segunda-feira, 7 de março de 2016

REVISTA JURÍDICA LUSO BRASILEIRA_ 2016/01


REVISTA JURÍDICA LUSO BRASILEIRA | ISSN 2183-539X




CAPA - i
Beatriz Homem de Mello Bianchi, "Origem Genética e Direito ao Sigilo do Doador de Material Genético: Fronteiras" – 1
Danilo Haddad Jafet, "Hipóteses de Aplicação da Teoria da Responsabilidade Civil pela Perda de uma Chance no Direito de Família" – 19
Felipe Matte Russomanno, "Famílias Paralelas e Triação de Bens" – 55
Fernando Graciani Dolce, "Abandono Afetivo e o Dever de Indenizar" – 93
Flávia Leitold Araújo, "Há Limites na Apreensão de Novas Formas de Família?" – 111
Francisco Sabadin Medina, "O Alcance da Comunicação dos Proventos do Trabalho dos Cônjuges no Regime de Comunhão Parcial dos Bens (Art. 1659 VI CC)" –135
Giovani Guitti Gianellini, "Limites da Escritura Pública de União Estável: Um Ensaio sobre a Validade" – 171
Horival Marques de Freitas Júnior, "Breves Apontamentos sobre a Mediação no Direito de Família" – 185
João Pedro de Oliveira de Biazi, "Pacto Antenupcial: Uma Leitura à Luz da Teoria do Negócio Jurídico" – 229
Lívia Froner Moreno Ramiro, "Dano Moral entre Cônjuges: Uma Tentativa de Sistematização da Técnica" – 265
Lucas Rosa Monteiro, "A Cessação do Dever de Prestar Alimentos" – 289
Luciana Yoshida, "Políticas Públicas e a Família" – 329
Maici Barboza dos Santos Colombo, "Limites na Formação do Vínculo Parental em Razão do Afeto" – 363
Maria Conceição Amgarten, "Usucapião Familiar" – 389
Nadime Meinberg Geraige, "A Súmula 377 do STF e sua Atual Aplicação" – 417
Rafael Lauria Marçal Tucci, "Partilha do Lucro na «Reversão de Lucros Líquidos» em Patrimônio Incomunicável" – 435
Sandra Regina Garcia Olivan Bayer, "Medidas Preventivas de Danos na Seara Familiar, para além dos Punitive Damages no Direito Brasileiro" – 469
Thomas Alexandre de Carvalho, "Pacto Antenupcial e Cláusula Penal" – 511
Adalberto Pasqualotto, "O Direito dos Fumantes à Indenização" – 545
Adriano Barreto Espíndola Santos, "O Arrendamento Urbano: Um Estudo Analítico e Propositivo para o Cenário Luso-Brasileiro" – 589
Alexandre Libório Dias Pereira, "A Linguagem de Mercado da Sociedade De Consumo Na Era Da Comunicação Cibernética" – 631
Aluisio Gonçalves de Castro Mendes & Larissa Clare Pochmann da Silva, "A Efetivação do Crédito e os Cadastros de Inadimplentes no Novo Código de Processo Civil Brasileiro: Breves Notas" – 653
André Luiz Maluf Chaves, "Omissão Inconstitucional e Revisão Geral Anual: Argumentos Suplementares para Procedência do Recurso Extraordinário 565.089" –673
Antônio Carlos Efing & Augusto César Leite de Resende, "Educação para o Consumo Consciente: Um Dever do Estado" – 713
Bruno Montanari Rostro, "Os Benefícios da Negociação e seus Obstáculos" – 747
Clayton Maranhão, "Observações sobre o Rol Taxativo das Hipóteses de Cabimento do Recurso de Agravo de Instrumento no CPC/2015, na Perspectiva da Duração Razoável do Processo" – 785
Daniel Braga Lourenço, "As Propostas de Alteração do Estatuto Jurídico dos Animais em Tramitação no Congresso Nacional Brasileiro" – 811
Diogo Leite de Campos, "Tempo, Pessoa e Agregado na Relação Jurídica" – 841
Eduardo C. B. Bittar, "A Educação em Direitos Humanos e o Humanismo Social, Republicano e Democrático" – 865
Eduardo A. Tillmann, Ianes Ratnieks & Giácomo Balbinotto Neto, "Regulação e Risco Moral nas Concessões de Florestas: O Caso da Floresta Nacional do Jamari" – 881
Érico Marques de Mello, "O Aborto no Brasil e em Portugal" – 907
Ettore Botteselli, "Princípios do UNIDROIT: Internacionalização e Unificação do Direito Comercial Internacional" – 933
Eugênio Facchini Neto, "O Maior Consenso Possível – O Consentimento Informado sob o Prisma do Direito Comparado" – 953
Heitor Vitor Mendonça Sica, "Linhas Fundamentais do Novo Código de Processo Civil Brasileiro" – 1025
Judith Martins-Costa, "Como Harmonizar os Modelos Jurídicos Abertos com a Segurança Jurídica Dos Contratos? (Notas para uma Palestra)" – 1051
Julia Duarte & Zamira de Assis, "Unimultiplicidade Familar: Alguns Aspectos das Novas Formas de Organização Familiar no Brasil" – 1065
Juliana Krueger Pela, "«Inadimplemento Eficiente» (Efficient Breach) nos Contratos Empresariais" – 1091
Laís Machado Lucas, "Função Social e Função Econômica do Contrato: Análise do Recurso Especial 1.163.283" – 1105
Liane Huning, "A Extrafiscalidade Ambiental como um Instrumento de Justiça Socioambiental do Estado Brasileiro" – 1147
Luiz Guilherme Marinoni, "Decisão do Recurso x Precedente" – 1157
Marco Fábio Morsello, "O Contrato de Transporte Aéreo e sua Interface com o Sistema de Defesa do Consumidor, à Luz do Ordenamento Jurídico Brasileiro e da Perspectiva Portuguesa" – 1167
Marcos Aurélio Pereira Valadão, "Os Limites Legais no Aproveitamento dos Prejuízos e o Conceito de Renda Tributável das Pessoas Jurídicas no Direito Brasileiro" – 1205
Marcus Gouveia dos Santos, "Interpretação e Aplicação das Normas Constitucionais" – 1231
Mariana Pargendler & Bruno Meyerhof Salama, "Direito e Consequência no Brasil: Em Busca de um Discurso sobre o Método" – 1259
Marília Rulli Stefanini, "Breve Análise acerca dos Marcos Históricos-Legais da Educação Brasileira" – 1323
Mário Luiz Delgado, "O Paradoxo da União Estável: Um Casamento Forçado" – 1349
Matheus Passos Silva, "O Combate à Corrupção por Meio da Cidadania Ativa" – 1373
Michael César Silva & Vinícius Lott Thibau, "A Desconsideração da Personalidade Jurídica e o Novo Código de Processo Civil" – 1407
Paulo Lôbo, "Direitos dos Membros das Associações Civis" – 1445
Rennan Faria Krüger Thamay, "A Coisa Julgada no Tempo: Do Código de Processo Civil de 1973 ao Projetado Código de Processo Civil" – 1459
Rita Lobo Xavier, "O «Estatuto Privado» dos Membros da União de Facto" – 1497
Rosa Maria Barreto Borriello de Andrade Nery, "O Estatuto da Pessoa com Deficiência (L 13146, de 6.7.2015 – EPD) (Notícia do Novo Sistema Jurídico Brasileiro)" – 1541
Sebastião Manuel Timóteo, "Sawabona Shikoba - «Eu Sou Bom»" – 1563
Thereza Christina Nahas, "Direito Social e Mercosul" – 1593

NJ Especial - Teletrabalho: Como a JT mineira tem se posicionado diante do home office e do trabalho externo.




Não há distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado à distância, desde que estejam caracterizados os requisitos da relação de emprego (art. 6º da CLT).

Imagine o seguinte cenário: uma sala pequena e aconchegante, uma mesa com um computador. Uma criança dormindo no carrinho de bebê. Um gato de estimação dormindo sobre uma pilha de contratos, planilhas, projetos e relatórios. É a típica imagem do escritório de um teletrabalhador que presta serviços em sua própria residência.

Será que os profissionais do futuro trabalharão em casa ou, pelo menos, longe dos olhos do empregador? Não há respostas definitivas para esse questionamento, mas pode-se afirmar com certeza que esse fato já é realidade no presente e faz parte da rotina de muitos trabalhadores e empresas. A revolução provocada pela internet e o surgimento da computação em "nuvem" abriram o caminho para o crescimento de uma nova modalidade de prestação de serviços: o teletrabalho. Hoje em dia, o local da execução de tarefas não se restringe ao espaço físico da empresa.

A prestação de serviços na residência do profissional não é novidade no mundo do trabalho. Na Antiguidade os artesãos já realizavam esse tipo de trabalho. A atividade externa também já é conhecida há séculos. Mas a realidade dos trabalhadores a distância do passado - em sua maior parte navegantes, rodoviários, ferroviários ou caixeiros viajantes - é muito diferente da realidade da nova geração de profissionais, que conta com o auxílio da tecnologia.

"Home office", "trabalho remoto", "trabalho à distância", "trabalho externo", "trabalho portátil", "mobilidade corporativa". São expressões que já se incorporaram ao vocabulário adotado pelo mercado de trabalho moderno. Nesta NJ Especial, veremos como a JT mineira se posicionou com relação à matéria, no julgamento de casos recentes envolvendo a questão do teletrabalho.Conceito de teletrabalho e legislação aplicável

Inicialmente, é importante conceituar o teletrabalho, que é aquele realizado fora das dependências físicas da empresa, com a utilização de meios tecnológicos. O trabalhador que presta serviços desse modo poderá ser autônomo ou empregado. Tudo dependerá da forma como a relação se desenvolve. Se for uma pessoa física que presta serviços de natureza não eventual, com pessoalidade, onerosidade e subordinação ao contratante, estaremos diante de uma relação de emprego. Nesse sentido, dispõem os artigos 2º e 3º da CLT.

No dia 15/12/2011 foi publicada a Lei nº 12.551, que alterou o artigo 6º da CLT para equiparar os efeitos jurídicos da subordinação exercida por meios telemáticos e informatizados à exercida por meios pessoais e diretos. Com isso, reforçou-se a ideia de que o poder diretivo poderá ser exercido tanto de forma pessoal pelo empregador dentro da empresa como por meios telemáticos ou informatizados, quando a prestação de serviços se der a distância.

A prestação de serviços a distância pode ocorrer de duas formas: pelo sistema de home office, expressão inglesa que significa ¿escritório em casa¿, e pelo sistema de trabalho externo. No primeiro caso, o trabalhador realiza suas atividades em domicílio, usando computador ou outros dispositivos ligados à internet, bem como programas específicos. Os designers e professores de cursosonline são exemplos de profissionais que podem prestar serviços dessa forma. No segundo caso, a execução das tarefas ultrapassa os limites de um local físico, podendo ser realizadas fora do estabelecimento comercial da empresa e monitoradas com a utilização de meios tecnológicos, como, por exemplo, aparelho celular e tacógrafo. É o caso das atividades realizadas por profissionais como o caminhoneiro e o representante comercial.Direitos do empregado que trabalha em home office ou em atividade externa

A legislação trabalhista não diferencia o empregado que realiza trabalho a distância daquele que presta serviço na sede da empresa. Como regra geral, são aplicadas as mesmas normas às duas espécies de execução das atividades, de modo que, em tese, esses empregados possuem os mesmos direitos.

Existem algumas exceções referentes às particularidades do sistema adotado. Por exemplo, o benefício do vale transporte não é devido ao empregado que trabalha em domicílio, por razões óbvias.

Ao analisar o processo PJe nº 0010284-21.2013.5.03.0061, o desembargador Jorge Berg de Mendonça fez uma importante observação sobre esse tema: "O fato constitutivo do direito ao vale transporte é o deslocamento do empregado de sua residência até o local de trabalho, o que se presume, pois, é o que ordinariamente acontece, salvo casos excepcionais de trabalho em domicílio do empregado ou situações em que este resida no próprio estabelecimento empresarial, hipóteses que não restaram demonstradas nos autos".Relação de emprego

O pedido de reconhecimento do vínculo empregatício entre as partes está sempre presente na maioria das ações trabalhistas que versam sobre o teletrabalho.

Nos termos do artigo 6º da CLT, "Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego".

Nos casos julgados pela JT mineira, observa-se que não há divergências quanto ao fato de que o trabalho remoto do empregado não representa obstáculo ao reconhecimento da relação de emprego, quando presentes os pressupostos exigidos pelo artigo 3º da CLT. No entanto, a identificação dos elementos caracterizadores da relação de emprego não é uma tarefa fácil para os julgadores. Depende da análise minuciosa de cada caso e das provas produzidas em juízo. A maior dificuldade está em aferir a subordinação, uma vez que ela é atenuada quando se trata de teletrabalho.

No caso analisado no processo nº 0000096-90.2012.5.03.0129, a desembargadora relatora Denise Alves Horta não reconheceu a existência de vínculo empregatício entre os réus e um tecelão. De acordo com a versão apresentada pelo trabalhador, os réus lhe pagariam um real por peça produzida. Mas a desembargadora percebeu que essa informação não correspondia à realidade, pois foi desmentida em juízo pelo próprio tecelão.

Inicialmente, ela reforçou que o fato de o trabalho ser realizado em domicílio do trabalhador (art. 6°, caput, da CLT) ou em oficina da família (art. 83 da CLT), por si só, não impede a configuração da relação de emprego, desde que estejam caracterizados os requisitos para isso. Contudo, na percepção da desembargadora, o depoimento pessoal do próprio tecelão revelou elementos desfavoráveis à tese de relação de emprego. Ele confessou que os réus lhe venderam uma máquina de tecer que seria paga a eles com a entrega de peças de roupas. O tecelão revelou ainda que o serviço combinado seria prestado por ele e por sua esposa, trabalhando por peça produzida e partilhando com ela o valor recebido.

"Cumpre pontuar que, em se tratando de trabalho em domicilio, há a mitigação do requisito da pessoalidade na configuração do vínculo empregatício, considerando que o trabalho é realizado longe das vistas do empregador. Assim, o fato de as peças serem também produzidas pela esposa do reclamante, em auxílio a ele, por si só, não seria suficiente para o afastamento do vínculo. Não obstante, no caso, a subordinação jurídica, outro requisito para a configuração do liame empregatício, restou afastada, uma vez que os réus apenas exigiam os produtos do trabalho, não havendo fiscalização sobre o modus operandi da atividade", concluiu a relatora.

Já o caso analisado no processo nº 00977-2009-129-03-00-7 teve um desfecho diferente. A 7ª Turma do TRT mineiro reconheceu o vínculo existente entre uma vendedora de passagens, que prestava serviços em sua própria residência, e uma empresa de transporte rodoviário municipal e intermunicipal de alunos e turistas. A empresa fornecia equipamentos para a execução do serviço, como linha telefônica, computador, impressora e móveis. Por isso, a Turma considerou caracterizada a ocorrência de teletrabalho, já que o contrato envolvia execução de atividade especializada com o auxílio da informática e da telecomunicação.

A empresa afirmou ter contratado o agendamento e a venda de passagens de forma autônoma. Entretanto, rejeitando a alegação patronal, o relator do caso, juiz convocado Jessé Cláudio Franco de Alencar, considerou que os elementos fornecidos pela própria reclamada contribuíram para caracterizar a relação de emprego. A empresa incluiu no contrato escrito firmado com a trabalhadora que ela não poderia locar, ceder, transferir ou sublocar a terceiros os serviços contratados, durante o prazo de vigência do contrato, sem a expressa autorização da contratante. O contrato também impunha os dias da semana e os horários em que deveriam ser executadas as atividades. Ficou comprovado ainda que a reclamante recebia comissões sobre as vendas realizadas.Controle de jornada: o teletrabalhador está incluído no art. 62 da CLT?

Em relação ao teletrabalho, o controle de jornada é o tema mais frequente abordado nas ações que tramitam na JT mineira. Os trabalhadores reivindicam o reconhecimento do direito de receber horas extras, ao fundamento de que cumprem jornadas superiores à estabelecida em lei. Mas nem sempre eles obtêm sucesso em seus pedidos. Tudo vai depender das circunstâncias do caso e do conjunto de provas.

O artigo 62, inciso I, exclui da duração normal de 8 horas diárias de trabalho os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho.

Diante dessa norma, surge o seguinte questionamento: faz jus às horas extras o trabalhador que se ativa fora do escritório ou em casa, da mesma forma que aquele que presta serviços no próprio estabelecimento? Essa é uma dúvida comum no meio jurídico. Nessa situação, os julgadores verificam se o trabalho realizado pelo empregado fora do estabelecimento é compatível com algum tipo de controle de horário pelo empregador. E, dependendo da atividade do trabalhador, existem programas de computador capazes de controlar a sua jornada.

No processo nº 00727-2013-018-03-00-1, julgado pela 4ª Turma do TRT-MG, um trabalhador alegou em seu recurso que foi contratado como Auxiliar de Pesquisa e Coleta de Dados, prestando serviços "em casa" ou externos. Destacou, ainda, que a única sede da empresa no Brasil está localizada no estado de São Paulo e renovou o pedido de condenação da empresa ao pagamento das horas extras trabalhadas. Entretanto, o relator do caso, juiz convocado Vitor Salino de Moura Eça, não deu razão ao empregado. Ao analisar os depoimentos das testemunhas, ele verificou que o trabalho era desempenhado sem fiscalização da jornada. O magistrado observou que o próprio reclamante afirmou em depoimento pessoal que comparecia à empresa somente duas vezes por ano, confessando que a organização da rota e o horário de intervalo eram definidos por ele mesmo.

Na visão do relator, a empresa conseguiu demonstrar a impossibilidade de fiscalização das atividades externas praticadas pelo reclamante, seja em sistema "home office" ou "teletrabalho", em sua residência, seja na visitação a lojistas conforme rota que o empregado estabelecia, atendendo à própria conveniência.

"Demonstrada na vertente hipótese a ausência de fiscalização da jornada praticada, além de livremente organizadas pelo trabalhador as atividades externas realizadas, ou em sistema de home office praticadas, incide a exceção expressa no art. 62, inciso I, da CLT. Executado o labor fora do alcance de controle do empregador, não faz jus o obreiro às horas extras postuladas", finalizou o julgador.Doença ocupacional do teletrabalhador: empregador pode ser responsabilizado?

O fato de o empregado trabalhar no sistema de home office isenta o empregador de responsabilidade em caso de acidente de trabalho ou doença ocupacional? A Turma Recursal de Juiz de Fora julgou o processo nº 00208-2006-143-03-00-2, no qual foi abordada essa matéria. Para os julgadores, a resposta é: não.

No caso, a reclamante foi contratada para exercer a função de "acabamentista/cortadeira" e foi afastada dos serviços nove anos depois, por ter adquirido uma tendinite. A atividade da reclamante consistia em passar o cadarço, com uma agulha especial, pela boca dos sacos confeccionados pela ré, o que resultava em movimentos repetitivos, sendo executados em série, com produção em grande escala. O laudo pericial confirmou a existência de nexo causal entre o trabalho e a doença que acometeu a reclamante. Entendendo que ficou evidenciada a culpa patronal, o juiz sentenciante condenou a empresa ao pagamento de uma indenização por danos morais, no valor de 10 mil reais. A empresa recorreu sustentando que, pela natureza do trabalho realizado, não tinha condições de acompanhar o cotidiano da empregada.

Rejeitando as alegações patronais, o desembargador relator Heriberto de Castro confirmou a condenação, apenas reduzindo o valor da indenização para 5 mil reais. E fundamentou seu voto com as seguintes palavras:

"O fato de o empregado trabalhar em domicílio não constitui, por si só, motivo para eximir o empregador da observância das normas de segurança e medicina do trabalho, colocando o trabalhador à margem da proteção legal que deve abranger 'todos os locais de trabalho', sem distinção (artigo 154 da CLT). É certo que não há como exigir do empregador, em semelhante circunstância, a fiscalização cotidiana dos serviços prestados, inclusive quanto à efetiva observância pelo empregado das normas de segurança e medicina, mesmo porque a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem o consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial, nos termos da garantia estatuída no artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal. Essa particularidade, sem dúvida, constitui elemento que vai interferir na gradação da culpa do empregador em relação a eventual doença profissional constatada, mas não permite isentá-lo do cumprimento de obrigações mínimas, como a de instruir os empregados quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais, nos termos do artigo 157, II, da CLT, além de fornecer mobiliário adequado, orientando o empregado quanto à postura correta (artigo 199 da CLT), pausas para descanso, etc. Verificado o descumprimento dessas obrigações primordiais pelo empregador, em face da sua omissão negligente no tocante aos cuidados com a saúde da empregada, é inegável a sua culpa no surgimento da doença profissional constatada, incidindo sua responsabilidade pela compensação do dano moral sofrido pela obreira".Estrutura necessária para o funcionamento do home office

Como a questão dos custos com a implantação da estrutura necessária ao funcionamento do sistema não é regulamentada, via de regra, essas despesas são pagas integralmente pelo empregador, pois a ele compete assumir os riscos da atividade econômica (CLT, art. 2º). Ou, ainda, podem ser divididas entre a empresa e o empregado, quando existe a possibilidade de uso das ferramentas de trabalho também para fins particulares.

Foi o que constatou o juiz convocado Vitor Salino de Moura Eça ao analisar o processo nº 00727-2013-018-03-00-1: o reclamante admitiu que recebia o reembolso de 50% da despesa com a contratação da banda larga, cujas faturas foram juntadas ao processo. Entretanto, conforme ponderou o relator do caso, em se tratando de home office, é evidente que o uso da banda larga não se limitava exclusivamente aos fins de trabalho, sendo livremente utilizado pelo reclamante para fins particulares/pessoais, sem qualquer limitação de acesso ou controle por parte da reclamada. Nesse sentido, o magistrado não reconheceu qualquer desproporcionalidade entre o valor do reembolso ofertado e pago pela reclamada e o valor efetivamente gasto pelo reclamante, contemplando o uso particular da banda larga, motivo pelo qual confirmou a sentença que julgou improcedente o pedido de reembolso das despesas com internet.Relação de teletrabalho exige preparação de ambas as partes envolvidas

A preparação traz benefícios para ambas as partes. A empresa ganha em economia, rapidez das soluções e maior produtividade dos teletrabalhadores. Por sua vez, os empregados ganham em comodidade, organização, motivação, flexibilidade de horários, mais tempo livre e qualidade de vida.

Mas a JT mineira recebeu a ação de uma trabalhadora que ainda não estava preparada para essa modalidade de prestação de serviços e teve uma experiência mal sucedida com o home office. A empresa instalou na residência dela uma linha telefônica, à disposição das empresas tomadoras de serviços 24 horas por dia. Segundo alegou, a empregada, a casa dela transformou-se em base da empresa, recebendo visitas de inspetores, emitindo documentos e notas fiscais, sendo também setor de vendas. Ela disse que a situação feriu a sua privacidade e de sua família e que, por pouco, não houve comprometimento da convivência familiar. Por essas razões, pleiteou indenização pelos danos morais sofridos, pedido que foi rejeitado pelo juiz sentenciante.

Atuando como relatora do caso, a desembargadora Mônica Sette Lopes negou provimento ao recurso da trabalhadora e enfatizou em seu voto que: "o fato de a reclamante ter aceitado que a empresa instalasse, provisoriamente, um telefone e equipamentos em sua residência, não configura dano moral. Não houve prova de que a transferência temporária da base da ré para a casa da autora lhe causasse constrangimentos, ou que lhe tivesse sido imposta, de modo a caracterizar invasão de sua privacidade. O home office constitui tendência no mundo corporativo mundial e, na verdade, traz várias vantagens para o empregado, porque amplia o seu tempo de convivência familiar, além de diminuir os seus gastos com transporte e alimentação". (Processo nº 0000768-30.2014.5.03.0129).
Notícias jurídicas anteriores sobre o tema: 

05/08/2015 06:02h - Conteúdo de mensagens eletrônicas enviadas à noite afasta a configuração de horas extras 

19/12/2014 06:04h - JT-MG declara válido acordo coletivo que estabelece horas extras presumidas em jornada externa incompatível com controle 

09/12/2014 06:04h - Montador de móveis que exerce atividade externa compatível com fixação de jornada tem direito a horas extras 

03/09/2013 06:04h - JT concede horas extras a motorista carreteiro que tinha horário controlado pela empresa 

28/09/2012 06:00h - Empregado que continuava expediente em casa após jornada normal receberá horas extras 

19/03/2012 06:01h - Teletrabalho pode gerar relação de emprego 

05/07/2011 06:00h - Tecelão que trabalhava em casa tem vínculo de emprego reconhecido 

05/04/2010 06:03h - JT reconhece vínculo entre universidade e professor de cursos à distância 

06/01/2010 06:03h - JT reconhece relação de teletrabalho entre empresa de turismo e vendedora de passagens 

26/06/2009 06:01h - Jornada externa controlada indiretamente gera direito a horas extras 

17/04/2008 06:40h - Trabalhar em casa não afasta vínculo empregatício 


Fonte: TRT3

sexta-feira, 4 de março de 2016

OAB quer acesso a delação de Delcídio e estuda pedir impeachment de Dilma





Por Sérgio Rodas


A Ordem dos Advogados do Brasil pedirá nesta sexta-feira (4/3) que o Supremo Tribunal Federal dê acesso ao suposto acordo de delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), noticiado pela revista IstoÉ. O presidente do Conselho Federal da entidade, Cláudio Lamachia, disse, que se forem confirmadas as acusações de que a presidente Dilma Rousseff tentou interferir no andamento da operação “lava jato”, os advogados poderão protocolar um novo pedido de impeachment dela na Câmara dos Deputados. Em nota, o senador disse não reconhecer a autenticidade do documento mostrado pela revista.

“Nós entendemos que os fatos que estão sendo noticiados dessa delação premiada, se confirmados, são gravíssimos, e que a sociedade brasileira precisa efetivamente saber o que está acontecendo. Pelo dever de informação, e por um princípio constitucional, nós temos agora a necessidade de informarmos à sociedade tudo que está acontecendo. (...) Se confirmados esses fatos, nossa instituição não faltará ao Brasil e tomará as medidas necessárias — até mesmo um pedido de abertura de um impeachment”, disse Lamachia a jornalistas nesta quinta (3/3), em São Paulo.

No entanto, ele deixou claro que tal medida só será tomada após “um exame aprofundado, técnico, crítico e jurídico da instituição”, e depois de ser aprovado pelo Pleno do Conselho Federal e pelo Colégio de Presidentes das seccionais da OAB.

Para Lamachia, a importância da Ordem confere peso ao caso e justificaria a liberação do acesso à suposta delação de Delcídio mesmo antes de ela ter sido homologada — em outras ocasiões na “lava jato”, a corte negou a liberação de documentos sigilosos.

“Não estamos falando de um terceiro — estamos falando de uma instituição que é a voz do cidadão brasileiro. A OAB tem um compromisso com a advocacia, mas também tem um compromisso com a cidadania. (...) Neste momento, se esses fatos forem confirmados, nós saímos do campo penal e entramos em outro campo, que é o campo moral, o campo ético, e é o campo de defesa da própria cidadania. Se isso que está posto nessa delação premiada for verdadeiro, nós estamos diante de uma verdadeira agressão ao Estado Democrático de Direito e às instituições brasileiras”, destacou.

“Estamos diante de situações que transbordam do âmbito do processo penal, e estamos diante de denúncias que ferem exatamente o princípio constitucional do devido processo legal. Ou seja, de forma inversa, se esses fatos se confirmarem, nós estamos diante de um trabalho feito para ferir o devido processo legal”, avaliou. Cláudio Lamachia e Marcos da Costa durante coletiva em São Paulo nesta quinta-feira.
José Luis da Conceição/OAB-SP

Cláudio Lamachia ainda classificou como “deboche” a volta de Delcídio ao Senado e a permanência do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na presidência da Câmara — nesta quinta, o STF aceitou a primeira denúncia contra ele por corrupção e lavagem de dinheiro. Ele ainda ressaltou que a entidade investigará denúncias de envolvimento do ex-ministro da Justiça e atual advogado-geral da União nas tentativas de interferir na “lava jato”.

A Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013) estabelece que os benefícios da delação premiada só serão concedidos se as informações fornecidas ajudarem a desvendar crimes e identificar autores. Assim, os depoimentos, isoladamente, não têm valor de prova.

Precedente favorável
No mesmo evento, o presidente da OAB de São Paulo, Marcos da Costa, manifestou confiança de que pedido de acesso à delação premiada de Delcídio do Amaral seja aceito pelo STF.

“Já tivemos uma hipótese como essa um ano e meio atrás, quando o Conselho Federal da OAB pediu ao STF para que a corte deixasse todas as denúncias apresentadas [contra políticos na “lava jato”] sem a imposição de sigilo. Isso permitiu que nós conhecêssemos todos os agentes públicos que estavam sendo denunciados. O caminho me parece o mesmo agora. Independentemente da delação ser ou não homologada, o fato é que ela já traz por si denúncias absolutamente graves, talvez únicas na história republicana brasileira”, afirmou.

Dilma e Lula
A revista IstoÉ informou nesta quinta que Delcídio afirmou, em delação premiada, que a presidente Dilma Rousseff e o antecessor dela, Luiz Inácio Lula da Silva, sabiam de crimes na Petrobras e agiram para evitar que eles fossem revelados.

Segundo reportagem da IstoÉ, o senador garantiu que Dilma tentou por três vezes interferir na operação “lava jato” com a ajuda do ex-ministro da Justiça e atual advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo. Em uma delas, a presidente teria tido uma reunião com Cardozo e com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, em Portugal, para pedir uma mudança nos rumos da “lava jato”. Contudo, o encontro teria sido um fracasso — e o ministro do Supremo teria se negado a participar do esquema.

Outra iniciativa citada pela revista teria sido indicar Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça com a intenção de que aceitasse os recursos de empreiteiros presos na operação. Navarro, no entanto, deixou a relatoria dos processos da “lava jato” na corte.

Já Lula seria acusado por Delcídio de ordenar a ele que tentasse convencer o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró de não implicar o fazendeiro José Carlos Bumlai em acordo de delação premiada.

A IstoÉ diz ainda que ex-presidente também agiu na operação zelotes para evitar a convocação do casal Mauro Marcondes e Cristina Mautoni para depor. A razão seria que o fundador do PT estaria com medo de que eles revelassem repasses irregulares à empresa de seu filho Luís Cláudio e confirmassem repasses para o governo aprovar a Medida Provisória 471/2009, que beneficiou o setor automobilístico.


Sérgio Rodas é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 3 de março de 2016, 20h21

Marcelo Navarro Ribeiro Dantas negou compromisso para beneficiar empreiteiros investigados pela Operação Lava Jato





ANDRÉ DUSEK/ESTADÃO CONTEÚDO - 2.9.15
Segundo reportagem, indicação de Marcelo Navarro Ribeiro Dantas para o STJ teria sido estratégica

O ministro Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), divulgou uma nota, no início da noite desta quinta-feira (3), para esclarecer a suposta menção ao nome dele na delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS). O ministro confirma ter se reunido com o petista, mas afirma que nunca tratou com ele a respeito de questões ligadas à Operação Lava Jato. "Tenho a consciência limpa e uma história de vida que fala por mim", afirmou.

De acordo com a revista "Istoé", Delcídio disse, em delação, que a nomeação de Ribeiro Dantas ao cargo de ministro do STJ era uma estratégia do governo para garantir a soltura dos executivos Marcelo Odebrecht e Otávio Marques de Azevedo. "Nunca me comprometi a nada, se viesse a ser indicado", contesta Dantas.

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"Estive, como é de praxe, com inúmeras autoridades dos três Poderes da República, inclusive com o referido parlamentar, que era então o líder do governo no Senado. Jamais, porém, com nenhuma delas tive conversa do teor apontado nessa matéria", afirma Dantas no comunicado. De acordo com o ministro, os encontros serviram para que ele pudesse se apresentar e expor a trajetória profissional aos parlamentares.

O ministro tomou posse em setembro do ano passado e assumiu a relatoria dos casos da operação Lava Jato tramitando no Tribunal. Ribeiro Dantas foi citado em gravação que justificou a prisão de Delcídio. Após votar pela flexibilização da pena de seis executivos presos por envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras, cresceram as suspeitas de que o relator não agia de maneira imparcial. Navarro deixou a relatoria dos casos em dezembro.

"Nos apenas seis processos em que me posicionei pela concessão da soltura (no âmbito da Lava Jato), com base em fundamentação absolutamente jurídica, levei-os ao colegiado que integro. Voto vencido, passei a relatoria adiante, e não apenas naqueles processos específicos: levantei questão de ordem, com apoio em dispositivo do regimento interno da Corte, para repassar também os outros feitos conexos, oriundos da mesma operação", disse em nota.

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Fonte: Ultimo segundo

Empregado não pode receber mais de um adicional de insalubridade, ainda que exposto a dois ou mais agentes nocivos à saúde.


O empregado que presta serviços em condições insalubres tem direito ao recebimento de adicional de insalubridade, em percentual variável, conforme classificação nos graus máximo, médio e mínimo (artigo 192 da CLT). Mas, e quando o trabalhador se sujeita a mais de um fator insalubre, ele poderá cumular os adicionais? Não. Nesse caso, de acordo com a jurisprudência majoritária no TST (Tribunal Superior do Trabalho), caberá ao empregado optar pelo adicional que lhe for mais vantajoso, sendo vedada a percepção cumulativa de dois ou mais adicionais de insalubridade.
Essa foi a situação encontrada pelo juiz Ronaldo Antônio Messeder Filho, em sua atuação na 1ª Vara do Trabalho de Passos-MG, ao apreciar a ação trabalhista ajuizada por um lavador de carros, que pretendia receber adicional de insalubridade, sob a alegação de que o trabalho o expunha a agentes nocivos à saúde.
No caso, após visitar o local de trabalho do empregado e proceder às entrevistas, avaliações e medições de praxe, o perito nomeado pelo juízo concluiu que ele trabalhava exposto a "HIDROCARBONETOS" (insalubridade em grau máximo) e "ALCALIS CAUSTICO" (grau médio). O magistrado verificou, portanto, que houve cumulação de agentes insalubres nas atividades desempenhadas pelo lavador de veículos. Entretanto, o julgador ressaltou que, de acordo com o artigo 192 da CLT, não existe previsão de cumulação desses agentes para o pagamento do adicional de insalubridade, havendo, apenas, uma classificação em relação às condições insalubres de trabalho, em grau máximo, médio e mínimo.
Lembrou ainda o magistrado que o item 15.3. da NR-15 do Ministério do Trabalho e Emprego estabelece que, no caso de incidência de mais de um fator de insalubridade, será apenas considerado o de grau mais elevado, para efeito de acréscimo salarial, sendo vedada a percepção cumulativa. Com base nesses fundamentos, deferiu ao reclamante o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo, tendo como base de cálculo o salário mínimo (Súmula Vinculante 4 do STF). Houve recurso da decisão, que se encontra em trâmite no TRT-MG.

Processo nº 01459-2014-070-03-00-9. Publicação da decisão: 21/01/2016

Teste de gravidez com ciência da empregada em exame demissional não configura dano moral


Na Justiça do Trabalho, a obrigação de indenizar exige a prática de ato ilícito atribuído ao empregador ou alguém a seu mando, que resulte em prejuízo ao trabalhador. "A determinação é de lei e não aceita entendimento abrangente". Com esses fundamentos, a 4ª Turma do TRT afastou a possibilidade de uma trabalhadora vir a ser indenizada apenas pelo fato de a empresa ter incluído um teste de gravidez entre os exames demissionais de praxe. Ficou constatado que o exame aconteceu com a ciência da trabalhadora e que, além do mais, não lhe ocasionou qualquer constrangimento moral.
Na versão da reclamante, ela teria sido vítima de assédio moral, visto que, na ocasião do exame demissional, quando realizou hemograma completo e anticorpos, a empresa incluiu, sem o seu consentimento prévio, exame BHCG para comprovação de eventual gravidez. Disse que o fato violou sua intimidade e vida privada, devendo ser indenizada pela ex-empregadora. Mas o pedido foi indeferido pelo juiz de Primeiro Grau e a 4ª Turma do TRT mineiro, ao analisar o recurso da trabalhadora, manteve a sentença.
De acordo com o relator, desembargador Júlio Bernardo do Carmo, cujo voto foi acolhido pela Turma, o reconhecimento do dano moral e sua reparação têm como objetivo ressarcir o íntimo sofrimento humano, assegurando a convivência respeitosa e a dignidade do cidadão trabalhador. Mas, para o julgador, no caso, o procedimento da empresa não ofendeu os direitos de personalidade da reclamante, nem gerou dano ou lesão passíveis de reparação.
Chamaram a atenção do desembargador as declarações de uma testemunha. Ela disse que o exame BHCG só foi feito na época da dispensa da reclamante porque ela vinha de uma quarta gestação e a empresa não queria dispensá-la se estivesse grávida. A testemunha também afirmou que a empregada tinha plena ciência do exame de gravidez, o qual, inclusive, tinha acesso com a senha do sistema.
Nesse quadro, o relator observou que a conduta da empresa não foi ilícita, além de não ter causado constrangimento moral à empregada. Dessa forma, concluiu que ela não tem direito à indenização pleiteada. Acompanhando esse entendimento, a Turma negou provimento ao recurso da reclamante.
( 0001150-20.2014.5.03.0033 RO )

Fonte: TRT3

quinta-feira, 3 de março de 2016

O pacote anticorrupção do Ministério Público e o fator Minority Report






Atuei durante 28 anos no Ministério Público do Rio Grande do Sul e sempre acreditei que, a partir da Constituição de 1988, todos os membros do MP deveriam atuar como guardiães da Constituição. Sugiro que parem a leitura e leiam o Post Scriptum 1. Sigamos. Sempre agi assim, ainda que, para o grande público, a figura do promotor — por culpa do próprio MP — seja vista como a do grande acusador, do caçador de bandidos, do justiceiro e por aí vão tantos epítetos sugestivos...

Sempre mantive uma atuação pautada pela legalidade constitucional, leitor fiel de Elias Diaz. Por assim dizer, “sou constitucionalista, mas sou limpinho”...! Nunca me posicionei como reserva moral da sociedade, mas como um agente público que deveria zelar pela aplicação da lei. Este deve ser o papel de um membro do MP em uma democracia. Em ditaduras ocorrem o inverso. Sabemos como ocorria antes de 1988. Mas será que todos sabem que estamos em novo paradigma?

Bem, parece que, em tempos de “guerra contra a corrupção”, a noção constitucional do papel do MP tem perdido cada vez mais seu significado. Procuradores e promotores justiceiros querem combater a corrupção corrompendo a Constituição. E sempre em nome de uma “boa causa”.

É nessa perspectiva que alguns agentes do Ministério Público Federal estão apresentando uma solução facilitadora para o grave problema da corrupção. Ao proporem as 10 medidas anticorrupção (ver aqui) os autoresestão jogando a criança fora junto com a água suja. Querem fragilizar direitos que foram conquistados a duras penas neste país tristemente marcado por ditaduras ao longo de sua história. Demoramos tanto tempo para conquistar uma Constituição democrática e agora estamos tomando um rumo perigoso, capaz de colocar em risco os avanços.

É sempre bom lembrar que ninguém é a favor da corrupção, salvo o corrupto. Pensando bem, nem o corrupto é a favor da corrupção — com exceção da praticada por ele, é claro. O inferno são os outros... Da mesma forma, ninguém é a favor da impunidade. Tanto a corrupção como a impunidade são verdadeiras pragas que agridem a sociedade. A grande questão é a seguinte: o que estamos dispostos a sacrificar em nome do combate à corrupção? Vamos, por exemplo, relativizar as garantias constitucionais? Abrir mão do Habeas Corpus? Fazer valer prova ilícita?

Pois bem. Já apresentei críticas em relação a tais medidas. Fazendo umaanamnese das medidas propostas, chego à conclusão que o porteiro [1] do Supremo Tribunal Federal já as declarará inconstitucionais. Mas, sigo analisando algumas das principais “bandeiras” dessa cruzada:

Flagrante forjado: na pressa, o pacote do MPF ataca a presunção de inocência. Lá se vai a criança... Em vez de apresentar provas lícitas que possam comprovar a prática de conduta ilícita de seu agente público, o Estado estará autorizado a simular situações que permitam testar a conduta do agente. Uma proposta, além de inconstitucional, patética. Funcionaria muito bem em regimes totalitários. Quero testar a conduta de um agente público e, para isso, ofereço propina para ele... O agente, sem saber que se trata de uma simples pegadinha, aceita a propina e, logo em seguida, é preso em flagrante. Por que o Brasil demorou tanto a ter essa ideia? O projeto do MPF pretende o quê com isso?

Teste de integridade: aqui entra o fator Minority Report, filme futurista em que o Estado consegue acabar com os assassinatos usando uma divisão pré-crime. Essa divisão visualiza o crime antes de ocorrer através dos precogs(pré-cognição, por óbvio). Ali, o culpado é punido antes que o crime seja praticado. Pois o pacote do MPF propõe algo parecido. Trata-se de o que chamo de "eugenia cívica". Pelo pacote, o agente público deve se submeter a testes que apontem se é propenso a cometer crimes. Como assim? Já existe tal ciência? Mais: e se o “teste” for positivo, será meio idôneo de prova, ainda que o acusado a tenha produzido contra si mesmo? E será aplicado nos concursos de juiz e procurador? E na indicação de ministros? Eles não são agentes públicos? Seria algo como o teste de fidelidade que se vê na televisão brasileira?

Chama a atenção a ressalva do MPF de que tal teste não pode ser feito de forma a representar “uma tentação desmedida, a qual poderia levar uma pessoa honesta a se corromper”. Ok. Quer dizer que quanto maior a propina melhor para o corrupto que sem dúvida vai alegar “tentação desmedida”? Ou existe uma “medida” da tentação “desmedida”? Então quer dizer que uma pessoa honesta é honesta só até certo ponto? Claro, todo mundo tem um preço! Será?

Inversão do ônus da prova: sugere o MPF o crime de “enriquecimento ilícito”, no qual o agente é culpado caso não consiga explicar o aumento de seu patrimônio. Nítida inversão do ônus da prova. Segundo o MPF, isso não seria inversão, mas “escolher a única explicação para a discrepância”, com “base na experiência”. Nessa mesma linha, é proposto o chamado “confisco alargado”, onde diante da condenação por determinados crimes a diferença entre o patrimônio existente e aquele cuja origem foi demonstrada é perdido. Trata-se, como o próprio MPF reconhece na justificativa, de uma “presunção razoável” da ilicitude (sic). Sim, vocês leram corretamente: Presunção Razoável da Ilicitude! Não sei o que é pior: condenar com base na inversão do ônus da prova ou partindo de uma presunção?

Aproveitamento de prova ilícita: O porteiro do STF terá muito trabalho. O pacote propõe o aproveitamento de provas ilícitas no artigo 157 do CPP quando estas servirem para refutar álibi, fizerem contraprova de fato inverídico deduzido pela defesa ou demonstrarem falsidade ou inidoneidade de prova por ela produzida, ou necessária para provar a inocência do réu. Algo como “álibi não provado, réu culpado”. O que chama a atenção é que a nulidade somente deve ser decretada quando servir para dissuadir os agentes do Estado, ou seja, quando servir para orientá-los a não mais violar direitos. E eu que pensei que o processo deveria servir ao réu! Quer dizer que, nesses casos, mesmo sendo produzida ilicitamente o azar seria do réu?

Extensão da prisão preventiva: o MPF quer que seja possível decretar prisão preventiva para “permitir a identificação do produto e proveito do crime” ou “assegurar sua devolução” ou “evitar utilização para fuga ou defesa”. Será que entendi? O cidadão pode ser preso como forma de pressão para que devolva o dinheiro? A prisão como forma de coação? Claro, seguem a linha da prisão para celebrar “delação”. Adverte o MPF que “não se trata de prisão por dívida”! Claro que não. Afinal, se permitem a ironia, sequer uma dívida foi constituída ainda! Sequer um julgamento ocorreu! Chamando as coisas pelo nome: É uma prisão como constrangimento, coação, simplesmente para que o acusado entregue o dinheiro.

Informante confidencial: pretende legalizar o denuncismo próprio de regimes autoritários, onde as pessoas incriminam vizinhos, colegas de trabalho, familiares, desafetos, etc., sem ter que mostrar o rosto para o denunciado (lembram de Lon Fuller – O caso dos denunciantes invejosos?). Nem é necessário gastar caracteres para criticar essa pretensão. Só o nome já se delata.

Transformação da corrupção em crime hediondo: é a ideia mágica de fazer com que a corrupção tenha uma pena mais grave do que o homicídio em casos de desvio igual ou superior a cem salários mínimos. Em vez de buscar soluções mágicas, apresentadas por seguidores do direito penal máximo que acreditam que uma simples mudança na lei — no sentido de torná-la mais rigorosa — pode mudar a realidade, não seria melhor lutar para ampliar a democratização do nosso sistema político?

O velho punitivismo nunca foi a melhor solução... Vejam a Inglaterra do século XVIII, que transformou o ato de bater carteiras em pena de morte por enforcamento. No dia dos primeiros enforcamentos — em praça pública — foi o dia em que mais carteiras furtaram. O exemplo fala por si.

Restrição de recursos e fragilização do Habeas Corpus: com um discurso preocupado com a eficiência (sic) da Justiça, o MPF propõe reduzir os recursos. Os argumentos são parecidos com os do tempo da ditadura. Em nome de uma boa causa se ataca o Estado (Democrático?) de Direito. Afinal, as alterações servirão para caçar somente os homens maus que habitam a república. E assim o MPF retoma o argumento dos militares a favor da restrição do habeas corpus: “estamos aperfeiçoando o sistema processual brasileiro”.

Ora, o Habeas Corpus já foi melhor há mais de mil anos. Sendo mais explícito: pela proposta do MPF, fica vedada a concessão do HC de ofício; em caráter liminar; quando houver supressão de instância; para se discutir nulidade, trancar investigação ou processo e, além disso, condiciona sua concessão à prévia requisição de informações ao promotor natural da instância de origem. Por que não proibir logo o Habeas Corpus?

Declaração do trânsito em julgado de ação: decretação do trânsito em julgado em casos de recursos manifestamente protelatórios. Num país marcado pela discricionariedade judicial, querem que o trânsito em julgado da ação possa ser declarado monocraticamente. Inacreditável. Não seria mais fácil propor uma PEC dizendo: o réu será amarrado com uma pedra no pescoço e jogado na água; se flutuar, estará absolvido; se afundar, culpado. Muito mais barato.

Ampliação dos prazos de prescrição: ao mesmo tempo, propõem eternizar o processo. De acordo com os procuradores, “[...] a busca da prescrição e consequente impunidade é uma estratégia de defesa paralela às teses jurídicas, implicando o abuso de expedientes protelatórios”. Assim, a polícia, o MP e o Judiciário poderão atuar sem qualquer preocupação com o tempo,pois o Estado terá todo tempo do mundo para exercer a punição. Algo “eficiente”, se não estivéssemos falando de uma democracia.

Antecipação do cumprimento de pena: bom, esse é o tema da moda. Como a proposta dos procuradores é anterior à decisão do Supremo Tribunal, parece que eles venceram essa, não? De todo modo, estamos lutando para uma virada na decisão do STF, conforme escrevi no artigo sobre a proposição de ADC.

Enriquecimento ilícito de agentes públicos: considera-se situação de enriquecimento ilícito quando houver amortização ou extinção de dívidas do servidor público por terceiro. O negócio é tão surreal que se o próprio pai paga dívida de filho servidor público endividado, pode ser processado porque é um terceiro enriquecendo ilicitamente o rebento.

Eis aí o pacote. Se a moral corrige o Direito, minha pergunta é: quem corrige a moral?

Post scriptum 1: em defesa (prévia) da coerência e integridade de meu discurso.
Antes que alguém venha de novo (nas redes sociais e nas redes internas do MP isso se tornou voz corrente) com o argumento de que Lenio Streck escreve isso porque hoje é advogado, sugiro que não se atirem de peito aberto nessa empreitada... para não quebrarem a cara. Não há diferença entre o Lenio MP e o Lenio pós-MP. Todos os meus livros seguem uma linha antidiscricionária, garantista e social. Mesmo em questões, digamos assim, mais conservadoras, sempre a Constituição esteve presente (por exemplo, na questão de a CF conter mandados de criminalização). Alguns pontos que mostram L=L: na revisão constitucional de 1993, defesa intransigente de uma revisão restrita (escrevi um livro sobre isso); propus durante anos a proibição do uso de antecedentes no plenário do júri (e assim agi), porque o direito penal é do fato e não do autor; rejeição do in dubio pro societate, por não ser um princípio; combate ao moralismo; fui um dos primeiros a introduzir Ferrajoli explicitamente no processo criminal; defendi sempre a secularização do Direito; mais: o garantismo explicitado no livro sobreInterceptações Telefônicas e no livro sobre o Júri; e em Criminologia e Feminismo, escrito com Alessandro Barata; e em Hermenêutica em Crise(com 15 edições e tiragens), etc. Fiz a primeira arguição de inconstitucionalidade difusa em outubro de 1988 para afastar o processo judicialiforme; primeiro a sustentar que a lei da sonegação fiscal devia ser usada a favor de quem comete crime de furto (isso em 1990), tese acatada no TJ-RS; pena abaixo do mínimo — uma das teses que ajudei a sustentar junto com a 5ª Câmara; sustentei a tese de que a majorante do roubo por concurso de pessoas (1/3) devia ser usada a favor dos réus em crime de furto qualificado; sustentei, pioneiramente, a inconstitucionalidade da reincidência (acórdão do desembargador Amilton); como procurador, em mais de 80% dos processos em que oficiei, sustentei teses garantistas, a maioria vitoriosas a favor dos acusados (não que isso fosse bom ou ruim, mas porque era de lei); presente, em todos os pareceres, a filtragem hermenêutico-constitucional; as seis hipóteses de minha teoria da decisão foram criadas ainda como procurador; propus que o MP levasse ao PGR a feitura de uma ADC no caso da progressão de regime, para evitar que apenas alguns réus recebessem o benefício da progressão nos crimes hediondos; aliás, sempre defendi a progressão; quando nem a OAB se dera conta, sustentei, em comandita com a 5ª Câmara do TJ-RS, que todos as ações penais em que o interrogatório fora feito sem a presença de advogado eram... nulos (na época, o STJ anulava as nossas anulações sob o argumento de que CPP não exigia isso — quer dizer, obedecia-se o CPP e não a CF!); fui pioneiro em criticar o pamprincipiologismo... Posso fazer uma lista que levaria algumas páginas. Meus companheiros de 5ª Câmara criminal do TJ-RS (Amilton, Aramis, Genaceia e Gonzaga Moura podem falar sobre isso). Portanto, quem quiser entrar nessa seara de falácia ad hominem, chegará tarde. Para registro, minha defesa do poder investigatório do MP está em textos e livros... da década de 90 e, interessante, como advogado, continuei a defender essa tese. Sem esquecer as orientações de mestrado e doutorado sobre a defesa ortodoxa da CF, com dois prêmios Capes na algibeira.

Post scriptum 2: A relativização dos princípios e da Constituição
Fico muito preocupado com discursos nas redes sociais apoiando teses tipo “relativização dos princípios constitucionais” em nome da segurança pública e do combate à impunidade. Já se fala até do uso da tortura. Diz-se até que o único princípio intocável é o de não ser escravizado. Tudo para sustentarem que o STF acertou na decisão da presunção da inocência. Se os ministros do STF lerem e verem o que está nas redes sociais, mudarão seu voto, porque ficarão assustados com os “apoios”.

O que quero dizer é que estou muito preocupado com o rumo que o Direito está tendo no país. Estamos esticando demais a corda. O moralismo pode nos arrastar para o abismo, rompendo o pacto da modernidade.

Por isso, meu brado: Acorda, comunidade jurídica. Não “a corda” (para enforcar alguém), mas “acorda”!


1 Escrevi em um jornal que até o porteiro... e recebi críticas, porque estaria menosprezando o porteiro. Incrível como tem gente que, em nome da linguagem PC, acha “pelo em ovo”. 



Lenio Luiz Streck é jurista, professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do Escritório Streck, Trindade e Rosenfield Advogados Associados:www.streckadvogados.com.br.



Revista Consultor Jurídico, 3 de março de 2016, 8h00

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...