em casa, e assistir. Essa é mais uma opção para o magistrado.

ConJur — Há uma filial da EPM no interior ou os juízes têm acesso apenas aos cursos online?
Maia da Cunha — O interior também é prioridade da escola na nossa gestão. Tenho visitado os núcleos regionais para saber o que os juízes querem da escola. Uma dificuldade em relação aos cursos de pós-graduação é que o Conselho Estadual de Educação estabelece que devem ser presenciais. Portanto, devem ser feitos lá. Os núcleos de estudo podem ser criados em qualquer cidade ou região.

ConJur — Os cursos presenciais são mais procurados do que os online?
Maia da Cunha — Este é o pequeno dilema que estamos enfrentando atualmente. As inscrições presenciais equivalem a 30% dos inscritos a distância. Os cursos de curta duração têm entre 150 e 180 inscritos a distância e apenas 50 que vão pessoalmente. A dificuldade de deslocamento em São Paulo é uma das principais responsáveis por essa mudança.

ConJur — Recentemente, a EPM ganhou a nova atribuição de oferecer cursos de aperfeiçoamento aos juízes que se movimentarem na carreira. Como serão esses cursos?
Maia da Cunha — A formação continuada do juiz, instituída pelo provimento do Conselho Superior da Magistratura [Provimento 2.179/2014], se resume no seguinte: o mundo é outro. Há um mundo novo em comparação ao que se decidiu há 20 anos, nas relações sociais, na velocidade das informações. A formação continuada traz essas reflexões sobre as alterações que são fundamentais na vida do juiz. Ele precisa ser alguém do próprio tempo e o estudo continuado traz o juiz para mais perto desse mundo. Por exemplo, o juiz que muda de uma vara cível para uma criminal precisa, em vez de simplesmente sentar e interpretar a lei, saber o que se tem discutido na área penal, como os colegas têm decidido e quais são as suas fundamentações. O Direito Empresarial tem as suas implicações próprias, pede decisões rápidas, que podem influenciar na atividade econômica. Se o juiz se muda para a área da família precisa conviver com a nova realidade das mudanças familiares. A ideia não é ensinar Direito de Família. Isso ele sabe. A ideia é mostrar a evolução das controvérsias e dos julgamentos na área para a qual se mudou.

ConJur — O curso é de quanto tempo?
Maia da Cunha — É de 90 dias, bem espaçado, uma vez por semana. Serão a distância. Ele vai acessar os vídeos e ver os problemas que pode enfrentar nos próximos anos e como se tem feito para solucioná-los. As aulas serão dadas por juízes que há anos atuam com aquela especialidade e que vão contar como trabalham, como decidem, como chegaram a essas conclusões e quais as outras linhas de pensamento.

ConJur — Essas aulas já estão disponíveis para os juízes?
Maia da Cunha — Estarão disponíveis a partir de novembro. Por que novembro? Porque estamos em ano de eleição e até lá todas as promoções estão suspensas. Mas já escolhemos os coordenadores gerais de cada área: penal, cível, juizado especial, família, crime, violência doméstica, infância e juventude, empresarial, falência e recuperação. Há também um coordenador para as varas cumulativas, porque o juiz que vai assumir não terá tempo para fazer todos esses cursos. Faremos um curso específico para as varas cumulativas. É um pouco mais delicado, mas estamos selecionando pessoas preparadas para isso.

ConJur — O senhor fez mudanças no curso oferecido aos novos juízes?
Maia da Cunha — A EPM vem tentando, há muito tempo, trazer para o novo juiz a prática forense, a prática do dia a dia. No último curso, fizemos alguns ajustes para deixá-lo mais o mais prático possível. Pedimos aos juízes que fizessem críticas e sugestões e vamos aplicá-las nos próximos cursos. Convidamos três dos novos juízes para integrar a coordenação do curso, que é feita hoje pelo juiz Claudio Godoy. Estamos tentando melhorá-lo. Este é um trabalho da escola que já vinha e que deverá ser constantemente aperfeiçoado.

ConJur — Em agosto foi inaugurada a EJUS, a escola dos servidores. Qual é o seu principal objetivo?
Maia da Cunha — A Escola de Servidores é um grande atalho para o tribunal melhorar a prestação jurisdicional, melhorar o serviço público que presta à sociedade e passar a ter dela o respeito que merece. Vamos oferecer cursos aos novos servidores e também capacitação àqueles que já trabalham conosco. Não faz sentido que os novos cheguem e comecem a trabalhar sem qualquer orientação. A EJUS quer oferecer aos servidores o mesmo aprimoramento que estamos oferecendo aos juízes, do ponto de vista funcional. Quando o servidor tomar posse vai aprender qual é o trabalho dele. Vamos explicar, passo a passo, como se usa o processo eletrônico, quais são as suas funcionalidades. Eles também terão aulas de Direito básico. O escrevente não precisa ser bacharel, mas deve ter noções básicas de Direito para trabalhar com processos.

ConJur — Os cursos são obrigatórios?
Maia da Cunha — Sim, da mesma forma que acontece com os novos juízes. Os cursos de aperfeiçoamento também. A escola tem todo equipamento e espaço para oferecer os cursos da melhor maneira. Eles serão feitos à tarde, horário em que não há aulas da EPM.


Lilian Matsuura é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 28 de setembro de 2014, 07:13

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