terça-feira, 17 de setembro de 2013

CERTIFICAÇÃO DIGITAL - PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO

Certificação digital - Processo Judicial eletrônico

Processos | 08.08.2013
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O que é certificado digital?

É um documento eletrônico, que contém dados sobre a pessoa ou empresa que o utilizam, para comprovar sua identidade perante terceiros. Funciona como uma carteira de identidade eletrônica, permitindo que transações via internet, assinatura digital de documentos e autenticação de usuários tornem-se operações seguras. Sua validade jurídica é garantida pela  Medida Provisória 2200-2/2001.

No TJMG, a emissão de certificados digitais é regulamentada pela Portaria 2337/2009.

O que é assinatura digital?


Assinar digitalmente um documento é, por meio de autenticação com certificado digital, garantir a autenticidade e integridade desse documento, ou seja, provar que o autor é quem diz ser e que o conteúdo do documento não foi alterado, desde a sua assinatura.

 
Benefícios da utilização da assinatura digital no TJMG:

- agilizar atos e procedimentos inerentes à prestação jurisdicional;
- diminuir custos;

- aumentar a capacidade de processamento de ações;

- facilitar o trabalho dos advogados, defensores e promotores;
- melhorar a qualidade do atendimento às partes.

 
Por que você vai precisar da certificação digital no TJMG?

Em breve, o TJMG vai implantar, na 2ª instância, o processo judicial eletrônico. Advogados, defensores públicos e promotores poderão, por meio do certificado digital, protocolizar petições iniciais, recursais e intermediárias, interpor recursos e acompanhar os autos eletronicamente.


Como obter a certificação digital?

É de responsabilidade de cada órgão o fornecimento do certificado digital. Defensores públicos e promotores podem procurar, junto a suas entidades, as informações sobre como obter a certificação digital. Advogados podem obter a certificação junto à OAB/MG.  Acesse o link.


Em quais aplicações já é possível usar a certificação digital?

- Themis;
 
- Projudi;
 
- Infojud (Sistema da Receita Federal);
 
- Renajud;
 
- Alvará de Soltura eletrônico;
 
- Malote Digital CNJ;
 
- Sistema de Informações Eleitorais (SIEL);
 
- IRPF (envio da declaração do Imposto de Renda de Pessoa Física);
 
- alguns bancos já admitem o acesso do home banking, utilizando-se o certificado digital.
 

Atos normativos

Lei Federal nº 11.419/2006: dispõe sobre a informatização do processo judicial.
Portaria-Conjunta 258/2012: dispõe sobre o aproveitamento e a expansão do Projeto Themis no TJMG.
Portaria 2337/2009: dispõe sobre normas para fornecimento de certificados digitais para magistrados e servidores no âmbito do TJMG.
Medida Provisória 2200-2/2001

Fonte: TJMG

"Regra de três" na sustentação ajuda a fixar ideias

Oradores, escritores e formadores de opinião sonham em perpetuar suas palavras na memória de seus ouvintes, de seus leitores, de seu público-alvo. Advogados e promotores se esforçam para perpetuar seus melhores argumentos nas mentes dos jurados. Entre eles, apenas os mestres da palavra conhecem, por dom natural ou aprendizado, um dos segredos da perenidade da mensagem, seja ela falada, escrita ou cantada: a "regra de três" do discurso.
A regra nada tem de matemática. Apenas ensina que o número certo de palavras que garante a eloquência discursiva para fixar a mensagem nas mentes é três — duas é pouco, quatro é demais. De acordo com o advogado e professor de Direito Elliott Wilcox, editor do site TrialTheather, isso é importante para advogados e promotores que precisam "dramatizar" alguns aspectos de suas alegações ou sustentações.
Se advogados e promotores querem dar eloquência a um pedido aos jurados, eles podem dizer, por exemplo: "Que seja feita Justiça – hoje, amanhã e sempre!"
O que importa, na opinião de Wilcox, é que as três palavras sejam separadas por três pontinhos, porque eles expressam a pausa que dá eloquência à expressão: "Hoje... Amanhã... E sempre". A primeira pausa é curta. A segunda, mais demorada, segundo ensina aos adeptos do preciosismo.
Em todo o seu pronunciamento no tribunal do Júri ou em um tribunal superior, o advogado ou promotor deve fixar na mente de sua audiência três pontos fundamentais, os mais importantes de toda sua linha de argumentação. Pode ser um, dois ou quatro. Mas, para expressar da melhor maneira possível a mensagem, é melhor que sejam três, diz o especialista.
A história está recheada de exemplos de frases memoráveis, em que a expressão inesquecível é formada por três palavras — talvez seja uma questão de ritmo. E não precisamos pesquisar na internet para lembrá-las:
- "Vim, vi, venci" — "veni, vidi, vici", em latim. Agora, a pesquisa ajuda: a frase teria sido dita por Júlio César, depois de vencer uma batalha, em uma mensagem ao Senado romano. A intenção dele era fixar essa mensagem na mente dos senadores, porque Roma passava por uma guerra civil. Alternativas com duas ou quatro palavras: "Vim, vi"; ou "vim, vi, venci e... o quê? Voltei?". Nenhuma delas é boa.
- "Liberdade, Igualdade e Fraternidade" (Liberté, Egalité, Fraternité). Não é possível esquecer esse slogan da Revolução Francesa, convertido posteriormente em "princípios universais". A frase foi cunhada por Jean-Jacques Rousseou. Possíveis alternativas às três palavras soariam ou pegariam mal: "Liberdade e Fraternidade"; ou "Liberdade, Igualdade, Fraternidade e... o quê? Guilhotina?".
Wilcox dá dois exemplos americanos e um oferecido à posteridade por Shakespeare:
- "Vida, liberdade e busca da felicidade" ("Life, Liberty and the pursuit of Happiness"). A frase imortal da Declaração de Independência dos Estados Unidos, proferida por Thomas Jefferson, descreve os "direitos alienáveis" dos cidadãos, como parte da crença de que "todos os homens são criados iguais". São mais de três palavras, mas "pursuit of happiness" é uma expressão consagrada. Portanto, no conjunto, são três ideias.
- "Amigos, Romanos, Compatriotas ("Friends, Romans, Countrymen"), concedei-me sua atenção". Faz parte do discurso de Marco Antônio na peça "Julius Caesar", de Shakespeare. Foi um discurso feito no funeral de César, bastante analisado, porque Marco Antônio promete a Brutus não colocar a culpa nele e nos conspiradores, mas o faz de uma forma indireta. Em sua oratória aos romanos, ele afirma, por exemplo, que não vai colocar a culpa em Brutus, porque ele é um homem honrado — e assim por diante. No final das contas, a turba se volta contra Brutus e os conspiradores.
- "Estalo, Estalido e Estouro!" ("Snap, Crackle and Pop"!). São os nomes dos personagens-mascotes do anúncio de um cereal vendido nos Estados Unidos.
A regra de três também é usada nos EUA por alguns comediantes, com sucesso. O criador do programa Story Theater, Doug Stevenson, explica como funciona. Os comediantes conseguem um efeito humorístico com quebra da sequência ou de um padrão. Por exemplo: "Maçãs... Laranjas ... Compensados" — para fazer uma brincadeira com tábuas de compensado. O ator e comediante Steve Martin usa três frases, em vez de três palavras, para fazer o "juramento do inconformista" na abertura de seu show: "Prometo ser diferente... Prometo ser único... Prometo não repetir os que os outros já disseram".
No tribunal do Júri, os jurados não vão se lembrar de todos os argumentos e provas apresentadas nas alegações. Por isso, melhor é escolher os três pontos mais importantes, os que devem necessariamente ficar na mente dos jurados, e lhes dar eloquência com três palavras, três frases ou três exemplos. Se houver dois, encontre mais um. Se houver quatro, dispense o mais fraco, recomenda Wilcox. Na hora da decisão, eles podem esquecer muita coisa, mas não irão esquecer dos pontos principais, construídos de acordo com a "regra de três".
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 26 de fevereiro de 2013

Ignorar as próprias testemunhas é erro comum no júri



Por João Ozorio de Melo


Há um erro grave que muitos advogados e promotores, mesmo os mais experientes, cometem no tribunal do júri: ignorar suas próprias testemunhas. Na inquirição direta, eles fazem uma pergunta e, quando a testemunha começa a respondê-las, eles tiram os olhos dela. Passam a olhar suas anotações, a conferir documentos ou o que quer que seja. O fato é: deixam de dar atenção a sua testemunha. Pelo menos, é o que parece.

Normalmente, é um erro involuntário, mas que provoca um efeito indesejável. No momento em que o advogado (ou promotor) deixa de prestar atenção à testemunha, ao que parece aos jurados, a tendência é que eles também façam o mesmo. "Por que prestar atenção no que a testemunha está falando se nem a parte interessada, que a convocou, está fazendo isso?", pergunta o advogado e editor do site TrialTheater, Elliott Wilcox.

Uma razão frequente desse costume do advogado é a de que ele se preparou muito bem para o julgamento, conversou com a testemunha, e já sabe, de cor e salteado, o que ela vai falar. É claro que ele está ouvindo o que a testemunha diz, enquanto prepara a próxima pergunta ou vasculha seus documentos. Mas não é assim que os jurados veem as coisas.

Os jurados observam o tempo todo o profissional em atuação. Reagem conforme o que veem: interesse ou desinteresse. "Se o advogado (ou promotor) não está dando importância às palavras da testemunha, é porque elas não têm importância e, portanto, eu também não preciso dar importância a elas", seguramente pensa um jurado, segundo Wilcox.

"Você pode pensar que isso não está certo. Mas, da mesma forma que o freguês está sempre certo, o jurado também está sempre certo", diz Wilcox. Se ele não gosta do que você está fazendo, ele está certo e você está errado. Assim também no caso de ele ignorar o testemunho ou a prova que você tentou apresentar", afirma.

Não se pode esquecer do óbvio: que o veredicto que vai decidir a sorte do réu está nas mãos dos jurados — ou, mais precisamente, em suas cabeças, onde se formam interpretações de tudo o que veem, ouvem e, sobretudo, percebem ou "sentem" no julgamento. Não nas anotações ou documentos do advogado (ou do promotor).

Para Wilcox, o advogado (ou promotor) deve focar seus olhos, durante qualquer inquirição, apenas na testemunha, na prova ou ilustração que está sendo apresentada, e no júri. E deve se posicionar em um lugar que possa ser visto pelos jurados, ao mesmo tempo em que veem a testemunha.

Tirar os olhos da testemunha e fazer alguma outra coisa durante sua resposta só serve para uma coisa: evitar que os jurados prestem atenção a uma resposta da testemunha — o que, em algumas situações, pode ser conveniente.

João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.

Revista Consultor Jurídico, 17 de setembro de 2013

Desconsideração da personalidade jurídica atinge sociedade em que mãe e filha dividem cotas



Não é possível afastar a responsabilidade de um dos sócios quando se trata de sociedade familiar, na qual mãe e filha detêm cada uma 50% do capital social votante, se não ficou comprovado na demanda quem atuou como gerente ou administrador da empresa.

A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso em que uma das sócias, a filha, pedia para não figurar na demanda, com a alegação de que não tinha participado das decisões da empresa.

No caso, a filha ajuizou exceção de pré-executividade, após ser declarada a desconsideração da pessoa jurídica da empresa para satisfazer um cheque no valor de pouco mais de R$ 2.500. O Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE) considerou que a confusão patrimonial impunha a responsabilização de ambas.

Recurso no STJ

A filha sustentou em recurso ao STJ que o TJSE atribuiu interpretação extensiva ao artigo 50 do Código Civil de 2002, ao permitir a responsabilização de sócio que não era gerente ou administrador da sociedade.

A desconsideração da pessoa jurídica ocorre em situação excepcional, sendo necessária a presença do pressuposto específico do abuso da personalidade jurídica, com a finalidade de lesão a direito de terceiro, infração da lei ou descumprimento de contrato. Em resumo, é necessário ter presente a efetiva manipulação da autonomia patrimonial da sociedade em prol de terceiros.

O objetivo da medida é garantir o pagamento de dívidas da sociedade, mediante a constrição do patrimônio pessoal dos sócios ou administradores.

No processo analisado pela Terceira Turma, mãe e filha eram as únicas sócias da empresa.

Necessidade de prova

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, em uma organização empresarial modesta, em que mãe e filha figuram como únicas sócias, a titularidade de cotas e a administração são realidades que frequentemente se confundem, o que dificulta a apuração de responsabilidade por eventuais atos abusivos ou fraudulentos.

"Em hipóteses como essa, a previsão, no contrato social, de que as atividades de administração serão realizadas apenas por um dos sócios não é suficiente para afastar a responsabilidade dos demais", disse a ministra. "Seria necessária, para afastar a referida responsabilidade, a comprovação de que um dos sócios estava completamente distanciado da administração da sociedade", acrescentou.

Como no caso analisado pela Turma a discussão sobre a legitimidade começou em exceção de pré-executividade, que não admite dilação probatória, não foi possível produção de prova capaz de demonstrar que a filha não interferiu na administração da sociedade.

De acordo com a relatora, embora seja possível limitar a responsabilidade de sócio minoritário, afastado das funções de gerência e administração, que comprovadamente não concorreu para o desvio de finalidade ou confusão patrimonial, nesse caso se trata de sociedade modesta, que tem como únicas sócias mãe e filha, detendo, cada uma, 50% das cotas sociais, e, por isso, não é possível afastar a responsabilidade da filha.

REsp 1315110

Fonte: Editora Magister

Nulidade de acórdão por ausência de fundamentação específica tem repercussão geral



O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a existência repercussão geral no tema tratado no Recurso Extraordinário (RE) 719870, em que se discute a validade de acórdão por ausência de fundamentação sobre ponto relevante para a análise de constitucionalidade de norma impugnada por meio de ação direta de inconstitucionalidade estadual. No caso dos autos, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MP-MG) questiona decisão do Tribunal de Justiça mineiro que declarou a constitucionalidade de três leis de Além Paraíba (MG) que criaram cargos em comissão no âmbito daquela municipalidade.

A Corte Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG) assentou a constitucionalidade das Leis municipais 2.604/2008, 2.186/2003 e 2.079/2001. No entendimento do colegiado, aos cargos em comissão por elas criados corresponderiam funções de chefia, direção e assessoramento, motivo pelo qual não haveria ofensa aos artigos 21, parágrafo 1º, e 23 da Constituição estadual. Aquela corte apontou ainda a necessidade de análise de questão fática, bem como de matéria legal, para verificação da correspondência entre os cargos criados e as suas atribuições.

RE

No RE interposto ao Supremo, o MP mineiro alega inicialmente omissão do TJ-MG que, mesmo após a interposição de embargos de declaração, não teria analisado todas as questão apresentadas, o que afrontaria o artigo 93, inciso IX, da CF, que trata da necessidade de fundamentação das decisões judiciais.

No mérito, o MP-MG aponta violação ao artigo 37, incisos II e V, da Constituição Federal, uma vez que os cargos criados pelos diplomas legais questionados seriam de caráter meramente técnico, e as atividades atinentes a eles não possuiriam vínculo de confiança inerente às funções de chefia e assessoramento. O MP afirma, também, que o STF tem entendimento pacífico no sentido da impossibilidade de criação de cargos em comissão para o exercício de funções técnicas e operacionais.

Ainda conforme o recorrente, o legislador municipal de Além Paraíba não especificou as atividades concernentes a vários dos cargos instituídos pelas mencionadas leis. Aponta, ainda, entre as omissões do TJ-MG, que o voto condutor do julgamento não se teria manifestado sobre o fato de apenas 4 dos 114 cargos de provimento em comissão criados pelas leis impugnadas possuírem as atribuições descritas nos preceitos por ele atacados.

Repercussão

O relator do recurso no STF, ministro Marco Aurélio, ao se manifestar pela repercussão geral da matéria, lembrou que o TJ-MG decidiu que todos os cargos indicados nas normas trazem atividades de chefia, assessoramento e coordenação (direção). Assim, segundo o TJ, não se constataria a incompatibilidade com o texto constitucional.

Conforme destacou o relator, o MP-MG apresentou embargos de declaração buscando ver explicitado pelo tribunal estadual o que está previsto na legislação quanto aos cargos, para a indispensável definição de enquadramento, ou não, na exceção ao concurso público. Contudo os embargos foram desprovidos.

“A persistir o quadro, estará inviabilizado o acesso ao Supremo, brecando o tribunal de origem o exame cabível”, destacou o ministro. Em sua manifestação, o ministro Marco Aurélio destacou que o acórdão da corte mineira inviabilizou o acesso ao STF, violando “norma comezinha alusiva ao devido processo legal”.

Ao reconhecer a repercussão geral do tema, a manifestação foi seguida, por maioria, por deliberação no Plenário Virtual da Corte.

FK/AD

Processos relacionados
RE 719870

INFORMATIVO JURISPRUDENCIAL DO STJ Nº. 525

Informativo n. 0525
Período: 11 de setembro de 2013.

As notas aqui divulgadas foram colhidas nas sessões de julgamento e elaboradas pela Secretaria de Jurisprudência, não consistindo em repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal.
 
Primeira Seção

DIREITO ADMINISTRATIVO. REGRAS DE PROGRESSÃO NA CARREIRA DA EDUCAÇÃO BÁSICA, TÉCNICA E TECNOLÓGICA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. N. 8/2008-STJ).
Até o advento do Decreto 7.806/2012, que regulamenta o art. 120 da Lei 11.784/2008, era possível a docente da Carreira da Educação Básica, Técnica e Tecnológica progredir por titulação sem observância de interstício temporal. Conforme o art. 120 da Lei n. 11.784/2008, “o desenvolvimento na Carreira de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico dos servidores que integram os Quadros de Pessoal das Instituições Federais de Ensino, subordinadas ou vinculadas ao Ministério da Educação, ocorrerá mediante progressão funcional, exclusivamente, por titulação e desempenho acadêmico, nos termos do regulamento”. Ainda, conforme o § 1º do mesmo artigo, a progressão funcional será feita após o professor cumprir o interstício de dezoito meses de efetivo exercício no nível respectivo. Ocorre que o § 5º do aludido dispositivo legal prevê que, até que seja publicado o regulamento previsto no caput para fins de progressão funcional e desenvolvimento na respectiva carreira, devem ser aplicadas as regras estabelecidas nos arts. 13 e 14 da Lei n. 11.344/2006, nas quais há previsão de progressão por titulação sem cumprimento de interstício temporal. Assim, o entendimento do STJ é que a progressão dos docentes da carreira do magistério básico, técnico e tecnológico federal, até a publicação do Decreto n. 7.806/2012, é regida pelas disposições da Lei n. 11.344/2006, com duas possibilidades: por interstício, com avaliação de desempenho; e por titulação, sem observância do interstício. REsp 1.343.128-SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/6/2013.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE NA HIPÓTESE DE FILHO MAIOR DE 21 ANOS. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
O filho maior de 21 anos, ainda que esteja cursando o ensino superior, não tem direito à pensão por morte, ressalvadas as hipóteses de invalidez ou deficiência mental ou intelectual previstas no art. 16, I, da Lei 8.213/1991. O art. 16, I, da Lei 8.213/1991 é taxativo, não cabendo ao Poder Judiciário legislar positivamente, usurpando função do Poder Legislativo. Precedentes citados: MS 12.982-DF, Corte Especial, DJe 31⁄3⁄08; REsp 771.993-RS, Quinta Turma, DJ 23⁄10⁄06; e AgRg no Ag 1.076.512-BA, Sexta Turma, DJe 3⁄8⁄11. REsp 1.369.832-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 12/6/2013.
 
Segunda Turma

DIREITO ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. REGULAMENTAÇÃO DO ACESSO A FONTES DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA.
É possível que decreto e portaria estaduais disponham sobre a obrigatoriedade de conexão do usuário à rede pública de água, bem como sobre a vedação ao abastecimento por poço artesiano, ressalvada a hipótese de inexistência de rede pública de saneamento básico. Os estados membros da Federação possuem domínio de águas subterrâneas (art. 26, I, da CF), competência para legislar sobre a defesa dos recursos naturais e a proteção do meio ambiente (art. 24, VI, da CF) e poder de polícia para precaver e prevenir danos ao meio ambiente (art. 23, VI e XI, da CF). Assim, a intervenção desses entes sobre o tema não só é permitida como também imperativa. Vale acrescentar que o inciso II do art. 12 da Lei 9.433/1997 condiciona a extração de água do subterrâneo à respectiva outorga, o que se justifica pela notória escassez do bem, considerado como recurso limitado, de domínio público e de expressivo valor econômico. Nesse contexto, apesar de o art. 45 da Lei 11.445/2007 admitir soluções individuais de abastecimento de água, a interpretação sistemática do dispositivo não afasta o poder normativo e de polícia dos estados no que diz respeito ao acesso às fontes de abastecimento de água e à determinação de conexão obrigatória à rede pública. REsp 1.306.093-RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 28/5/2013.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO DO VALOR EXECUTADO MESMO APÓS O PAGAMENTO DE PARCELA INCONTROVERSA.
O pagamento espontâneo da quantia incontroversa dentro do prazo do art. 475-J, caput, do CPC não gera a preclusão do direito do devedor, previsto no § 1º do mesmo dispositivo, de impugnar o valor executado. Isso porque não há identidade entre o prazo previsto no caput do art. 475-J do CPC e aquele positivado no seu § 1º. O caput refere-se ao pagamento espontâneo da dívida e impõe como sanção o acréscimo de multa de 10% da quantia devida, quando não observado o interregno de quinze dias para o pagamento do valor apurado, cujo termo inicial se dá na intimação do devedor na pessoa de seu advogado. Já a previsão contida no § 1º é relativa à apresentação de impugnação pelo executado para discussão do cumprimento da sentença. REsp 1.327.781-BA, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 2/5/2013.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECOLHIMENTO POST MORTEM DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PARA A CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE.
Não se admite o recolhimento post mortem de contribuições previdenciárias a fim de que, reconhecida a qualidade de segurado do falecido, seja garantida a concessão de pensão por morte aos seus dependentes. De fato, esse benefício é devido ao conjunto de dependentes do segurado que falecer, mas desde que exista, ao tempo do óbito, a qualidade de segurado do instituidor. Nesse contexto, é imprescindível o recolhimento das contribuições pelo próprio contribuinte, de acordo com o art. 30, II, da Lei 8.212/1991. Sendo assim, não obstante o exercício de atividade pelo segurado obrigatório ensejar sua filiação obrigatória no RGPS, para  seus dependentes perceberem a pensão por morte, são necessários a inscrição e o recolhimento das respectivas contribuições em época anterior ao óbito, diante da natureza contributiva do sistema. Dessa forma, não há base legal para uma inscrição post mortem ou para que sejam regularizadas, após a morte do segurado, as contribuições não recolhidas em vida por ele. Precedente citado: REsp 1.328.298-PR, Segunda Turma, DJe 28/9/2012. REsp 1.346.852-PR, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 21/5/2013.

DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO. CONVENÇÃO DA HAIA SOBRE ASPECTOS CIVIS DO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS.
Não se deve ordenar o retorno ao país de origem de criança que fora retida ilicitamente no Brasil por sua genitora na hipótese em que, entre a transferência da criança e a data do início do processo para sua restituição, tenha decorrido mais de um ano e, além disso, tenha sido demonstrado, por meio de avaliação psicológica, que a criança já estaria integrada ao novo meio em que vive e que uma mudança de domicílio poderia causar malefícios ao seu desenvolvimento. De fato, a Convenção da Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro com a edição do Dec. 3.413/2000, tem por objetivo: a) assegurar o retorno imediato de crianças ilicitamente transferidas para qualquer Estado Contratante ou nele retidas indevidamente; e b) fazer respeitar de maneira efetiva nos outros Estados Contratantes os direitos de guarda e visita existentes num Estado Contratante (art. 1º). De acordo com o art. 12 da convenção, quando uma criança tiver sido ilicitamente transferida ou retida e tenha decorrido um período de menos de um ano entre a data da transferência ou da retenção indevidas e a data do início do processo perante a autoridade judicial ou administrativa do Estado Contratante onde a criança se encontrar, a autoridade respectiva deverá ordenar o retorno imediato da criança. Ainda conforme esse dispositivo, a autoridade judicial ou administrativa respectiva, mesmo após expirado o mencionado período de um ano, deverá ordenar o retorno da criança, salvo quando for provado que a criança já se encontra integrada ao seu novo meio. Isso porque a referida convenção tem como escopo a tutela do princípio do melhor interesse da criança, de forma a garantir-lhe o bem estar e a integridade física e emocional de acordo com suas verdadeiras necessidades. Para que se possa entender esse princípio, bem como para sua aplicação, o julgador deve considerar uma série de fatores, como o amor e os laços afetivos entre os pais, os familiares e a criança, o lar da criança, a escola, a comunidade, os laços religiosos e a habilidade do guardião de encorajar contato e comunicação saudável entre a criança e o outro genitor. Essas considerações, essencialmente subjetivas, são indicadores que conduzem o juiz à descoberta do que lhe parece ser o melhor interesse da criança em cada caso concreto. Por isso a Convenção da Haia, não obstante apresente reprimenda rigorosa ao sequestro internacional de menores, com determinação expressa de seu retorno ao país de origem, garante o bem estar e a integridade física e emocional da criança, o que deve ser avaliado de forma criteriosa, fazendo-se necessária a prova pericial psicológica. REsp 1.293.800-MG, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 28/5/2013.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PENHORABILIDADE DE VALOR RECEBIDO POR ANISTIADO POLÍTICO A TÍTULO DE REPARAÇÃO ECONÔMICA.
Os valores recebidos por anistiado político a título de reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada (art. 5º da Lei 10.559/2002) são suscetíveis de penhora para a garantia de crédito tributário. De fato, o art. 184 do CTN determina que são passíveis de penhora todos os bens e rendas de qualquer origem ou natureza do sujeito passivo, salvo os declarados por lei absolutamente impenhoráveis. Por sua vez, o art. 649 do CPC estabelece que são absolutamente impenhoráveis, entre outros bens, os vencimentos, subsídios, soldos, salários e remunerações (inciso IV). Ocorre que, de acordo com a Lei 10.559/2002 — que regulamenta o Regime do Anistiado Político —, a reparação econômica devida a anistiado político não possui caráter remuneratório ou alimentar, mas sim “caráter indenizatório” (art. 1º, II). Sendo assim, essas verbas se mostram passíveis de constrição, na medida em que não foram consideradas por lei como absolutamente impenhoráveis. REsp 1.362.089-RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/6/2013.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PRAZOS PROCESSUAIS NO CASO DE GREVE DE ADVOGADOS PÚBLICOS.
A greve de advogados públicos não constitui motivo de força maior a ensejar a suspensão ou devolução dos prazos processuais (art. 265, V, do CPC). Precedentes citados: AgRg no REsp 502.403-RS, Segunda Turma, DJe de 16/12/2008; AgRg no Ag 1.428.316-PI, Quarta Turma, DJe 23/4/2012; AgRg no Ag 1.253.872-DF, Quinta Turma, DJe 26/4/2010; e AgRg no REsp 373.323-DF, Sexta Turma, DJe de 4/8/2008. REsp 1.280.063-RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 4/6/2013.

DIREITO TRIBUTÁRIO. DEDUÇÃO NA DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA DE GASTOS COM PROFISSIONAL DE SAÚDE NÃO INSCRITO EM CONSELHO PROFISSIONAL.
Na declaração anual de imposto de renda, é possível a dedução de valor referente à despesa do contribuinte com profissional de saúde, mesmo que este não seja regularmente inscrito no respectivo conselho profissional. Isso porque o art. 8º, I, da Lei 8.134/1990 — que estabelece rol de hipóteses de dedução do imposto de renda — não fez qualquer restrição à devida inscrição nos respectivos conselhos profissionais. Ademais, o § 1º, "c", do referido artigo exige apenas a comprovação do gasto por meio de recibo no qual conste nome, endereço, CPF ou CNPJ do emissor ou indicação do nome do profissional no cheque emitido pelo contribuinte. Assim, uma vez verificado que o contribuinte comprovou as despesas médicas nos termos da legislação de regência, é possível a dedução efetuada na declaração de ajuste anual do imposto de renda. AgRg no REsp 1.375.793-RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 4/6/2013.

DIREITO ADMINISTRATIVO. FALTA DE IDENTIFICAÇÃO DO TIPO DE CADERNO DE QUESTÕES EM CERTAME PÚBLICO.
Não tem direito à correção de cartão-resposta de prova aplicada em certame público o candidato que, descumprindo regra contida no edital e expressa no próprio cartão-resposta, abstenha-se de realizar a identificação do seu tipo de caderno de questões. Isso porque viabilizar a correção da folha de resposta de candidato que não tenha observado as instruções contidas no regulamento do certame e ressalvadas no próprio cartão-resposta implicaria privilegiar um candidato em detrimento dos demais — que concorreram em circunstâncias iguais de maturidade, preparação, estresse e procedimento —, configurando flagrante violação do princípio da isonomia. REsp 1.376.731-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 14/5/2013.
 
Terceira Turma

DIREITO DO CONSUMIDOR. PRAZO DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO POR DANOS DECORRENTES DA QUEDA DE AERONAVE.
É de cinco anos o prazo de prescrição da pretensão de ressarcimento de danos sofridos pelos moradores de casas atingidas pela queda, em 1996, de aeronave pertencente a pessoa jurídica nacional e de direito privado prestadora de serviço de transporte aéreo. Isso porque, na hipótese, verifica-se a configuração de um fato do serviço, ocorrido no âmbito de relação de consumo, o que enseja a aplicação do prazo prescricional previsto no art. 27 do CDC. Com efeito, nesse contexto, enquadra-se a sociedade empresária no conceito de fornecedor estabelecido no art. 3º do CDC, enquanto os moradores das casas atingidas pela queda da aeronave, embora não tenham utilizado o serviço como destinatários finais, equiparam-se a consumidores pelo simples fato de serem vítimas do evento (bystanders), de acordo com o art. 17 do referido diploma legal. Ademais, não há dúvida de que o evento em análise configura fato do serviço, pelo qual responde o fornecedor, em consonância com o disposto do art. 14 do CDC. Importante esclarecer, ainda, que a aparente antinomia entre a Lei 7.565/1986 — Código Brasileiro de Aeronáutica —, o CDC e o CC/1916, no que tange ao prazo de prescrição da pretensão de ressarcimento em caso de danos sofridos por terceiros na superfície, causados por acidente aéreo, não pode ser resolvida pela simples aplicação das regras tradicionais da anterioridade, da especialidade ou da hierarquia, que levam à exclusão de uma norma pela outra, mas sim pela aplicação coordenada das leis, pela interpretação integrativa, de forma a definir o verdadeiro alcance de cada uma delas à luz do caso concreto. Tem-se, portanto, uma norma geral anterior (CC/1916) — que, por sinal, sequer regulava de modo especial o contrato de transporte — e duas especiais que lhe são posteriores (CBA/1986 e CDC/1990). No entanto, nenhuma delas expressamente revoga a outra, é com ela incompatível ou regula inteiramente a mesma matéria, o que permite afirmar que essas normas se interpenetram, promovendo um verdadeiro diálogo de fontes. A propósito, o CBA regula, nos arts. 268 a 272, a responsabilidade do transportador aéreo perante terceiros na superfície e estabelece, no seu art. 317, II, o prazo prescricional de dois anos da pretensão de ressarcimento dos danos a eles causados. Essa norma especial, no entanto, não foi revogada, como já afirmado, nem impede a incidência do CDC quando evidenciada a relação de consumo entre as partes envolvidas. Destaque-se, por oportuno, que o CBA não se limita a regulamentar apenas o transporte aéreo regular de passageiros, realizado por quem detenha a respectiva concessão, mas todo serviço de exploração de aeronave, operado por pessoa física ou jurídica, proprietária ou não, com ou sem fins lucrativos. Assim, o CBA será plenamente aplicado, desde que a relação jurídica não esteja regida pelo CDC, cuja força normativa é extraída diretamente da CF (art. 5º, XXXII). Ademais, não há falar em incidência do art. 177 do CC/1916, diploma legal reservado ao tratamento das relações jurídicas entre pessoas que se encontrem em patamar de igualdade, o que não ocorre na hipótese. REsp 1.202.013-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/6/2013.

DIREITO EMPRESARIAL. AVAL EM CÉDULA DE CRÉDITO RURAL.
Tratando-se de Cédula de Crédito Rural emitida por pessoa física, é nulo o aval prestado por pessoa física estranha ao negócio jurídico garantido. Segundo o art. 60, caput, do Decreto-lei 167/1967, são aplicáveis às cédulas de crédito rural as mesmas regras de direito cambiário, no que forem cabíveis, inclusive em relação ao aval, dispensado o protesto para assegurar o direito de regresso contra endossantes e seus avalistas. Contudo, o § 3º do mencionado dispositivo define que são nulas quaisquer garantias reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, pela própria empresa ou por outras pessoas jurídicas. Precedente citado: REsp 599.545-SP, Terceira Turma, DJ 25/10/2007. REsp 1.353.244-MS, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 28/5/2013.
 
Quarta Turma

DIREITO CIVIL E EMPRESARIAL. PRAZO PRESCRICIONAL DAS AÇÕES DE INDENIZAÇÃO CONTRA ARMAZÉNS GERAIS.
Nas ações de indenização contra armazéns gerais, o prazo prescricional é de três meses. Isso porque o disposto no art. 11 do Dec. 1.102/1903 é norma especial em relação ao art. 177 do CC/1916. Precedentes citados: REsp 767.246-RJ, Quarta Turma, DJ 27/11/2006; REsp 89.494-MG, Quarta Turma, DJ de 29/8/2005. AgRg no REsp 1.186.115-RJ, Rel. Min. Isabel Gallotti, julgado em 14/5/2013.

DIREITO CIVIL E EMPRESARIAL. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL PARA PLEITEAR INDENIZAÇÃO DECORRENTE DO USO DE MARCA INDUSTRIAL QUE IMITE OUTRA PREEXISTENTE.
O termo inicial do prazo prescricional de cinco anos (art. 225 da Lei 9.279/1996) para pleitear indenização pelos prejuízos decorrentes do uso de marca industrial que imite outra preexistente, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia registrada (art. 124, XIX), é a data da violação do direito à propriedade industrial e se renova enquanto houver o indevido uso. Isso porque o prazo prescricional começa a correr tão logo nasça a pretensão, a qual tem origem com a violação do direito subjetivo — o direito de propriedade industrial. Ademais, considerando que a citada violação é permanente, enquanto o réu continuar a utilizar marca alheia registrada, diariamente o direito será violado, nascendo nova pretensão indenizatória, motivo pelo qual não há como reconhecer que a pretensão do autor estava prescrita quando do ajuizamento da demanda. REsp 1.320.842-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2013.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PAGAMENTO DE CUSTAS E DE PORTE DE REMESSA E DE RETORNO POR MEIO DA INTERNET.
Nos processos de competência do STJ, é possível o pagamento de Guia de Recolhimento da União (GRU) referente a custas processuais e porte de remessa e de retorno por meio da internet. O processo civil brasileiro vem passando por contínuas alterações legislativas, de modo a se modernizar e a buscar celeridade, visando a efetivar o princípio da razoável duração do processo. Nesse contexto, insere-se a Lei 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial. No que diz respeito ao recolhimento das despesas processuais, no âmbito do STJ, a Res. 4/2010 estabelecia, em seu art. 6º, § 1º, que as guias de recolhimento das custas e do porte e remessa e retorno deveriam ser emitidas no sítio do Tesouro Nacional. Quanto ao pagamento, essa resolução não fixava a maneira pela qual deveria ocorrer, isto é, não estabelecia se o pagamento deveria ser feito obrigatoriamente na agência bancária ou se poderia ser utilizado outro meio. Com efeito, ainda não há, na legislação de regência, norma que vede expressamente o pagamento pela internet ou determine que este ocorra na agência bancária ou em terminal de autoatendimento. Além disso, o próprio Tesouro Nacional autoriza o pagamento da GRU pela internet. Contudo, havendo dúvida acerca da autenticidade do comprovante, o Tribunal de origem ou relator poderá, de ofício ou a requerimento da parte contrária, determinar a apresentação de documento idôneo e, caso não suprida a irregularidade, declarar a deserção. AgRg no REsp 1.232.385-MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 6/6/2013.
 
Quinta Turma

DIREITO PENAL. QUALIFICADORA DO MOTIVO FÚTIL NO CRIME DE HOMICÍDIO.
A anterior discussão entre a vítima e o autor do homicídio, por si só, não afasta a qualificadora do motivo fútil. Precedente citado: AgRg no AREsp 31.372-AL, Sexta Turma, DJe 21/3/2013; AgRg no AREsp 182.524-DF, Quinta Turma, DJe 17/12/2012. AgRg no REsp 1.113.364-PE, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe 21/8/2013.

Fonte: STJ

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Novo CPC decreta a morte da lei. Viva o common law!


Por Lenio Luiz Streck



Bula para casos de ingestão indevida
Como a da semana passada, também esta coluna não é indicada para quem gosta de jurisprudencialização do Direito e do jargão “o Direito é aquilo que os tribunais dizem que é” e da máxima de que “princípios são valores”. Em caso de ingestão indevida, a Constituição deverá ser consultada.

Passando batido?
Dito isso, volto a um assunto que não está merecendo a devida atenção da comunidade jurídica. É impressionante como o projeto do novo CPC está passando “batido”. Cheio de problemas, repleto de equívocos, é o retrato daquilo que se pode chamar de “baixo apego dos juristas à Teoria do Direito”. Seria isso sinal de acomodação, alienação ou sintomas de que, definitivamente, pouco estamos nos importando com o futuro do direito? Talvez devamos fazer uma campanha, em outdoors: “Salvemos o Direito dos predadores exógenos (política, moral e economia) e endógenos (pan-principiologismo, relativização da coisa julgada, embargos declaratórios, commonlização e discricionariedades)”.

De há muito venho alertando à comunidade jurídica para esse problema do protagonismo judicial, que deita raízes em uma questão paradigmática e não meramente “técnica”. Veja-se, por exemplo, a seguinte decisão, que se repete nas várias instâncias da justiça brasileira: “O sistema normativo pátrio utiliza o princípio do livre convencimento motivado do juiz, o que significa dizer que o magistrado não fica preso ao formalismo da lei nem adstrito ao laudo pericial produzido nos autos, devendo o julgador analisar o caso concreto, levando em conta sua livre convicção pessoal”. (5001367-22.2011.404.7119). Decisão desse jaez é emblemática, porque é uma amostra da dificuldade com que a dogmática jurídica lida com a teoria do direito e, especialmente, com o conceito de princípio jurídico (veja-se, no caso, o famoso princípio do livre convencimento). Não faltam vozes para afirmar que princípios são “normas gerais que possibilitam a criação de normas mais específicas”... Dever-se-ia perguntar: criação de normas particulares por parte de quem? Por parte do juiz, para levar a cabo o seu livre convencimento? Mas, se assim o é, qual a diferença dessa postura para com aquela defendida por Kelsen em sua Teoria Pura do Direito, que previa para o aplicador, no momento de criar a norma concreta de solução para o caso, uma margem geral de atuação, isto é, um campo semântico que daria uma margem de liberdade (discricionariedade) para o aplicador da norma geral superior. Não faltam vozes, também, que consideram a questão dos princípios ligada umbilicalmente à “questão da ponderação” (argh!)... De todo modo, esse assunto demandará uma Coluna específica, na sequência.

Nem quero falar das “macro-lides”, como a decisão do STJ que “criou” um recurso sustentado nessa tese, como pode ser visto no recente REsp. 1.251.331-RS? Tudo em nome de efetividades quantitativas. E nem das demandas repetitivas em discussão no STF.

Nesse sentido, insisto na pergunta: adianta somente mudar a lei? De que importa tudo isso se o projeto não abre mão do livre convencimento, corolário do paradigma epistemológico da filosofia da consciência?[1] Vejamos o artigo 378: “O juiz apreciará livremente a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”. Já o artigo 401 diz que “A confissão extrajudicial será livremente apreciada pelo juiz.” E no artigo 490 lê-se que “A segunda perícia não substitui a primeira, cabendo ao juiz apreciar livremente o valor de uma e outra”. Vejam: não é invenção minha. E nem cisma!

Sendo mais claro: não avançaremos enquanto não nos dermos conta da necessidade de construirmos uma teoria abrangente do processo, para guiar a nossa interpretação dos dispositivos legais.

Ou seja: não basta falar em apreciação das provas... No caso, o projeto falha em dizer que a apreciação é livre, o que é pior. Mas o que falta mesmo, permito-me repetir, é uma-teoria-abrangente-do-processo-para-guiar-a-nossa-interpretação-da-lei!

“Fundamentação”? Adianta? E o livre convencimento?
Ao se fazer uma análise mais detida do CPC projetado, fica claro que suas bases fundantes partem do velhíssimo e desgastado modelo social protagonista, que impõe o evidente receio de mantença da matriz autoritária de processo social, capitaneado pelas correntes instrumentalistas, que acreditam, de modo romântico, nas virtudes soberanas do decisor e em sua capacidade de antever o impacto decisório (político, econômico e social). Ah, como isso é velho!

Veja-se o equívoco do projeto. Embora pareça assumir uma postura participativa (leiam seus primeiros 12 artigos), aposta, ao fim e ao cabo, no (velho) protagonismo (solipsista). Aliás, é um equívoco que corrói a raiz do projeto. Nisso há um déjà vu, que nos remete ao século XIX. Ouve-se, ao longe, o discurso de Bülow ao Imperador... Ora isso viabilizou, anos depois, o surgimento, por exemplo, das correntes voluntaristas, como a Escola do Direito Livre. Livre do que? Bingo: Livre da lei, é claro.

Igualzinho ao projeto do novo CPC. Livre da lei e atirado nos braços dos “precedentes”. Portanto, não é sem razão que os novos projetos de Códigos Processuais (sim, os dois projetos) não abrem mão do livre convencimento ou da livre apreciação das provas. E, além disso, apostam nos precedentes.

Por isso, não tenho receio em afirmar que o projeto do novo CPC já nasce velho. O projeto favorece uma espécie de Judiciariocracia dos Tribunais Superiores. Já nas instâncias inferiores... Bem, é melhor lerem o projeto...

“Cadê”a civil law e a legalidade que estavam aqui? O CPC comeu...
Vejamos às incongruências do projeto. Há um capítulo (XV) intitulado “Do Precedente Judicial” (vejam: não há um capítulo do tipo “Da Lei”!). Diz que os tribunais “devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável”. Aí está o busílis. Se resolveram importar a doutrina dos precedentes, já começaram mal. Muito mal. Ora, a estabilidade é diferente da integridade e da coerência do Direito, pois a “estabilidade” é um conceito autorreferente, isto é, numa relação direta com os julgados anteriores. Já a integridade e a coerência guardam um substrato ético-político em sua concretização, isto é, são dotadas de consciência histórica e consideram a facticidade do caso. Simples, pois.

Sob o pretexto de que se almejaria dar efetividade ao princípio da legalidade, cria-se um elo impossível entre este princípio e o pragmati(ci)smo dos tribunais. Por isso, denuncio aqui que, nesse Capítulo XV, o projeto do novo CPC põe abaixo o princípio da legalidade na teoria da interpretação. E o Congresso, seu autor, comete(rá) uma espécie de haraquiri. O suicídio de sua função normativa. E ele não se dá conta disso. O Parlamento foi envolvido pelo canto da sereia dos precedentes. Mal sabe ele que está abrindo mão de dizer o que é a lei.

Repetindo: o projeto revoga por meio de um texto infraconstitucional o princípio constitucional da legalidade. Ao invés da cláusula pétrea do artigo 5º, inciso II, da Constituição, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, teremos, agora, um “novo”, pelo qual “os juízes não serão obrigados a decidir senão em virtude dos precedentes”. E isso sem qualquer emenda a Constituição (que nem poderia vingar, por ser cláusula pétrea!).

Isto é, um texto infraconstitucional que contraria a Constituição, que determina que os juízes não devem mais julgar com base na normatividade, mas, sim, de acordo com as decisões dos tribunais. Adeus jurisdição constitucional às instâncias que se tornam, de fato, inferiorizadas. O mais grave é que é um texto infraconstitucional que altera a espinha dorsal de nossa tradição, baseada no princípio da legalidade. Na prática, opera uma ruptura histórica em nossa ordem jurídica, de romano-germânica para common law. Explico isso melhor:

Diz o texto do projeto do novo CPC (artigo 521), que os juízes e os tribunais seguirão “a súmula vinculante, os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos”; depois, os enunciados das súmulas do STF em matéria constitucional, do STJ em matéria infraconstitucional e dos tribunais aos quais estiverem vinculados, nesta ordem; e “não havendo enunciado de súmula da jurisprudência dominante, os juízes e os tribunais seguirão”... os precedentes do STF, em matéria constitucional, do STJ, em matéria infraconstitucional.

Mais: Em não havendo precedente do STF ou do STJ, “os juízes e os órgãos fracionários do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Regional Federal seguirão os precedentes do plenário ou do órgão especial respectivo, nesta ordem”.

Mas, não para por aí, porque o texto estabelece que “os juízes e os órgãos fracionários do Tribunal de Justiça seguirão, em matéria de direito local, os precedentes do plenário ou do órgão especial respectivo, nesta ordem”. Como no tempo de criança, pergunto: “cadê” a tradição romano-germânica e a legalidade que estava aqui? O CPC comeu...

Nem vou falar dos atos de ofício previstos no projeto. Nada mais serôdio do que isso. Nem vou me referir aos embargos declaratórios, que não passam de uma gambiarra hermenêutica (um puxadinho proto-epistêmico) para salvar a falta de fundamentação... Nem vou falar da parte destinada às cautelares, que sofre de um anti-hermeneutismo à toda evidência, uma vez que dependente – e eis, aqui, de novo, o busílis da questão – em demasia do protagonismo judicial.

De como o projeto recupera dois positivismos
Sigo. Poder-se-ia alegar, em favor do projeto, que este tenta resolver o problema da litigiosidade repetitiva, com o reforço do modelo de padronização decisória, que faz crer que os litígios devam ser exterminados, após o proferimento de uma decisão modelar proferida por tribunais, sem que se perceba a completa ausência de uma teoria apta para a interpretação/aplicação dessa “padronização”.

Mas, eis aí o problema: não adianta fazer um modelo de extermínio de ações repetidas sem uma teoria decisional! Não tenho nenhum receio em afirmar isso. E lanço esse desafio à comunidade jurídica.

É que, nesse ponto, o projeto comete um pecado hermenêutico. Vou tentar ir mais a fundo. Faltou, sim — e temos de ter coragem para dizer isto, com todas as letras — um hermeneutic turn no projeto. Nele, há uma falácia semântica ou uma crença na plenipotenciariedade dos conceitos, como se fosse possível a uma lei — e agora, especialmente a uma Súmula ou a uma ementa jurisprudencial — prever todas as hipóteses de aplicação de forma antecipada. Ou seja, para os autores do projeto, os conceitos podem abranger todas as hipóteses de aplicação... No fundo, o projeto faz um mix: ao mesmo tempo que aposta na construção de conceitos com pretensão de “norma geral” (ah, o velho positivismo), aposta também no protagonismo decorrente do livre convencimento.

Apostando na commonlização do Direito[2], o projeto consegue a façanha de acumular dois positivismos: o velho exegetismo, porque aposta em uma espécie de conceptualização (saudades da Bregriffjurisprudenz?[3]), e no positivismo pós-exegético de perfil normativista, porque aposta no poder discricionário dos juízes, em especial, das cúpulas (eis aí o protagonismo judicial). Veja-se: de um lado, um capítulo sobre Precedentes (artigos 520 e seguintes, com o já visto), apostando no conceptualismo; de outro, o livre convencimento na apreciação das provas... Como coadunar isso? Ou seja, sob o pretexto de se livrarem das velhas posturas positivistas (clássicas), o projeto reafirma tanto o velho como o “novo” (sic) positivismo. Isso apenas mostra que parcela da comunidade jurídica ainda não entendeu o “que é isto — o positivismo”.

Aliás, uma coisa inacreditável: a aposta no conceptualismo ou na vontade de regressar a uma jurisprudência analítica ou, quem sabe, a uma Begriffjurisprudenz, parece também estar clara no fato de o novo CPC incentivar a que se construam súmulas e que nos encaminhemos, efetivamente, a um direito jurisprudencializado. Ora, isso enfraquece a doutrina. E, sobremodo, fragiliza a autonomia do direito. Com efeito, os artigos 520 e seguintes me deram essa nítida impressão.

E, atenção: que história é essa de “modelo de como seguir precedentes”? Afinal, o que seria isso? E que coisa é essa — a modulação dos efeitos em caso de alteração dos precedentes? Nem vou falar aqui do restante do capítulo destinado aos precedentes (por exemplo, o que se quer dizer com o parágrafo 7º do artigo 521: “O efeito previsto nos incisos do caput deste artigo decorre dos fundamentos determinantes adotados pela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou não sido sumulado?)”. Parece que no Brasil somos campões em fazer gambiarras e puxadinhos: pegamos a ponderação de Alexy e a transformamos em uma pedra filosofal interpretativa; transformamos os princípios em meros álibis teórico-retóricos e agora pegamos a common law e a acoplamos ao sistema romano-germânico... Como é que ninguém pensou nisso antes? Como sobrevivemos até hoje sem essas ideias revolucionárias?

Quando o réu não se ajuda...
Em outras palavras: do que menos se fala no novo CPC é... da lei e de como a cumprir de forma equânime. Bingo! Sim. O Congresso, que deveria preservar o papel da lei, aposta na... jurisprudência. E, o pior: desgastado,aceita isso dando um tiro no próprio pé! De fato, “o réu não se ajuda”. Incrível. O Congresso se queixa da invasão do Judiciário e, ao mesmo tempo, aprova a forma mais sofisticada de imperialismo jurisprudencial. Onde estão os caros assessores — e os assessores caros — dos parlamentares? Acho que eles deveriam pedir socorro aos estagiários, essa valorosa classe que ainda tomará o poder. Talvez só ela possa nos salvar.

A questão mais grave... e um exemplo de poder discricionário
Portanto, é neste ponto — a commonlização — que aparece a questão mais grave. Gravíssima. Ninguém está se dando conta que, com o projeto, qualitativamente, há uma grande chance de perda no nosso sistema decisório, porque de um lado, o projeto não combate a possibilidade de o STJ e o STF continuarem a decidir discricionariamente, e de outro ele atribui, irrefletidamente, efeito vinculante para a quase totalidade das decisões desses tribunais (inclusive dos obter dictum).

Vejam: O projeto traz um modelo de “como-seguir-precedentes”... só que esse modelo só serve para as instâncias inferiores. Não há nada que indique que quem faz o precedente tenha algum controle. Pronto. Controle sobre os juízes. Quem elabora os precedentes mais relevantes não precisa seguir os caminhos que as instâncias inferiores devem seguir...

Essas coisas todas e em especial a aposta no protagonismo do tipo “realismo jurídico”, não são implicância minha. Basta ler o projeto.[4] Parece que os processualistas não conseguem trabalhar a ideia de um processo que não dependa do solipsismo. Parece que o sistema presidencialista de governo se incrustou também no modo de aplicar o direito. No fundo, o projeto estabelece uma espécie de Direito Processual de Coalisão...!

No âmago, o discurso da grande maioria dos processualistas se cinge a defesa do aumento da produtividade e da celeridade processual, esquecendo-se que o processo civil brasileiro não serve somente para resolução de conflitos privados e patrimoniais, mas também viabiliza o aferimento de direitos fundamentais básicos.

Perceba-se que não se promove um ataque generalizado ao trabalho dos juristas que participaram das comissões, especialmente agora na Câmara, uma vez que o trabalho dogmático promoveu uma boa melhora técnica do projeto. Impossível não reconhecer isso. O que critico é a ausência de uma mudança paradigmática, que fará manter e, talvez, fortalecer a análise do sistema processual sob a ótica principal e única do juiz e da jurisdição, tal qual já ocorre na atualidade.

Quero saber se estamos dispostos a sacrificar a qualidade das decisões em prol da quantidade (não que, hoje, tenhamos isso). O que quero dizer é que um novo CPC deveria se preocupar com efetividades qualitativas, já que as efetividades quantitativas são decorrência. A recíproca, entretanto, nem de longe é verdadeira.

Não estou de má vontade
Nem de longe estou tendo má vontade com o projeto do novo CPC. Tudo o que já escrevi sobre o problema do instrumentalismo processual e seus problemas dão mostras suficientes que estou apenas mantendo a coerência.

Mas, com relação à commonlização, sim, confesso minha má vontade. Mas é uma má vontade de caráter epistêmico. Parece que os seus defensores querem repristinar o realismo jurídico, que não passa de um positivismo fático (só que a aplicação do direito, por exemplo, em Alf Ross, era muito mais complexa do que querem os neocommonlizadores). Para quem não entendeu ainda, tento ser mais simples: o projeto desloca o discurso de validade da lei em direção à decisão judicial. Sendo mais explícito ainda: Conforme o projeto, o direito é aquilo que os tribunais superiores dirão que é. De minha parte, prefiro o original, Holmes, do que uma clonagem sua.

Numa palavra: seja do ponto de vista normativo, seja do ponto de vista performativo, “livre convencimento” (ou livre apreciação da prova) não é o mesmo que “decisão fundamentada”. Isso porque da perspectiva normativa do princípio que exige a fundamentação das decisões, o juiz não tem a opção para se convencer por qualquer motivo, uma espécie de discricionariedade em sentido fraco que seja, mas deve explicitar com base em que razões, que devem ser intersubjetivamente sustentáveis, ele decidiu desta e não daquela maneira, conforme bem diz Marcelo Cattoni. É claro que nenhuma decisão se dá no vácuo, mas num contexto histórico-institucional. Todavia, na sua fundamentação, o juiz deve posicionar-se explicitamente em relação a este contexto institucional.

Realmente, ser correto e decidir de forma imparcial não é fácil mesmo. Exige exercício prático, senso de dever, capacidade de se adotar uma atitude reflexiva em relação às próprias precompreensões, garantia de comparticipação dos destinatários da decisão no processo deliberativo, aprendizado institucional e debate público. O resto é desculpa para se fugir de responsabilidades.

Nos rios, leite fresco; nas árvores, favos do mais puro mel...
O que o projeto faz, na esteira do que a maioria dos processualistas vem fazendo,é incorrer na chamada falácia naturalista: uma inversão normativa fundada na suposta força do factual. Na verdade, uma força atribuída ao factual em função do próprio ponto de partida interpretativo que se adota. O suposto do qual se parte é aquele segundo o qual a “realidade” é um obstáculo para a concretização da normatividade.

Portanto, o projeto do novo CPC recupera pressupostos da dogmática jurídica, mas sacrifica os pressupostos filosóficos, que são a condição de possibilidade de o projeto se tornar compatível com o paradigma do constitucionalismo contemporâneo e não com posturas teóricas que, a pretexto de superar velhas fórmulas como “o juiz boca da lei”, nada mais fazem do que apostar em um “juiz protagonista”. Nada mais velho do que isso. Escopos processuais, instrumentalismo, agora com novos nomes.

Metaforicamente, o projeto propõe que os utentes de terrae brasiliensis escolham entre isso que está ai (a barbárie, que já gerou, darwinianamente, as Súmulas Vinculantes e a Repercussão Geral) ou a “civilização”, em que os rios fornecerão leite e as árvores favos de mel. Assim, os utentes fazem, primeiro, um pacto de associação e, depois, um pacto de submissão... Delegando todo poder ao soberano, representado pelo protagonismo judicial. Uma espécie de leviatã neoprocessual (como em Hobbes, se me entendem).

Bem, cumpri meu dever cívico de denunciar (de novo) a falácia que é o projeto do (novo?) CPC. Com tantos programas de pós-graduação no Brasil, a academia deve cumprir seu papel de locus de reflexão e de crítica, visando a estabelecer um projeto de CPC cuja arquitetura se compatibilize com a do edifício constitucional, ao invés de se omitir ou avalizar puxadinhos, lajes e gambiarras jurídicas. O projeto reproduz um conjunto de ingenuidades, algo como aquilo que Lénin denunciava nos anos 20 do século XX: o esquerdismo era a doença infantil do comunismo, alusão àqueles que achavam que os partidos políticos eram inúteis. Pois, então: quem acha que a lei vale menos que a jurisprudência ou que a lei é (praticamente) inútil, apostando no communlismo, pode estar praticando um erro histórico, ou seja, o communlismo (ou commonlização) pode ser a doença infantil do processo.

Tenho a certeza de que os juristas brasileiros podemos mais do que isto... Ou não.

Dica final
Nesta sexta-feira (13/9), farei a abertura do XII Congresso de Direito Constitucional Aplicado, em Salvador, no Hotel Fiesta. Falarei sobre Teoria Constitucional, Teoria do Direito e Jurisdição Constitucional. Enfim, as cinco recepções equivocadas que a doutrina e os tribunais brasileiros fizeram pós-1988.
[1] Permito-me ser repetitivo e insistir na “questão da filosofia”, embora setores importantes do direito desconsiderem o fato de a filosofia ser condição de possibilidade do próprio direito. De todo modo, faço a seguinte observação: o que se tem visto no plano das práticas jurídicas nem de longe chega a poder ser caracterizada como “filosofia da consciência”; trata-se de uma vulgata disso. Mas não vou aprofundar isso aqui. Remeto o leitor para o meu Hermenêutica Jurídica e(m) crise (Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2013).
[2] Essa circunstância foi denunciada no livro O Que é Isto – Os Precedentes e as Súmulas Vinculantes (Lenio Streck e Georges Abboud; 1ª. E 2ª. Ed; Livraria do Advogado, 2012).
[3] Jurisprudência dos Conceitos, forma de positivismo exegético predominante na Alemanha do século XIX.
[4] Na verdade, estou com uma dúvida. O realismo jurídico foi uma reação à jurisprudência analítica, forma de positivismo exegético inglês do século XIX, semelhante ao que ocorria na França e com as pandectas alemãs. Logo, não estaria eu sendo generoso, ao epitetar o projeto de intentar um “realismo jurídico tropical”? O projeto não buscaria, mesmo, uma imitação da jurisprudência analítica, em que os precedentes tinham que ser tão duramente seguidos como uma lei em França e uma pandecta na Alemanha? O que os leitores acham?


Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.

Revista Consultor Jurídico, 12 de setembro de 2013

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...