terça-feira, 22 de julho de 2014

CAIXA ECONÔMICA FEDERAL RESPONDERÁ POR DÉBITOS TRABALHISTAS DE OBRA DO MINHA CASA MINHA VIDA


CEF responderá por débitos trabalhistas de obra do Minha Casa Minha Vida





A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação subsidiária da Caixa Econômica Federal (CEF) pelos débitos trabalhistas de um pintor de obra do programa "Minha Casa Minha Vida", do Governo Federal. Embora o TST aplique a casos semelhantes a Orientação Jurisprudencial 191 da Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), que isenta o dono da obra da responsabilidade pelas dívidas de empreiteiras, no caso específico, a CEF, financiadora do empreendimento, assumiu a gestão da obra após intervenção judicial resultante de ação civil pública do Ministério Público do Trabalho motivada pela ausência de pagamento dos salários dos empregados (Processo 0000684-77.2012.5.04.0741).

Ao não conhecer do recurso da CEF contra a condenação, o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, relator do processo na Sexta Turma, destacou que, quando assumiu "atos de gestão administrativa e financeira do canteiro de obras", a instituição "atuou como verdadeira empregadora e, por esse motivo, não há como afastar sua responsabilidade subsidiária".

O autor do processo foi contratado como pintor pela Construtora e Incorporadora Walan Ltda. em março de 2010. Em julho de 2012, foi demitido sem justa causa. A CEF interveio na obra em março de 2012, após a construtora ter seus bens bloqueados por ordem judicial.

Originalmente, o juízo da 1ª Vara do Trabalho de Passo Fundo (RS) inocentou a instituição de qualquer responsabilidade pelas verbas trabalhista do pintor (aviso prévio, férias proporcionais e 40% do FGTS, entre outras). Segundo a sentença, o não pagamento das obrigações trabalhistas implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços (Súmula 331 do TST, que trata da terceirização), mas esta não seria a situação da CEF, apenas gestora do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), fonte dos recursos do financiamento. A instituição não seria, no caso, considerada tomadora de serviço, nem a relação entre ela e o pintor seria de terceirização.

No entanto, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) acolheu recurso do pintor, com o fundamento de que a CEF adotou atos de gestão administrativa e financeira do canteiro de obras, como o pagamento dos trabalhadores e dos fornecedores. Assim, teria assumido a obra, sucedendo a construtora inicialmente contratada, devendo, por isso, ser responsabilizada subsidiariamente.

Empregadora

Ao julgar recurso da CEF no TST, a Sexta Turma entendeu que, nesse contexto, a instituição financeira atou "como verdadeira empregadora". Para o ministro Corrêa da Veiga, o caso não se identificaria como terceirização nem como "dono da obra", não havendo, assim, violação à Súmula 331 e à OJ 191, como pretendia a Caixa em seu recurso.

Dona da obra

Em dois outros casos envolvendo a CEF e o programa Minha Casa, Minha Vida, a instituição foi absolvida de responsabilidade por dívidas trabalhistas das empresas contratadas para a construção das casas. Nesses casos, que envolveram um ajudante de obras no Espírito Santo e um vigia de um canteiro em Abaetetuba (PA), o entendimento da Segunda e da Quarta Turmas do TST foi o de que a CEF se enquadrava como dona da obra, aplicando-se ao caso a OJ 191. 

No primeiro caso, a Justiça do Trabalho da 17ª Região (ES) condenou a CEF com base no item I da Súmula 331, e ainda solidariamente pelo pagamento de indenização por danos morais decorrente do atraso na quitação das verbas rescisórias. Ao examinar o recurso contra a condenação, o ministro José Roberto Freire Pimenta disse que o caso não era de terceirização, como entendeu o TRT-ES, e sim de contratação de empreiteira. A CEF, portanto, seria a dona da obra.

No segundo caso, a CEF foi absolvida da responsabilidade pela Justiça do Trabalho da 8ª Região (PA). O relator do agravo do vigia na Quarta Turma, o relator, desembargador convocado José Ribamar Oliveira Lima Júnior, manteve o entendimento regional no sentido de que a CEF não se beneficiou do trabalho do empregado, "pois atuou como mera gerenciadora do fundo instituído pelo Programa de Arrendamento Residencial previsto na Lei 10.188/2001.

(Augusto Fontenele, Taciana Giesel e Mário Correia/CF)


Fonte: TST

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Um sintoma do atraso de nosso Direito: acreditar que basta estar na lei


Um sintoma do atraso de nosso Direito: acreditar que basta estar na lei



Um novo produto: o usucapião antiepistêmico
No Direito de terrae brasilis velhas teses se encalastram no imaginário social e jurídico e impedem o surgimento de novos saberes. Trata-se de algo que, pela passagem do tempo, já pode ser considerado como usucapião (anti)epistêmico, isto é, a sedimentação de algo errado e que passa a fazer parte do patrimônio do utente (e da comunidade jurídica). Usucapião antiepistêmico é uma variante do senso comum teórico dos juristas. Ou, como diria Warat, uma “constelação de representações, imagens, pré-conceitos, crenças, ficções, hábitos de censura enunciativa, metáforas, estereótipos e normas éticas que governam e disciplinam anonimamente os atos de decisão [judiciária] e de enunciação [do direito]”.[1]

Uma das teses equivocadamente usucapidas é a de que as leis “se bastam”, à revelia da Constituição. Com efeito, essa questão da relação “lei-Constituição” é algo que o Constitucionalismo Contemporâneo demorou muito para convencer os adeptos de positivismo clássico. Por exemplo, Ferrajoli passou por isso na Itália. Os juristas conservadores teimavam em continuar a aplicar os velhos códigos, ignorando a Constituição. Por isso, criou a sua teoria garantista. Por ela, uma lei tem dois âmbitos: vigência e validade. Ela pode ser vigente; mas a sua validade só será aferida na conformidade com a Constituição. Simples e ao mesmo tempo complexo. Até hoje tem gente que acredita que as leis podem valer mais do que a Constituição.

Em terrae brasilis isso é corriqueiro. Não fosse assim e já teríamos novos códigos. Não fosse assim e já teríamos feito uma filtragem hermenêutico-constitucional das velhas leis. Não fosse assim e a Lei das Contravenções Penais já não existiria no plano da validade. Não fosse assim e o sistema acusatório já teria sido aplicado pelo Poder Judiciário e Ministério Público.

Nesse sentido, basta observar algumas questões que, pelo seu valor simbólico, representam o modo pelo qual a instituição “positivismo” assegura a sua validade mesmo em face da emergência de um novo paradigma. É o caso de três dispositivos que funcionam como elementos de resistência no interior do sistema jurídico, como que para demonstrar a prevalência do velho em face do novo.

Três exemplos de usucapião antiepistêmico
Vejamos: mesmo com a vigência de um novo Código Civil desde 2003, foi aprovada a famosa lei como nome de chocolate, a LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Uma lei patética, que nada mais faz do que reproduzir o que dizia a velha LICC (Lei de Introdução ao Código Civil), de 1942. Segundo o artigo 4º, “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”.

Ora, uma teoria do direito que quer ser séria não pode se quedar silente em face desse estado d’arte. Com efeito, ao se manter, nesta quadra da história, uma “lei de introdução ao Direito” (sic) pautada na interpretação do Código Civil e nos parâmetros para uma aplicação “geral” do direito, está-se contribuindo para uma resistência de um modelo (positivista) em relação ao novo constitucionalismo, que ingressa na história justamente para superar o antigo modelo. Desse modo, jamais se terá a constitucionalização do direito civil; no máximo, ter-se-á uma “codificação” da Constituição. A “Vontade de Constituição” (que nos remeteria ao fundamento do Estado Democrático de Direito) soçobra na “Vontade de Sistema” de uma malsinada “consciência legislativa”. É por isso que a LINDB apenas confirma a resistência positivista aqui denunciada. Trata-se, pois, de uma contradição: em pleno pós-positivismo, é mantido o principal ferramental do positivismo (na verdade, do positivismo mais primitivo e ingênuo). Mas o mais ridículo é a alusão que a LINDB faz aos princípios gerais do direito. Em Hermenêutica e(m) Crise trituro essa questão.

Já o artigo 335 do Código de Processo Civil, de 1973, acentua que, “em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial”. Consta que no projeto do novo CPC essa redação permanece, com pequenos ajustes gramaticais. A questão é: qual é a necessidade de um dispositivo desse jaez?

É flagrante a inconstitucionalidade e a incompatibilidade paradigmáticas ao se admitir a validade de dispositivo processual prevendo a aplicação de “regras de experiência comum subministradas pela observação...”, como se ao juiz fosse dado, em pleno Estado Democrático de Direito, o poder de suprir lacunas a partir de juízos particulares. Dizendo de outro modo, a questão, no fundo, é paradoxal: os princípios antes autorizadores do “fechamento do sistema” a partir do exercício da discricionariedade nos casos difíceis (omissão da lei, lacunas etc.), agora soçobram diante dos princípios constitucionais instituídos justamente para evitar essa “delegação” em direção ao protagonismo judicial.

Vale registrar: não raro tais institutos chegam a ser rechaçados até pelos que pretendem dar continuidade ao criticado paradigma positivista. É o caso do processualista e jusfilósofo Michele Taruffo, o qual, embora se auto-defina como “positivista crítico” e pregue a “discricionariedade utilizada racionalmente” na decisão judicial em termos de “livre-convencimento motivado”, mesmo assim critica o conceito de “máxima de experiência”, por julgá-lo:

“[...] mais desorientador do que útil: tende, de fato, a dar a impressão de que as máximas exprimam generalizações universais (ou pelo menos fundadas no id quod plerumque accidt), podendo, portanto, embasar inferências capazes de produzir conclusões dedutivamente certas (ou pelo menos próximas à certeza). Essa impressão é, entretanto, falaciosa, pois em muitos casos as noções formuladas nas máximas de experiência não exprimem qualquer generalização fundada em alguma base cognoscitiva; ao invés disso, exprimem nada mais do que lugares-comuns, preconceitos e estereótipos, consolidados em alguma medida no senso comum (que não correspondem, contudo, a qualquer conhecimento efetivo de algo)”[2].

Bingo. Neste ponto, Taruffo está certo. É esse o imaginário que prospera; são posicionamentos como estes que impedem efetivas e substanciais alterações nos códigos. Máximas de experiência, presunções, induções, preenchimento de lacuna, omissões, princípios gerais do direito etc. Tudo isso só releva a prevalência do velho. Sim, o velho que não morre e que não deixa o novo nascer.

Em linha similar, tem-se o artigo 3º do Código de Processo Penal, também da década de 40 do século passado, segundo o qual “a lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais do direito”. Esse dispositivo repete alusão ao apelo que o juiz deve fazer aos princípios gerais do Direito (sic), tal qual o aludido artigo 4º da LINDB, incluindo, entre eles, a equidade. Ainda há pouco o Supremo Tribunal Federal (HC 103.525) deixou de aplicar o artigo 212 do CPP em um caso em que o juiz elaborou toda a prova (não esqueçamos que o artigo 212 diz que o juiz somente fará perguntas complementares...). Argumento do STF: o réu, condenado a 8 anos de reclusão, não teria provado o prejuízo. Fundamento do Pretório Excelso: o princípio geral do direito “não há nulidade sem prejuízo”.

Observe-se que o problema não é só de nomenclatura, não valendo, portanto, a assertiva, por vezes vista em parte da literatura nacional, de que os princípios gerais do direito foram “positivados” na Constituição. Isso é inaceitável.

Insisto: trata-se de uma análise equivocada da função dos princípios constitucionais. Ou seja, enquanto os princípios gerais do Direito se constituíam em uma “autorização” para a discricionariedade, um fator que justificava a “saída” do juiz do sistema codificado para solucionar o caso que lhe era apresentado e que não encontrava resposta no Código (foi para isso que dispositivos desse jaez foram colocados nos Códigos), os princípios constitucionais apresentam-se, contemporaneamente, como um contraponto a essa discricionariedade.

Numa palavra final
A força simbólica desses dispositivos que fincam os marcos do positivismo no interior do (novo) constitucionalismo enfraquece sobremodo o valor da doutrina na construção do conhecimento jurídico, com o consequente fortalecimento do papel do aplicador da lei. Cada vez mais, os juristas ficam à mercê de decisões tribunalícias, como a dar razão ou a repristinar as velhas teses do realismo jurídico, pelas quais o direito se realiza na decisão, forma acabada de um positivismo que, buscando superar o normativismo exegético, abriu, historicamente, o caminho para discricionariedades e decisionismos. Do mesmo modo, não há como compatibilizar o (novo) constitucionalismo e positivismo jurídico, porque mesmo o primeiro constitucionalismo era contrário ao positivismo.

Trata-se, pois, de entender que, se o primeiro problema metodológico — como se interpreta — tem uma resposta que está fundamentada na superação do paradigma representacional, em que não mais cindimos interpretação de aplicação, o segundo — como se aplica — parece bem mais difícil de resolver, isto é, aqui se trata de dar uma resposta talvez ao maior desafio do Direito nestes tempos de pós-positivismo: como evitar decisionismos, ativismos etc. e alcançar uma resposta correta (adequada constitucionalmente) em cada caso. Ou seja, como transformar a Constituição — e a sua interpretação — em um direito fundamental do cidadão, no sentido de que o resultado dessa interpretação não seja fruto de um sujeito solipsista ou dependente de métodos igualmente elaborados a partir do (velho) paradigma representacional.

Enfim, a questão é: como fazer com que a comunidade jurídica acredite que não basta que algo esteja na lei? Não basta que o CPC fale em regras de experiência; não basta que que o CPP fale em “princípios gerais do direito”; não basta que a Lei Complementar 64 fale em presunções e induções; não basta que a lei-com-nome-de-chocolate (LINDB) apresente um monte de sandices... A questão é: tais dispositivos podem se manter diante da Constituição e do que representa o novo Constitucionalismo em termos paradigmáticos? Eis um antigo dilema: o novo e o velho, o velho e novo...

Post Scriptum: por que os leitores acham que um juiz pode aplicar a tese da insignificância para o valor de R$ 20 mil em caso de descaminho? E, ao mesmo tempo, centenas de juízes estão negando a aplicação desse mesmo princípio para ladrões de sabonete e whisky barato? Por que os leitores acham que o artigo 212 do CPP foi tornado ineficaz? Por que ninguém se impressiona com o dispositivo da LC 64, que no artigo 23 diz que o juiz pode julgar por presunções? A resposta é simples: o texto acima é um dos sintomas da crise do direito. Uma crise paradigmática — de cariz filosófico — que venho denunciado há mais de vinte anos. Até quando isso será assim?

[1] Warat, Luiz Alberto. Tomo I. Interpretação da lei: temas para reformulação. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1994. p.13.

[2] Taruffo, Michele. Uma simples verdade: o juiz e a construção dos fatos. Trad. Vitor de Paula Ramos. Madri: Marcial Pons, 2012. p. 81.

Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.



Revista Consultor Jurídico, 17 de julho de 2014, 08:00h

terça-feira, 15 de julho de 2014

Informativo jurisprudencial do STJ condensado por ramo de direito - ano 2013


Por Luiz Cláudio Borges


          Segue abaixo Informativo Jurisprudencial do STJ dividido por ramo de direito:

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Fonte: STJ

Novo Código de Processo Civil aprimora regras sobre a sustentação oral nos tribunais


Novo CPC aprimora regras sobra a sustentação oral nos tribunais 




Em face da explosão da litigiosidade, vem se tornando cada vez mais comum a utilização de julgamentos massificados mediante a adoção de padrões decisórios (fruto ou não de consensos jurisprudenciais), listas[1] nos tribunais, entre outras “técnicas” de otimização numérica de julgamento nas quais a fundamentação do julgado não é produzida como decorrência do diálogo ocorrido ao longo do processo, mas, por um imperativo de produtividade, parte-se de “temas” para tal situação,[2] anteriormente analisados com amplo debate (ou não) acerca do mesmo.

Este fenômeno convida a advocacia à mudança de seu papel, eis que, na hipótese de se contentar, como de praxe, em somente apresentar seus arrazoados escritos (petições) ao longo do processo, sem qualquer interlocução de outra espécie, correrá o enorme risco de simplesmente receber uma resposta jurisdicional “padrão” com a reprodução de decisão anteriormente prolatada por aquele juízo.

Tal situação não é nova, mas vem se agravando pelo esvaziamento cada vez maior da técnica da oralidade no curso do processo.

Sabemos que desde os grandes movimentos reformistas capitaneados por Klein no final do século XIX existe a busca de modelos orais de processo e de formação das decisões.[3] Sabemos, também, que apesar da adoção de uma matriz oral desde o CPC de 1939, tal técnica no Brasil nunca obteve aplicação adequada, por inúmeros fatores, desde o déficit de formação dos profissionais, passando pela ausência de um ambiente de debates entre os sujeitos processuais (dentro do processo) e chegando à criação de um falso mito de que a oralidade não auxiliaria na busca da formação do convencimento do juiz.

Tal pauperização da oralidade se amplia com os movimentos de informatização e com o uso, já comentado, da padronização decisória nos julgamentos, criando a falsa crença de que a busca, pelos advogados, de interlocução oral com os julgadores seria inócua.

Ocorre que não poderia haver erro maior.

Tanto do plano teórico, quanto da experiência prática de bons anos de advocacia promovendo interlocuções orais com juízes em todos os níveis, especialmente nos Tribunais, constato que a apresentação oral da linha de defesa é decisiva para que os argumentos produzidos sejam levados à sério.

No nosso sistema em que cada magistrado se vê na responsabilidade de julgar milhares de casos e no qual a leitura acurada de cada um dos autos se torna cada vez mais incomum, a oralidade pontual, ao longo do iter, promove o destaque necessário do caso ou de situação específica que se patrocina como advogado da massa anônima de feitos, sob a responsabilidade do juiz.

No âmbito dos tribunais a situação se agrava muito pois a alegação de que as conversas prévias à sessão pública e de que as sustentações orais não mudam julgamentos, pelos votos já estarem produzidos, na última hipótese, despreza o fato de que muitas vezes, pelo excesso de trabalho, são os “modelos decisórios” que forjam o julgamento de “casos aproximados” (não propriamente idênticos), ampliando a importância para o destaque oral de peculiaridades do caso, que poderão gerar a mudança de entendimento.

Somente a manifestação oral do advogado poderá viabilizar a distinção (distinguishing) entre estes casos, fazendo que os argumentos sejam levados em consideração; algo que o discurso de produtividade e padronizador impede que ocorra.

O novo Código de Processo Civil (CPC) viabilizará de modo claro a adoção dogmática do contraditório como influência e não surpresa (artigo 10) [4] e imporá, nos julgamentos, o respeito ao dever de informação pelo juízo e dos direitos de manifestação e de consideração para as partes.

Além de impedir que o magistrado surpreenda as partes com fundamentos novos (decisão de surpresa),[5] em face do referido direito de se levar em consideração os argumentos das partes (Recht auf Berücksichtigung von Äußerungen), atribui-se ao magistrado não apenas o dever de tomar conhecimento das razões apresentadas (Kenntnisnahmepflicht), como também o de considerá-las séria e detidamente (Erwägungspflicht).[6]

No entanto, em decorrência da utilização cada vez mais corrente dos “padrões” para otimizar julgamentos, caberá ao advogado, cada vez mais, saber atuar de modo mais técnico de forma a chamar a atenção para as peculiaridades de seu caso.

E não tenho dúvidas que isto passa necessariamente pelo aprimoramento da técnica oral de manifestação.

Ciente disso, no âmbito dos tribunais, o CPC projetado aprimora o regramento acerca da sustentação oral em seus artigos 946 e 950.[7]

Cabe aos advogados em formação ou em exercício, assim, a percepção do aumento da importância da sustentação e intelocução oral para o julgamento dos casos, pois, em face de estudos acerca da oralidade[8] e da experiência de bons anos atuando no tribunal com esta finalidade, tal intervenção, certamente, determina, com recorrência, o sucesso de uma linha de defesa.

Venho com recorrência pontuando (por aqui)[9] os dilemas brasileiros no uso dos precedentes e da jurisprudência no Brasil, e, assim, devo pontuar que no ponto aqui trabalhado temos também muito a aprender com os países do common law, pois lá a oralidade sempre foi respeitada na construção das decisões e, se caminhamos a passos largos no uso corriqueiro do direito jurisprudencial como fundamento decisório, devemos voltar ao debate sobre a oralidade a fim de viabilizar uma influência concreta dos advogados (partes) na formação das decisões, especialmente, dos tribunais.

Este é uma grande desafio para a advocacia e para seus órgãos representantivos pois, caso contrário, ficaremos cada vez mais à mercê de julgamentos que não levarão em conta os argumentos das partes para sua formação.



[1] Cf. LEAL, Saul Tourinho. Julgamentos em listas, com advogado silenciado, mostra que fracassamos. http://www.valor.com.br/legislacao/fio-da-meada/3573268/julgamentos-em-listas-com-advogado-silenciado-mostra-que-fracassamos


[2] Cf. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=publicacaoInformativoRG&pagina=BoletimdaRepercussaoGeral2013


[3] NUNES, Dierle. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008.




[4] “Art. 10. Em qualquer grau de jurisdição, o órgão jurisdicional não pode decidir com base em fundamento a respeito do qual não se tenha oportunizado manifestação das partes, ainda que se trate de matéria apreciável de ofício”.


[5] THEODORO JR, Humberto; NUNES, Dierle. Uma dimensão que urge reconhecer ao contraditório no direito brasileiro: sua aplicaçao como garantia de influência e não surpresa. RePro v. 168. 2009. Acessível em : https://www.academia.edu/4563667/Principio_do_contraditorio_como_influencia_e_nao_surpresa_-_Dierle_Nunes_e_Humberto_Theodoro_Jr


[6] GEISLER, Herbert. Die Gewährleistung rechtlichen Gehörs in den Tatsacheninstanzen: Hinweise für den erfolgreichen Zivilprozess. AnwBl 3 / 2010, p. 149-154.


[7] Art. 946. Se o relator constatar a ocorrência de fato superveniente à decisão recorrida, ou a existência de questão apreciável de ofício ainda não examinada, que devam ser considerados no julgamento do recurso, intimará as partes para que se manifestem no prazo de cinco dias. § 1º Se a constatação ocorrer durante a sessão de julgamento, este será imediatamente suspenso a fim de que as partes se manifestem especificamente, em sustentação oral, na própria sessão, no prazo de quinze minutos.§ 2º Se a constatação se der em vista dos autos, deverá o juiz que a solicitou encaminhá-los ao relator, que tomará as providências previstas no caput e, em seguida, solicitará a inclusão do feito em pauta para prosseguimento do julgamento, com submissão integral da nova questão aos julgadores.

Art. 950. Na sessão de julgamento, depois da exposição da causa pelo relator, o presidente dará a palavra, sucessivamente, ao recorrente e ao recorrido, e ao membro do Ministério Público, nos casos de sua intervenção, pelo prazo improrrogável de quinze minutos para cada um, a fim de sustentarem suas razões nas seguintes hipóteses: I – no recurso de apelação; II – no recurso ordinário; III – no recurso especial; IV – no recurso extraordinário; V – nos embargos de divergência; VI – na ação rescisória, no mandado de segurança e na reclamação; VII – em outras hipóteses previstas em lei ou no regimento interno do tribunal. § 1º A sustentação oral no incidente de resolução de demandas repetitivas observará o disposto no § 1º do art. 994.§ 2º O procurador que desejar proferir sustentação oral poderá requerer, até o início da sessão, que seja o feito julgado em primeiro lugar, sem prejuízo das preferências legais. § 3º Caberá sustentação oral no agravo interno interposto contra decisão de relator que extingue o processo nas causas de competência originária previstas no inciso VI. § 4º É permitido ao advogado cujo escritório se situe em cidade diversa daquela onde está sediado o tribunal realizar sustentação oral por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que o requeira até o dia anterior ao da sessão.


[8] NUNES, Dierle. Processo jurisdicional democrático. cit.


[9] NUNES, Dierle. NOVO CPC: É preciso repensar o modo como os tribunais vêm atuando. Acessível em: http://www.conjur.com.br/2014-jun-11/dierle-nunes-preciso-repensar-modo-tribunais-atuam. NUNES, Dierle. NOVO CPC: Afastamento de precedente não pode continuar sendo regra. Acessível em: http://www.conjur.com.br/2014-jun-04/dierle-nunes-afastamento-precedente-nao-regra. NUNES, Dierle. Acórdãos deveriam ter linearidade argumentativa. Acessível em: http://www.conjur.com.br/2012-out-24/dierle-nunes-aos-tribunais-atribuida-forma-julgamento. NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco. Enunciados De Súmulas: Falta aos tribunais formulação robusta sobre precedentes. Acessível em: http://www.conjur.com.br/2014-jan-07/falta-aos-tribunais-formulacao-robusta-precedentes


Dierle Nunes é advogado, doutor em Direito Processual, professor adjunto na UFMG e PUCMinas e sócio do escritório Camara, Rodrigues, Oliveira & Nunes Advocacia.



Revista Consultor Jurídico, 15 de julho de 2014, 12:17h

Turma do TST exclui tempo gasto com banho de intervalo intrajornada de abatedor de aves


Turma exclui tempo gasto com banho de intervalo intrajornada de abatedor de aves


A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho restabeleceu decisão que havia concedido a um trabalhador o pagamento de uma hora diária a título de intervalo intrajornada. Empregado de setor de abate de aves, ele provou que, no período que dispunha para se alimentar e repousar, gastava mais de nove minutos para se lavar e cumprir as exigências sanitárias da BRF Brasil Foods S.A. A decisão foi unânime.

O empregado requereu o pagamento do valor integral do intervalo intrajornada sustentando que o tempo que levava com a troca do uniforme com sangue das aves e com sua higienização não era computado na jornada, mas deduzido do intervalo, sem compensação posterior. A BRF, em sua defesa, afirmou que o empregado sempre usufruiu de uma hora para descanso e alimentação, e acrescentou que a produção é interrompida setorialmente para gozo do intervalo intrajornada, o que obrigava os trabalhadores a fruí-lo integralmente.

A 2ª Vara do Trabalho de Rio Verde (GO) considerou que o tempo gasto com a higienização era superior a cinco minutos e que o empregado, de fato, não usufruía do intervalo integral. Assim, deferiu-lhe o pagamento de uma hora por dia trabalhado, acrescida de 50%, conforme o artigo 71, parágrafo 4º da CLT. O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, porém, excluiu a condenação por entender que o desenvolvimento de atividades nesse período não desnatura o gozo regular do intervalo intrajornada.

Ao examinar recurso do abatedor de aves, a Oitava Turma do TST reformulou entendeu que os fundamentos de natureza biológica que obrigam a concessão integral do intervalo – renovação das forças do empregado – não se confundem com os que justificam a tolerância quanto aos minutos que antecedem e sucedem a jornada, estes previstos na Súmula 366 do TST. O intervalo foi parcialmente concedido pela Turma com base na Súmula 437, item I, do TST, nos termos do voto do relator, ministro Márcio Eurico Vitral Amaro.


Fonte: TST

Bancária receberá R$160 mil por perseguições após licença para tratar câncer


Bancária receberá R$ 160 mil por perseguições após licença para tratar câncer






Uma bancária que sofreu sucessivas transferências e foi rebaixada de função ao retornar ao trabalho após nove meses de licença para tratar câncer de mama receberá R$ 160 mil por dano moral. O Itaú Unibanco S/A tentou trazer ao TST sua pretensão de reduzir o valor da condenação, mas a Quinta Turma rejeitou seu agravo de instrumento, por concluir que o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) decidiu com base nas provas e, ao fixar o valor da indenização, considerou a extensão do dano, a condição econômica das partes e o grau de culpa do banco.

O Itaú foi condenado pelo juízo da Vara do Trabalho de Almenara (MG) a indenizar em R$ 50 mil a bancária por dano moral, por considerar que houve abuso no poder diretivo do banco, que "atuou de forma discriminatória e sem qualquer comprometimento social para com aqueles trabalhadores que tiram licença por motivo de saúde".

Perseguição

Admitida em 1979 como escriturária, a trabalhadora foi caixa e depois gerente operacional, até ser demitida em 2011. Nos últimos quatro anos de contrato, disse ter sofrido perseguições da chefia. A licença para tratamento do câncer ocorreu em 2006, e, em fevereiro 2007, quando retornou, ainda abalada e com quadro depressivo pela retirada da mama e pelos tratamentos, foi transferida para Governador Valadares.

Na reclamação trabalhista, ela afirma que "implorou à chefia" para não ir, devido à necessidade de estar próxima da família, mas não foi atendida. A partir daí, segundo ela, as perseguições aumentaram: foi rebaixada de função e deslocada para várias cidades da região, cobrindo férias de funcionários de agências pequenas, sempre como caixa. De 2008 a 2011, foram 18 transferências.

Tendo como parâmetro depoimentos de testemunhas, o juízo concluiu que havia discriminação por parte do banco em relação aos empregados afastados por longo período, que eram deslocados para atividades menores, transferidos de agência e submetidos a extrema pressão psicológica.

Contra a sentença as partes recorreram ao TRT-MG – a bancária para aumentar o valor da indenização, e o Itaú para ser absolvido. O Regional constatou que houve "verdadeiro abuso do poder diretivo" por parte do banco, e elevou para R$ 160 mil o valor da indenização.

O agravo de instrumento pelo qual o Itaú pretendia destrancar seu recurso de revista e levar o caso à análise pelo TST foi desprovido pela Quinta Turma. O ministro Emmanoel Pereira, relator do agravo, reiterou ser incabível recurso de revista ou embargos para reexaminar fatos e provas, conforme estabelecido na Súmula 126 do TST.

A decisão foi unânime. O Itaú opôs embargos de declaração, ainda não examinados pela Turma.

(Lourdes Côrtes/CF)


Fonte: TST

segunda-feira, 14 de julho de 2014

"JUIZ QUE SACRIFICA SUA INDEPENDÊNCIA PARA SER SUBORDINADO SERÁ UM LÍDER RUIM"


"Juiz que sacrifica sua independência para ser subordinado será um líder ruim"



"O juiz que sacrifica a sua independência para se tornar subordinado poderá, no futuro, ser um líder de má qualidade." A afirmação é do presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Fábio Prieto, para quem é preciso que o juiz exercite a sua "característica fundamental: a independência funcional".

Na sua gestão, Prieto busca priorizar a atividade-fim do Poder Judiciário: julgar. Contrário à burocratização e à "funcionarização" da magistratura, não tem juiz assessor em seu gabinete. Os desembargadores federais que indicou para cargos administrativos não se afastaram da jurisdição. Para ele, mais que contrárias à Lei Orgânica da Magistratura, tais condutas podem comprometer a formação de novas lideranças.

“É muito confortável ter, aqui, três ou quatro juízes federais assessorando o presidente. É evidente que eu gostaria muito de fazer isso. Não faço, porque tenho um compromisso maior com a institucionalidade do Poder Judiciário", diz.

Responsável por instalar as turmas criminas exclusivas no tribunal, Prieto é visto como um gestor prático, que não espera ter as condições perfeitas para executar o que acha necessário. As novas turmas das 1ª e 4º seções serão compostas por três desembargadores, enquanto as demais continuarão com quatro integrantes.

O TRF-3 é a corte federal que mais recebe processos no país e é o tribunal com os melhores números de desempenho, nos três indicadores de produtividade medidos pelo CNJ. Segundo a pesquisa do Instituto de Direito de Público, de Brasília, a corte é o melhor tribunal de apelação do país.

Prieto estipulou duas metas principais para a sua gestão: começar a implantação do processo eletrônico e ajudar a 3ª seção do tribunal — competente para julgar processos relacionados ao direito previdenciário.

Prieto liderou a pacificação do então mais conflagrado tribunal do país. De 2005 em diante, todas as eleições do tribunal foram parar no Supremo Tribunal Federal. Na eleição de 2011, Prieto recusou a candidatura à presidência do TRF-3, para não iniciar um novo conflito. Apoiou Newton de Lucca e foi candidato à Corregedoria. Quando as urnas foram abertas, Prieto foi o mais votado. 

Em novembro de 2013, foi eleito pelo pleno do tribunal com 97% dos votos. Nomeado desembargador pelo Presidente da República, em 1998, aos 36 anos, foi o primeiro juiz federal concursado por um dos cinco tribunais regionais federais a ser promovido a desembargador. E o único a chegar na presidência. 

Quando atuou na 2ª Seção do tribunal, competente para o julgamento de matéria tributária, o desembargador recebeu o maior acervo acumulado da história do tribunal: mais de 11 mil processos. Quando saiu para assumir a Corregedoria, deixou 4 mil processos. 

Fábio Prieto foi advogado e membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, antes de prestar concurso para juiz federal. 

Leia a entrevista:

ConJur — Quando o senhor assumiu a presidência, quais eram as preocupações?
Fábio Prieto — Eu me preocupo com dois eixos centrais: a institucionalidade do Poder Judiciário e a gestão administrativa do tribunal. Com a institucionalidade, eu quero preservar a independência dos juízes e desembargadores e a funcionalidade de alto nível dos nossos servidores. Isso implica em não chamar juízes assessores para o tribunal. Nem para a presidência. Nem para os desembargadores que ocupam funções administrativas indicados por mim. Esses desembargadores não estão afastados das funções jurisdicionais. Porque o principal aqui é a função jurisdicional. Isso libera os nossos servidores, de excelente nível, altamente capacitados, com larga experiência, para desempenhar o papel que lhes cabe. Os servidores fazem isso, com muita competência.

ConJur — Por que os desembargadores não podem ter um juiz assessor? 
Fábio Prieto — A Lei Orgânica da Magistratura veta a prática expressamente. Não existe independência funcional subordinada. Ou subordinação independente. A proibição tem uma razão de ser. É importante formar uma nova geração de líderes. O juiz que sacrifica a sua independência, para se tornar subordinado, no futuro poderá ser um líder de má qualidade. É preciso que o juiz exercite a sua característica fundamental: a independência funcional. É muito confortável ter, aqui, três ou quatro juízes federais assessorando o presidente. É evidente que eu gostaria muito de fazer isso. Não faço, porque tenho um compromisso maior: com a institucionalidade do poder judiciário. O juiz é juiz quando tem independência funcional. Hoje, nós temos juízes que não dão uma sentença há 10 anos. O que é essa pessoa? Juiz não é. Os Governadores devem explicar a razão pela qual um policial militar não está no policiamento de rua, mas na banda da corporação ou no setor de preenchimento de formulários. Como um agente político tão bem formado e caro, como o juiz, não está prolatando sentenças, mas abrindo portas e carregando os escritos de ministros e desembargadores? É o estímulo errado.

ConJur — Uma das suas metas, quando assumiu o cargo, era instalar as duas turmas especializadas em Direito Penal. Por que essa mudança demorou tanto? Houve resistência dos desembargadores?
Fábio Prieto — O tribunal mudou o regimento em setembro de 2012, na gestão anterior. Por várias razões, só agora executou essa tarefa. Uma pretensão legitima do próprio tribunal, da advocacia e do Ministério Público. Todos estão de acordo com isso, a mudança foi feita. Eu fiz a reforma administrativa necessária. Aprovada por unanimidade. Consegui as gratificações, para montar essas unidades de serviço. Arrumei o equipamento de informática. Alojei as novas unidades judiciárias no prédio do tribunal. As turmas foram instaladas no começo de julho. Está tudo andando bem. Não surgiram problemas. Se surgirem, vamos enfrentá-los.

ConJur — Os servidores foram realocados? Como foi feita essa mudança no tribunal?
Fábio Prieto — Essa mudança poderia ser feita de dois modos. Com a criação de novos cargos, por lei. Fora de cogitação. Ou redistribuindo recursos e pessoas. Como em uma empresa privada, quando vai criar uma diretoria. No tribunal, a mudança passa por conselhos colegiados de administração. Eu tirei gratificações aqui da presidência, que já é muito enxuta, e de algum outros locais do tribunal, e aprovei tudo isso por unanimidade. Não teve um voto contra. O processo é coletivo. O presidente só lidera. É importante lembrar que, entre os vários indicadores de desempenho nos quais o TRF-3 se destaca, um deles diz respeito à relação entre servidores designados nas atividades fim e meio. O nosso tribunal é o mais direcionado para a atividade-fim. Ainda assim, cortei a já enxuta estrutura da presidência.

ConJur — Por que as turmas criminais eram necessárias?
Fábio Prieto — Eu não colocaria nessa perspectiva da necessidade. Vamos considerar a expectativa de melhora de desempenho, via especialização. Eu diria que isso foi visto como uma experiência que deveria ser feita. E como essa experiência tinha e tem o apoio do próprio tribunal, tem o apoio da advocacia, dos advogados criminalistas, e do Ministério Público, não havia razão para que não fosse feita.

ConJur — Então o senhor não sentiu nenhuma relutância, na criação dessas novas turmas?
Fábio Prieto — Alguns colegas tiveram dúvidas. Essas dúvidas são naturais do processo. Seria estranho, se não tivéssemos dúvidas, em um grupo heterogêneo. Mas acabou prevalecendo a ideia de que era melhor tentar avançar com esse projeto. Por coincidência, agora, o Supremo também levou a matéria criminal para as turmas.

ConJur — O processo de criação dessas turmas foi demorado, principalmente porque ficou parado no CNJ, que não liberou os 12 juízes que seriam convocados do primeiro grau, para compor as turmas. Assim, cada turma teria quatro julgadores e não três, como foi feito agora. Essa decisão de montar quatro turmas de três desembargadores foi a melhor solução?
Fábio Prieto — Os 12 juízes iriam trabalhar no estoque antigo de processos. Mas as estatísticas dos desembargadores provam que isto não é necessário. A expressiva maioria dos gabinetes tem números bons.

ConJur — Esse número reduzido de desembargadores pode prejudicar no julgamento? Por exemplo, na ausência de um julgador, a sessão vai ser cancelada por falta de quórum?
Fábio Prieto — A solução é muito simples. Está na Lei Orgânica da Magistratura desde 1979. Na ausência de um desembargador, um colega da turma ao lado é chamado para completar o quórum e votar. É claro que quando a turma chama um colega para a sessão, os desembargadores não vão levar um processo de 500 volumes para julgar naquele dia. Isso é natural de qualquer processo de trabalho, em regime de substituição. Não se trata de uma particularidade do Judiciário, nem do nosso tribunal.

ConJur — Como vai ficar a distribuição dos processos?
Fábio Prieto — As relatorias não foram alteradas, em relação aos processos já distribuídos. A competência só foi alterada a partir da instalação. Os acervos antigos ficaram com os relatores originais.

ConJur — E em relação ao volume de processos que será distribuído? As turmas vão continuar recebendo os processos, mas a distribuição será feita entre três julgadores e não quatro, como antes. Com isso, cada desembargador receberá mais processos? Isso é um problema? 
Fábio Prieto — Não. A expectativa é obter ganho com a especialização. Agora, não podemos dizer o que vai acontecer. Se vai ser mais fácil julgar o cível ou o criminal, ninguém sabe. Nós imaginamos, pelo número de processos e pelo desempenho dos desembargadores, que não haverá problema em setor algum. Vamos acompanhar a evolução do projeto.

ConJur — Pelos números, as turmas especializadas em Direito Civil vão receber mais processos do que as turmas criminais...
Fábio Prieto — Cuidado com a interpretação dos números no Judiciário brasileiro. A nossa cultura ainda é de julgamento de processos, não de causas. Ou seja, uma causa é repetida em milhões de processos iguais. Depois de 20 anos, a causa chega ao STF e é resolvida. Aos poucos, o Brasil está abandonando este modelo. O que é muito positivo.

ConJur — Precisamos abandonar o modelo de julgamento de processos e não de causas?
Fábio Prieto — Estamos fazendo a transição, na medida em que há Ações Diretas de Insconstitucionalidade, controle de constitucionalidade pelo Supremo, repercussão geral e outros instrumentos. Há áreas nas quais a cada causa corresponderá necessariamente um processo. Direito de Família, por exemplo.

ConJur — O julgamento em bloco é um problema?
Fábio Prieto — Dentro deste sistema ruim, de julgamento de processos repetidos, é uma solução. Se as petições iniciais e as contestações são iguais, não poderiam ser distintas as sentenças. Isto me lembra o tempo do mimeógrafo, com tinta azul. Um juiz diligente comprou o aparelho. Fez 15 sentenças iguais, com ar de modernidade. Estamos nos anos 80. Os recursos caem com um desembargador intelectualmente limitado e emocionalmente invejoso. Sua Excelência manda datilografar 15 acórdãos iguais e anula as sentenças. Motivo: as sentenças eram todas as iguais. O papel carbono censurou o mimeógrafo.

Mas o nosso sistema está evoluindo muito. Veja o artigo 557 do CPC. Primo distante do artigo 90, parágrafo 2º, da Loman. O 557 fez uma revolução silenciosa. Deu autoridade aos precedentes, sem os ritos e as formalidades necessárias para a edição de uma súmula ou do incidente de uniformização de jurisprudência. Tanto que a súmula vinculante e as súmulas em geral perderam todo o impacto. Hoje, quem informa é o computador. Você pesquisa e aplica o direito, os precedentes.

ConJur — O juiz brasileiro é um bom administrador?
Fábio Prieto — Do ponto de vista da administração, o juiz brasileiro é visto como um dos grandes exemplos no mundo. O juiz brasileiro é formado em uma escola invisível de administração. Ele entra como juiz substituto, em qualquer segmento da justiça. Vai trabalhar junto com o juiz titular. Ali, vai verificar como esse juiz trabalha, a administração dos processos, dos servidores, de materiais. Passados vários anos, será juiz titular. Vai implementar o seu próprio modelo. Com o tempo, começa a exercer funções administrativas dentro dos fóruns. É diretor do foro, coordenador de algum setor. Todos estes anos, ao lado dele, há um grupo de servidores especializado em administração. O nosso sistema é de cogestão. Não é o juiz que faz sozinho.

ConJur — Nesse sistema de cogestão, o juiz aprende desde cedo como ser um administrador?
Fábio Prieto — Temos um sistema no Brasil de cogestão, de juízes e servidores especializados na administração. Se o juiz chegar ao tribunal, vai entrar no último lugar. Não vai participar da administração, mas vai ter contato com aqueles que participam. Com os anos, vai ser suplente de um conselho de administração, de um órgão com natureza administrativa. Vai começar a relatar processos deste tipo. Começar a conviver com os dirigentes do tribunal. Se, eventualmente, chegar nos cargos de direção, vai trabalhar com uma grande equipe administrativa. Nós temos um grupo especializado nisso, estável. Nosso sistema é de cogestão, do começo ao fim da carreira. E é por isso que o juiz brasileiro é, em regra, um bom gestor. Ele aprende a ser um bom gestor o tempo todo.

ConJur — Então, trazer uma equipe de gestão de fora para atuar no tribunal é perda de tempo?
Fábio Prieto — É só para gastar o dinheiro do contribuinte. Ou por falta de conhecimento do que é o nosso sistema, ou porque não se respeita o dinheiro do contribuinte. Já temos um corpo de servidores estável, que trabalha com a administração. Agora, às vezes, por conta de alguns defeitos, se propõe a criação de uma nova estrutura, com mais cargos, mais equipamentos, mais prédios públicos. Isso é só falta de respeito com o dinheiro do contribuinte. A experiência mostra o contrário: o Judiciário brasileiro é bem gerido. O que não quer dizer que não possa evoluir. Nem corrigir falhas.

ConJur — As decisões do STJ e do STF devem ser seguidas pelos desembargadores?
Fábio Prieto — Sem dúvida. Isto é da racionalidade do sistema decisório. Qualquer decisão superior, no sentido de hierarquia entre níveis decisórios, não entre pessoas, deve ser observada. Não é porque é o Judiciário. É irracional não observar isso.

ConJur — Qual a situação do processo eletrônico no TRF-3?
Fábio Prieto — O meu segundo objetivo era começar a instalação do processo eletrônico. O nosso tribunal federal é o maior do Brasil. Não se concebe a ideia de que não tenha processo eletrônico. Nós já temos alguma experiência com isto. Os processos administrativos na direção do tribunal são eletrônicos; o nosso juizado especial federal tem o melhor e mais testado programa de processo eletrônico, com mais de 3 milhões de feitos. Mas temos que ter esse programa para toda estrutura. Será uma operação de grandes proporções.

ConJur — Será que a comissão de implantação do PJe deveria ouvir a advocacia pública e privada ou o Ministério Público para ajudar nessa implementação?
Fábio Prieto — Quando eu ganhei a eleição, a primeira coisa que fiz foi me reunir com as entidades representativas da advocacia. A OAB, a Associação dos Advogados de São Paulo, o Instituto dos Advogados de São Paulo e o Movimento de Defesa da Advocacia. Vários de seus dirigentes são meus companheiros desde o meu tempo na advocacia. E eu garanti para eles que esse processo iria ser feito de forma negociada. E fiz o mesmo com o Ministério Público Federal e também com as outras instituições que atuam aqui, as procuradorias e defensorias públicas. Trata-se de um processo social, não de uma instituição. É preciso que você conheça as necessidades de todos, para que tenhamos o melhor projeto possível. Há comitês com a participação de todos esses segmentos. Já foram montados, temos todos os representantes. De outro lado, estamos fazendo os ensaios nos processos e definindo os fluxos de trabalho. Tudo isso foi feito de forma negociada e no melhor ambiente possível.

ConJur — Há alguma relutância com o processo eletrônico dentro do tribunal? Isso está sendo considerado?
Fábio Prieto — Se tem, nunca foi exposta para mim. Mas acredito que tenha. Eu acho que há certos temores, certas dúvidas, insegurança, pertinentes em qualquer processo de inovação. Não é porque é eletrônico, é porque é um processo novo.

ConJur — A 3ª Seção, que julga processos que envolvem Direito Previdenciário, é a maior seção do tribunal e também a que tem mais processos do tribunal. O que precisa ser feito para ajudar os julgadores? 
Fábio Prieto — Esse é o meu terceiro objetivo: dar apoio a seção que tem mais processos no tribunal. Temos, no tribunal, um gabinete de apoio, iniciado na gestão do desembargador Newton De Lucca. Providenciei mais funcionários e estamos trabalhando junto com os gabinetes que estão sendo auxiliados, com os desembargadores que são titulares desse gabinete. Não há interferência ou ruído de juiz de 1º Grau.

ConJur — Como no exemplo dos mutirões? O senhor é contra essa medida?
Fábio Prieto — Não tenho estusiasmo. Este modelo me parece disfuncional. Porque cria um elemento estranho, que não é permanente do tribunal. É bastante simples: nós temos que trabalhar com os grupos que têm permanência no tribunal; eles têm que se apropriar das teses, do conhecimento, da matéria, para ter funcionalidade e constância.

ConJur — Qual é o principal desafio da 3ª Região? Ainda é a grande demanda de processos?
Fábio Prieto — Sim e não. O Judiciário repete o modelo social brasileiro. Nós temos a Avenida Paulista e a favela. Dentro do Judiciário, isso se reproduz. Há ações que são julgadas, hoje, aqui, em dois graus de jurisdição, em seis meses. É muito rápido, como em um país de primeiro mundo ou talvez até melhor. E temos ações que demoram muito tempo. Não se pode apresentar receita genérica. É preciso focar nos problemas, saber onde e como se apresentam.

ConJur — Presidente, podemos dizer que a magistratura está carente? Há muitas reclamações na carreira. Por exemplo, os juízes reclamam que a remuneração devia seguir tempo de serviço, ou criticam a limitação do juiz que só pode desenvolver uma função. 
Fábio Prieto — Por que um senador não faz essa pergunta? Por que um cirurgião não faz essa pergunta? Por que um juiz satisfeito como eu não faz essa pergunta? Porque você está inteiro naquilo que faz. Se você tem maturidade, sabe o que é exigido e cumpre a função. O modelo brasileiro não é muito diferente de outros países.

ConJur — E a questão do vencimento por tempo de serviço? A reclamação é que o juiz com 20 anos de carreira recebe a mesma coisa que o juiz que acabou de entrar na carreira. Isso é um problema? Deveria ser modificado ou não?
Fábio Prieto — Eu acho que os dois modelos podem atender bem a sociedade e o juiz. Depende. A pequena diferença salarial, entre os vários níveis de produção do trabalho, é uma conquista dos países ricos. Mas não há nada de errado, também, em eventualmente se colocar um diferencial pelo tempo de serviço. Essa é uma opção que a sociedade fará no parlamento. O problema atual não é esse. O problema atual é mais grave e mais difícil de resolver, é a inflação. Quando o problema é de uma categoria profissional, ele é de fácil solução. Não é o caso.

ConJur — Qual é a situação dos juizados especiais hoje em dia? 
Fábio Prieto — Eu acho que, na média, é excepcional. Pela demanda que sofrem, é um serviço realmente espetacular aqui em São Paulo. Claro que nós temos problemas localizados, isso é próprio de um país com a nossa estrutura social. Mas esse é um modelo que funciona muito bem. Nós temos sempre que aperfeiçoá-lo, mas reconhecer que esse modelo é muito eficiente.

ConJur — Quais são os problemas que devem ser resolvidos?
Fábio Prieto — Normalmente, quando instalamos o JEF em uma cidade, a demanda aumenta. Os processos são deslocados da Justiça estadual para a federal. Mas as nossas unidades estão muito bem distribuídas. No geral, estão bem. Apesar dos problemas localizados, é uma ideia que o Brasil desenvolveu com grande sucesso.

ConJur — Quais são as características do juiz ideal?
Fábio Prieto — O juiz é ideal, porque não existe. As ditaduras têm a pretensão de ter agentes políticos ideais. A democracia liberal não tem essa pretensão. O juiz ideal só existe na cabeça dos tiranos e dos provincianos. O juiz ideal pressupõe o reconhecimento da existência de valores absolutos. As democracias liberais trabalham com o conceito de valores relativos. O juiz que é diferente de mim não é pior, nem melhor, é apenas diferente. Tem uma perspectiva de mundo diferente. E isso não é ser melhor ou ser pior. Tentar pasteurizar o juiz é próprio das sociedades autoritárias ou provincianas.

ConJur — O sistema recursal precisa de reformas?
Fábio Prieto — Urgente. Esse é o maior problema da justiça brasileira. O número um. Na 3ª região, se nós não tivéssemos um sistema recursal tão burocrático, já estaríamos em outro patamar de justiça, de prestação de serviço, dos países que fazem isso da melhor forma. É necessário e urgente que se faça isso.

ConJur — Os filtros para recursos são a solução?
Fábio Prieto — Os sistema de administração de justiça operativos têm algumas características que se repetem. Uma delas é ter filtro. O JEF é um filtro. Quando eu era juiz federal criminal, no início da década de 90, julgava o banqueiro da Rua Boavista e o sujeito que matava uma capivara em Presidente Venceslau. Não havia filtro. No Brasil, fizemos isso com os juizados especiais. Outra coisa comum a todo sistema judiciário operativo: a entrada deve ser acessível, barata. Mas os recursos nos sistemas que são operativos são sempre caros.

ConJur — Qual é o papel que o CNJ deve desempenhar: controlar a atuação dos juízes ou trabalhar na gestão administrativa do Judiciário?
Fábio Prieto — As duas coisas. Deve fazer tudo aquilo que está na Constituição. O CNJ é órgão de cúpula na administração do Poder Judiciário. Deve exercer essa função de gestão com cuidado, sabendo que o Brasil é um país continental, onde há tribunais com estrutura administrativa muito eficiente, com tradição na prestação de serviços judiciários; outros, não. Deve exercer a função disciplinar, quando isso se mostrar necessário.

ConJur — A especialização das varas é uma forma de trazer celeridade e soluções mais técnicas para os casos?
Fábio Prieto — Depende. Esta é uma receita que se tem aplicado para qualquer doença. Todo dia, aqui no tribunal, recebo pedido para especializar varas. Se especializar todas que me pedem, vai faltar juiz. Tem que ser analisado caso a caso.

ConJur — O senhor leva em consideração a quantidade de processos que cada desembargador está julgando? Isso é uma função do presidente?
Fábio Prieto — Indiretamente acaba levando. Porque para definir quais são as prioridades, é preciso saber o que acontece no tribunal. E uma das coisas mais importantes é exatamente o número de votos que cada desembargador produz. É um dado central de gestão. Não se trata de exercício de poder disciplinar, porque isso não compete ao presidente. Agora, o presidente tem que saber o que acontece em todas as áreas. E uma das principais atividades, senão a principal, é exatamente fazer voto.

ConJur — Qual é a situação da primeira instância da 3ª Região?
Fábio Prieto — Como regra, é bastante equilibrada. O desembargador Newton de Lucca executou um trabalho muito importante. Redimensionou toda a distribuição de competências na 3 Região. Foi uma iniciativa excelente.

ConJur — Na gestão anterior, houve uma preocupação muito grande em implantar novas varas no interior. Isso está sendo feito ou já há um número considerável de varas?
Fábio Prieto — O Congresso aprovou uma lei, com a previsão de novas varas nas cinco regiões. A instalação destas varas foi distribuída por vários anos, para diminuir o impacto orçamentário. Os presidentes anteriores cumpriram o cronograma. Também cumprirei. Está tudo pronto e organizado para isto. 


Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 13 de julho de 2014, 07:47h

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