quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Pai de sócia que integrava sociedade de forma oculta responderá pela execução







*Publicada originalmente em 24/10/2014 



Com base no voto do juiz convocado Paulo Maurício Ribeiro Pires, a 8ª Turma do TRT de Minas determinou que o pai da sócia de uma empresa de montagens industriais e serviços responda pela execução movida por um ex-empregado. É que ficou comprovado que ele integra a sociedade de forma oculta, em nítida fraude contra credores.

O juiz de 1º Grau havia indeferido o pedido de inclusão do pai da sócia, ao fundamento de que o nome dele não consta do quadro societário da executada e não foi incluído no polo passivo da demanda na fase de conhecimento. No entanto, o ex-empregado recorreu e conseguiu modificar a decisão. O exame das provas pelo relator revelou que o pai sempre esteve por trás do negócio e era ele quem conduzia o empreendimento, apesar de seu nome não aparecer na sociedade.

O primeiro aspecto que chamou a atenção do juiz convocado foi o fato de a filha, sócia majoritária da sociedade, contar com apenas 18 anos quando a ação foi ajuizada. O outro sócio era tio dela e faleceu em 2010. Além disso, o julgador notou que o pai da sócia foi apresentado na defesa como representante legal da empregadora. E mais: uma certidão mencionou o nome do pai como sócio da executada e ele também constou do contrato de prestação de serviços firmado entre a reclamada e outra empresa.

Diante desse contexto, o magistrado não teve dúvidas em reconhecer a fraude contra credores, dando provimento ao recurso para determinar que a execução corra também contra o sócio oculto identificado. O relator lembrou que a verba trabalhista possui caráter alimentar, exigindo celeridade no cumprimento da execução. Principalmente no caso analisado, em que a execução se iniciou em janeiro de 2012 e tem sido evitada a todo custo pelos executados.( 0002004-26.2011.5.03.0063 AP )
Fonte: TRT3

Julgamento de ADIs pelo Supremo promove centralização federativa







Não é novidade para ninguém que a federação brasileira se revela altamente centralizada, chegando às raias do federalismo meramente nominal. De um lado, isso se deve à engenharia constitucional no tocante à distribuição de competências (vide artigos 21 a 24 da Constituição de 1988) e, de outro, à contundente atuação do Superior Tribunal Federal ao exercer o controle de constitucionalidade de lei ou ato federal e estadual, especialmente o controle concentrado[1].

É o que mostram duas pesquisas realizadas em grupos diferentes e sem prévio contato, sendo uma elaborada por professores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e outra por docentes da Universidade de Brasília (UnB).

No estudo de Tomio e Robl Filho[2] são levantadas algumas hipóteses para se verificar se o STF tem ou não poder de veto no processo decisório legislativo.

O propósito é justamente verificar se o STF tem uma tendência maior a declarar inconstitucional uma norma emitida pela União ou pelos Estados. Isso influi diretamente na criação normativa determinada pela organização de competências no Brasil.

No levantamento realizado no período entre 1988 e 2012, Tomio e Robl Filho detectaram uma maior incidência no número de leis estaduais sujeitas ao controle por via de ADI do que leis federais. De um total de 4.751 ações desta natureza em 24 anos, 2.991 foram relativas a alguma lei ou ato normativo produzido pelos Estados, o que corresponde a 63% de todas as ações[3].

Os governadores são os legitimados que mais propõem ADIs contra leis estaduais (664), seguidos de associações (504) e o procurador-geral da República - PGR (398). São números bem diferentes e inferiores em comparação à propositura de tais ações cujo objeto sejam as leis federais, respectivamente 28, 331 e 117.

Além do número de ADIs propostas, verifica-se que 36% das que questionam a constitucionalidade no processo decisório estadual foram julgadas a favor do requerente, sendo que 23% foram totalmente procedentes. É um número mais que três vezes maior que os 11% de decisões favoráveis ao requerente em ADIs cujo objeto era uma lei federal.

Em comparação aos legitimados, os governadores, além de serem os que mais propõem ações, são os que têm a maior percentagem de sucesso (34%) e “utilizam, principalmente, como fundamentação constitucional às ADIs os artigos da CF 88 que tratam da distribuição de competências legislativas: artigo 61, parágrafo 1º, competências privativas do Executivo; artigo 22, competências privativas da União”[4]. Esse percentual é seguido proximamente pelo Procurador-Geral da República (30%), pelas Assembleias Legislativas e pela OAB (22%). 

Tais dados podem levar a uma prévia conclusão: os governadores utilizam a ADI como instrumento de derrubar leis aprovadas pelas Assembleias Legislativas de seus Estados – provavelmente pela ausência de apoio político ou da maioria da Casa ser de oposição ao governo – e também para impedir determinadas normas emitidas por outras unidades federativas.

Em razão disso, a propositura dessas ADIs pelos governadores é uma forma de interferir por meios processuais naquilo que deveria ser um debate político, seja entre Casa Legislativa e Governo Estadual, seja entre estados que fazem leis para seu benefício e que algumas vezes podem gerar efeitos negativos em outros (umas das razões que leva à chamada guerra fiscal). Isso pode ser reforçado pelo alto número de procedências de tais ações propostas pelas Assembleias, que podem usar o meio processual também como forma derrubar decisões políticas dos governadores oposicionistas.

Além do STF ter o poder de legislador negativo, pelo que os dados apresentam, há uma significativa interferência no processo legiferante estadual (ainda que em momento posterior), devido à percentagem de ações que são decididas a favor do requerente.

A propositura das ADIs com tal finalidade é mais uma forma institucional de alimentar a judicialização da política, uma vez que transfere para o STF um encargo de dar a última palavra sobre uma decisão de cunho político. É claramente uma forma do uso de um importante instrumento de estabilização constitucional – e diga-se, essencial a qualquer Estado de Direito – com finalidades que não sejam apenas de contestar sua constitucionalidade, mas sim de vencer pela via do direito uma batalha já perdida na política.

Alexandre Araújo Costa e Juliano Zaiden Benvindo, autores de outra pesquisa com objetivo semelhante[5], possuem uma posição bem realista a respeito do interesse de algum legitimado mover uma ADI: “este sistema somente pode ser movido quando há um interesse concreto dos agentes legitimados para invocar essa forma de controle. Mover uma ADI é uma opção política, e não uma necessidade lógico-jurídica.”[6].

Devido à organização federativa peculiar do Brasil, o uso da ADI para tais fins pelos governadores aumenta a dependência que os Estados têm da União, uma vez que, por de ser um órgão do judiciário nacional a dar a última palavra sobre uma lei estadual, o grau de autonomia diminui drasticamente.

Certamente essa situação acaba contribuindo para reforçar a inter-relação de dependência jurídica, política e econômica dos Estados-Membros. Esse problema é, ao mesmo tempo, uma das grandes consequências centralizadoras e uma causa centralizadora: distribuição desigual das competências administrativas/legislativas, além do caráter exclusivo/privativo da União na maioria delas.

Nesse contexto, as pesquisas deixam claro que a ADI foi largamente usada para fins de reafirmar a centralização causada pela distribuição das competências. Ao intervir como ator de veto nos processos legislativos com grande participação diretamente no âmbito estadual, o Supremo Tribunal se torna fiador da concentração dos poderes nas mãos do Governo Central.

[1]Tratei do tema de maneira mais profunda no seguinte artigo, escrito em co-autoria com o doutorando Leonam Baesso Liziero:MARRAFON, Marco Aurélio. LIZIERO, Leonam Baesso da Silva. Competencias constitucionais da Uniãoo e Supremo Tribunal Federal: fiadores da centralização no federalismo brasileiro. In: Octavio Campos Fischer; Scheila Barbosa dos Santos. (Org.). Federalismo fiscal e democracia. 1ed.Curitiba: Instituto Memória, 2014, v. , p. 26-47.
[2]TOMIO, Fabricio Ricardo de Limas; ROBL FILHO, Ilton Norberto. Empirical Legal Research: Teoria e Metodologia para a Abordagem do Processo Decisório de Controle de Constitucionalidade no STF. In: SIQUEIRA, Gustavo Silveira; VESTENA, Carolina Alves. Direito e Experiências Jurídicas.Vol.2: Debates Práticos. Belo Horizonte: Arraes, 2013, pp. 96-117.
[3]Ibidem, p. 109.
[4]TOMIO, Fabricio Ricardo de Limas; ROBL FILHO, Ilton Norberto. Empirical... Op. cit, p. 114.
[5] COSTA, Alexandre Araújo; BENVINDO, Juliano Zaiden,(orgs.). A Quem Interessa o Controle Concentrado de Constitucionalidade? O Descompasso entre Teoria e Prática na Defesa dos Direitos Fundamentais. Disponível neste link (Relatório) e neste link (Gráficos). Acesso em setembro de 2014.
[6]Ibidem, p. 18


Marco Aurélio Marrafon é presidente da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst), professor de Direito e Pensamento Político na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).



Revista Consultor Jurídico, 27 de janeiro de 2015, 21h11

Desconsideração de pessoa jurídica com base no Código Civil exige prova de abuso



A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – que reúne as duas turmas de julgamento especializadas em direito privado – superou a divergência que havia na corte a respeito dos requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica e definiu que esse instituto, quando sua aplicação decorre do artigo 50 do Código Civil, exige a comprovação de desvio de finalidade da empresa ou confusão patrimonial entre sociedade e sócios.

Para o colegiado, o simples encerramento irregular das atividades – quando a empresa é fechada sem baixa na Junta Comercial ou deixando dívidas na praça – não é suficiente para autorizar a desconsideração e o redirecionamento da execução contra o patrimônio pessoal dos sócios.

A decisão foi tomada no julgamento de embargos de divergência opostos pela Comércio de Carnes Vale Verde Ltda. e seus sócios contra acórdão da Terceira Turma do STJ que determinou a desconsideração da personalidade jurídica da empresa em execução movida pela massa falida do Frigorífico Rost S⁄A.

De acordo com a relatora do caso na Segunda Seção, ministra Isabel Gallotti, a desconsideração só é admissível em situações especiais, quando verificado o abuso da pessoa jurídica, seja por excesso de mandato, desvio de finalidade da empresa ou confusão patrimonial entre a sociedade e os sócios.

Sem má-fé

No curso da execução, foi requerida a despersonalização da empresa devedora para que os sócios respondessem pelas dívidas com seus bens particulares. O juiz determinou a medida, tendo em vista que a devedora havia encerrado suas atividades de forma irregular. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), porém, reverteu a decisão.

Para o TJSC, "o fato de a sociedade empresária ter encerrado suas atividades de forma irregular não é, por si só, indicativo de que tenha havido fraude ou má-fé na condução dos negócios". A ausência de bens suficientes para a satisfação das dívidas, segundo o tribunal estadual, poderia ser motivo para a falência, mas não para a desconsideração da personalidade jurídica.

A credora recorreu ao STJ, onde o relator, ministro Massami Uyeda (hoje aposentado), restabeleceu a decisão de primeiro grau ao fundamento de que a dissolução irregular é motivo bastante para a desconsideração (REsp 1.306.553). O entendimento do ministro, amparado em precedentes, foi confirmado pela Terceira Turma.

Requisitos necessários

No entanto, a questão não era pacífica no STJ. No julgamento do REsp 1.098.712, de relatoria do ministro Aldir Passarinho Junior (também aposentado), a Quarta Turma decidiu que, embora não seja necessária ação autônoma para a desconsideração, seu deferimento exige “a constatação de desvio da finalidade empresarial ou confusão patrimonial entre a sociedade e seus sócios”.

Naquele julgamento, os ministros da Quarta Turma reformaram a decisão que havia desconsiderado a personalidade jurídica da empresa devedora, entendendo que o tribunal estadual – no caso, o do Rio Grande do Sul – não avançara no exame dos requisitos necessários à medida, mas apenas apontara a ocorrência de dissolução irregular.

Com base nesse acórdão da Quarta Turma, a Comércio de Carnes Vale Verde Ltda. e seus sócios entraram com os embargos de divergência para que a Segunda Seção resolvesse a controvérsia.

Regra de exceção

Em seu voto, a ministra Isabel Gallotti afirmou que a criação teórica da pessoa jurídica serviu para o desenvolvimento da atividade econômica ao permitir que o risco do empreendedor ficasse limitado ao patrimônio destacado para esse fim.

Segundo ela, abusos no uso da empresa justificaram, em lenta evolução jurisprudencial, posteriormente incorporada ao direito positivo brasileiro, a tipificação de hipóteses em que se autoriza o afastamento da personalidade jurídica para atingir o patrimônio de sócios que dela se prevaleceram dolosamente para finalidades ilícitas.

“Tratando-se de regra de exceção, de restrição ao princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, a interpretação que melhor se coaduna com o artigo 50 do Código Civil é a que relega sua aplicação a casos extremos, em que a pessoa jurídica tenha sido instrumento para fins fraudulentos, configurado mediante o desvio da finalidade institucional ou a confusão patrimonial”, disse a relatora.

Microssistemas

Isabel Gallotti destacou que a desconsideração da personalidade jurídica está prevista não apenas no artigo 50 do Código Civil de 2002, mas também no artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, no artigo 34 da Lei 12.529/11 (que organizou o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência) e no artigo 4º da Lei 9.605/98 (que trata das sanções em caso de agressão ao meio ambiente). Também o Código Tributário Nacional, apontou a ministra, admite que a dívida fiscal da empresa seja cobrada diretamente dos sócios (artigo 134, VII).

Segundo a relatora, cada uma dessas leis estabelece requisitos específicos para que a cobrança possa ser redirecionada contra o patrimônio pessoal dos sócios, razão pela qual os pressupostos da desconsideração devem ser analisados à luz do microssistema jurídico-legislativo aplicável a cada caso.

No campo tributário, por exemplo, a Súmula 435 do STJ dispõe que “presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio gerente”.

Teoria maior

“Há, portanto, hipóteses em que os requisitos exigidos para a aplicação do instituto serão distintos, mais ou menos amplos, mais ou menos restritos, mais ou menos específicos”, disse a ministra. Quanto à execução movida pela massa falida do Frigorífico Rost, Gallotti observou que se baseia em cheques emitidos pela devedora, sem haver relação de consumo ou qualquer outra que não seja regida apenas pelo Código Civil.

De acordo com a relatora, o STJ já fixou em vários precedentes o entendimento de que a teoria da desconsideração adotada pelo Código Civil foi a chamada “teoria maior”, que exige a presença de dolo das pessoas que usam a personalidade jurídica da empresa para acobertar atos ilícitos prejudiciais aos credores. “É a intenção ilícita e fraudulenta, portanto, que autoriza, nos termos da teoria adotada pelo Código Civil, a aplicação do instituto”, disse.

“Não se quer dizer com isso que o encerramento da sociedade jamais será causa de desconsideração de sua personalidade, mas que somente o será quando sua dissolução ou inatividade irregulares tenham o fim de fraudar a lei, com o desvirtuamento da finalidade institucional ou confusão patrimonial”, concluiu a ministra.Leia aqui a íntegra do voto da relatora.
Fonte: STJ

Direito à meação em união estável só existe para bens adquiridos após a Lei 9.278




Em uniões estáveis iniciadas antes da Lei 9.278/96, mas dissolvidas já na sua vigência, a presunção do esforço comum – e, portanto, o direito à meação – limita-se aos bens adquiridos onerosamente após a entrada em vigor da lei.

Esse foi o entendimento majoritário da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu questão controvertida nas duas turmas que compõem o colegiado ao julgar recurso sobre partilha de bens em união estável iniciada em 1985 e dissolvida em 1997.

O recorrente se insurgiu contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que reconheceu o direito à meação do patrimônio reunido pelos companheiros nos moldes da Lei 9.278, incluídos todos os bens, inclusive os que foram adquiridos antes da edição da lei. O TJMG considerou a presunção legal do esforço comum.

Segundo o recorrente, a decisão do tribunal mineiro desrespeitou o direito adquirido e o ato jurídico perfeito por ter atingido os bens anteriores à lei, que seriam regidos por outra legislação.

A ministra Isabel Gallotti, cujo voto foi vencedor no colegiado, afirmou que se houve ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, isso não decorreu do texto da Lei 9.278, mas da interpretação do TJMG acerca dos conceitos legais de direito adquirido e de ato jurídico perfeito – presentes no artigo 6º da Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) –, “ensejadora da aplicação de lei nova (Lei 9.278) à situação jurídica já constituída quando de sua edição”.

Sociedade de fato

A ministra explicou que até a entrada em vigor da Constituição de 1988, as relações patrimoniais entre pessoas não casadas eram regidas por “regras do direito civil estranhas ao direito de família”.

De acordo com Gallotti, o entendimento jurisprudencial sobre a matéria estava consolidado na Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal (STF). O dispositivo diz que, comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.

A ministra lembrou que a partilha do patrimônio se dava não como reconhecimento de direito proveniente da convivência familiar, mas de contrato informal de sociedade civil, cujos frutos eram resultado de contribuição direta dos conviventes por meio de trabalho ou dinheiro.

Segundo Gallotti, com a Constituição de 1988, os litígios envolvendo as relações entre os conviventes passaram a ser da competência das varas de família.

Evolução

Ao traçar um histórico evolutivo das leis, a ministra reconheceu que antes de ser publicada a Lei 9.278, não se cogitava presunção legal de esforço comum para efeito de partilha igualitária de patrimônio entre os conviventes.

A partilha de bens ao término da união estável dava-se “mediante a comprovação e na proporção respectiva do esforço de cada companheiro para a formação do patrimônio amealhado durante a convivência”, afirmou.

Segundo Gallotti, com a edição da lei, foi estabelecida a presunção legal relativa de comunhão dos bens adquiridos a título oneroso durante a união estável.

Aquisição anterior

Entretanto, essa presunção não existe “se a aquisição se der com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união”, acrescentou a ministra.

Ela explicou que, com a edição da Lei 9.278, “os bens a partir de então adquiridos por pessoas em união estável passaram a pertencer a ambos em meação, salvo se houvesse estipulação em sentido contrário ou se a aquisição patrimonial decorresse do produto de bens anteriores ao início da união”.

Segundo Gallotti, a partilha dos bens adquiridos antes da lei é disciplinada pelo ordenamento jurídico vigente quando se deu a aquisição, ou seja, com base na Súmula 380 do STF.

A ministra afirmou que a aquisição da propriedade acontece no momento em que se aperfeiçoam os requisitos legais para tanto, e por isso sua titularidade “não pode ser alterada por lei posterior, em prejuízo do direito adquirido e do ato jurídico perfeito”, conforme o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição e o artigo 6º da LICC.

Expropriação

Isabel Gallotti disse que a partilha de bens, seja em razão do término do relacionamento em vida, seja em decorrência de morte do companheiro ou cônjuge, “deve observar o regime de bens e o ordenamento jurídico vigente ao tempo da aquisição de cada bem a partilhar”.

De acordo com a ministra, a aplicação da lei vigente ao término do relacionamento a todo o período de união implicaria “expropriação do patrimônio adquirido segundo a disciplina da lei anterior, em manifesta ofensa ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, além de causar insegurança jurídica, podendo atingir até mesmo terceiros”.

Por isso, a Seção determinou que a presunção do esforço comum e do direito à meação limitam-se aos bens adquiridos onerosamente após a vigência da Lei 9.278.

Quanto ao período anterior, “a partilha deverá ser norteada pela súmula do STF, mas, sobretudo, pela jurisprudência deste tribunal, que admite também como esforço indireto todas as formas de colaboração dos companheiros, mas que não assegura direito à partilha de 50%, salvo se assim for decidido pelo juízo de acordo com a apreciação do esforço direto e indireto de cada companheiro”, afirmou Gallotti.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: STJ

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Como o Poder Judiciário presta contas à sociedade?







Está inscrito no artigo 2º da Constituição Federal que Judiciário, Legislativo e Executivo são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si.

Por integrarem a estrutura estatal e prestarem serviços públicos, devidamente remunerados pela sociedade, estão obrigados a prestar contas, não só por determinação legal, mas por questão de ética e transparência.

Em relação ao Poder Judiciário, são duas as principais formas de prestação de contas:

(i) Sobre as atividades jurisdicionais, através da disponibilização de dados estatísticos, acervos, inteiro teor das decisões (exceto nos casos de segredo de justiça), resultados sobre o cumprimento, ou não, das metas de julgamento; e,

(ii) Sobre as atividades administrativas, através da disponibilização dos atos de gestão aos órgãos de controle, interno e externo.

O artigo 37 da Constituição Federal estabelece que o Judiciário, assim como os demais órgãos da Administração Pública, é pautado pelos princípios da eficiência, da moralidade e da publicidade.

A eficiência compreende não só o cumprimento quantitativo de metas, mas também a qualidade do serviço prestado.

Neste sentido, a imposição de metas razoáveis é extremamente positiva, na medida em que orienta os juízes a priorizar o julgamento dos processos mais antigos, demonstrando à sociedade que há perspectiva de conclusão, em prazo adequado e com o uso dos meios de trabalho disponíveis. A medida não fere — e nem poderia — a independência do juiz, que é livre para formar seu convencimento, desde que devidamente fundamentado, como impõe o artigo 93 da Constituição Federal.

Além do acompanhamento da atuação jurisdicional feita pelas respectivas Corregedorias, estão sendo criadas, nos tribunais, as Ouvidorias, novo e importante canal de comunicação entre o Judiciário e a sociedade, destinado a aprimorar a prestação jurisdicional e aperfeiçoar o diálogo entre os interessados.[1]

Os próprios tribunais dão publicidade aos seus dados estatísticos, através da internet, livremente acessada por quem tiver interesse[2]. Só é possível afirmar que há efetiva transparência, se os atos praticados, nas esferas administrativa e jurisdicional, forem divulgados.

Também as atividades administrativas realizadas pelos Tribunais, aqui englobada a gestão do patrimônio, estão sujeitas à fiscalização interna e externa, na forma dos artigos 70 e 71 da Constituição Federal.

No âmbito da Justiça Federal, o Sistema de Controle Interno é integrado pelas unidades de Controle Interno do Conselho da Justiça Federal, como órgão central, pelas unidades de Controle Interno dos TRFs, como órgãos setoriais, e pelas unidades de Controle Interno das Seções Judiciárias, como unidades seccionais.[3] Estes órgãos, de atuação permanente e continuada, acompanham a execução de todos os atos administrativos relacionados à gestão de recursos orçamentários, ratificando-os ou recomendando as correções cabíveis.

O controle externo, por sua vez, é exercido pelo Tribunal de Contas da União, com periodicidade anual. A fiscalização pelo TCU é feita mediante provocação ou por iniciativa do próprio órgão, através de levantamentos, auditorias, inspeções, acompanhamentos e monitoramentos.

O TCU disponibiliza as informações que não são sigilosas na sua página da internet. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, no ícone “Transparência pública”, e a Justiça Federal de São Paulo também disponibilizam informações completas sobre a gestão do patrimônio, a execução do orçamento, os processos de contas, o relatório de gestão fiscal, os planos de auditorias e outros documentos correlatos.

A estrutura que movimenta a máquina judiciária — pessoal, orçamento e patrimônio — pode ser equiparada à de uma empresa privada e sua gestão é predominantemente técnica.

Os servidores públicos das áreas administrativas dos tribunais são extremamente qualificados em administração pública e realizam as atribuições com o maior grau de eficiência possível, sem perder de vista a atividade-fim do Judiciário.

As boas práticas devem ser destacadas e apresentadas.

Em outubro de 2014, por exemplo, o Plenário do Tribunal de Contas da União (Acórdão 2746/2014, que aprovou a Decisão Normativa 140/2014) reconheceu a excelência da atual gestão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, isentando-o, na prática, de submeter as contas de 2014 ao julgamento plenário do próprio TCU, bastando a apresentação do Relatório de Gestão.

A decisão é importante, não apenas porque inaugural na história da Corte Regional, mas por reconhecer a excelência dos novos controles implantados no início (Março/2014) da gestão da atual Presidência do TRF-3.

Para uma análise comparativa, no sistema de administração de justiça federal, os outros quatro tribunais regionais federais, o STF, o STJ, o CNJ e o CNMP, entre outros, deverão prestar contas no Plenário do TCU sobre os dados de 2014.

Há outros indicadores desenvolvidos por órgãos estranhos à estrutura do Estado, mas também direcionados à medição da eficiência do Poder Judiciário.

É o caso do Índice de Desempenho da Justiça ( IDJus), índice desenvolvido pelo Centro de Pesquisas sobre o Sistema de Justiça Brasileiro (CPJus) e construído a partir de dados oficiais do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Trata-se de um indicador sintético, inspirado no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que procura medir o grau de desenvolvimento da Justiça, possibilitando comparar a produtividade e desempenho dos Tribunais (Estaduais, Federais e do Trabalho).[4]

É um referencial significativo, na medida em que engloba as três dimensões do Judiciário, quais sejam, a gestão de processos, a gestão de recursos e a gestão orçamentária, ou seja, analisa a atuação do Judiciário como um todo.

De acordo com o último relatório apresentado em 2014, relativo ao ano de 2012, no âmbito da Justiça Federal, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região ficou em primeiro lugar; no âmbito da Justiça Estadual, o posto foi alcançado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul; na esfera trabalhista, o Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (Pará e Amapá) e o TRT da 2ª Região (São Paulo) ocuparam a primeira posição.

Resta claro desta breve exposição que todas as facetas do Judiciário estão abertas à sociedade. E que eficiência, moralidade e transparência estão sendo efetivamente perseguidas, de forma técnica e responsável.

Este é o Poder Judiciário do século XXI.



[1]No Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por exemplo, a Ouvidoria tem a função de receber, registrar e responder as reclamações, críticas, elogios, sugestões, consultas ou pedidos de informações relacionadas à prestação de serviços judiciais ou atos praticados pelas unidades integrantes da 3ª Região que lhe forem dirigidos. As informações sobre a atuação do órgão podem ser facilmente visualizadas na página principal da internet (www.trf3.jus.br), sendo também disponibilizados os canais de comunicação com o órgão (email, carta, telefone ou pessoal).


[2] Mais uma vez utilizando o Tribunal Regional Federal da 3ª Região como exemplo, são disponibilizadas em sua página da internet as estatísticas da primeira e segunda instâncias, o inteiro teor das metas estipuladas para a Justiça Federal e os resultados alcançados, a pauta das sessões de julgamento, entre outras informações.


[3] A organização do sistema de Controle Interno da Justiça Federal é regulamentada pela Resolução 85/2009 do CJF e pela Resolução 86/2009 do CNJ.


[4] As informações foram extraídas da página da internet do Centro de Pesquisas sobre o Sistema de Justiça brasileiro (http://cpjus.idp.edu.br/metodologia/).


Giselle de Amaro e França é mestre e doutoranda em Direito do Trabalho e Seguridade Social, pela Universidade de São Paulo, juíza federal titular da 6ª Vara Previdenciária/SP e ocupa o cargo de Diretora do Foro da Seção Judiciária de São Paulo.



Revista Consultor Jurídico, 25 de janeiro de 2015, 8h10

Pensão por morte não pode ser paga ao mesmo tempo à viúva e à concubina



É vedada a concessão simultânea de pensão por morte à viúva e à concubina. Isso porque, de acordo com jurisprudência dos tribunais superiores, não é possível o reconhecimento de união estável com outra pessoa na constância do casamento.

Esse foi o entendimento aplicado pela 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região ao negar pedido de pensão por morte a uma mulher que declarou ter mantido união estável com servidor público morto.

A autora alegou que durante 24 anos manteve relacionamento com o auditor fiscal do trabalho, que estaria separado de fato de sua esposa. Disse que era economicamente dependente do falecido, com quem teve um filho em 1978, reconhecido apenas em dezembro de 1988, após a nova Constituição, que passou a permitir o reconhecimento de filhos havidos fora do casamento, mesmo na constância do vínculo matrimonial, o que antes era proibido.

Após a morte do auditor fiscal, a pensão foi paga à sua mulher legal. A interessada afirma que somente veio a requerer a pensão por morte, quando a esposa morreu, porque acreditava não ter direito ao benefício por não ser casada oficialmente com o segurado.

Indagada sobre como se mantinha desde a morte do companheiro, ela respondeu que contava com a ajuda das filhas e que recebia benefício previdenciário. Ficou constatado no processo que ela recebe atualmente pensão por morte de sua filha desde 1994, aposentadoria por idade desde 2000 e pensão por morte de outro companheiro desde 2003. Antes disso, recebia pensão por morte de seu cônjuge, falecido em 1971, cessado em 2003 por acumulação indevida de benefícios.

Ao analisar o caso, a 1ª Turma do TRF-3 confirmou sentença que negou o benefício à autora da ação por verificar que, além do relacionamento com ela, o auditor manteve o casamento com outra. Na decisão, o colegiado cita jurisprudência dos tribunais superiores no sentido de que não é possível o reconhecimento de união estável com outra pessoa na constância do casamento. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-3.

Processo 2010.60.05.003519-1/MS

Revista Consultor Jurídico, 25 de janeiro de 2015, 7h00

Turma aumenta indenização concedida a porteiro que sofreu discriminação estética







O caso de um porteiro dispensado por não concordar em tirar o cavanhaque que usava há pelo menos 17 anos foi parar na Justiça do Trabalho. Sentindo-se vítima de discriminação estética, o reclamante pediu o pagamento de uma indenização por danos morais. Ao analisar o caso, o juiz de 1º Grau deu razão a ele e condenou as duas empresas envolvidas. Mas o porteiro não concordou com o valor deferido e conseguiu aumentar o valor da reparação para R$ 6 mil. A decisão foi da 7ª Turma do TRT-MG, com base no voto do juiz convocado Mauro César Silva.

O reclamante prestava serviços na biblioteca de uma universidade, mas era empregado de uma empresa contratada. Ele usava cavanhaque há pelo menos 17 anos e com essa aparência física foi admitido no emprego. Após três meses de trabalho, foi chamado pelo chefe da vigilância da instituição de ensino, que exigiu a retirada do cavanhaque. O representante da ré invocou a existência de uma norma interna para agir dessa forma. Como o empregado não aceitou a imposição, acabou sendo dispensado.

Para o relator, a conduta é inaceitável e configura abuso do poder do empregador, já que o cavanhaque em nada afeta o exercício da função de porteiro de biblioteca de uma instituição de ensino. O magistrado esclareceu que o patrão só pode interferir na aparência do empregado em situações específicas, que realmente a justifiquem: "A interferência da empregadora (ou da tomadora) na aparência física do empregado apenas se justifica em casos restritos, em que determinada condição do indivíduo seja capaz de interferir substancialmente no desempenho de sua função no trabalho". Na visão do magistrado, esse não é o caso dos autos.

"Não é justificável que, para exercer a função de porteiro da biblioteca da Universidade, o empregado seja proibido de usar cavanhaque", destacou o relator no voto, entendendo que essa exigência não é razoável e configura discriminação estética. O magistrado reconheceu, no caso, a prática de ilícito passível de atrair a responsabilidade civil das reclamadas. A matéria é regulada pelos artigos 186 e 927 do Código Civil.

O juiz convocado concordou com o entendimento do reclamante de que o valor fixado em 1º Grau para a indenização deveria ser aumentado. Por essa razão, reformou a sentença para deferir a quantia de R$ 6 mil. O relator explicou que o dano moral não tem valor definido e sua reparação deve ser estabelecida conforme o prudente arbítrio do juiz, sempre com razoabilidade e moderação. Extensão do dano, intensidade da culpa e condição econômica das partes foram critérios destacados como importantes da hora de fixar a condenação. O magistrado também lembrou a função punitiva e pedagógica da medida, que tem como objetivo inibir a repetição de eventos semelhantes e convencer o agente de que não vale a pena repetir o ato.

Na decisão, também foi abordada a questão da responsabilidade da universidade. Na avaliação do relator, a condenação subsidiária definida na sentença se justifica fortemente, considerando que foi exatamente um representante da universidade quem praticou o ato ilícito. Com fundamento no ordenamento jurídico vigente, foram refutados todos os argumentos levantados pela instituição, que pretendia se livrar da condenação. Assim, o recurso da instituição de ensino foi julgado improcedente para manter a responsabilização de forma subsidiária.( 0001419-13.2012.5.03.0071 AIRR )
Fonte: TRT3ª

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