segunda-feira, 14 de julho de 2014

"JUIZ QUE SACRIFICA SUA INDEPENDÊNCIA PARA SER SUBORDINADO SERÁ UM LÍDER RUIM"


"Juiz que sacrifica sua independência para ser subordinado será um líder ruim"



"O juiz que sacrifica a sua independência para se tornar subordinado poderá, no futuro, ser um líder de má qualidade." A afirmação é do presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Fábio Prieto, para quem é preciso que o juiz exercite a sua "característica fundamental: a independência funcional".

Na sua gestão, Prieto busca priorizar a atividade-fim do Poder Judiciário: julgar. Contrário à burocratização e à "funcionarização" da magistratura, não tem juiz assessor em seu gabinete. Os desembargadores federais que indicou para cargos administrativos não se afastaram da jurisdição. Para ele, mais que contrárias à Lei Orgânica da Magistratura, tais condutas podem comprometer a formação de novas lideranças.

“É muito confortável ter, aqui, três ou quatro juízes federais assessorando o presidente. É evidente que eu gostaria muito de fazer isso. Não faço, porque tenho um compromisso maior com a institucionalidade do Poder Judiciário", diz.

Responsável por instalar as turmas criminas exclusivas no tribunal, Prieto é visto como um gestor prático, que não espera ter as condições perfeitas para executar o que acha necessário. As novas turmas das 1ª e 4º seções serão compostas por três desembargadores, enquanto as demais continuarão com quatro integrantes.

O TRF-3 é a corte federal que mais recebe processos no país e é o tribunal com os melhores números de desempenho, nos três indicadores de produtividade medidos pelo CNJ. Segundo a pesquisa do Instituto de Direito de Público, de Brasília, a corte é o melhor tribunal de apelação do país.

Prieto estipulou duas metas principais para a sua gestão: começar a implantação do processo eletrônico e ajudar a 3ª seção do tribunal — competente para julgar processos relacionados ao direito previdenciário.

Prieto liderou a pacificação do então mais conflagrado tribunal do país. De 2005 em diante, todas as eleições do tribunal foram parar no Supremo Tribunal Federal. Na eleição de 2011, Prieto recusou a candidatura à presidência do TRF-3, para não iniciar um novo conflito. Apoiou Newton de Lucca e foi candidato à Corregedoria. Quando as urnas foram abertas, Prieto foi o mais votado. 

Em novembro de 2013, foi eleito pelo pleno do tribunal com 97% dos votos. Nomeado desembargador pelo Presidente da República, em 1998, aos 36 anos, foi o primeiro juiz federal concursado por um dos cinco tribunais regionais federais a ser promovido a desembargador. E o único a chegar na presidência. 

Quando atuou na 2ª Seção do tribunal, competente para o julgamento de matéria tributária, o desembargador recebeu o maior acervo acumulado da história do tribunal: mais de 11 mil processos. Quando saiu para assumir a Corregedoria, deixou 4 mil processos. 

Fábio Prieto foi advogado e membro do Ministério Público do Estado de São Paulo, antes de prestar concurso para juiz federal. 

Leia a entrevista:

ConJur — Quando o senhor assumiu a presidência, quais eram as preocupações?
Fábio Prieto — Eu me preocupo com dois eixos centrais: a institucionalidade do Poder Judiciário e a gestão administrativa do tribunal. Com a institucionalidade, eu quero preservar a independência dos juízes e desembargadores e a funcionalidade de alto nível dos nossos servidores. Isso implica em não chamar juízes assessores para o tribunal. Nem para a presidência. Nem para os desembargadores que ocupam funções administrativas indicados por mim. Esses desembargadores não estão afastados das funções jurisdicionais. Porque o principal aqui é a função jurisdicional. Isso libera os nossos servidores, de excelente nível, altamente capacitados, com larga experiência, para desempenhar o papel que lhes cabe. Os servidores fazem isso, com muita competência.

ConJur — Por que os desembargadores não podem ter um juiz assessor? 
Fábio Prieto — A Lei Orgânica da Magistratura veta a prática expressamente. Não existe independência funcional subordinada. Ou subordinação independente. A proibição tem uma razão de ser. É importante formar uma nova geração de líderes. O juiz que sacrifica a sua independência, para se tornar subordinado, no futuro poderá ser um líder de má qualidade. É preciso que o juiz exercite a sua característica fundamental: a independência funcional. É muito confortável ter, aqui, três ou quatro juízes federais assessorando o presidente. É evidente que eu gostaria muito de fazer isso. Não faço, porque tenho um compromisso maior: com a institucionalidade do poder judiciário. O juiz é juiz quando tem independência funcional. Hoje, nós temos juízes que não dão uma sentença há 10 anos. O que é essa pessoa? Juiz não é. Os Governadores devem explicar a razão pela qual um policial militar não está no policiamento de rua, mas na banda da corporação ou no setor de preenchimento de formulários. Como um agente político tão bem formado e caro, como o juiz, não está prolatando sentenças, mas abrindo portas e carregando os escritos de ministros e desembargadores? É o estímulo errado.

ConJur — Uma das suas metas, quando assumiu o cargo, era instalar as duas turmas especializadas em Direito Penal. Por que essa mudança demorou tanto? Houve resistência dos desembargadores?
Fábio Prieto — O tribunal mudou o regimento em setembro de 2012, na gestão anterior. Por várias razões, só agora executou essa tarefa. Uma pretensão legitima do próprio tribunal, da advocacia e do Ministério Público. Todos estão de acordo com isso, a mudança foi feita. Eu fiz a reforma administrativa necessária. Aprovada por unanimidade. Consegui as gratificações, para montar essas unidades de serviço. Arrumei o equipamento de informática. Alojei as novas unidades judiciárias no prédio do tribunal. As turmas foram instaladas no começo de julho. Está tudo andando bem. Não surgiram problemas. Se surgirem, vamos enfrentá-los.

ConJur — Os servidores foram realocados? Como foi feita essa mudança no tribunal?
Fábio Prieto — Essa mudança poderia ser feita de dois modos. Com a criação de novos cargos, por lei. Fora de cogitação. Ou redistribuindo recursos e pessoas. Como em uma empresa privada, quando vai criar uma diretoria. No tribunal, a mudança passa por conselhos colegiados de administração. Eu tirei gratificações aqui da presidência, que já é muito enxuta, e de algum outros locais do tribunal, e aprovei tudo isso por unanimidade. Não teve um voto contra. O processo é coletivo. O presidente só lidera. É importante lembrar que, entre os vários indicadores de desempenho nos quais o TRF-3 se destaca, um deles diz respeito à relação entre servidores designados nas atividades fim e meio. O nosso tribunal é o mais direcionado para a atividade-fim. Ainda assim, cortei a já enxuta estrutura da presidência.

ConJur — Por que as turmas criminais eram necessárias?
Fábio Prieto — Eu não colocaria nessa perspectiva da necessidade. Vamos considerar a expectativa de melhora de desempenho, via especialização. Eu diria que isso foi visto como uma experiência que deveria ser feita. E como essa experiência tinha e tem o apoio do próprio tribunal, tem o apoio da advocacia, dos advogados criminalistas, e do Ministério Público, não havia razão para que não fosse feita.

ConJur — Então o senhor não sentiu nenhuma relutância, na criação dessas novas turmas?
Fábio Prieto — Alguns colegas tiveram dúvidas. Essas dúvidas são naturais do processo. Seria estranho, se não tivéssemos dúvidas, em um grupo heterogêneo. Mas acabou prevalecendo a ideia de que era melhor tentar avançar com esse projeto. Por coincidência, agora, o Supremo também levou a matéria criminal para as turmas.

ConJur — O processo de criação dessas turmas foi demorado, principalmente porque ficou parado no CNJ, que não liberou os 12 juízes que seriam convocados do primeiro grau, para compor as turmas. Assim, cada turma teria quatro julgadores e não três, como foi feito agora. Essa decisão de montar quatro turmas de três desembargadores foi a melhor solução?
Fábio Prieto — Os 12 juízes iriam trabalhar no estoque antigo de processos. Mas as estatísticas dos desembargadores provam que isto não é necessário. A expressiva maioria dos gabinetes tem números bons.

ConJur — Esse número reduzido de desembargadores pode prejudicar no julgamento? Por exemplo, na ausência de um julgador, a sessão vai ser cancelada por falta de quórum?
Fábio Prieto — A solução é muito simples. Está na Lei Orgânica da Magistratura desde 1979. Na ausência de um desembargador, um colega da turma ao lado é chamado para completar o quórum e votar. É claro que quando a turma chama um colega para a sessão, os desembargadores não vão levar um processo de 500 volumes para julgar naquele dia. Isso é natural de qualquer processo de trabalho, em regime de substituição. Não se trata de uma particularidade do Judiciário, nem do nosso tribunal.

ConJur — Como vai ficar a distribuição dos processos?
Fábio Prieto — As relatorias não foram alteradas, em relação aos processos já distribuídos. A competência só foi alterada a partir da instalação. Os acervos antigos ficaram com os relatores originais.

ConJur — E em relação ao volume de processos que será distribuído? As turmas vão continuar recebendo os processos, mas a distribuição será feita entre três julgadores e não quatro, como antes. Com isso, cada desembargador receberá mais processos? Isso é um problema? 
Fábio Prieto — Não. A expectativa é obter ganho com a especialização. Agora, não podemos dizer o que vai acontecer. Se vai ser mais fácil julgar o cível ou o criminal, ninguém sabe. Nós imaginamos, pelo número de processos e pelo desempenho dos desembargadores, que não haverá problema em setor algum. Vamos acompanhar a evolução do projeto.

ConJur — Pelos números, as turmas especializadas em Direito Civil vão receber mais processos do que as turmas criminais...
Fábio Prieto — Cuidado com a interpretação dos números no Judiciário brasileiro. A nossa cultura ainda é de julgamento de processos, não de causas. Ou seja, uma causa é repetida em milhões de processos iguais. Depois de 20 anos, a causa chega ao STF e é resolvida. Aos poucos, o Brasil está abandonando este modelo. O que é muito positivo.

ConJur — Precisamos abandonar o modelo de julgamento de processos e não de causas?
Fábio Prieto — Estamos fazendo a transição, na medida em que há Ações Diretas de Insconstitucionalidade, controle de constitucionalidade pelo Supremo, repercussão geral e outros instrumentos. Há áreas nas quais a cada causa corresponderá necessariamente um processo. Direito de Família, por exemplo.

ConJur — O julgamento em bloco é um problema?
Fábio Prieto — Dentro deste sistema ruim, de julgamento de processos repetidos, é uma solução. Se as petições iniciais e as contestações são iguais, não poderiam ser distintas as sentenças. Isto me lembra o tempo do mimeógrafo, com tinta azul. Um juiz diligente comprou o aparelho. Fez 15 sentenças iguais, com ar de modernidade. Estamos nos anos 80. Os recursos caem com um desembargador intelectualmente limitado e emocionalmente invejoso. Sua Excelência manda datilografar 15 acórdãos iguais e anula as sentenças. Motivo: as sentenças eram todas as iguais. O papel carbono censurou o mimeógrafo.

Mas o nosso sistema está evoluindo muito. Veja o artigo 557 do CPC. Primo distante do artigo 90, parágrafo 2º, da Loman. O 557 fez uma revolução silenciosa. Deu autoridade aos precedentes, sem os ritos e as formalidades necessárias para a edição de uma súmula ou do incidente de uniformização de jurisprudência. Tanto que a súmula vinculante e as súmulas em geral perderam todo o impacto. Hoje, quem informa é o computador. Você pesquisa e aplica o direito, os precedentes.

ConJur — O juiz brasileiro é um bom administrador?
Fábio Prieto — Do ponto de vista da administração, o juiz brasileiro é visto como um dos grandes exemplos no mundo. O juiz brasileiro é formado em uma escola invisível de administração. Ele entra como juiz substituto, em qualquer segmento da justiça. Vai trabalhar junto com o juiz titular. Ali, vai verificar como esse juiz trabalha, a administração dos processos, dos servidores, de materiais. Passados vários anos, será juiz titular. Vai implementar o seu próprio modelo. Com o tempo, começa a exercer funções administrativas dentro dos fóruns. É diretor do foro, coordenador de algum setor. Todos estes anos, ao lado dele, há um grupo de servidores especializado em administração. O nosso sistema é de cogestão. Não é o juiz que faz sozinho.

ConJur — Nesse sistema de cogestão, o juiz aprende desde cedo como ser um administrador?
Fábio Prieto — Temos um sistema no Brasil de cogestão, de juízes e servidores especializados na administração. Se o juiz chegar ao tribunal, vai entrar no último lugar. Não vai participar da administração, mas vai ter contato com aqueles que participam. Com os anos, vai ser suplente de um conselho de administração, de um órgão com natureza administrativa. Vai começar a relatar processos deste tipo. Começar a conviver com os dirigentes do tribunal. Se, eventualmente, chegar nos cargos de direção, vai trabalhar com uma grande equipe administrativa. Nós temos um grupo especializado nisso, estável. Nosso sistema é de cogestão, do começo ao fim da carreira. E é por isso que o juiz brasileiro é, em regra, um bom gestor. Ele aprende a ser um bom gestor o tempo todo.

ConJur — Então, trazer uma equipe de gestão de fora para atuar no tribunal é perda de tempo?
Fábio Prieto — É só para gastar o dinheiro do contribuinte. Ou por falta de conhecimento do que é o nosso sistema, ou porque não se respeita o dinheiro do contribuinte. Já temos um corpo de servidores estável, que trabalha com a administração. Agora, às vezes, por conta de alguns defeitos, se propõe a criação de uma nova estrutura, com mais cargos, mais equipamentos, mais prédios públicos. Isso é só falta de respeito com o dinheiro do contribuinte. A experiência mostra o contrário: o Judiciário brasileiro é bem gerido. O que não quer dizer que não possa evoluir. Nem corrigir falhas.

ConJur — As decisões do STJ e do STF devem ser seguidas pelos desembargadores?
Fábio Prieto — Sem dúvida. Isto é da racionalidade do sistema decisório. Qualquer decisão superior, no sentido de hierarquia entre níveis decisórios, não entre pessoas, deve ser observada. Não é porque é o Judiciário. É irracional não observar isso.

ConJur — Qual a situação do processo eletrônico no TRF-3?
Fábio Prieto — O meu segundo objetivo era começar a instalação do processo eletrônico. O nosso tribunal federal é o maior do Brasil. Não se concebe a ideia de que não tenha processo eletrônico. Nós já temos alguma experiência com isto. Os processos administrativos na direção do tribunal são eletrônicos; o nosso juizado especial federal tem o melhor e mais testado programa de processo eletrônico, com mais de 3 milhões de feitos. Mas temos que ter esse programa para toda estrutura. Será uma operação de grandes proporções.

ConJur — Será que a comissão de implantação do PJe deveria ouvir a advocacia pública e privada ou o Ministério Público para ajudar nessa implementação?
Fábio Prieto — Quando eu ganhei a eleição, a primeira coisa que fiz foi me reunir com as entidades representativas da advocacia. A OAB, a Associação dos Advogados de São Paulo, o Instituto dos Advogados de São Paulo e o Movimento de Defesa da Advocacia. Vários de seus dirigentes são meus companheiros desde o meu tempo na advocacia. E eu garanti para eles que esse processo iria ser feito de forma negociada. E fiz o mesmo com o Ministério Público Federal e também com as outras instituições que atuam aqui, as procuradorias e defensorias públicas. Trata-se de um processo social, não de uma instituição. É preciso que você conheça as necessidades de todos, para que tenhamos o melhor projeto possível. Há comitês com a participação de todos esses segmentos. Já foram montados, temos todos os representantes. De outro lado, estamos fazendo os ensaios nos processos e definindo os fluxos de trabalho. Tudo isso foi feito de forma negociada e no melhor ambiente possível.

ConJur — Há alguma relutância com o processo eletrônico dentro do tribunal? Isso está sendo considerado?
Fábio Prieto — Se tem, nunca foi exposta para mim. Mas acredito que tenha. Eu acho que há certos temores, certas dúvidas, insegurança, pertinentes em qualquer processo de inovação. Não é porque é eletrônico, é porque é um processo novo.

ConJur — A 3ª Seção, que julga processos que envolvem Direito Previdenciário, é a maior seção do tribunal e também a que tem mais processos do tribunal. O que precisa ser feito para ajudar os julgadores? 
Fábio Prieto — Esse é o meu terceiro objetivo: dar apoio a seção que tem mais processos no tribunal. Temos, no tribunal, um gabinete de apoio, iniciado na gestão do desembargador Newton De Lucca. Providenciei mais funcionários e estamos trabalhando junto com os gabinetes que estão sendo auxiliados, com os desembargadores que são titulares desse gabinete. Não há interferência ou ruído de juiz de 1º Grau.

ConJur — Como no exemplo dos mutirões? O senhor é contra essa medida?
Fábio Prieto — Não tenho estusiasmo. Este modelo me parece disfuncional. Porque cria um elemento estranho, que não é permanente do tribunal. É bastante simples: nós temos que trabalhar com os grupos que têm permanência no tribunal; eles têm que se apropriar das teses, do conhecimento, da matéria, para ter funcionalidade e constância.

ConJur — Qual é o principal desafio da 3ª Região? Ainda é a grande demanda de processos?
Fábio Prieto — Sim e não. O Judiciário repete o modelo social brasileiro. Nós temos a Avenida Paulista e a favela. Dentro do Judiciário, isso se reproduz. Há ações que são julgadas, hoje, aqui, em dois graus de jurisdição, em seis meses. É muito rápido, como em um país de primeiro mundo ou talvez até melhor. E temos ações que demoram muito tempo. Não se pode apresentar receita genérica. É preciso focar nos problemas, saber onde e como se apresentam.

ConJur — Presidente, podemos dizer que a magistratura está carente? Há muitas reclamações na carreira. Por exemplo, os juízes reclamam que a remuneração devia seguir tempo de serviço, ou criticam a limitação do juiz que só pode desenvolver uma função. 
Fábio Prieto — Por que um senador não faz essa pergunta? Por que um cirurgião não faz essa pergunta? Por que um juiz satisfeito como eu não faz essa pergunta? Porque você está inteiro naquilo que faz. Se você tem maturidade, sabe o que é exigido e cumpre a função. O modelo brasileiro não é muito diferente de outros países.

ConJur — E a questão do vencimento por tempo de serviço? A reclamação é que o juiz com 20 anos de carreira recebe a mesma coisa que o juiz que acabou de entrar na carreira. Isso é um problema? Deveria ser modificado ou não?
Fábio Prieto — Eu acho que os dois modelos podem atender bem a sociedade e o juiz. Depende. A pequena diferença salarial, entre os vários níveis de produção do trabalho, é uma conquista dos países ricos. Mas não há nada de errado, também, em eventualmente se colocar um diferencial pelo tempo de serviço. Essa é uma opção que a sociedade fará no parlamento. O problema atual não é esse. O problema atual é mais grave e mais difícil de resolver, é a inflação. Quando o problema é de uma categoria profissional, ele é de fácil solução. Não é o caso.

ConJur — Qual é a situação dos juizados especiais hoje em dia? 
Fábio Prieto — Eu acho que, na média, é excepcional. Pela demanda que sofrem, é um serviço realmente espetacular aqui em São Paulo. Claro que nós temos problemas localizados, isso é próprio de um país com a nossa estrutura social. Mas esse é um modelo que funciona muito bem. Nós temos sempre que aperfeiçoá-lo, mas reconhecer que esse modelo é muito eficiente.

ConJur — Quais são os problemas que devem ser resolvidos?
Fábio Prieto — Normalmente, quando instalamos o JEF em uma cidade, a demanda aumenta. Os processos são deslocados da Justiça estadual para a federal. Mas as nossas unidades estão muito bem distribuídas. No geral, estão bem. Apesar dos problemas localizados, é uma ideia que o Brasil desenvolveu com grande sucesso.

ConJur — Quais são as características do juiz ideal?
Fábio Prieto — O juiz é ideal, porque não existe. As ditaduras têm a pretensão de ter agentes políticos ideais. A democracia liberal não tem essa pretensão. O juiz ideal só existe na cabeça dos tiranos e dos provincianos. O juiz ideal pressupõe o reconhecimento da existência de valores absolutos. As democracias liberais trabalham com o conceito de valores relativos. O juiz que é diferente de mim não é pior, nem melhor, é apenas diferente. Tem uma perspectiva de mundo diferente. E isso não é ser melhor ou ser pior. Tentar pasteurizar o juiz é próprio das sociedades autoritárias ou provincianas.

ConJur — O sistema recursal precisa de reformas?
Fábio Prieto — Urgente. Esse é o maior problema da justiça brasileira. O número um. Na 3ª região, se nós não tivéssemos um sistema recursal tão burocrático, já estaríamos em outro patamar de justiça, de prestação de serviço, dos países que fazem isso da melhor forma. É necessário e urgente que se faça isso.

ConJur — Os filtros para recursos são a solução?
Fábio Prieto — Os sistema de administração de justiça operativos têm algumas características que se repetem. Uma delas é ter filtro. O JEF é um filtro. Quando eu era juiz federal criminal, no início da década de 90, julgava o banqueiro da Rua Boavista e o sujeito que matava uma capivara em Presidente Venceslau. Não havia filtro. No Brasil, fizemos isso com os juizados especiais. Outra coisa comum a todo sistema judiciário operativo: a entrada deve ser acessível, barata. Mas os recursos nos sistemas que são operativos são sempre caros.

ConJur — Qual é o papel que o CNJ deve desempenhar: controlar a atuação dos juízes ou trabalhar na gestão administrativa do Judiciário?
Fábio Prieto — As duas coisas. Deve fazer tudo aquilo que está na Constituição. O CNJ é órgão de cúpula na administração do Poder Judiciário. Deve exercer essa função de gestão com cuidado, sabendo que o Brasil é um país continental, onde há tribunais com estrutura administrativa muito eficiente, com tradição na prestação de serviços judiciários; outros, não. Deve exercer a função disciplinar, quando isso se mostrar necessário.

ConJur — A especialização das varas é uma forma de trazer celeridade e soluções mais técnicas para os casos?
Fábio Prieto — Depende. Esta é uma receita que se tem aplicado para qualquer doença. Todo dia, aqui no tribunal, recebo pedido para especializar varas. Se especializar todas que me pedem, vai faltar juiz. Tem que ser analisado caso a caso.

ConJur — O senhor leva em consideração a quantidade de processos que cada desembargador está julgando? Isso é uma função do presidente?
Fábio Prieto — Indiretamente acaba levando. Porque para definir quais são as prioridades, é preciso saber o que acontece no tribunal. E uma das coisas mais importantes é exatamente o número de votos que cada desembargador produz. É um dado central de gestão. Não se trata de exercício de poder disciplinar, porque isso não compete ao presidente. Agora, o presidente tem que saber o que acontece em todas as áreas. E uma das principais atividades, senão a principal, é exatamente fazer voto.

ConJur — Qual é a situação da primeira instância da 3ª Região?
Fábio Prieto — Como regra, é bastante equilibrada. O desembargador Newton de Lucca executou um trabalho muito importante. Redimensionou toda a distribuição de competências na 3 Região. Foi uma iniciativa excelente.

ConJur — Na gestão anterior, houve uma preocupação muito grande em implantar novas varas no interior. Isso está sendo feito ou já há um número considerável de varas?
Fábio Prieto — O Congresso aprovou uma lei, com a previsão de novas varas nas cinco regiões. A instalação destas varas foi distribuída por vários anos, para diminuir o impacto orçamentário. Os presidentes anteriores cumpriram o cronograma. Também cumprirei. Está tudo pronto e organizado para isto. 


Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 13 de julho de 2014, 07:47h

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