Fredie Didier
Jr.
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Advogado e Consultor
Jurídico; Professor-
Adjunto de Direito Processual Civil da Universidade Federal da Bahia; Mestre (UFBA), Doutor (PUC-SP) e Pós-Doutor (Universidade de Lisboa). |
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Artigo publicado na Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil nº 44 - Set/Out de 2011 |
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RESUMO: Este
ensaio tem o objetivo de demonstrar a importância da técnica legislativa das
cláusulas gerais para o Direito Processual Civil contemporâneo.
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PALAVRAS-CHAVE:
Direito Processual Civil. Cláusulas Gerais. Criatividade
Judicial.
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SUMÁRIO: 1 Consideração
Introdutória. 2 Cláusulas Gerais. 3 O Direito Processual Civil e as Cláusulas
Gerais.
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1 Consideração Introdutória | ||||
A metodologia jurídica
transformou-se sensivelmente a partir da segunda metade do século XX. Embora não
seja este o local adequado para fazer uma resenha deste processo histórico, não
se pode deixar de afirmar uma quase obviedade: o Direito processual civil não é
imune a toda essa transformação.
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A compreensão e a
aplicação do Direito processual não podem prescindir desta nova metodologia. É
preciso fazer um aggiornarmento do repertório teórico do operador do
Direito; apontar as principais marcas do pensamento jurídico contemporâneo e
examinar de que modo elas vêm interferindo no Direito processual civil e na
Teoria do Processo.
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Uma dessas marcas é a
transformação da hermenêutica jurídica, com o reconhecimento do papel criativo e
normativo da atividade jurisdicional: a função jurisdicional passa a ser
encarada como uma função essencial ao desenvolvimento do Direito, seja pela
estipulação da norma jurídica do caso concreto, seja pela interpretação dos
textos normativos, definindo-se a norma geral que deles deve ser extraída e que
deve ser aplicada a casos semelhantes.
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Estabelece-se, ainda, a
distinção teórica entre texto e norma, sendo essa o produto da
interpretação daquele 1. Consagram-se as máximas (postulados, princípios ou
regras, conforme a teoria que se adote) da proporcionalidade e da razoabilidade
na aplicação das normas. Identifica-se o método da concretização dos
textos normativos, que passa a conviver com o método da subsunção 2.
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Expande-se, ainda, a
técnica legislativa das cláusulas gerais, que exigem do órgão
jurisdicional um papel ainda mais ativo na criação do Direito.
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Esse último aspecto é o
que interessa a esse ensaio, que cuida de destacar a importância e a função das
cláusulas gerais no direito processual civil.
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2 Cláusulas Gerais | ||||
Cláusula geral é
uma espécie de texto normativo, cujo antecedente (hipótese fática) é composto
por termos vagos e o consequente (efeito jurídico) é indeterminado. Há,
portanto, uma indeterminação legislativa em ambos os extremos da estrutura
lógica normativa 3. Há várias concepções sobre as cláusulas gerais
4. Optamos por essa para fins didáticos, além de a
considerarmos a mais adequada, mas não se ignora a existência de
outras.
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Judith Martins-Costa, uma
das autoras que mais contribui para a correta sistematização das cláusulas
gerais, assim as define: "Considerada do ponto de vista da técnica legislativa,
a cláusula geral constitui, portanto, uma disposição normativa que utiliza, no
seu enunciado, uma linguagem de tessitura intencionalmente ‘aberta’, ‘fluida’ ou
‘vaga’, caracterizando-se pela ampla extensão do seu campo semântico, a qual é
dirigida ao juiz de modo a conferir-lhe um mandato (ou competência) para que, à
vista do caso concreto, crie, complemente ou desenvolva normas jurídicas,
mediante o reenvio para elementos cuja concretização pode estar fora do sistema;
estes elementos, contudo, fundamentarão a decisão, motivo pelo qual, reiterados
no tempo os fundamentos da decisão, será viabilizada a ressistematização destes
elementos originariamente extrassistemáticos no interior do ordenamento
jurídico" 5. Cabe ao aplicador da norma identificar o preenchimento
do suporte fático e determinar qual a consequência jurídica que dele será
extraída 6.
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A cláusula geral é uma
técnica legislativa que vem sendo cada vez mais utilizada, exatamente porque
permite uma abertura do sistema jurídico a valores ainda não expressamente
protegidos legislativamente, a "standards 7, máximas de conduta, arquétipos exemplares de
comportamento, de deveres de conduta não previstos legislativamente (e, por
vezes, nos casos concretos, também não advindos da autonomia privada), de
direitos e deveres configurados segundo os usos do tráfego jurídico, de
diretivas econômicas, sociais e políticas, de normas, enfim, constantes de
universos metajurídicos, viabilizando a sua sistematização e permanente
ressistematização no ordenamento positivo" 8.
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A técnica das "cláusulas
gerais" contrapõe-se à técnica casuística 9. Não há sistema jurídico exclusivamente estruturado
em cláusulas gerais (que causariam uma sensação perene de insegurança) ou
em regras casuísticas (que tornariam o sistema sobremaneira rígido e
fechado, nada adequado à complexidade da vida contemporânea). Uma das
principais características dos sistemas jurídicos contemporâneos é exatamente a
harmonização de enunciados normativos de ambas as espécies 10.
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É indiscutível que a
existência de cláusulas gerais reforça o poder criativo da atividade
jurisdicional 11. O órgão julgador é chamado a interferir mais
ativamente na construção do ordenamento jurídico, a partir da solução de
problemas concretos que lhe são submetidos.
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O método da subsunção
do fato ao enunciado normativo, próprio e útil para os casos de textos
normativos típicos e fechados, revela-se insuficiente para a aplicação de
cláusulas gerais. As cláusulas gerais exigem concretização em vez de
subsunção. "Na apreciação do caso concreto, o juiz não tem apenas de
‘generalizar’ o caso; tem também de ‘individualizar’ até certo ponto o critério;
e precisamente por isso, a sua actividade não se esgota na ‘subsunção’. Quanto
‘mais complexos’ são os aspectos peculiares do caso a decidir, ‘tanto mais
difícil e mais livre se torna a actividade do juiz, tanto mais se afasta da
aparência da mera subsunção" 12.
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O Direito passa a ser
construído a posteriori, em uma mescla de indução e dedução 13, atento à complexidade da vida, que não pode ser
totalmente regulada pelos esquemas lógicos reduzidos de um legislador que pensa
abstrata e aprioristicamente 14. As cláusulas gerais servem para a realização da
justiça do caso concreto 15; revelam-se, em feliz metáfora
doutrinária, como "pontos de erupção da equidade" 16.
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Como afirma Wieacker, "as
cláusulas gerais constituíram uma notável e muitas vezes elogiada concessão do
positivismo à autorresponsabilidade dos juízes e a uma ética social
transpositiva, cujo padrão propulsor para o legislador foi constituído pela
organização dada pelo praetor romano ao judex para determinar o
conteúdo da decisão de acordo com a bona fides. O legislador transformou
o seu trabalho - através da referência à "boa-fé", aos bons costumes, aos
hábitos do tráfego jurídico, à justa causa, ao caráter desproporcionado, etc. -
em algo mais apto para as mutações e mais capaz de durar do que aquilo que era
de se esperar" 17.
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Uma das técnicas de
compreensão e aplicação das cláusulas gerais é o "método do grupo de casos"
(Fallgruppenmethode), desenvolvido pelos juristas germânicos e aplicado,
por exemplo, na arrumação das hipóteses de aplicação do princípio da boa-fé
processual. Trata-se de método que reforça a função do precedente judicial
na concretização das normas gerais, inclusive as cláusulas
gerais.
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Conforme a explicação de
Fabiano Menke, "por meio dele, compara-se o caso a ser decidido com os casos
isolados que integram um grupo de casos já julgados sobre determinada norma.
Caso haja identidade fático-normativa entre os casos, será possível agregar o
novo caso ao grupo já consolidado, e no que toca à sua fundamentação, bastará a
indicação de que pertence ao grupo, de maneira que ocorre um verdadeiro
reaproveitamento das razões já expendidas nas hipóteses assemelhadas. Parece ter
lugar uma nova configuração da argumentação, no sentido de que ela não busca a
justificação da adequação de determinada cláusula geral ao caso em questão, mas
sim a possibilidade de comparação entre o novo caso com os já decididos" 18.
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A relação entre cláusula
geral e o precedente judicial é bastante íntima. Já se advertiu, a propósito,
que a utilização da técnica das cláusulas gerais aproximou o sistema do civil
law do sistema do common law. Esta relação revela-se, sobretudo, em
dois aspectos. Primeiramente, a cláusula geral reforça o papel da jurisprudência
na criação de normas gerais: a reiteração da aplicação de uma mesma ratio
decidendi dá especificidade ao conteúdo normativo de uma cláusula geral,
sem, contudo, esvaziá-la; assim ocorre, por exemplo, quando se entende que tal
conduta típica é ou não exigida pelo princípio da boa-fé 19. Além disso, a cláusula geral funciona como
elemento de conexão, permitindo ao juiz fundamentar a sua decisão em
casos precedentemente julgados 20.
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A vagueza da proposição
normativa é esclarecida paulatinamente pelas decisões judiciais, que "mediante
exemplos ‘ilustrativos’ e, em seguida, ‘por via da comparação com outros casos
julgados em conformidade com eles, bem como mediante a elaboração de ideias
jurídicas novas e mais especiais, com base na análise jurídica dos casos em que
elas se manifestam, conseguem enriquecer cada vez mais o conteúdo da pauta
relativamente ‘indeterminada’, concretizá-la em relação a certos casos e grupos
de casos e, deste modo, criar finalmente um entrelaçado entre modelos de
resolução em que possam ser arrumados, na sua maioria, os novos casos a julgar"
21.
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O método do agrupamento
de casos não é perfeito, obviamente. Há casos julgados em época com contexto
social muito diverso (casos sobre "bons costumes" do início do século vinte
teriam pouca serventia nos dias atuais 22). Pode ser que ainda não haja casos passíveis de
comparação, quando então, "mas só precisamente então", só a convicção
pessoal do órgão julgador do que seja a medida do justo poderá oferecer a
solução 23. Finalmente, há o perigo de que o agrupamento de casos
sirva de fundamento para um retorno ao método da subsunção exclusiva, impedindo
o desenvolvimento judicial do Direito e acomodando a interpretação das cláusulas
gerais pelos tribunais 24.
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Há outros elementos que,
ao lado dos precedentes, servem à concretização das cláusulas
gerais.
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A observância à
finalidade concreta da norma é um dos elementos imprescindíveis à
concretização de uma cláusula geral. O método teleológico de compreensão das
normas, não obstante tenha as suas dificuldades 25, não pode ser ignorado. Cabe ao aplicador procurar os
"objetivos concretos" da norma: a concretização é uma atividade, é um criativo
processo de integração de valores e interesses concretos 26.
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Outro elemento decisivo
na concretização das cláusulas gerais é a pré-compreensão do aplicador a
respeito dos elementos do enunciado normativo. "Não se pode negar que, ao
apreciar as circunstâncias de fato e as hipóteses normativas, o aplicador opera
seletivamente e, nessa atividade, há componentes que não estão pré-qualificados
sistematicamente, mas que são, limitadamente, qualificados pelo próprio
aplicador" 27.
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Não pode o aplicador, na
concretização das cláusulas gerais, ignorar o consenso social já
estabelecido a respeito de determinadas circunstâncias que devem ser por ele
examinadas 28. As práticas negociais de agricultores de uma região,
por exemplo, não podem ser ignoradas na compreensão do que significa um
comportamento socialmente havido como honesto (standard), para fim de
concretização da cláusula geral da boa-fé. Os standards servem como
parâmetro para a concretização das cláusulas gerais 29- 30.
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Pedro Pais de Vasconcelos
defende que a concretização das cláusulas gerais exige que o intérprete "se
debruce sobre a situação concreta do caso, que intua a constelação valorativa de
referência, que pondere a consequência da concretização e que formule o juízo em
termos tais que seja susceptível de ser sindicado" 31. A observação é importante, exatamente para destacar o
seguinte: a concretização das cláusulas gerais pode ser controlada, quer por
razões formais (incompetência do órgão julgador ou falta de fundamentação), quer
por razões substanciais (má compreensão da cláusula geral). É possível rever
uma decisão que aplica mal uma cláusula geral, quer porque a aplicou de modo
irrazoável ou inadequado (decisão injusta), quer porque a aplicou sem a devida
fundamentação (decisão nula).
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As cláusulas gerais
trazem consigo, entretanto, o sério risco de insegurança
jurídica.
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A despeito do contexto
político-social da época da decisão, as cláusulas gerais "possibilitam ao juiz
fazer valer a parcialidade, as valorações pessoais, o arrebatamento
jusnaturalista ou tendências moralizantes do mesmo gênero, contra a letra e
contra o espírito da ordem jurídica. Por outro lado, o uso inadequado, hoje cada
vez mais frequente, das cláusulas gerais pelo legislador atribui ao juiz uma
responsabilidade social que não é a do seu ofício" 32. Esses problemas ainda podem ganhar maior vulto em
tempos de efervescência social, guerras ou crise econômica. Há o perigo quase
inevitável da fuga para as cláusulas gerais (Die Flucht in die
Generalklauseln), conforme célebre expressão de Hedemann. Como parece ser
inevitável a existência de cláusulas gerais no ordenamento jurídico, inclusive
no Direito processual, cabe à teoria jurídica e à jurisprudência desenvolver
técnicas dogmaticamente adequadas de manejo dessas espécies
normativas.
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Finalmente, é preciso
distinguir cláusula geral e princípio. Cláusula geral é um
texto jurídico; princípio é norma. São institutos que operam em
níveis diferentes do fenômeno normativo. A norma jurídica é produto da
interpretação de um texto jurídico 33. Interpretam-se textos jurídicos para que se verifique
qual norma deles pode ser extraída. Um princípio pode ser extraído de uma
cláusula geral, e é o que costuma acontecer. Mas a cláusula geral é texto que
pode servir de suporte para o surgimento de uma regra. Da cláusula
geral do devido processo legal é possível extrair a regra de que a
decisão judicial deve ser motivada, por exemplo.
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Este ensaio é mais um
passo na empresa doutrinária de divulgação do pensamento jurídico sobre o
assunto, etapa indispensável para o desenvolvimento do Direito. Muito já se
construiu a respeito do tema, como visto. As linhas básicas podem assim ser
resumidas: a) percepção de que não há legislação composta apenas por
cláusulas gerais: a existência de regras jurídicas é indispensável para a
diminuição da complexidade da regulação da vida social e o prestígio da
segurança jurídica; b) a aplicação das cláusulas gerais não dispensa
sólida fundamentação pelo órgão julgador, cuja decisão pode ser submetida ao
controle formal ou substancial; c) o método da concretização das
normas é o mais adequado para a aplicação das cláusulas gerais, que, não
obstante ainda necessite de um contínuo aprimoramento teórico, exige a
observância dos precedentes judiciais, da finalidade concreta da norma; da
pré-compreensão, da valoração judicial dos resultados da decisão e do consenso
como fundamento parcial da decisão (conforme sistematização de Humberto
Ávila).
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Feita a ressalva, podemos
ir adiante.
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3 O Direito Processual Civil e as Cláusulas Gerais | ||||
As cláusulas gerais
desenvolveram-se inicialmente no âmbito do Direito Privado, cujos principais
exemplos são as cláusulas gerais da boa-fé, da função social da
propriedade e da função social do contrato.
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Ultimamente, porém, as
cláusulas gerais têm "invadido" o Direito processual, que naturalmente sofreu as
consequências das transformações da metodologia jurídica no século passado
34. Afinal, o Direito processual também
necessita de "normas flexíveis que permitam atender às especiais circunstâncias
do caso concreto" 35.
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O princípio do devido
processo legal é o principal exemplo de cláusula geral processual. O CPC
brasileiro contém outros vários exemplos de cláusulas gerais: a) cláusula geral
executiva (art. 461, § 5º, CPC) 36; b) poder geral de cautela (art.
798 do CPC) 37; c) cláusula geral do abuso do direito do exequente
(art.
620 do CPC 38); d) cláusula geral da boa-fé processual (art. 14, II,
CPC); e) cláusula geral de publicidade do edital de hasta pública (art. 687, §
2º, CPC 39); f) cláusula geral de adequação do processo e da
decisão em jurisdição voluntária (art.
1.109 do CPC 40) etc.
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A existência de várias
cláusulas gerais rompe com o tradicional modelo de tipicidade estrita que
estruturava o processo até meados do século XX 41.
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No Direito processual
civil brasileiro, porém, as cláusulas gerais aparecem soltas, como se
houvessem sido previstas sem qualquer preocupação sistemática.
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O CPC português é
estruturado em cláusulas gerais: a) princípio da adequação formal (art. 265º-A
42); b) cláusula geral do acesso a uma justiça efetiva,
tempestiva e adequada (art. 2º, 1 e 2) 43; c) cláusula geral da igualdade das partes (art. 3º-A)
44 etc.; d) cláusula geral de cooperação processual (art.
266º, 1). Nesse aspecto, o CPC português está na vanguarda mundial. Não há
legislação processual de onde se possam extrair tantas cláusulas gerais
expressamente consagradas.
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A flexibilidade/abertura
do Direito Processual Civil português revela-se muito claramente. A topografia
das previsões legislativas portuguesas é emblemática. As cláusulas gerais no CPC
português aparecem no início da codificação, como que compondo o prólogo
indispensável à compreensão do direito processual português. No CPC brasileiro,
as cláusulas gerais mostram-se dispersas, sem qualquer ligação sistemática,
produtos de inúmeras reformas legislativas que desestruturaram o sistema
organizado por Alfredo Buzaid para o Direito processual civil brasileiro, sem
preparar um outro para substituí-lo.
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A produção doutrinária e
as manifestações jurisprudenciais sobre as cláusulas gerais são quase infinitas
45. Notadamente na Alemanha, há um vastíssimo número de
ensaios doutrinários a respeito do tema. Tudo isso contribuiu para que as
cláusulas gerais fossem aplicadas de maneira dogmaticamente aceitável e,
consequentemente, de modo a que se pudessem controlar as decisões judiciais que
delas se valessem.
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O princípio da boa-fé
processual pode servir como exemplo do quanto ora se diz.
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O princípio da boa-fé
processual decorre de uma cláusula geral. As consequências normativas para o
desrespeito ao princípio da boa-fé não precisam ser típicas: pode-se
construir o efeito jurídico mais adequado ao caso concreto. A infração ao
princípio da boa-fé pode gerar invalidade do ato processual, preclusão
de um poder processual (talvez até mesmo uma supressio), dever de
indenizar (se a infração vier acompanhada de um dano), direito a tutela
inibitória, sanção disciplinar etc. 46 Essa parece ser a solução para o problema mais
recorrente no manejo das cláusulas gerais processuais: saber a consequência
normativa para o seu descumprimento. Aplicam-se aqui, em razão da proximidade
entre abuso do direito e boa-fé, as considerações de Cunha de Sá sobre a sanção
ao abuso do direito, cuja determinação "deverá ser feita em função e de acordo
com as circunstâncias específicas do comportamento concretamente assumido pelo
titular do direito" 47.
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Enfim, o operador
jurídico não pode prescindir desses subsídios na aplicação das cláusulas gerais
processuais, atualmente tão abundantes.
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TITLE: Procedural general
clauses.
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ABSTRACT: This
essay aims to demonstrate the importance of the legislative technique of
"general clauses" for the contemporary Civil Procedural Law.
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KEYWORDS: Civil
Procedural Law. General Clauses. Judicial Creativity.
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