O controle externo exercido pelo Ministério Público sob a polícia não abarca toda e qualquer atividade desenvolvida pela instituição. Foi o que decidiu a juíza Juliana Faleiro de Lacerda Ventura, da 2ª Vara Cível de Araguari, em Minas Gerais, ao julgar improcedente uma ação civil pública movida peloparquet para garantir acesso aos registros internos da Polícia Civil mineira.
No pedido, o MP-MG requereu senha para acesso direto ao sistema interno da Polícia Civil de gerenciamento de procedimento policias pela web, para acompanhar os registros de ocorrência, de inquéritos policias, de fiança criminal e de diligências preliminares, entre outros procedimentos. Pediu ainda que o estado seja obrigado a divulgar na internet os Registros de Eventos de Defesa Social (REDs) que geram inquéritos policias, assim como o número de pessoas presas e vagas existentes por unidade prisional.
O MP argumentou que a Promotoria responsável pelo controle externo da atividade policial tem tido dificuldade para acompanhar as notícias-crime oriundas das ocorrências registradas na delegacia de Araguari. Destacou que nem todas resultam em inquéritos e que, em razão da falta de informações, o órgão tem sido procurado por cidadãos interessados em saber as providencias tomadas nas suas demandas.
Segundo o MP-MG, a negativa da polícia em lhe dar acesso ao sistema impede o controle externo da atividade policial e dificulta o efetivo controle da criminalidade, já que muitos registros deixam de ser encaminhados aoparquet ou ao Judiciário.
Já a Polícia Civil argumentou que o controle externo que a Constituição Federal conferiu ao Ministério Público não pode ser negado, mas encontra limites normativos, uma vez que nem toda atividade está sujeita ao domínio do MP por estar alicerçada na autonomia administrativo-funcional, também concedida por lei à autoridade policial. Para a polícia, o controle externo do MP não lhe dá poder disciplinar nem o autoriza a conduzir investigações ou procedimentos policias, assim como fiscalizar e gerenciar atos de natureza administrativa interna.
Ao analisar o caso, a juíza deu razão à Polícia Civil. De acordo com ela, o controle externo do MP sob a atividade policial tem como fundamento a defesa da ordem jurídica e do regime democrático a fim de salvaguardar a sociedade de quaisquer medidas que possam resultar em violação dos direitos constitucionais sociais e individuais indisponíveis.
“Todavia, esta atribuição dada ao parquet deve ser analisada com parcimônia, dada sua incidência limitada a certos atos perpetrados pela polícia. O controle externo não incide sobre toda e qualquer atividade policial, mas apenas se verifica em relação aos atos que digam respeito à chamada ‘polícia judiciária’ e à apuração de infrações penais, quando exercidas pela Polícia Civil”, destacou.
Para a juíza, o controle externo exercido pelo MP não implica em subordinação por parte dos membros da Polícia Civil. “Por certo, não é intuito do legislador criar verdadeira hierarquia ou disciplina administrativa, subordinando a autoridade policial e seus funcionários aos agentes do Ministério Público”, destacou.
Na avaliação da juíza, as regras para o controle externo pelos ministérios públicos dos estados constam na Lei Orgânica do MP da União, que nessa questão é aplicado de forma subsidiária. A norma estabelece as medidas à disposição do Ministério Público para exercer essa atribuição.
“Há disposição legal que dispõe acerca do acesso a estabelecimentos e documentos, possibilidade que o promotor fiscalize a legalidade da atuação policial e exerça um limitado controle formal do inquérito. Contudo, continua faltando um dispositivo que diga de forma clara que o Ministério Público exercerá o controle externo da atividade policial, dando instruções gerais e específicas para a melhor condução do inquérito policial, as quais estarão vinculados os agentes da polícia judiciária. E, diante da ausência de regulamentação no sentido de se permitir o acesso do Ministério Público aos dados existentes nos sistemas da Polícia Civil, outro caminho não resta que a improcedência dos pedidos inicias, visto a ausência de previsão legal”, decidiu.
O Ministério Público recorreu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, mas o caso ainda não foi julgado.
Processo 0092152-37.2014.8.13.0035
Giselle Souza é correspondente da ConJur no Rio de Janeiro.
Revista Consultor Jurídico, 23 de novembro de 2015, 17h48
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