quinta-feira, 25 de agosto de 2016

NJ Especial: Indenização pela perda de uma chance requer prova de perda efetiva de oportunidade real e concreta






Frustrar a expectativa de alguém que está diante da chance concreta de realizar algo. Impedir alguém de concretizar uma conquista material que tinha em vista, não fosse a sua ação dolosa ou culposa. Será que quem pratica esse ato pode ser obrigado, na Justiça, a responder civilmente por isso? Sim, é a isso que o direito moderno dá o nome de "responsabilidade civil baseada na perda de uma chance". Em linhas gerais, é a obrigação de se indenizar alguém que foi tolhido da oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar um prejuízo real.
Fruto da construção doutrinária francesa e italiana no fim do século XIX, a teoria da reparação por perda de uma chance é de adoção relativamente recente nos tribunais brasileiros, sendo um reflexo da evolução do instituto da responsabilidade civil na sociedade contemporânea. E o estudo e aplicação dessa teoria ficou mesmo a cargo da doutrina e da jurisprudência, já que o Código Civil de 2002 não faz menção à indenização por perda de uma chance.
Nesta NJ Especial, vamos entender o que é esse direito, como se caracteriza a perda de uma chance, em sua forma indenizável, e como ela se dá na esfera trabalhista. Ao final, confira como os magistrados da JT mineira têm julgado casos envolvendo pedidos de indenização pela perda de uma chance.
Perda de uma chance e responsabilidadeEm termos simples, a responsabilidade civil pode ser definida como a obrigação que uma pessoa tem de reparar o dano que causou a outra, por força de sua ação ou omissão. A perda de uma chance é aceita como um princípio de responsabilidade civil, no qual aquele que causa dano a outra pessoa fica obrigado a reparar os prejuízos decorrentes do seu ato. O fundamento é que, em razão de um ato ilícito e injusto praticado por uma pessoa, alguém pode ficar privado da oportunidade de obter determinada vantagem ou, então, de evitar um prejuízo. Nesse caso, a vítima poderá ajuizar ação na justiça com pedido de indenização pela perda de uma chance ou oportunidade.
Na responsabilidade civil pela perda de uma chance, o que é indenizável é a probabilidade séria de obtenção de um resultado legitimamente esperado e impedido por ato ilícito do ofensor. Ou seja, o dano se concretiza na frustração de uma esperança, na perda de uma oportunidade viável e real que a vítima esperava, já que a conduta ilícita interrompeu o curso normal dos acontecimentos antes que a oportunidade se concretizasse.
A tendência de tornar esse prejuízo indenizável ganhou respaldo com a Constituição de 1988, que consagrou o princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil. Aliás, todo o sistema da responsabilidade civil é orientado pela ideia de solidariedade social, de acordo com os princípios constitucionais. Assim, apesar de não existir previsão legal específica no Código Civil Brasileiro regulamentando a reparação pela chance perdida, considera-se que a teoria é aceita pelo ordenamento jurídico pátrio porque está de acordo com a interpretação e a finalidade dos dispositivos que regulam a obrigação de indenizar e, ainda, como os princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, também o princípio da reparação integral do dano (artigos 403 e 944 do Código Civil).
Mas, atenção: não basta a mera possibilidade da ocorrência da oportunidade, já que danos potenciais ou hipotéticos não são indenizáveis. É essencial que se demonstre a seriedade da chance perdida, que deve ser real.
Como pedir? Como quantificar o valor da chance perdida? Na lição de Raimundo Simão de Melo (in Caderno de Doutrina e Jurisprudência da Ematra XV, v.3, n.2, março/abril 2007), na reparação por perda de uma chance, a comprovação do prejuízo se faz com o nexo de causalidade, ainda que parcial, entre a conduta do réu e a perda da chance, e não propriamente com o dano definitivo (vantagem que se deixou de ganhar). No entanto, muitas vezes, os pedidos na Justiça são feitos de forma inadequada, buscando-se indenização pela perda da vantagem esperada e não pela perda da oportunidade de obter a vantagem ou de evitar o prejuízo. Isto porque, o que se indeniza é a possibilidade de obtenção do resultado esperado.
Como consequência, ensina o doutrinador, o valor da indenização a ser fixado pelo julgador deve ter como parâmetro o valor total do resultado esperado e sobre este deverá incidir um coeficiente de redução proporcional às probabilidades de obtenção desse resultado. Ou seja, com base nas provas produzidas e na sua convicção, o juiz deverá levar em conta as probabilidades reais de o autor da ação alcançar o resultado esperado. Quanto maiores essas possibilidades, maior deve ser o valor da indenização.
Hipóteses de perda de uma chance no direito do trabalhoNas relações de trabalho, a responsabilidade civil pela perda de uma chance encontra solo fértil, assim como ocorre com as indenizações por danos morais. Por exemplo, no campo das doenças profissionais e acidentes do trabalho, há grandes possibilidades de ocorrência de danos pela perda de oportunidades. É que, em razão das limitações físicas impostas pelo acidente ou doença, o trabalhador pode perder a chance de melhora profissional.
Mesmo na fase pré-contratual, quando são feitas as tratativas do contrato, embora o empregador seja livre para admitir ou não o empregado, já lhe é exigido um comportamento negocial pautado pela lealdade e pela confiança. Assim, cabe ao empregador se orientar por um dever de conduta, sem criar expectativas falsas ou vazias. Tudo em respeito ao princípio da boa-fé objetiva, inserido no artigo 422 do Código Civil: "Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé".
Permite-se que a empresa, antes de contratar o empregado, obtenha informações sobre a experiência profissional, exame de currículos, exame admissional, a fim de avaliar a capacidade profissional do candidato. Porém, se ela abusa desse direito de informação, ultrapassa os limites dessa fase preliminar e cria no trabalhador a esperança ou mesmo a certeza de sua contratação, deverá reparar os prejuízos sofridos pelo candidato com a frustração dessa expectativa. Entre estes, estão, geralmente, as despesas do trabalhador para se candidatar à vaga de emprego ofertada ou em razão do tempo que gastou (dano emergente), abrangendo também as chances perdidas. Por exemplo, a real oportunidade de um outro emprego, pelo fato de já ter como certa a sua contratação, posteriormente frustrada.
Veja, nos casos julgados pelo TRT mineiro, as situações em que pode se configurar, ou não, a "perda de uma chance":Empresa de telefonia é condenada a reparar trabalhador dispensado após processo seletivo para promoção internaNo caso julgado pela Sétima Turma do TRT mineiro um trabalhador teve reconhecido o direito a uma indenização por dano material, por ter sido dispensado de forma abusiva e ilícita, logo após ser aprovado em processo seletivo interno da empresa. Com a promoção, ele se transformaria em supervisor de vendas, cargo em que teria o salário dobrado. No entender do desembargador relator, Emerson José Alves Lage, o reclamante teve frustrada uma chance real de obter o esperado ganho salarial, ao ser injustamente dispensado sob a acusação de cometer falta grave. Por isso, faria jus à reparação patrimonial, pelo prejuízo consistente na perda dessa oportunidade.
É que a empresa resolveu investigar se os empregados utilizavam seus acessos ao sistema informatizado para realizar recargas de créditos de suas próprias linhas de telefone celular. Segundo relatos de testemunhas, mesmo sabendo que as recargas no celular do reclamante não haviam partido do seu acesso, os prepostos da empresa o mantiveram retido numa sala por mais de uma hora e meia até que, não suportando a pressão, ele assinou sua carta de demissão do emprego. No dia seguinte, voltou para pedir a reconsideração da sua demissão, mas diante da recusa da responsável pelo setor e ainda sob pressão, rasgou o documento que havia assinado. Após o incidente, foi dispensado por justa causa tipificada na letra a do artigo 482 da CLT, por destruir documento da empresa.
O juiz de 1º Grau reverteu a justa causa e declarou a rescisão indireta do contrato, porém indeferiu o pedido de indenização por danos materiais, ao fundamento de que a aprovação em teste de seleção para o cargo apenas criou a expectativa do direito à promoção. Desse entendimento, discordou o relator do recurso do reclamante e a decisão da Turma se assentou no artigo 402 do Código Civil, pelo qual as perdas e danos devidos ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar, já que a teoria da responsabilidade civil pela perda de uma chance "tornaria indenizável a probabilidade séria de obtenção de um resultado legitimamente esperado que é obstado por ato ilícito praticado pelo agente ofensor", explicou o julgador.
O relator considerou que a reparação da perda de uma chance não se fundaria na certeza, mas sim, na probabilidade, na possibilidade real de ganhos patrimoniais, que foi ilicitamente obstruída. A indenização teria por objetivo reparar a perda da oportunidade em si mesma, e não os ganhos perdidos. Até porque, no caso, não há como quantificar, ao certo, esses ganhos, pois não se pode prever por quanto tempo o reclamante se manteria no cargo de supervisor.
Partindo desta linha de considerações e da chance real e séria perdida pelo reclamante, o relator condenou a empresa a pagar a rescisão contratual se baseando no novo salário de supervisor, que seria devido a ele em função da suposta promoção, dando provimento ao recurso do reclamante. A Turma condenou ainda a ré a anotar na CTPS do reclamante a função de supervisor de operação de televendas, sob pena de multa diária de R$ 300,00. (RO 01533-2007-112-03-00-5 - Data 02/10/2008)
Empregado impedido de participar de eleição para CIPA ganha direito à indenização por perda de uma chanceNesse caso, também mais antigo, a 8ª Turma do TRT-MG manteve a condenação de uma empresa a pagar indenização pela perda de uma chance a um empregado dispensado às vésperas de registrar a sua candidatura a membro da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes). O reclamante era detentor de estabilidade no emprego até 30.11.08, por ter sido eleito membro da CIPA para o período 2006/2007, e foi dispensado em 09.10.08, dois dias depois de publicado o edital que convocava os empregados para nova eleição de representantes da CIPA e um dia antes do início do prazo para registro das candidaturas, a partir de 10.10.08. A ré alegou que tudo não passou de uma coincidência e que não houve prova de que a rescisão tenha ocorrido para impedir o trabalhador de se candidatar para a CIPA.
Mas, para a desembargadora, hoje aposentada, Cleube de Freitas Pereira, não havia como deixar de presumir que a dispensa teve mesmo o objetivo de impossibilitar que o autor se inscrevesse para concorrer às eleições da CIPA 2008/2009 e, se eleito, adquirisse o direito a novo período de estabilidade. Isso porque, como ele já havia sido escolhido pelos colegas para o período 2006/2007 e permaneceu atuando na comissão no período 2007/2008, por indicação da própria reclamada, certamente por ter apresentado um bom desempenho, a chance de ele ser eleito para o novo período era real. Além disso, como empregado estável, o autor somente poderia ser dispensado por justa causa, ou motivos técnicos, econômicos e financeiros.
Por isso, a conduta da empresa foi ilícita e causou danos ao trabalhador. "Assinalo que a reparação da perda de uma chance não está diretamente ligada à certeza de que esta seria realizada e que a vantagem perdida resultaria em prejuízo. Ao revés do sustentado pela reclamada, não se pode pretender que a vítima comprove, inequivocamente, que obteria o resultado perdido, caso não tivesse ocorrido a conduta do ofensor. Exige-se tão-somente a probabilidade, sendo a prova da perda da chance feita por verossimilhança", concluiu a desembargadora. (01405-2008-077-03-00-0 RO - Data 25/09/2009).
Reparação é concedida em caso de séria e real expectativa de emprego frustradaEm outro julgado, o CITIBANK S.A. e o CREDICARD SOLUÇÕES DE CRÉDITO foram condenados pelo juiz de primeiro grau, de forma solidária, a pagar à reclamante indenização por perda de uma chance no valor de R$15.000,00 e, ainda, indenização por danos morais arbitrada em R$20.000,00. Inconformados, eles recorreram da sentença, mas a 5ª Turma do TRT-MG, adotando o entendimento do relator, desembargador Marcus Moura Ferreira, manteve a condenação.
Ficou constatado que os réus, que formam grupo econômico, provocaram na reclamante uma séria e real expectativa de que seria contratada por eles e, em razão disso, ela chegou a pedir demissão do antigo emprego. Entretanto, a contratação acabou não acontecendo, gerando prejuízos à reclamante, por perda de uma chance e também de ordem moral.
Na versão dos réus, a reclamante teve no máximo, uma mera expectativa de emprego, já que não passou em todas as etapas da entrevista e nem realizou o exame admissional, deixando de reunir todos os requisitos para a contratação. Afirmaram ainda que, pela teoria da perda de uma chance, não é qualquer possibilidade perdida que obrigará o ofensor a ressarcir o dano, pois a chance deve ser séria e real, não abrangendo meras expectativas ou esperanças aleatórias. Entretanto, esses argumentos não forma acolhidos pela Turma julgadora.
De acordo com o relator, para que haja reparação por perda de uma chance é necessária uma oportunidade real e concreta que deixa de ser obtida pela intromissão de alguém, resultando em prejuízo. E, para o desembargador, foi exatamente o que aconteceu no caso. Isto porque a prova documental revelou que a reclamante pediu demissão de seu antigo emprego. Além disso, a reclamante apresentou as fichas de proposta de emprego, opção de vale transporte e opção de plano de saúde e odontológico, documentos que, na visão do relator, fornecem indícios suficientes de que não houve mera participação da reclamante em processo seletivo, mas séria expectativa de contratação: "Tanto é assim que o preposto de um dos réus chegou a reconhecer que candidato a emprego no banco não pega documento para plano de saúde nem de opção de vale transporte", frisou o desembargador.
Nesse quadro, o julgador não teve dúvidas de que os réus geraram uma legítima expectativa de contratação na reclamante, que não se concretizou unicamente por decisão deles, cabendo-lhes, portanto, reparar a trabalhadora pelos prejuízos sofridos.
Por essas razões, a Turma manteve a condenação dos réus de pagar à reclamante a indenização "por perda de uma chance", no valor reconhecido na sentença. Tendo em vista que a reclamante foi vítima de discriminação nos atos preparatórios da admissão ao emprego, a indenização por danos morais também foi mantida. O juiz de primeiro grau também condenou os réus a ressarcirem a reclamante por danos materiais (lucros cessantes), no valor de R$7.000,00, levando em conta o tempo de duração do contrato anterior da reclamante e o valor do último salário que lhe foi pago (R$692,00), o que foi mantido pela Turma revisora. (RO: 02006-2013-034-03-00-5 - Data 15/03/2016).
Perda de uma chance não caracterizada: Proposta concreta de emprego não demonstradaSituação diferente foi encontrada pela 6ª Turma do TRT mineiro, que julgou desfavoravelmente o recurso de uma trabalhadora, mantendo a sentença que rejeitou seu pedido de reparação por perda de uma chance. A alegação da reclamante foi de que teria sido seduzida pela ré com uma proposta de emprego com salário superior ao que recebia na época e, em razão disso, pediu demissão do antigo emprego, mas ficou a "ver navios", já que não foi contratada e está desempregada até hoje.
Mas, ao examinar as provas, o desembargador relator, Anemar Pereira Amaral, concluiu que a trabalhadora não demonstrou que, de fato, a empresa fez a ela uma proposta formal e concreta de contratação. Por isso, também entendeu não ser o caso de reparação por perda de uma chance.
O desembargador explicou que a "Teoria da Perda de uma Chance", de origem francesa, trata de uma nova forma de responsabilização civil, baseada na premissa de que, se alguém pratica um ato ilícito que faz com que outra pessoa perca uma oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar um prejuízo, deverá indenizá-la pelos danos causados. Mas ressaltou que, para a obrigação de reparar, é necessário que essa chance seja séria e real, e não apenas uma eventualidade, suposição ou desejo. Assim, ao se buscar a reparação da oportunidade de se obter uma vantagem supostamente frustrada pela ré, não basta alegar o prejuízo: deve-se provar a culpa da empresa. Isso é indispensável para o reconhecimento do ilícito trabalhista, assim como o nexo causal entre a conduta da empresa e a frustração da oportunidade de obter o direito.
Nesse contexto, a indenização por perda de uma chance será devida pela frustração de um direito ou vantagem, que muito provavelmente se consumaria, se não fosse a conduta ilícita praticada pelo ofensor, ou seja, o sujeito teria grande probabilidade de obter o resultado favorável se as coisas prosseguissem o seu caminho natural, frisou o relator. Mas, para ele, essa não foi a situação retratada no processo.
Isso porque a prova testemunhal revelou que, conforme havia afirmado a empresa, em nenhum momento houve qualquer proposta formal de contratação da reclamante. O que ocorreu, de fato, foi apenas uma conversa informal entre a reclamante e um ex-encarregado da ré, quando ele comentou que poderia surgir uma vaga na empresa, caso a ré fosse vencedora de uma concorrência para um novo contrato com a Vale S.A., o que, inclusive, acabou não se concretizando. Além disso, a própria reclamante confessou em seu depoimento pessoal que, embora estivesse empregada, estava procurando emprego e ligou para alguém na reclamada porque já havia trabalhado lá e tinha interesse de retornar.
"Nada houve para comprovar qualquer proposta formal por parte da reclamada, que justificasse o pedido de demissão da reclamante do emprego anterior. Na verdade, a conclusão que se chega é a mesma do juiz de primeiro grau: a reclamante já vinha querendo deixar o seu antigo emprego e motivada por uma mera possibilidade de vaga na ré, optou por pedir demissão por sua própria conta e risco", finalizou o julgador, mantendo a sentença que rejeitou o pedido da reclamante de indenização por perda de uma chance, no que foi acompanhado pela Turma revisora. (RO 0010133-87.2015.5.03.0060 (RO) - Data 06/10/2015).


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15/06/2016 06:00h - Juíza nega indenização por perda de uma chance a empregado que teve expectativa de contratação frustrada ao ser reprovado em exame admissional

09/12/2015 06:02h - Multinacional francesa indenizará advogado que teve legítima expectativa de contratação frustrada

29/05/2014 06:01h - Motorista não contratado após processo de seleção não consegue provar perda de uma chance

12/12/2013 06:00h - Esposa de empregado que sofreu acidente do trabalho será indenizada

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22/10/2013 06:05h - Professor será indenizado pela perda de uma chance

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26/07/2012 06:02h - Empresa que não deu baixa em crachá de ex-empregado pagará indenização pela perda de uma chance

29/05/2012 06:10h - Trabalhador rural será indenizado por perda de uma chance

29/12/2011 06:03h - Construtora indenizará engenheiro pela perda de uma chance

02/12/2010 06:09h - Trabalhador que perdeu chance de emprego por culpa da ex-empregadora será indenizado


Fonte: TRT3

Contagem dos prazos processuais em dias úteis prevista no novo CPC não se aplica ao Processo do Trabalho


O artigo 219 do novo CPC trouxe uma inovação: estipulou a contagem dos prazos processuais em dias úteis. Mas será que o Processo do Trabalho sofre influência desse dispositivo legal? Entendendo que o correto seria contar o prazo em dias úteis, uma trabalhadora ajuizou Embargos de Declaração para apontar omissão no julgado quanto ao pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita. Entretanto, a 7ª Turma do TRT de Minas não admitiu os embargos, por considerá-los intempestivos, isto é, ajuizados fora do prazo legal.

No caso, o acórdão embargado foi divulgado no DEJT em 19/05/2016 (quinta-feira) e publicado em 20/05/2016 (sexta-feira). Portanto, conforme esclareceu a desembargadora relatora, Cristiana Maria Valadares Fenelon, nos termos do artigo 897-A da CLT, o prazo de cinco dias para oposição de embargos de declaração fluiu de 23 a 27/05/2016. Tendo sido os embargos ajuizados somente em 30/05/2016, a relatora não teve dúvida do descumprimento do prazo legal.

A trabalhadora invocou, em seu favor, o art. 219 do CPC de 2015, segundo o qual a contagem dos prazos processuais deve ser feita em dias úteis. Entretanto, a desembargadora acentuou que, de acordo com a Instrução Normativa 39/2016 do TST, acolhida pela 7ª Turma do TRT mineiro, o referido dispositivo legal não se aplica ao processo do trabalho.

Salientou a relatora que, nos termos do art. 769 da CLT, as normas do processo civil são aplicáveis subsidiariamente na esfera trabalhista, no caso de omissão da lei processual do trabalho, exceto se houver incompatibilidade. Entretanto, ela lembrou que a CLT não é omissa quanto ao prazo para oposição de embargos de declaração, estabelecendo expressamente que ele é de cinco dias (art. 897-A). Ademais, a relatora enfatizou que há incompatibilidade entre as normas do processo civil e as do processo do trabalho no particular, em razão da natureza alimentar do crédito trabalhista. "Daí por que não se aplica o art. 219 do CPC, que estipula a contagem dos prazos processuais em dias úteis. Nesse sentido a IN 39/2016 do TST", completou.

Com base nesses fundamentos, a Turma de julgadores não conheceu dos embargos de declaração, por intempestivos. Ao finalizar, a desembargadora lembrou ainda que foram deferidos à trabalhadora, no acórdão, os benefícios da justiça gratuita, "pelo que inexiste, no julgado, a omissão que lhe é imputada".
PJe: Processo nº 0011143-52.2015.5.03.0001 (RO). Acórdão em: 23/06/2016Para acessar a decisão, digite o número do processo em:
https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ConsultaProcessual.seam

Fonte: TRT3

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

NJ Especial: Juíza defende interpretação evolutiva do artigo 461 da CLT, conferindo maior peso à identidade de funções para equiparação salarial









Releitura do artigo 461/CLT deve ser feita à luz da Constituição e de Tratados Internacionais 



No dia 1º de julho de 2016, a juíza Martha Halfeld Furtado de Mendonça Schmidt, titular da 3ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora-MG, tomou posse no cargo de juíza do Tribunal de Apelações das Nações Unidas (UNAT), em Nova York, Estados Unidos. O órgão tem por atribuição julgar, em segunda instância, causas trabalhistas e administrativas envolvendo funcionários e colaboradores da Organização. A magistrada é a primeira brasileira a ocupar esse cargo e foi eleita com a maior votação pela Assembleia Geral da ONU, em novembro/2015, para mandato no período 2016-2023, após ter sido selecionada pelo Conselho de Justiça Interno da ONU.


Profunda conhecedora de matérias que envolvem direito e tratados internacionais, a juíza, em recente atuação como convocada na 4ª Turma do TRT de Minas, teve oportunidade de julgar um recurso envolvendo o tema da equiparação salarial. Na minuciosa decisão proferida, propôs uma nova abordagem jurisprudencial, levando em conta não apenas a norma infraconstitucional, mas também a adoção das perspectivas constitucional e internacional de direitos humanos de índole trabalhista no campo de aplicação do princípio da não discriminação.


"Os rígidos critérios objetivos traçados pelo artigo 461 da CLT não podem restringir a aplicação das diretrizes constitucional e internacional. Uma releitura de seu vetusto texto se impõe diante da ordem constitucional vigente", defendeu no voto em que dá uma verdadeira aula sobre o assunto.


É por essa decisão e pelas inovadoras reflexões nela lançadas que faremos uma inspiradora incursão nesta NJ especial. Acompanhe:





Entendendo o caso: equiparação entre gerentes bancários



Caso típico apreciado pela Justiça do Trabalho: Um bancário buscou a condenação da instituição financeira onde trabalhou ao pagamento de diferenças salariais, alegando que teria exercido as mesmas funções dos colegas que indica.


Baseado no conteúdo do artigo 461 da CLT, o juiz que apreciou a demanda em 1º Grau registrou que o deferimento da equiparação salarial exige prova de que os paradigmas e o reclamante desenvolveram as mesmas funções, com a mesma produtividade e perfeição técnica, na mesma localidade (município ou região metropolitana), com diferença de realização da função na mesma empresa de, no máximo, 2 anos. Ressaltou que o ônus da prova seria do autor, por se tratar de fato constitutivo do direito.


Mas, após analisar as provas, julgou improcedente a pretensão. Um dos fundamentos apontados na sentença foi o fato de a instrução processual, no entender do julgador, ter revelado que existiam diversos empregados do banco que exerciam o cargo de gerente de pessoas de alta renda. De acordo com o juiz sentenciante, cada gerente tinha suas particularidades, em especial carteira de cliente diferenciada, o que acabava por gerar salários diferenciados. A conclusão final alcançada foi a de que a identidade de funções necessária ao reconhecimento da pretensão não teria ficado provada nos autos.


Recurso - Inconformado, o reclamante recorreu ao TRT-MG e a 4ª Turma reformou a decisão. Atuando como relatora, a juíza convocada Martha Halfeld procedeu a exame minucioso das provas, indicando no voto as razões de sua discordância com o posicionamento de 1º Grau.


Para ela, "a identidade funcional de âmago" entre os equiparandos ficou provada, o que garante ao trabalhador o direito às diferenças salariais almejadas. Conforme apurado, basicamente, ele e os modelos atendiam a clientes do banco, ainda que a atuação ocorresse em plataformas nominalmente distintas. As atribuições ou atividades substanciais exercidas eram as mesmas.


O fato de o banco distinguir o perfil dos clientes atendidos quanto às aplicações financeiras ofertadas e à taxa de rentabilidade não foi considerado, por si só, capaz de afastar realidade constatada e demonstrar a diferença de funções exercidas. Mesmo porque as testemunhas nada informaram sobre a necessidade de treinamento específico ou diferenciado para os gerentes de segmentos diversos. No modo de entender da relatora, o reclamado não conseguiu provar eventuais diferenças de produtividade ou perfeição técnica entre os equiparandos.


Acompanhando o enfoque dado ao tema, a Turma de julgadores, por maioria de votos, deu provimento parcial ao recurso, para condenar o banco réu ao pagamento de diferenças salariais e reflexos pretendidos pelo reclamante, tudo conforme explicitado na decisão.

Fundamentos: convenções internacionais e convite à releitura do art. 461 da CLT



"A equiparação salarial impõe-se como justa medida da isonomia correspondente consagrada em nosso ordenamento jurídico e que visa a remunerar com igual salário os empregados que executam um conjunto de tarefas e misteres inerentes a uma mesma função, desempenhada em benefício do mesmo empregador, na mesma localidade". Assim a juíza iniciou o voto no qual conclama sobre a necessidade de um novo enfoque jurisprudencial a respeito do tema. Sigamos o raciocínio:

Convenções internacionais - histórico e análise da relatora



Na decisão, a magistrada teceu considerações a respeito das convenções internacionais do trabalho e o contexto em que surgiram. Nesse sentido, ensinou que, a partir da constituição da OIT em 1919, no final da 1ª Guerra Mundial, elas tinham por objetivo estabelecer o equilíbrio assegurador da paz universal e durável, por meio da melhoria da condição social do ser humano.


Em matéria de isonomia, destacou vigorarem algumas convenções no plano jurídico internacional. Baseadas no princípio da igualdade de remuneração para um trabalho de igual valor, têm por objetivo a equiparação salarial. Para atingir essa equiparação salarial, explicou que é preciso, segundo o direito internacional do trabalho, assegurar igual remuneração para empregos idênticos ou similares e para empregos que não sejam idênticos ou similares, mas cujo valor do trabalho é igual.


Trabalho de igual valor. De acordo com a juíza, aqui está o grande salto em relação à atual redação do artigo 461 da CLT.


Ela explicou que a Convenção 100 da OIT versa sobre Igualdade de Remuneração de Homens e Mulheres Trabalhadores por Trabalho de Igual Valor. Aprovada logo após o término da Primeira Guerra Mundial, teve o contexto do trabalho desenvolvido pelas mulheres durante o conflito. A igualdade de remuneração entre homens e mulheres, segundo observou, é considerada uma das primeiras etapas do processo de instauração de melhor equidade na sociedade. Mais de 60 anos após sua adoção pela comunidade internacional, ainda hoje é considerada importante instrumento de inspiração e de repercussão do princípio da igualdade de tratamento no mundo.


Em 1958, prosseguiu a julgadora, foi adotada a mais ampla Convenção 111 da OIT, que trata da Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação. Em seu artigo 1º, a e b, compreende no termo discriminação, respectivamente, toda distinção, exclusão ou preferência fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidade ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão e qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou tratamento em matéria de emprego ou profissão que poderá ser especificada pelo Membro interessado depois de consultadas as organizações representativas de empregadores e trabalhadores, quando estas existam, e outros organismos adequados.


A juíza atenta para o fato de não haver números clausus. A enumeração é exemplificativa, diante da cláusula aberta a toda e qualquer outra distinção, exclusão ou preferência. Ela explica que mais de 90% dos Estados membros da OIT ratificaram essas duas convenções fundamentais, o que demonstra o grande nível de aceitação e de quase consenso sobre os valores sociais e humanos que delas emanam.


Pondera, ainda, que estas duas convenções são consideradas fundamentais pela Declaração da OIT de 1998, relativa aos principais direitos fundamentais no trabalho, dentre os quais se encontra a eliminação da discriminação em matéria de emprego e de profissão. A Declaração de 2008 sobre a justiça social para uma mundialização equitativa afirma que a igualdade entre homens e mulheres e a não discriminação devem ser consideradas como questões transversais na agenda do Trabalho Decente da OIT.


Igualmente a Convenção 168 da OIT, "Promoção do Emprego e Proteção Contra o Desemprego". No art. 6º, estabelece: "1. Todo Membro deverá garantir a igualdade de tratamento para todas as pessoas protegidas, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, religião, opinião pública, ascendência nacional, nacionalidade, origem étnica ou social, invalidez ou idade".


Segundo a julgadora, a interpretação dos órgãos de controle da OIT tem considerado que cabe remuneração quando há exercício de mesmo trabalho ou trabalho idêntico. Mas também quando os equiparandos realizam trabalho que, mesmo sendo diferentes, são de igual valor.


Exemplo da Irlanda - A decisão relata que a Comissão de Peritos examinou o exemplo da Irlanda, onde o âmbito da noção de trabalho similar foi definido como abrangendo desde o mesmo trabalho ao trabalho de mesmo valor, levando-se em conta o que for preciso em áreas tais como aptidões, esforço físico ou mental, responsabilidade e condições de trabalho.


A juíza avalia que garantias como essas, em alguns casos, têm sofrido retrocesso no ordenamento jurídico pátrio. Um exemplo é justamente a rígida interpretação que vem sendo conferida ao artigo 461 da CLT, se considerado em sua literalidade.

Direito internacional e ordenamento jurídico interno - Constituição de 1988



Para a julgadora, é preciso indagar a respeito do lugar do direito internacional no ordenamento jurídico interno. No aspecto, trouxe os seguintes dados:


A evolução da internalização do direito internacional dos direitos humanos revela que, até 1977, a tradição jurisprudencial no Supremo Tribunal Federal era de preponderância do direito internacional sobre o direito interno.


De 1977 até 2008, manteve-se o reconhecimento do status de lei ordinária aos tratados e convenções internacionais ratificados pelo Brasil e prevalência da Constituição sobre os tratados ratificados.


Ocorre que, com o advento da ordem constitucional de 1988, as instituições políticas passaram a ter novos desenhos, o que revelou a necessidade de novos posicionamentos acerca de alguns temas jurídicos, mais adequados aos novos paradigmas constitucionais. E, de fato, a Constituição da República de 1988 elegeu como princípios fundamentais da nova ordem jurídica a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III); a prevalência dos direitos humanos (artigo 4º, II).


O artigo. 5º, parágrafo 1º, da Constituição Brasileira de 1988, dispõe que os direitos e garantias fundamentais têm aplicabilidade imediata, vinculando os poderes públicos independentemente do reconhecimento expresso por lei infraconstitucional.


Por sua vez, o artigo 5º, parágrafo 2º, da Constituição estabelece que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.


Coroando esse processo, a Emenda Constitucional nº 45 de 2004 acrescentou o parágrafo 3º ao art. 5º, o qual dispõe que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Leading case - Recurso Extraordinário 466.343-1 - Supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos ratificados antes da EC nº 45/2004



No voto, a juíza chama a atenção para a importante modificação de jurisprudência de nossa Corte Constitucional, havida em 2008. O "leading case" foi o Recurso Extraordinário 466.343-1. Nele, houve profunda reflexão acerca da necessidade de reconhecimento de lugar privilegiado na hierarquia das normas aos tratados de direitos humanos ratificados antes da Emenda Constitucional nº 45/2004, que incorporou o § 3º ao art. 5º da Constituição da República.


A tese então prevalecente, foi a da supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos ratificados até a introdução do quórum qualificado do parágrafo 3º do art. 5º da Constituição.


Todavia, importante voto da lavra do Ministro Celso de Mello pregava a equiparação desses tratados à norma constitucional. Para chegar a essa conclusão, explicou a juíza que o Ministro se valeu da noção de bloco de constitucionalidade, para concluir que, mesmo não sendo formalmente constitucionais (porque inexistente o quórum qualificado de que trata o par. 3º do art. 5º da CF), esses tratados revestem-se de caráter materialmente constitucional.

Posicionamento da relatora: poder-dever do juiz de controlar a conformidade das leis aos tratados ratificados, em autêntico exercício de controle de convencionalidade.



No ponto de vista da juíza, não sendo possível a divisão dos tratados de direitos humanos em dois níveis hierárquicos (constitucional e supralegal), a concepção mais adequada é a que os reconhece como materialmente constitucionais, independentemente dos critérios formais de ratificação.


"A concepção de bloco de constitucionalidade é salvo-conduto para essa conclusão, na medida em que concebe o texto constitucional não somente como aquele objetivado na Constituição escrita, mas também abrange os textos que visam adicionar, expandir, complementar e integrar os parâmetros normativos fixados na própria Constituição, como é o caso dos tratados internacionais de direitos humanos até aqui conhecidos", avalia.


Para ela, ainda que se outorgue a esses tratados o valor apenas supralegal, uma consequência ressalta: o poder-dever do juiz de controlar a conformidade das leis aos tratados ratificados, em autêntico exercício de controle de convencionalidade. Isso significa que um jurisdicionado pode contestar perante o juiz a aplicação de uma lei por afronta a uma convenção internacional. Como no controle de constitucionalidade difuso, trata-se de uma aferição a posteriori e concreta, cujos efeitos somente serão sentidos inter partes.


"O controle de convencionalidade, com assento constitucional, constitui, pois, grande inovação na aplicação dos direitos fundamentais no âmbito do direito privado, em especial no campo da isonomia salarial", esclarece.

Evolução constitucional no tema da isonomia salarial



Após relembrar a evolução do direito internacional do trabalho e sua aplicação nacional, a juíza lança um desafio necessário: a evolução constitucional no tema da isonomia salarial.


Ela destaca que o princípio da isonomia consagrado constitucionalmente é densificado em regras específicas, as quais, no tocante às questões salariais, encontram nas figuras da equiparação salarial e do salário equitativo alguns de seus prismas.


A partir da Constituição de 1934, os direitos sociais do homem (decorrentes do direito natural) foram progressivamente inseridos no texto constitucional brasileiro, convertendo-se em direitos fundamentais, juridicamente institucionalizados em direito vigente.






O direito à igualdade salarial é contemplado desde então.


A Carta de 1934 assim regulou a questão:


Art. 121 - A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País. § 1º - A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar as condições do trabalhador: a) proibição de diferença de salário para um mesmo trabalho, por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil.


Princípio ignorado na Carta de 1937, foi parcialmente reinserido em 1946, em conformidade com o disposto no inciso II do artigo 157: Art. 157 - A legislação do trabalho e a da previdência social obedecerão aos seguintes preceitos, além de outros que visem a melhoria da condição dos trabalhadores: (...) II - proibição de diferença de salário para um mesmo trabalho por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil. Em comparação ao artigo 121 da Carta de 1934, suprimiu-se o caput do artigo, o que poderia ser interpretado como retrocesso.


Quanto à isonomia de salários, pontuou a Constituição de 1967, mas somente após a edição da Emenda Constitucional nº 1, de 1969, a teor do artigo 165: A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos têrmos da lei, visem à melhoria de sua condição social: III - proibição de diferença de salários e de critérios de admissões por motivo de sexo, côr e estado civil.


Já a Constituição Federal de 1988 trouxe expressivas e contundentes mudanças, mas, no entender da magistrada, apresenta timidez diante do texto da Convenção 111 da OIT, que ostenta maior amplitude, diante da cláusula de redação aberta pela enumeração meramente exemplificativa.


Especificamente quanto ao princípio da isonomia, a CF/88 inseriu a proibição não apenas de diferença de salários, mas de exercício de funções, a exemplo do disposto no artigo 7º, XXX: proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.


A juíza destaca o fato de o legislador constituinte ter utilizado a conjunção coordenativa "e", aditiva, ligando duas orações independentes e estabelecendo uma relação de soma, adição; inexistindo alternância, mediante o emprego de conjunção alternativa, como "ou". "Ora, os rígidos critérios objetivos traçados pelo artigo 461 da CLT não podem restringir a aplicação das diretrizes constitucional e internacional. Uma releitura de seu vetusto texto se impõe diante da ordem constitucional vigente", conclama na decisão.

Função: feixe peculiar de atribuições incumbidas ao empregado



Ainda conforme expôs a julgadora, a função é definida de acordo com o feixe peculiar de atribuições incumbidas ao empregado, que concretamente demandam, na dinâmica da prestação de serviços, a execução de atividades necessárias ao desempenho da responsabilidade inerente ao cargo.


"Ainda que considerada a plena vigência do artigo 461 da CLT, é preciso abrir sua interpretação", adverte. Para que se verifique identidade funcional entre dois empregados, no seu entender, há que se perquirir se desempenham as mesmas atribuições, ainda que se identifiquem variações no contexto, na forma ou no objeto das atividades realizadas.


O raciocínio adotado é de que os parâmetros definidos no artigo 461 da CLT, para aferição do trabalho de igual valor, inclusive os requisitos temporal e espacial, devem ser sopesados diante da análise do caso concreto. Para a magistrada, não há como se admitir sua aplicação de forma inflexível, sob pena de esvaziar o sentido igualitário privilegiado pela norma.

Caminho sugerido: Presunção apenas relativa quanto a trabalho de igual valor



Diante desse contexto, a relatora propõe a perspectiva de visão de que a CLT define uma presunção de ordem apenas relativa quando estabelece que trabalho de igual valor seria aquele desempenhado entre pessoas, com igual produtividade e perfeição técnica, que trabalham na mesma localidade e cuja diferença de tempo de serviço não seja superior a dois anos.


Segundo a abordagem, a isonomia constitucionalmente prevista e a decorrente dos ordenamentos internacionais ratificados deve se pautar no trabalho de igual valor. Não necessariamente, em coro com a limitação expressa no plano infraconstitucional, na identidade de funções (caput do artigo 461 da CLT). E independentemente de eventual diferença de dois anos no exercício e da existência de plano de cargos e salários, os quais devem ser considerados como parâmetros a serem avaliados diante do caso concreto.


"A isonomia tem, pois, como norte o trabalho humano digno", frisou no voto, explicando que o trabalho compreende uma gama diversa de atribuições e funções, com variantes que vão desde o desenvolvimento de atividades braçais até o trabalho remoto, sem qualquer necessidade de comparecimento às dependências do empregador."O trabalho, em seu largo conceito, e até mesmo o exercício de específica e determinada função, pode ou não ser desenvolvido em uma mesma localidade, sem que isso influencie a sua identidade", pontua.


Como exemplos, destaca atividades altamente intelectuais - que sequer dependem de metas e diretrizes específicas próprias que imponham às empresas atuação mais direta na forma de execução do trabalho - mais e mais praticadas em sistemas de home office, em voga na cultura globalizada de hoje.


Fazendo referência ao teor do art. 6º da CLT, a magistrada lembra que "Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego - com o conceito de mesma localidade inserido no caput do art. 461, do mesmo diploma normativo". E, em seguida, traz a seguinte reflexão:


"Como inserir as vetustas restrições expressas no art. 461 Consolidado (idêntica função, mesma localidade), na cultura globalizada que hoje se vivencia, é tarefa que, mais cedo ou mais tarde, todos os operadores de Direito haverão de enfrentar".


Na avaliação da magistrada, como priorizado desde a Carta de 1934, deve-se vedar a discriminação e garantir a igualdade, por meio da leitura teleológica e evolutiva dos conceitos que se inserem no artigo 461 Consolidado e no texto Constitucional inscrito no artigo 7º, caput e XXX, como também preceituado no artigo 5º da CLT: A todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual, sem distinção de sexo.


Conclusão - Um novo olhar sobre o artigo 461 da CLT: interpretação ampliativa.


A julgadora entende que devem ser sopesados os rígidos critérios do artigo 461 da CLT, a exemplo da diferença na função superior a dois anos ou a mesma localidade, diante do caso concreto, já que não mais têm o condão de afastar a isonomia quando provada a identidade funcional.


Vale registrar mais um trecho da decisão, em que a magistrada fundamenta esse entendimento:


"O raciocínio que prega a interpretação evolutiva da lei infraconstitucional cuida, antes de tudo, de reconhecimento da superioridade da Constituição e dos tratados internacionais reconhecedores de direitos humanos fundamentais no trabalho, em face da rigidez infraconstitucional, que, por sua vez, se submete a mutações legislativas, com alteração do significado, do alcance e do sentido de suas regras, sempre dentro dos limites da Constituição.


Essa autorização interpretativa dos Magistrados, oriunda do pós-positivismo, constitui, na realidade, reconhecimento do caráter evolutivo e dinâmico do Direito, que não está perfeito e acabado, mas deve sempre interagir com a realidade e com os fatos sociais.


Cuida-se, no dizer de renomados doutrinadores, de eficácia horizontal dos direitos fundamentais sociais, a qual autoriza concluir pela aplicação direta e imediata dos dispositivos constitucionais que os instituem, sempre com o objetivo de assegurar a máxima efetividade possível para os direitos fundamentais".


No voto, a julgadora refere-se aos juristas Luís Roberto Barroso e Ana Paula de Barcellos, para quem o discurso acerca dos princípios, da supremacia dos direitos fundamentais e do reencontro com a Ética - ao qual, no Brasil, se deve agregar o da transformação social e o da emancipação - deve ter repercussão sobre o ofício dos juízes, advogados e promotores, sobre a atuação do Poder Público em geral e sobre a vida das pessoas.


Trata-se, conforme observa, de transpor a fronteira da reflexão filosófica, ingressar na dogmática jurídica e na prática jurisprudencial e, indo mais além, produzir efeitos positivos sobre a realidade.

Ausência de violação ao princípio da reserva de plenário



A juíza considera não haver nessa atividade de interpretação ampliativa, violação ao princípio da reserva de plenário, conforme já decidiu o STF: "Controle incidente de inconstitucionalidade: reserva de plenário (CF, art. 97). Interpretação que restringe a aplicação de uma norma a alguns casos, mantendo-a com relação a outros, não se identifica com a declaração de inconstitucionalidade da norma que é a que se refere o art. 97 da Constituição. (cf. RE 184.093, Moreira Alves, DJ de 5-9-1997)."


Da mesma forma, o órgão fracionário teria até mesmo competência para estabelecer se a Constituição recepcionou ou não lei anterior à sua promulgação, no caso, eventual declaração de não recepção do artigo 461 da CLT, por restrição à norma constitucional mais abrangente. Nesse caso, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a questão se resolve no plano intertemporal e não no da validade da norma.


"A interpretação ampliativa da regra inserida no art. 461 da CLT parece ser, pois, a solução que melhor atende aos valores positivados nas normas princípio da Constituição e à necessidade de concretizar, com a maior efetividade possível, o direito à igualdade de tratamento contido no art. 5º da CLT (A todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual (...), assim como o direito fundamental à isonomia inscrito no inciso XXX, do art. 7º da Lei Maior (proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil) e nas Convenções Internacionais 100 e 111 da OIT, ratificadas pelo Brasil e consideradas fundamentais por aquele órgão das Nações Unidas (Declaração de 1998), além de manifestar aderência à vedação do retrocesso social (art. 7º, caput) e à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) ",fundamenta.


Sob o enfoque adotado, ainda que aplicada a literalidade do artigo 461 da CLT, os requisitos da isonomia salarial seriam: identidade funcional; identidade de empregador; identidade de localidade de exercício das funções e simultaneidade nesse exercício. Cabe a quem faz o pedido provar a presença desses requisitos, por constitutivos do direito vindicado, cumprindo ao réu a prova dos fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do pleito equiparatório, quais sejam: diferença de produtividade e perfeição técnica; diferença de tempo no exercício da função superior a dois anos; labor em localidades diferentes; e existência de quadro de carreira.


Ao final, a julgadora invoca o conceito da eterna Professora Alice Monteiro de Barros, para quem a identidade é relativa e não se descaracteriza se houver no exercício da função. Ou seja, no conjunto de atos e operações realizadas, pluralidade de atribuições afins entre os empregados, o que, aliás, traduz imposição do sistema racional de trabalho na empresa moderna. O importante é que as operações substanciais sejam idênticas. (Curso de Direito do Trabalho, LTr, 2009, p. 831).


Após defender seu ponto de vista, a julgadora foi acompanhada pela Turma julgadora, por maioria de votos, que declarou a equiparação salarial do reclamante com os paradigmas e condenou o reclamado ao pagamento das diferenças salariais daí decorrentes, tudo conforme explicitado na decisão, que também determinou a integração e reflexos nas parcelas discriminadas.


O assunto também é tratado em artigo da lavra da juíza Martha Halfeld Furtado de Mendonça Schmidt publicado na Revista LTr de fevereiro de 2015.

RO - 00216-2015-111-03-00-5 - Data: 22 de junho de 2016








Fonte: TRT3 

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...