quinta-feira, 11 de abril de 2013

BANCO DE PROVAS DA OAB/RS




BANCO DE PROVAS


Exame 2010.2


01. Caderno de prova objetiva - 01


02. Gabarito - caderno - 01


03. Questões anuladas - prova objetiva


04. Prova prático-profissional - Direito Civil


05. Prova prático-profissional - Direito Penal


06. Prova prático-profissional - Direito Trabalho


07. Prova prático-profissional - Direito Administrativo


08. Prova prático-profissional - Direito Constitucional


09. Prova prático-profissional - Direito Tributário


10. Prova prático-profissional - Direito Empresarial





Exame 2010.1


01. Caderno de prova objetiva - AFONSO ARINOS


02. Gabarito - caderno - AFONSO ARINOS


03. Questões anuladas - prova objetiva


04. Prova prático-profissional - Direito Civil


05. Prova prático-profissional - Direito Penal


06. Prova prático-profissional - Direito Trabalho


07. Prova prático-profissional - Direito Administrativo


08. Prova prático-profissional - Direito Constitucional


09. Prova prático-profissional - Direito Tributário


10. Prova prático-profissional - Direito Empresarial


11. Padrão de respostas - Direito Civil


12. Padrão de respostas - Direito Penal


13. Padrão de respostas - Direito Trabalho


14. Padrão de respostas - Direito Administrativo


15. Padrão de respostas - Direito Constitucional


16. Padrão de respostas - Direito Tributário


17. Padrão de respostas - Direito Empresarial





Exame 2009.3


1. Caderno de prova objetiva - AZUL


2. Gabarito - caderno - AZUL


3. Prova prático-profissional - Direito Civil


4. Prova prático-profissional - Direito Penal


5. Prova prático-profissional - Direito Trabalho


6. Padrão de respostas - Direito Civil


7. Padrão de respostas - Direito Penal


8. Padrão de respostas - Direito Trabalho





Exame 2009.2


1. Caderno de prova objetiva - FRATERNIDADE


2. Gabarito - caderno - FRATERNIDADE


3. Prova prático-profissional - Direito Civil


4. Prova prático-profissional - Direito Penal


5. Prova prático-profissional - Direito Trabalho


6. Padrão de respostas - Direito Civil


7. Padrão de respostas - Direito Penal


8. Padrão de respostas - Direito do Trabalho





Exame 2009.1


Caderno de prova objetiva - DELTA


Gabarito - caderno - DELTA


Prova prático-profissional - Direito Civil e Processual Civil


Prova prático-profissional - Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho


Prova prático-profissional - Direito Penal e Direito Processual Penal





Exame 2008.3


Caderno de prova objetiva - ALFA


Gabarito - caderno ALFA


Questões anuladas - justificativas


Prova prático-profissional - Direito Civil e Processual Civil


Prova prático-profissional - Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho


Prova prático-profissional - Direito Penal e Direito Processual Penal





Exame 2008.2


Caderno de prova objetiva - ÁGUA


Gabarito - caderno ÁGUA


Questões anuladas - justificativas


Prova prático-profissional - Direito Civil e Processual Civil


Prova prático-profissional - Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho


Prova prático-profissional - Direito Penal e Direito Processual Penal





Exame 2008.1


Caderno de prova objetiva - alfa


Gabarito - alfa


Questões anuladas - justificativas


Prova prático-profissional - Direito Civil e Processual Civil


Prova prático-profissional - Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho


Prova prático-profissional - Direito penal e Direito Processual Penal





Exame 2007.3


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2007.2


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2007.1


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2006.3


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2006.2


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2006.1


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2005.2


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2005.1


Prova Objetiva


Gabarito


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Traballho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Traballho e Processual do Trabalho





Exame 2004.2


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho





Exame 2004.1


Prova Objetiva


Gabarito


Questões Práticas - Direito Civil e Processual Civil


Peça Processual - Direito Civil e Processual Civil


Questões Práticas - Direito Penal e Processual Penal


Peça Processual - Direito Penal e Processual Penal


Questões Práticas - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho


Peça Processual - Direito do Trabalho e Processual do Trabalho










Fonte: OAB/RS

A PEC DAS DOMÉSTICAS E A SAUDADE DOS "BONS TEMPOS"


A saudade dos “bons tempos”
O cenário: uma antiga fazenda de café, janelas baixas, azuladas, pé direito alto. Algo do tipo Casa-Grande & Senzala, compreendem? Os personagens: dois recém-casados, caucasianos, que, ao acordarem, encaminham-se ao café da manhã (servido por uma empregada doméstica).

Corta! Cena 2: A câmera mostra os “colaboradores” (adoro essa tucanagem das palavras) da “casa-grande” se encaminhando para a plantação, com ferramentas rudimentares (típicas “daqueles tempos”).
Corta. Cena 3: O lindo sol raia no horizonte enquanto os campesinos se afastam e o belo casal, vestindo roupas brancas (assepsia, é claro!) senta-se à mesa, ornada com toalha rendada e com xícaras de fino porcelanato (provavelmente trazida lá do Aveiro).
Corta. Cena 4. Os patuleus já estão na plantação.
Corta. Cena 5, final. O café sendo servido. Fumegante, denso, saboroso... e uma voz vigorosa, meio rouca, em off anunciando, algo como “Café Pindorama[1]: a volta dos bons tempos!”
Essa peça publicitária não é fruto da minha imaginação. Foi ao ar na televisão aberta já há algum tempo e representa um imaginário que (ainda) permeia as relações de trabalho doméstico (e rural) em Pindorama (ou Terrae Brasilis). Reflexos de uma cultura escravagista e segregadora que se manifesta, ora sutilmente, ora explicitamente, como vamos ver em seguida.
Historicamente o liberalismo professado pelas elites brasileiras sempre foi atravessado por posturas políticas retrógradas. Na época do Império, os chamados políticos “liberais” proferiam discursos empolgantes sobre a igualdade, liberdade e fraternidade sem ao menos levar em consideração a situação degradante dos escravos. Era a razão cínica daqueles que apenas em momentos de conveniência política resolviam apoiar-se no pensamento liberal. As conquistas revolucionárias do mundo europeu eram assimiladas somente para atender às necessidades de um seleto grupo social que detinha o controle do aparelho estatal, ou seja, o estamento burocrático (no sentido de Faoro).
Desse modo, nos momentos de defesa do “incontestável” direito universal à propriedade (afinal, escravo era coisa), os donos do poder não deixavam de citar os clássicos do liberalismo político para sustentar seus privilégios; no entanto, logo depois, faziam questão de ignorá-los completamente quando o tema era a situação dos habitantes da senzala. De acordo com Bosi, o liberalismo brasileiro, “parcial e seletivo, não era incongruente: operava a filtragem dos significados compatíveis com a liberdade intra-oligárquica e descartava as conotações importunas, isto é, as exigências abstratas do liberalismo europeu que não se coadunassem com as particularidades da nova nação”.[2]
Essa situação também pode ser confirmada no envolvimento dos “liberais” brasileiros com os projetos estatais claramente despóticos, concretizados logo após o encerramento do processo de independência. As grandes lideranças políticas do Império conciliaram a arbitrariedade monárquica com os mecanismos de limitação do poder político apresentados pelo constitucionalismo moderno. Nesse sentido, a importação do Poder Moderador e do parlamentarismo serviu apenas como instrumento nas mãos centralizadoras do imperador, que, juntamente com o estamento burocrático, sempre esteve livre de qualquer controle constitucional. Tempos depois, em continuidade ao projeto político autoritário dessa mesma tradição liberal, o Estado Novo foi instituído em 1937 e o regime militar se instaurou em 1964. Deve ser por isso que Sérgio Buarque de Holanda dizia que o liberalismo no Brasil sempre foi “uma inútil e onerosa superfetação”.[3]
O liberalismo à moda brasileira, sustentado pelas oligarquias imperiais, foi, antes de tudo, um instrumento de defesa do latifúndio e do trabalho escravo. Diante da impossibilidade de compatibilizar a obra de um pensador muito caro à tradição liberal, como é o caso de John Locke, com a concentração fundiária existente no Brasil, os adeptos do liberalismo pátrio fizeram todo tipo de distorção e manipulação teórica para incorporá-la a sua realidade. E se o escravo também era visto como propriedade do latifundiário, nada melhor do que dar continuidade a essas distorções teóricas para fundamentar o domínio sobre esta “mercadoria”.
O “liberalismo” e a PEC das Domésticas
Interessante mesmo é comparar o comportamento dos oligarcas escravagistas do século XIX com a postura dos que atualmente estão demonstrando grande preocupação com a aprovação da PEC que amplia benefícios para os trabalhadores domésticos (é bom que se observe que não estou aqui a falar de uma “reformulação da carreira”, mas meramente da incorporação de alguns direitos básicos previstos na CLT, o que ainda não tem o condão de elevar as domésticas ao mesmo patamar dos demais trabalhadores). O discurso de que haveria mais prejuízos do que ganhos foi o mais explorado. Nada diferente do que aconteceu nos grandes debates parlamentares que antecederam a abolição da escravatura. Naquele momento diziam que “a-economia-do-país-iria-à-bancarrota”, que a produção seria sacrificada e que o “sagrado” direito à propriedade seria desrespeitado.

Hoje, depois de mais de um século de abolição, um expoente dessa mesma tradição liberal fez a seguinte afirmação a respeito da Emenda Constitucional que favorece os trabalhadores domésticos: “É preciso muita cautela nesse processo de desmonte das instituições que foram criadas ao longo dos anos no tocante ao trabalho doméstico. Erros poderão resultar em aumento massivo de desemprego, prejudicando milhões de trabalhadores que hoje são empregados nessas atividades. Ademais, não há sinais de rejeição ou de desconforto nessas relações” (clique aqui para ler).
Pelo visto, de acordo com a visão do nobre (a palavra “nobre” vem bem a calhar, pois não?) articulista, os trabalhadores domésticos nunca se sentiram desconfortáveis em seus respectivos empregos, já que a ausência de regulamentação constitucional nunca foi vista por eles como um problema. Afinal, trabalhar sem direito ao 13º salário, férias, limitação na jornada de trabalho, FGTS e registro em carteira sempre foi uma condição “muito confortável” para todos aqueles que dedica(ra)m parte considerável de sua vida a cuidar dos lares brasileiros.
Para fundamentar suas posições, o articulista fez referência ao Estatuto da Terra como um exemplo de impacto negativo na vida dos trabalhadores rurais. Para ele, o êxodo rural e o crescimento das favelas e periferias das grandes cidades não é consequência da concentração fundiária e da ausência de uma política capaz de realizar a reforma agrária e priorizar a produção em pequenas propriedades. Pelo contrário, a regulamentação jurídica, que buscou ajustar às distorções sociais presentes no campo, foi atacada pelo articulista como mecanismo uniformizante e pasteurizado, responsável por destruir uma estrutura social e organizacional inteiramente benéfica aos trabalhadores rurais. É aí que eu pergunto: seria mesmo benéfica qualquer relação de trabalho sem nenhum tipo de regulamentação? Como eu apenas confio nos homens desconfiando, prefiro ficar com a regulamentação.
Dois registros. Como dizia o Conselheiro Acácio (de O Primo Basílio, de Eça de Queirós), “as consequências sempre vem depois...” Pois é. Quando abolimos a escravidão, ao invés de políticas públicas, damos aos ex-escravos um novo Código Penal. E hoje nos queixamos da violência. É, de fato, as consequências vem sempre depois... A propósito: no dia 18 de abril estará, pela primeira vez em Porto Alegre, no Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o Prêmio Nobel J.M. Coetzee, falando sobre Ficção e Censura (clique aqui para mais informações). Recomendo Coetzee porque é um escritor sul-africano que compreendeu muito bem a questão da transição entre regimes (lá, na África do Sul, do apartheid para a democracia), problemática não bem resolvida no Brasil, nem depois da abolição da escravatura e nem da transição da ditadura para a democracia. Ele é autor de Desonra e A Espera dos Bárbaros, que muito podem nos ajudar a entender a complexidade destes tempos.
“Doutor — eu sei o meu lugar”
É inegável que, assim como as favelas são o modelo século XXI das senzalas, o empregado doméstico é o que mais se aproxima da ideia de escravo. É o ser socialmente invisível, cuja condição de violenta sub-humanidade é eufemisticamente encoberto por frases como “a fulana é quase uma pessoa da família” ou “ela até come na mesa com a gente”. Algo bem presente no imaginário social, reproduzido muito bem pelo programa de TV Mulheres Ricas, espécie de lumpesinato tardio-burguês, que retrata um país que não existe e a saudade dos “velhos tempos”.

Pergunto: será que você aceitaria que um parente seu tivesse que sempre acordar antes que os outros e ser o último (ou última, geralmente) a dormir? A revolta contra o fim da desproteção jurídica do trabalhador doméstico (e a consequente reação à Emenda Constitucional) é o sintoma de uma sociedade que ainda não conseguiu virar uma importante página da história: a que revela a existência de um estrato de pessoas juridicamente inferiorizadas. O empregado doméstico é, assim, o invisível social. Somente é notado nos momentos oportunos. Aqui, sugiro o livro A Elegância do Ouriço(também em programa no Direito & Literatura).
Talvez essa reação, por vezes hipócrita, que forma barreiras ao reconhecimento de direitos sociais aos trabalhadores doméstico, tenha me feito escrever esta coluna, para refletir sobre os estereótipos que povoam nosso imaginário e formam o inconsciente coletivo, segundo a psicologia analítica de Jung.
O arquétipo da empregada doméstica tem suas raízes na figura da mucama. Ampliou-se apenas a etnia. Hoje, em sua ampla maioria, mestiços. Isso explicaria em boa parte a sensação de incômodo que a Emenda Constitucional causa a muitos integrantes da classe média e média alta.
Essa emenda causa um mal-estar pela quebra das expectativas e da violação do arquétipo. Algo não estaria no lugar. No lugar de sempre. No lugar-comum. Ou seja, alguém, a partir da PEC, poderá “não mais saber o seu lugar”...!
Imaginário brasileiro talvez ainda não esteja preparado para esse reconhecimento. O caminho mais fácil, então, é negação pura e simples da emancipação que essa emenda trará. Sem esconder a hipocrisia, surge o discurso de uma imediata preocupação com aquele invisível social. Agora o resquício da mucama aparece porque toca em uma parte sensível do amo: o bolso. Por isso o discurso apocalíptico do desemprego em massa. Com a abolição também ocorreu isso.
Esse pequeno, mas poderoso, contingente de desconfortáveis, não acostumados a tal estado de coisas, enumera a falta de preparo intelectual da neo-mucama, a mesma que não pôde estudar porque teve que cuidar em tempo integral dos filhos do amo-patrão ou porque precisava ficar em casa preparando e servindo o jantar, arrumando a mesa e lavando a louça. A ama, claro, não pode lavar porque “faz mal às unhas”.
Há alguns anos eu contava em palestras o seguinte episódio, que retrata bem o modo como o “imaginário doméstico-brasileiro” foi sendo introjetado: no Rio de Janeiro, um empregador enfrentou o condomínio de seu prédio, requerendo em juízo o direito de sua empregada doméstica a utilizar o elevador social (no prédio, havia o apartheid entre elevadores sociais e de serviço). De posse da ordem judicial, o patrão comunicou o fato à empregada. No dia seguinte, vinha ela carregando a sua sacola das Casas da Banha e se dirigiu diretamente ao elevador de serviço. O patrão, sabendo disso, perguntou-lhe as razões dessa atitude, ao que ela respondeu: “Doutor – eu sei o meu lugar”. Pois é. Lendo algumas reações à PEC dos empregados domésticos, tem-se a nítida impressão de que o que se quer mesmo é a preservação desse tipo de imaginário. E, claro, junto com a manutenção doapartheid entre elevadores sociais e elevadores de serviço.
Afinal, como disse a atriz Carolina Ferraz, por ocasião do projeto da então prefeita Erundina que visava a acabar com esse apartheid social, nos idos da década de 90, “as coisas estão tão misturadas, confusas, na sociedade moderna. Algumas coisas, da tradição, devem ser preservadas. É importante haver hierarquia”. Ah, bom! Já a promoter paulista Daniela Diniz, fulminou: “... cada um deve ter o seu espaço. Não é uma questão de discriminação, mas de respeito” (nota: promoters são aquelas pessoas emplumadas e chatas que fazem festas para a burguesia cheirosa que só usa “perfumes oxítonos” — gosto como se pronuncia a palavra promoter de forma bem “afetada”, com sotaque “inglesado”). Ou seja, para elas (as filósofas contemporâneas Carolina e Daniela) — e para quantos mais (!?) — a patuleia (a choldra, a rafanalha) deve (continuar a) “saber-o-seu-lugar”... E que cada um tome o elevador que lhe caiba nesse butim social.
E vejam como o Brasil é democrata... Nada aconteceu a elas por terem dito isso. Por isso, muita gente ainda gosta “dos velhos e bons tempos. Enquanto alguém nos serve um bom e fumegante café em chávenas (chávena é legal, não? — e é dos bons tempos!) do Aveiro e em toalhas de renda feitas pelas senhoras de Ribeirão da Ilha.

[1] O nome, obviamente, é fictício. Os curiosos podem procurar…
[2] Cf. BOSI, Alfredo. Dialética da Colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 217.
[3] Cf. HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 5. ed., Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, p. 119.
Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine oFacebook.
Revista Consultor Jurídico, 11 de abril de 2013

terça-feira, 9 de abril de 2013

ASSOCIAÇÕES DE JUÍZES CRITICAM POSTURA DE BARBOSA


Após reunião tensa com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, nessa segunda-feira (8/4), três entidades de classe da magistratura emitiram uma nota de esclarecimento sobre a criação de novos tribunais regionais federais. Durante a audiência, o ministro criticou a aprovação no Congresso da PEC 544/2002, que prevê a instalação de mais quatro TRFs, e as próprias entidades. O texto é assinado pela Associação dos Magistrados Brasileiros, a Associação dos Juízes Federais do Brasil e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho.
De acordo com a nota, o ministro Barbosa “agiu de forma desrespeitosa, premeditadamente agressiva, grosseira e inadequada para o cargo que ocupa”. As entidades também defendem a necessidade e a instalação dos novos TRFs, proposta que tramitou por mais de uma década no Congresso. Segundo as associações, os deputados e senadores tiveram total liberdade para decidir sobre a matéria, como estabelece a Constituição Federal.
A nota ainda reitera que “as pessoas passam e as instituições permanecem. A história do Supremo Tribunal Federal contempla grandes presidentes e o futuro há de corrigir os erros presentes”.
Em outra nota, publicada pela Ajufe, são listados números para justificar a necessidade dos quatro novos TRFs. De acordo com a associação, o Conselho Nacional de Justiça teve conhecimento, em diversas oportunidades, sobre o interesse de aumentar a quantidade de tribunais regionais federais e a PEC 544/2002.
O texto também afirma que é incorreta a afirmação de que os novos TRFs custarão R$ 8 bilhões aos cofres públicos. “Segundo dados da Lei Orçamentária de 2013, todo o orçamento da Justiça Federal, incluindo 1º e 2º graus, é de R$ 7,8 bilhões”, diz. A viabilidade financeira da PEC 544/2002, de acordo com a nota, foi comprovada por estudos técnidos do Conselho da Justiça Federal.
Leia a nota:
A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), entidades de classe de âmbito nacional da magistratura, considerando o ocorrido ontem (8) no gabinete do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), vêm a público manifestar-se nos seguintes termos:
1. O presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, agiu de forma desrespeitosa, premeditadamente agressiva, grosseira e inadequada para o cargo que ocupa.
2. Ao permitir, de forma inédita, que jornalistas acompanhassem a reunião com os dirigentes associativos, demonstrou a intenção de dirigir-se aos jornalistas, e não aos presidentes das associações, com quem pouco dialogou, pois os interrompia sempre que se manifestavam.
3. Ao discutir com dirigentes associativos, Sua Excelência mostrou sua enorme dificuldade em conviver com quem pensa de modo diferente do seu, pois acredita que somente suas ideias sejam as corretas.
4. O modo como tratou as Associações de Classe da Magistratura não encontra precedente na história do Supremo Tribunal Federal, instituição que merece o respeito da Magistratura.
5. Esse respeito foi manifestado pela forma educada e firme com que os dirigentes associativos portaram-se durante a reunião, mas não receberam do ministro reciprocidade.
6. A falta de respeito institucional não se limitou às Associações de Classe, mas também ao Congresso Nacional e à Advocacia, que foram atacados injustificadamente.
7. Dizer que os senadores e deputados teriam sido induzidos a erro por terem aprovado a PEC 544, de 2002, que tramita há mais de dez anos na Câmara dos Deputados ofende não só a inteligência dos parlamentares, mas também a sua liberdade de decidir, segundo as regras democráticas da Constituição da República.
8. É absolutamente lamentável quando aquele que ocupa o mais alto cargo do Poder Judiciário brasileiro manifeste-se com tal desprezo ao Poder Legislativo, aos Advogados e às Associações de Classe da Magistratura, que representam cerca de 20.000 magistrados de todo o país.
9. Os ataques e as palavras desrespeitosas dirigidas às Associações de Classe, especialmente à Ajufe, não se coadunam com a democracia, pois ultrapassam a liberdade de expressão do pensamento.
10. Como tudo na vida, as pessoas passam e as instituições permanecem. A história do Supremo Tribunal Federal contempla grandes presidentes e o futuro há de corrigir os erros presentes.
Brasília, 9 de abril de 2013.
NELSON CALANDRA
Presidente da AMB

NINO OLIVEIRA TOLDO
Presidente da Ajufe

JOÃO BOSCO DE BARCELOS COURA
Presidente em exercício da Anamatra

Leia a nota sobre os TRFs:
A Associação dos Juízes Federais do Brasil – Ajufe, entidade de classe de âmbito nacional da magistratura federal, a propósito das declarações do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), em reunião com entidades de classe da magistratura brasileira, aberta a jornalistas, na qual Sua Excelência afirmou que houve uma movimentação “sorrateira”, “de surdina” e “açodada” pela aprovação da PEC 544/2002, que cria quatro novos tribunais regionais federais, vem a público apresentar os seguintes esclarecimentos:
1. Em primeiro lugar, em relação à PEC 544/2002, a Ajufe repudia a acusação de que houve atuação “sorrateira” em favor de sua aprovação. Ao longo de mais de uma década em defesa da PEC, a atuação da Associação sempre foi republicana, aberta e transparente, dialogando com todos os segmentos do Poder Judiciário, da sociedade civil organizada e da imprensa.
2. A Ajufe e os juízes federais produziram estudos consolidados em notas técnicas e cartilhas; publicaram dezenas de artigos em jornais de grande circulação e participaram de diversos seminários, audiências e atos públicos, com o objetivo de demonstrar os fundamentos técnicos em favor da PEC.
3. Em segundo lugar, soa estranho que se chame de açodada a aprovação de um projeto de emenda constitucional que tramita há 11 (onze) anos e 7 (sete) meses no Congresso Nacional, em procedimento público, que contou com amplos e aprofundados debates, seja nas comissões, seja nos plenários do Senado Federal e da Câmara dos Deputados.
4. Em terceiro lugar, é inverídico afirmar que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não teve conhecimento ou oportunidade de apreciar a PEC 544/2002. Em julgamento realizado na 98ª sessão ordinária, no dia 09/02/2010, nos autos do processo nº 0200511-29.2009.2.00.0000, acolhendo, por maioria, proposta do então Conselheiro Leomar Barros, o CNJ deliberou pela emissão de uma nota técnica em favor da criação dos novos tribunais federais.
5. A expansão e a descentralização do 2º grau da Justiça Federal, com a criação de novos tribunais, é uma necessidade premente, uma vez que o número de juízes federais na 1ª Instância cresceu 668% (seiscentos e sessenta e oito por cento) entre 1987 e 2013, passando de 277 (duzentos e setenta e sete) para 2.129 (dois mil cento e vinte e nove), enquanto o número de integrantes do 2º grau, entre 1989 a 2012, cresceu somente 89% (oitenta e nove por cento), passando de 74 (setenta e quatro) desembargadores para 139 (cento e trinta e nove).
6. Segundo dados do “Justiça em Números” do CNJ, edição 2012, a Justiça Federal é o menor dos ramos do Poder Judiciário nacional, com a mais elevada  relação entre o  número de magistrados de 1ª e 2ª graus.
7. Ainda segundo o “Justiça em Números 2012”, os desembargadores da Justiça Federal estão submetidos a uma carga individual de trabalho excessiva, muito superior à dos seus colegas das Justiças do Trabalho e Estadual.
8. A combinação de um reduzido número de tribunais e desembargadores com a elevada demanda processual faz do 2º grau da Justiça Federal o mais congestionado dos ramos do Poder Judiciário, como constatou o  “Justiça em Números 2012”, conforme se vê do gráfico ao lado.
9. É totalmente incorreta a afirmação de que os novos tribunais vão custar R$ 8 bilhões aos cofres públicos. Segundo dados da Lei Orçamentária de 2013, todo o orçamento da Justiça Federal, incluindo 1º e 2º graus, é de R$ 7,8 bilhões. O 1º grau, que não será ampliado, consome 78,6% desse orçamento, e o 2º grau, que será parcialmente ampliado, 21,4%. Como se vê, os custos serão bem inferiores aos erroneamente alardeados por Sua Excelência.
10. Acerca dos custos, ainda é importante destacar que o Conselho da Justiça Federal (CJF), órgão responsável pela supervisão administrativa e orçamentária da Justiça Federal, concluiu, a partir de estudos técnicos (Ofício nº 2012/01822), que a criação dos tribunais proposta por meio da PEC 544/2002 está em conformidade, do ponto de vista orçamentário e financeiro, com os limites da lei de responsabilidade fiscal.
11. Por fim, insinuar que uma associação de classe iludiu o Congresso Nacional é desmerecer e diminuir a capacidade técnica e política do parlamento brasileiro, que possui quadros experientes que jamais se submeteriam a artimanhas dessa natureza.
12. Os esclarecimentos acima resgatam a discussão técnica e republicana que orientou a aprovação da PEC 544/2012, demonstrando a total inconsistência das informações e adjetivações ofensivas veiculadas pelo ministro Joaquim Barbosa.
Brasília, 9 de abril de 2013,
NINO OLIVEIRA TOLDO
Presidente da Ajufe
Revista Consultor Jurídico, 9 de abril de 2013

DEMOCRACIA EXIGE SEPARAÇÃO ENTRE POVO E REPRESENTAÇÃO


É comum entre nós a ideia de que a democracia exige uma espécie de identidade essencial entre o que deseja o povo e a ação de seus representantes políticos. Em termos mais ingênuos, não são poucos os que acreditam que a democracia se revela tanto mais perfeita quanto mais identidade existir entre a vontade do povo e os atos dos governantes. Como pretendo demonstrar, a democracia não só prescinde de uma tal identidade, como de fato recusa a sua existência. Segundo Konrad Hesse, nem mesmo as democracias diretas podem pretender uma exata correspondência entre povo e detentores do poder. Portanto, se isso fosse verdadeiro, todos os regimes democráticos teriam falhado no essencial.

Contudo, bem observados os fatos, precisamente pela ausência de identidade fundamental entre o povo e os seus representantes, é que a virtude da democracia não está na transmissão sem contraste entre a vontade popular e as decisões e os atos de governo. Pelo contrário, a virtude da democracia consiste, precisamente, no fato de que, na sua conformação e existência, não havendo identidade entre o povo e os seus representantes no poder, mesmo a vontade do titular soberano do poder (o povo) pode sofrer — e de fato sofre — limitações, sobretudo, quando queira manifestar-se legitimamente. Por sua vez, essa distinção implica também, nos regimes democráticos, a existência de outros elementos essenciais à sua configuração: limites constitucionais e legais à vontade da maioria, controle e responsabilidade dos agentes de poder, além de respeito aos direitos das minorias.
Diversamente, nos regimes em que se possa afirmar a identidade entre a vontade do povo — como totalidade — e de seus governantes, suportados nessa identidade, obviamente, será mais fácil recusar tanto os direitos das minorias como também recusar a necessidade de controle e de responsabilidade dos governantes. De fato, dir-se-ia: para que se controlar governantes, ou respeitar direitos de minorias, num regime em que as decisões dos governantes apenas representam — em identidade essencial — a vontade de toda gente?
Mas enfrentemos melhor essas ideias.
Como todos sabem, o artigo 14 da Constituição da República, com seus incisos, alíneas e parágrafos, representa a concretização do princípio da soberania popular, por sua vez, já preconizado no artigo 1º, parágrafo único, do mesmo texto constitucional. Sendo um dos dispositivos mais conhecidos de nossa Lei Fundamental, o parágrafo único do seu artigo 1º prescreve que o poder soberano do Estado pertence em última instância ao povo, que o pode exercer tanto diretamente (através de plebiscito, referendo ou iniciativa popular), como por intermédio dos seus representantes, cuja escolha se desenvolve pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, conforme disciplina legal.
É, pois, esse princípio democrático que governa, tanto formal como materialmente, o processo político, no qual se expressa o poder do Estado, e sob cujo influxo, direta ou indiretamente, ganha esse poder legitimidade para desenvolver-se. Contudo, e isso nem sempre se consegue notar, ao afirmar o princípio da democracia representativa, nega-se aqui também uma identidade essencialentre os eleitores (o povo) e os que, em seu nome, exercem o poder.
Essa separação entre povo e os seus representantes (o governo), contudo, ao invés de implicar uma fraqueza dos regimes democráticos, como passo a demonstrar, significa uma de suas maiores virtudes.
Diversa, por exemplo, era a situação dos antigos Estados absolutistas, em que expressamente se pregava uma unidade essencial entre o povo, o Estado e o governante (l’Etat c’est moi). Nos regimes totalitários, a identidade é ainda mais profunda, pretendendo-se confundir, de um lado, a vida privada do cidadão com a esfera pública; de outro, restringir a sociedade civil aos contornos do próprio Estado. Assim, fora do Estado não existe vida nem sociedade civil.
Por tudo isso, no dizer de Martin Kriele, a ideia de democracia, como concebida contemporaneamente, não se compadece com o princípio da identidade, mas apenas como o de representaçãoOs órgãos do Estado não pretendem ser o povo, mas (apenas) representá-lo[1]. Somente governos totalitários (muito mais que os autocráticos) podem pretender, mais do que representar a vontade popular, ser a sua própria encarnação.
A compreensão de democracia nos Estados atuais leva-nos, pois, a negar uma identidade absoluta ou essencial entre governantes e governados, o que só se poderia alcançar, de qualquer forma, mediante uma conversão totalizante e absolutamente indevida da vontade do verdadeiro titular do poder soberano, o povo, em simples vontade de quem governa. Além disso, nas modernas democracias constitucionais, há sempre a possibilidade de normas constitucionais e legais bloquearem a própria vontade popular. O povo, se quiser contrariar as opções legislativas e constitucionais tomadas deverá, previamente, segundo o devido processo legislativo, modificar as normas institucionalmente já existentes. Aliás, no caso das chamadas Cláusulas Pétreas, algumas opções são até mesmo subtraídas da possibilidade de alteração.
Rejeita-se, portanto, qualquer espécie de identidade total entre governantes e governados, mesmo que se cuide de uma implausível democracia direta que, de toda sorte, apenas se faria possível mediante a identificação forçada da vontade da maioria dos que participam das eleições e das decisões estatais com a vontade de toda a comunidade nacional. De fato, uma tal identificação (Sinne identitärer Demokratie), adverte Konrad Hesse, além do mais, resultaria numa espécie de inadmissível domínio total (totale Herrschaft), por exigir a desconsideração tanto da vontade dos não votantes como da vontade daqueles que perderam a votação (minoria), ou mesmo daqueles que não estavam legitimados ao voto (Nicht-Stimmberechtigten)[2].
Outro grave problema que se coloca na base de uma total identidade entre governantes e governados é que essa ordem de ideias implicaria negar a possibilidade e mesmo a existência de conflitos no seio da comunidade nacional. Assim, por mais que os governantes se legitimem e se esforcem por representar a vontade da — mais ampla — maioria, e mesmo que alcançassem em determinado momento a totalidade dos votos dos cidadãos do Estado legitimados a votar, a imposição constitucional de voto periódico, universal, livre e com valor igual para todos, ao trazer sempre à memória da sociedade e dos governantes a necessidade de alternância no poder, impõe a certeza de que, na democracia, os representantes do povo são e serão sempre algo diverso daquele que é o verdadeiro titular do poder soberano: o povo.
Por isso, todo poder há de ser, em nossa realidade constitucional, periódico, circunstancial, passível de mudança. Aliás, essa ideia é tão cara à nossa Constituição, que o Poder Constituinte a elevou à condição de cláusula irreversível, ao estabelecer no artigo 60, parágrafo 4º, II, da Constituição da República, que não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir o voto direto, secreto, universal e periódico. Ao fixar o sufrágio periódico como regra imutável, a Constituição, além de estabelecer a necessidade de eleições como processo regular para a escolha dos governantes, cumpre institucionalmente a função de (a) garantir o direito subjetivo de cada cidadão de ver considerada a sua opinião política manifestada através do voto, bem como (b) assegurar aos cidadãos o direito subjetivo de participar como candidatos de eleições[3].
Dada a importância, pois, da manifestação do voto, por meio do direito político ativo, assim como do direito fundamental de pleitear uma candidatura, ou de tomar parte de sua indicação por meio dodireito político passivo, é que a doutrina e a jurisprudência reconhecem nos direitos políticos as qualidades de um direito irrenunciável, intransmissível e inalienável, não admitindo, pois, seu exercício por representação (procuração) de terceiro, porquanto, em resumo, um direito personalíssimo[4].
Nem a chamada democracia direta suprime, entre nós, a separação entre a vontade do povo e decisão de governo ao final tomada. Não por outra ração, todas as formas de democracia direta previstas na Constituição (plebiscito, referendo e iniciativa popular), se pretendem manifestar-se legitimamente, submetem-se a limitações tanto formais quanto materiais.
Além disso, os pressupostos e a estrutura para o exercício pelo povo de uma democracia exclusivamente direta, na sábia advertência do professor Gomes Canotilho, desapareceram quase que completamente no quadro histórico da sociedade e dos Estados contemporâneos[5]. Com efeito, a estrutura territorial e social, a acentuada complexidade nas expectativas e valores sociais, a multiplicidade e especificidades dos problemas a resolver, os riscos aí envolvidos, assim como a exigência de crescentes e específicos conhecimentos técnicos para a sua solução, tudo isso acabou conformando a base das atuais sociedades (complexas, de risco e de massa), inviabilizando por completo a possibilidade de que os negócios do Estado fossem geridos permanentemente por deliberações de todo o povo reunido em assembleia.
Lembra ainda o professor Canotilho, o medo de que a vontade popular pudesse ser manipulada, seja por líderes carismáticos, na forma de alguma espécie de Cesarismo ou Bonapartismo (veja-se o exemplo de Hitler e do Partido Nacional-Socialista — NSDAP[6]), seja pela possibilidade de os meios de comunicação atuarem, nas sociedades de massa, como agenda-setter, isto é, agendarem os temas que acabam ganhando a atenção e a preferência popular (agenda-setting theory), tudo isso acabou por justificar, lembra o mestre de Coimbra, uma recorrente hostilidade contra os procedimentos de democracia semidireta[7].
Não obstante isso, em nosso país, o poder constituinte acabou consagrando instrumentos de democracia direta (o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular), que, inseridos no texto constitucional, ao mesclarem-se com a democracia representativa, explicitamente privilegiada pela Constituição, irão conformar em nosso País uma forma de democracia semidireta. A doutrina distingue os institutos do plebiscito e do referendo, basicamente, tendo em consideração o momento em que o povo é chamado a manifestar diretamente a sua vontade política.
Se o povo é chamado a manifestar a sua vontade, aprovando ou rejeitando o ato normativo,antes de sua deliberação pelo legislador, de tal ordem que a sua vontade componha o próprio processo de decisão, é caso de plebiscito[8]; se, diversamente, o povo é convocado quando o ato normativo já foi editado, na forma de ratificação ou rejeição, o caso é de referendo. Observe-se que, numa como noutra manifestação de democracia direta, conquanto preponderante, a vontade popular não é exclusiva e depende sempre, antes ou depois, da manifestação de outros órgãos de poder. Além disso, não obstante veículos de exercício de democracia direta, tanto no plebiscito como no referendo, o resultado da manifestação da vontade popular submeter-se-á sempre ao controle de constitucionalidade, tanto na forma abstrata como no caso concreto.
No Brasil, desde a edição da Lei 9.709/98, os institutos do plebiscito e do referendo ganharam precisa conformação legal, respectivamente, em seu artigo 2º, parágrafo 1º e 2º. No que respeita à forma de sua convocação, ainda segundo a Lei 9.709/98, no seu artigo 3º, nas questões de relevância nacional, de competência do Poder Legislativo ou do Poder Executivo, bem como no caso do parágrafo 3º do artigo 18 da Constituição Federal, o plebiscito e o referendo são convocados mediante decreto legislativo, por proposta de um terço, no mínimo, dos membros que compõem qualquer das Casas do Congresso Nacional, de conformidade com esta Lei.
A Constituição Federal, especificamente, impõe a consulta popular como pressuposto formal para a deliberação sobre alguns fatos jurídico-políticos. Assim, nos casos de incorporação, subdivisão e desmembramento de Estados-membros ou Municípios, em que, expressamente, a Constituição exige a consulta prévia, mediante plebiscito, da população ou das populações diretamente interessadas (artigo 18, parágrafos 3º e 4º, da Constituição da República).
Por fim, por intermédio da chamada iniciativa popular (artigo 14, III, da CF), a Constituição estimulou a participação direta do povo na formação da vontade política do Estado, conferindo-lhe a titularidade de iniciativa de lei, autorizando-lhe, sem a necessidade de intermediação de um representante político, diretamente, propor projetos de lei. Contudo, também aqui não há uma exata e incontrastável conformação da vontade do povo em ato de poder e de governo. Em outras palavras, também aqui a Constituição separa povo e governantes.
De fato, segundo o artigo 61, parágrafo 2º, da Constituição, a iniciativa popular será exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles. Como se vê, a vontade popular aqui se limita à iniciativa de projeto de lei, ato que apenas faz instaurar o processo legislativo. A partir de então, o projeto de iniciativa popular, não obstante a considerável força política de sua origem, estará sujeito à mesma sorte (ou azar) de qualquer outro projeto de lei. Além disso, também aqui, ainda que convertendo-se em lei o projeto de iniciativa popular, o ato normativo daí resultante submete-se ao controle de constitucionalidade.
Como se dizia, todas essas formas de manifestação direta de poder popular sofrem restrições quanto à sua possibilidade de manifestação. Tudo isso é bom para a democracia, pois, se, de um lado, não é recomendável que algum poder, grupo ou organização de pessoas, possa postular a condição de representante essencial do povo, de outro, as minorias se veriam extremamente prejudicadas na defesa de seus interesses se a maioria e seus representantes, pretendendo representar todo o povo, pudesse — antes ou depois — exercer sua vontade sem qualquer limitação ou contraste.
Em conclusão, numa verdadeira democracia — quem o diria? — também o povo deve impor-se limitações.

[1] Kriele, Martin. Einführung in die Staatslehre. 5 ed., Opladen: Westdeutscher Verlag, 1994, p. 294.
[2] Hesse, Konrad. Grundzüge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland. Heidelberg: Muller, 20 ed., 1995, p. 60.
[3] Maunz in Maunz-Dürig. Grundgesetz-Kommentar. München, Verlag C.H.Beck, 1996, Art. 38, vol. III, par. 31).
[4] Maunz in Maunz-Dürig. Grundgesetz-Kommentar. München, Verlag C.H.Beck, 1996, Art. 38, vol. III, par. 32).
[5] Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed., 2003, p. 294.
[6] É também do prof. Canotilho a lembrança da trágica herança plebiscitária da República de Weimar assim como as consultas plebiscitárias gaullistas.
[7] Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed., 2003, p. 297. Ver também McCombs, Maxwell. Setting the Agenda: The Mass Media and Public Opinion, 2004, p. 2
[8] Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed., 2003, p. 296.
Néviton Guedes é desembargador federal do TRF da 1ª Região e doutor em Direito pela Universidade de Coimbra.
Revista Consultor Jurídico, 8 de abril de 2013

segunda-feira, 8 de abril de 2013

STJ VEM FIRMANDO JURISPRUDÊNCIA QUANTO AO CHEQUE


O Superior Tribunal de Justiça vem firmando jurisprudência ao cheque, em relação a questões como execução, prescrição, indenização por erros ou mesmo delitos como fraude e roubo. A popularização desse título de crédito trouxe consigo a insegurança e a desconfiança, pois aquele pequeno pedaço de papel não oferecia a garantia de que a conta teria fundos suficientes para o pagamento do valor ali expresso. Além da devolução por falta de fundos, vieram outros problemas, como as fraudes e as confusões geradas pelo cheque pós-datado. 
O tribunal, por exemplo, negou a aplicação do princípio da insignificância a um caso de furto em que o réu se aproveitou da relação de amizade com a vítima para furtar quatro folhas de cheque em branco. A 6ª Turma do STJ considerou que a existência de maus antecedentes e a má conduta do réu, que abusou da confiança do amigo, justificaram a sua condenação à pena de dois anos e 11 meses de reclusão (HC 135.056). 
Em outro caso, o mesmo colegiado negou Habeas Corpus a um homem que cometeu o crime de estelionato ao subtrair um talão de cheques e falsificar a assinatura do titular em duas folhas, realizando em seguida compras de mercadorias no valor de R$ 43 e R$ 51. O homem foi condenado a dois anos e seis meses de reclusão, em regime semiaberto. 
O relator do caso, ministro Og Fernandes, entendeu que a falta de exame grafotécnico nos cheques fraudados pode ser suprida por outras provas. 
“No caso, a materialidade do delito teria sido demonstrada pelo boletim de ocorrência registrado pela vítima, apreensão das microfilmagens dos cheques, auto de exibição e apreensão de cópia de comprovante de abertura de conta corrente em nome da vítima, termo de coleta de padrões gráficos do réu e confissão na fase do inquérito e em juízo”, afirmou o ministro (HC 124.908). 
Prescrição
Como o cheque é ordem de pagamento à vista, a sua eficácia para o saque inicia-se com a simples entrega por parte do emitente ao beneficiário, podendo este dirigir-se imediatamente à agência bancária para proceder ao saque ou depósito. O prazo de apresentação serve como orientação para a contagem do prazo prescricional. 

O STJ já consolidou o entendimento de que o cheque deixa de ser título executivo no prazo de seis meses, contados do término do prazo de apresentação fixado à data em que foi emitido, e a regra persiste independentemente de o cheque ter sido emitido de forma pós-datada. 
Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, o uso do cheque pós-datado, embora disseminado socialmente, traz riscos ao tomador do título, como o encurtamento do prazo prescricional e a possibilidade de ser responsabilizado civilmente pela apresentação do cheque antes do prazo estipulado (REsp 875.161). 
Para a ministra Nancy Andrighi, ainda que seja prática costumeira na sociedade moderna, a emissão de cheques pós-datados não encontra previsão legal. “Admitir-se que do acordo extracartular decorram os efeitos almejados pela parte recorrente importaria na alteração da natureza do cheque como ordem de pagamento à vista, além de violação dos princípios da literalidade e abstração”, afirmou (REsp 1.068.513). 
Execução
A execução do cheque é forma de cobrança simples, rápida e eficaz de título cambial. O STJ já entendeu que, para poder ser executado, o cheque deve ter sido apresentado à instituição financeira dentro do prazo legal. A falta de comprovação do não pagamento do título retira sua exigibilidade (REsp 1.315.080). 

Para o ministro Luis Felipe Salomão, “por materializar uma ordem a terceiro para pagamento à vista”, o cheque tem seu momento natural de realização na apresentação, “quando então a instituição financeira verifica a existência de disponibilidade de fundos, razão pela qual a apresentação é necessária, quer diretamente ao sacado quer por intermédio do serviço de compensação”. 
Em outro julgamento, a 3ª Turma do STJ definiu que empresa que endossa cheque de terceiro perante factoringtambém é responsável pelo pagamento do valor do título (REsp 820.672). 
No caso, a empresa de factoring ajuizou ação de execução contra a empresa e contra a pessoa que emitiu o cheque, com o objetivo de cobrar importância de cerca de R$ 1 mil. Ao analisar a questão, o colegiado destacou: “A lei é mais que explícita: quem endossa garante o pagamento do cheque. Seja o endossatário quem for. A lei não faz exclusões. Portanto, não cabe criar exceções à margem da lei.” 
Indenização
Acordo em cheque pós-datado não vincula terceiros que o sacaram antes do prazo. Dessa forma, o terceiro de boa-fé não está sujeito a indenizar o emitente por eventuais danos morais decorrentes da apresentação antes da data combinada. O entendimento foi aplicado pela 4ª Turma (REsp 884.346). 

Segundo o relator, ministro Luis Felipe Salomão, era incontroverso no caso que o cheque circulou e que não constava como data de emissão aquela supostamente pactuada, mas a data em que foi efetivamente emitido. “O cheque é ordem de pagamento à vista e submete-se aos princípios da literalidade, abstração, autonomia das obrigações cambiais e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-fé”, afirmou. 
O ministro observou que, apesar de a Súmula 370 do próprio STJ orientar que há dano moral na apresentação antecipada do cheque pós-datado, essa regra se aplica aos pactuantes e não a terceiros. 
O STJ condenou outra instituição bancária a pagar indenização por ter devolvido cheques sustados ao devedor, e não ao credor. No caso, a 4ª Turma manteve a condenação do Banco do Brasil a indenizar por danos morais, no valor de R$ 10 mil, a Associação Comunitária de Laginha, na Paraíba, por sustação de dois cheques (REsp 896.867). 
A associação celebrou convênio com o estado da Paraíba, mediante o Projeto Cooperar, para a construção de rede de eletrificação rural. Sustentou que o Projeto Cooperar depositou dois cheques na sua conta corrente, no valor de R$ 22.271,57, que serviriam para pagar a empresa contratada por ela. 
Ocorre que os cheques foram sustados pela administração pública, sendo o valor estornado da conta corrente da associação. Porém, ao invés de a instituição bancária ter devolvido os títulos para o credor (associação), entregou-os ao devedor (Projeto Cooperar), conduta essa que impediu a associação de exercer seus direitos creditórios e pagar suas obrigações junto a fornecedores. 
Para o ministro Luis Felipe Salomão, relator, o governo do estado não tem atribuição para emitir normas relativas a procedimentos bancários, notadamente as concernentes a cheques. 
“Ainda que se reconhecesse alguma vinculação entre o governo estadual e a instituição bancária, o que não ocorre, notadamente quanto a procedimentos bancários, não cometeria ato ilícito a instituição que deixasse de cumprir determinação manifestamente ilegal”, afirmou o ministro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ. 
Revista Consultor Jurídico, 7 de abril de 2013

REDUÇÃO DO ESTOQUE DE AÇÕES FOI MAIS LENTA EM SEIS TJs


Pelo menos seis tribunais de Justiça do país descumpriram, em 2012, a Meta 2 do Judiciário, de analisar pelo menos 80% dos processos distribuídos em 2007. Bahia, Ceará, Piauí, Rondônia, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, segundo relatório do Conselho Nacional de Justiça, não alcançaram o patamar mínimo estabelecido para análises de casos. A proposta faz parte das 19 Metas do Judiciário estabelecidas pelo CNJ para 2012. São Paulo, o maior tribunal do país, Rio de Janeiro e Acre não revelaram os dados sobre o tema. Rondônia teve o índice mais baixo: 27,78%.
As informações revelam avanço na redução de estoque de ações em tramitação no país, que já são de aproximadamente 62 milhões. Essa é uma das principais bandeiras do CNJ. Em 2010, quando foi fixada a meta de julgar todos os processos de conhecimento distribuídos até dezembro de 2006, nenhum dos tribunais de Justiça cumpriu totalmente o objetivo. Para o Conselho, o resultado de 2012 é positivo porque grande parte do Judiciário tem atendido ao princípio constitucional da razoável duração do processo.
Nas Justiças Eleitoral, do Trabalho, Federal e Militar Estadual, o objetivo de julgar os casos mais antigos foi atingido em mais de 95% das cortes em 2012. A situação é bem diferente de 2010, quando metade dos tribunais superiores e das unidades da Justiça do Trabalho tiveram índice inferior à meta. No caso da Justiça Federal, o objetivo não havia sido alcançado em nenhum estado e, na Justiça Eleitoral, apenas um terço dos processos saíram do estoque de atrasados.
Tribunais abarrotados
O desequilíbrio entre a capacidade de produção e a demanda é, segundo o relatório, o principal motivo para o congestionamento da Justiça. Entre 2011 e 2012, a quantidade de processos julgados passou de 17,045 milhões para 18,528 milhões — aumento de 8,69%. Em contrapartida, a demanda cresceu em maior proporção. Ao longo de 2011, 18,526 milhões de novas ações chegaram ao Judiciário enquanto, no ano seguinte, a quantidade foi de 20,575 milhões — 11,06% a mais.

O excesso de processos por juiz preocupa o CNJ. Em média, a produção anual é de 1.095 ações por magistrado. A entrada, porém, é de 1,2 mil novos casos para cada um dos juízes. De acordo com o artigo 93 da Constituição, o número de juízes na unidade jurisdicional deve ser proporcional à efetiva demanda judicial e à respectiva população. O Brasil tem cerca de 17 mil juízes. 
De acordo com o último relatório Justiça em Números, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro é o que teve em 2011 maior número de sentenças por juiz: 2.913. A corte fluminense é seguida pelos TJs do Rio Grande do Sul (2.427), de São Paulo (1.779) e de Santa Catarina (1.451). Já o TJ piauiense, naquele ano, foi o que teve quantidade mais baixa de ações analisadas por juiz: 396. Na Justiça do Trabalho, a média foi de 1.172 sentenças por magistrado, e na Justiça Federal, de 1.734.
A expectativa do Conselho é que a implantação gradativa do Processo Judicial Eletrônico (PJe) acelere os trâmites. Na Justiça do Trabalho, por exemplo, 23 dos 24 dos tribunais regionais conseguiram cumprir a Meta 16 — implantar o PJe em ao menos 10% das varas. O TRT-15, de Campinas, havia sido o único a não atingir o patamar mínimo. Atualmente, o tribunal já cumpriu a meta.
Abandonar o papel, porém, não tem sido tarefa simples. As seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco, Pará e Rio de Janeiro já questionaram no CNJ a obrigatoriedade do uso do sistema eletrônico. Por problemas estruturais, o TRT–8 suspendeu temporariamente o peticionamento eletrônico na Comarca de Belém. Segundo a OAB-PA, o andamento dos processos ficou mais demorado e a ideia é tornar a aplicação do PJE facultativa nessa fase de adaptação. Em Pernambuco, uma liminar do CNJ de fevereiro suspendeu o uso exclusivo do processo eletrônico nas unidades de Justiça do estado.
A implantação do sistema eletrônico para consulta à tabela de custas e emissão de guia de recolhimento, a Meta 5, foi concluída por 93% das cortes. Já a Meta 7 — de implantar projeto-piloto do PJe em pelo menos uma unidade da Justiça Militar Estadual — não foi seguida pelos tribunais de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo. 
As plataformas virtuais também contribuem para dar transparência ao trabalho das cortes. Dos 91 tribunais do país, apenas dez não seguiram a Meta 3 — tornar acessíveis as informações processuais atualizadas sobre andamento e decisões, respeitando o sigilo de Justiça. A situação está mais atrasada na Justiça do Trabalho, em que cerca de um quinto das varas ainda não disponibilizam o material na rede.
Outras frentes
Além da tecnologia, o CNJ aposta nas alternativas extrajudiciais para reduzir o déficit de julgamentos. Quatro dos cinco tribunais regionais federais cumpriram a Meta 10 — de designar 10% a mais de audiências de conciliação do que em 2011. O Tribunal Regional Federal da 5ª Região — que abrange Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe — foi o único a não alcançar o objetivo.

O aumento da quantidade de execuções encerradas na Justiça do Trabalho — definido pela Meta 17 — preocupa o Conselho. Durante 2012, 14 dos 24 TRTs não conseguiram elevar em 10% o número de execuções terminadas em relação ao ano anterior. Os tribunais regionais do trabalho — exceto o TRT–6, de Pernambuco, e do TRT–10, do Distrito Federal e Tocantins — já haviam instalado um núcleo de apoio à execução em 2011. 
Na tentativa de facilitar o planejamento e o trabalho dos tribunais, o Conselho Nacional de Justiça estabeleceu, ainda em novembro de 2011, as metas para este ano. Além de julgar quantidade maior de processos do que recebem, objetivo cumprido por somente 27% de todas as cortes brasileiras em 2012, os tribunais terão que continuar o esvaziamento do estoque de ações. Dentre outros objetivos, deve haver novo aumento de 10% nas audiências de conciliação na Justiça Federal, aplicação do PJe em pelo menos 40% das varas da Justiça do Trabalho e acréscimo de 15% no quantitativo de execuções concluidas na comparação com 2011.
Victor Vieira é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 8 de abril de 2013

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...