quarta-feira, 1 de agosto de 2012

AULA DE DIREITO EMPRESARIAL I - PARTE GERAL







AULA DE DIREITO EMPRESARIAL I 


1 - Introdução ao Direito Empresarial 



1.1 - Introdução 


Embora não reste dúvida da existência de algumas regras particulares destinadas a controlar o comércio e a circulação de bens de consumo desde mais de dois mil anos antes de Cristo, é certo que o Direito Comercial somente começou a adquirir alguma consistência a partir da Idade Média. 


O comércio na época era essencialmente marítimo e como não havia ainda um poder político que pudesse estabelecer regras gerais que abarcasse um número considerável de mercadores, ou que fosse substancialmente respeitado pela classe burguesa, cada região, principalmente da Europa, berço da civilização, criava e divulgava suas próprias regras regionais. 



O bom funcionamento destas regras dependia do grau de influência de cada região em razão dos seus produtos de comércio e dos interesses dos comerciantes compradores ou distribuidores. 


O Direito Canônico, pela sua capacidade de irradiar pelas mais remotas regiões, tinha força para impor regras mas, como não valorizava o lucro e repudiava os juros, não zelava pelo desenvolvimento do comércio, permitindo pela omissão, que fossem mantidos alguns institutos comerciais típicos originários do costume regional e da engenhosidade dos comerciantes. 


A partir do início dos anos 1500 surgiram os primeiros grupos organizados de profissionais mercadores que foram disseminando uma nova cultura comercial e estabelecendo regras que regiam as relações entre seus membros. 


Estas regras, embora corporativas, foram pressionando os poderes estatais a ponto de influenciar definitivamente na crença de que era imperativa a criação do direito comercial oficial já que em algumas situações, por se vincular à atividade mercantil, as regras privadas se impunham e às vezes desafiavam os demais direitos. 


Até então a jurisdição mercantil era monopólio das chamadas corporações de ofício, contudo, com o surgimento dos Estados Nacionais, controlados com vigor pelos monarcas absolutos, novas forças foram se compondo de forma que as leis estatais, embora adotando os usos e costumes da época, foi inibindo, pouco a pouco, a criação e fortalecimento das normas de comércio originadas das corporações privadas. 



1.2 - Codificação Napoleônica 


Mas o início verdadeiro de um sistema jurídico estatal nasceu com a codificação Napoleônica na França que criou duas vertentes para o direito privado. No ano de 1804 foi editado o Código Civil, destinado a atender os interesses da chamada burguesia fundiária, regulamentando essencialmente o direito de propriedade, e em 1808 foi anunciado o Código Comercial como o diploma regulador dos chamados atos de comércio que abrangia as relações jurídicas de transporte, comércio e indústria. 


O Code de Commerce francês foi severamente criticado por doutrinadores da época. Alguns apontavam vícios na forma e na filosofia que o inspirou, outros condenavam também suas disposições objetivas e ou omissões.


Entre tantas, algumas das críticas mais sérias diziam respeito ao fato de que restaram esquecidas as atividades de prestação de serviços, negociação imobiliária e atividades rurais que deveriam estar contempladas no código porque se inseriam no conceito de atos de comércio. 


O Brasil, que até então aplicava a legislação portuguesa para solucionar conflitos, com a abertura dos portos em 1808, sentiu o quanto se fazia necessário possuir uma legislação apropriada para as relações comerciais. Então, depois de navegar na burocracia, houve por bem de instituir uma comissão de juristas com o objetivo de criar e apresentar um projeto de lei com sugestões de normas que regulassem o comércio internacional. 


Apesar da celeuma que envolvia as regras francesas, os Códigos de Napoleão Bonaparte fizeram escola e, lentamente, foram absorvidos por outras culturas, depois, entre tantas, também foram adotadas pelo Brasil que, em 1850, editou o Código Comercial Brasileiro. 


Com o tempo as normas brasileiras foram adotando figuras jurídicas mais novas, algumas da escola italiana, outras desenvolvidas pelos doutrinadores ou pela jurisprudência pátria, até que, finalmente, pelo novo Código Civil brasileiro instituído pela Lei 10.406/02 as regras legais alcançaram o pensamento moderno e a teoria francesa dos atos de comércio, foi substituída pela teoria da empresa, de origem italiana. 
1.3 - Direito Comercial e Direito Empresarial 



Diante desta real e vigente orientação legal surgiu uma dúvida interessante. Alguns estudiosos se perguntavam se seria correta a substituição da expressão direito comercial pela expressão direito empresarial, ou se seria possível e coerente a utilização de ambas as figuras independentemente ou, ainda, se seria adequado utilizá-las como expressões sinônimas. 


É inquestionável que hoje a expressão direito comercial é pouco utilizada, todavia, grandes autores insistem em afirmar que se trata de uma terminologia tradicional e que o fato da adoção da teoria da empresa pelo ordenamento jurídico nacional não implica na sua substituição. 
Em meio a estas conceituações, de pouca utilidade prática, no nosso sentir é bom não abandonar nenhuma das expressões. O direito comercial e o direito empresarial podem conviver, como figuras independentes ou como sinônimas, sem que haja efetivo prejuízo para qualquer entendimento. 


É oportuno, ainda nesta fase de introdução, observar que o Código Civil abriu espaço para inserir em meio ao seu regramento o direito empresarial como um regime jurídico especial, contudo, ao lado de outras especialidades, também importantes e aparentemente autônomas. 



Importa observar que a Constituição Federal vigente, na leitura do seu artigo 22, inciso I, distingue o direito civil do direito comercial, contudo, a nosso ver, esta separação não implica em atribuir absoluta autonomia e independência ao direito empresarial, registrando, todavia, que inúmeros doutrinadores entendem de modo diferente. 


A tese da autonomia, respeitável, se apóia na assertiva de que, em se considerando o ponto de vista substancial ou material, o direito empresarial gozaria de efetiva independência aos demais ramos jurídicos, ainda que abrigados no mesmo diploma legal.
Mas parece absolutamente claro que o legislador entendeu que a separação outrora existente entre o direito comercial e o direito civil não correspondia ao fato inequívoco de que estas especialidades seriam meras faces do direito privado e que, por isso, caberiam em um único arcabouço jurídico. 


Na verdade o Código Civil regula somente o núcleo do direito empresarial já que outras normas da mesma forma importantes e especialíssimas, também o alimentam.




Apenas para registrar a existência de normas extravagantes também influentes no direito empresarial é oportuno destacar aquelas que dispõem sobre os títulos de crédito, direito bancário, propriedade industrial, direito concorrencial, etc. 



Assim, para adotar uma definição simples, é possível admitir que o direito empresarial moderno, inserto no Código Civil como um regime jurídico especial e ramo do direito privado, é destinado a regular as atividades econômicas; as relações dos sujeitos a elas vinculados e os instrumentos que as viabilizam no mundo jurídico. 


2 - Registro de Empresa

2.1 - Inscrição perante a Junta Comercial 


Como visto anteriormente, a lei determina que antes do início das atividades o empresário e a sociedade empresária devem se inscrever perante a Junta Comercial. 



Importa registrar, por oportuno, que o fato do empresário por qualquer motivo deixar de se atender esta disposição legal, não quer dizer que ele estaria dispensado de cumprir o regime jurídico empresarial, aliás, é necessário observar que a inscrição perante a Junta Comercial é um requisito delineador da regularidade formal, mas não da sua caracterização. 



Ou seja, independentemente da inscrição perante a Junta Comercial, o empresário, de qualquer forma, ao exercer atividade empresária, estará sujeito a todos os ônus, compromissos e responsabilidades próprios do regime empresarial. 


O Registro está disciplinado em lei especial (Lei 8.934/94), contudo, o Código Civil nos artigos 1.150 a 1.154 também dispõe sobre a matéria.

Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária.


Art. 1.151. O registro dos atos sujeitos à formalidade exigida no artigo antecedente será requerido pela pessoa obrigada em lei, e, no caso de omissão ou demora, pelo sócio ou qualquer interessado.§ 1o Os documentos necessários ao registro deverão ser apresentados no prazo de trinta dias, contado da lavratura dos atos respectivos. 
§ 2o Requerido além do prazo previsto neste artigo, o registro somente produzirá efeito a partir da data de sua concessão. 

§ 3o As pessoas obrigadas a requerer o registro responderão por perdas e danos, em caso de omissão ou demora.

Art. 1.152. Cabe ao órgão incumbido do registro verificar a regularidade das publicações determinadas em lei, de acordo com o disposto nos parágrafos deste artigo. 

§ 1o Salvo exceção expressa, as publicações ordenadas neste Livro serão feitas no órgão oficial da União ou do Estado, conforme o local da sede do empresário ou da sociedade, e em jornal de grande circulação.

§ 2o As publicações das sociedades estrangeiras serão feitas nos órgãos oficiais da União e do Estado onde tiverem sucursais, filiais ou agências. 

§ 3o O anúncio de convocação da assembléia de sócios será publicado por três vezes, ao menos, devendo mediar, entre a data da primeira inserção e a da realização da assembléia, o prazo mínimo de oito dias, para a primeira convocação, e de cinco dias, para as posteriores.

Art. 1.153. Cumpre à autoridade competente, antes de efetivar o registro, verificar a autenticidade e a legitimidade do signatário do requerimento, bem como fiscalizar a observância das prescrições legais concernentes ao ato ou aos documentos apresentados. 

Parágrafo único. Das irregularidades encontradas deve ser notificado o requerente, que, se for o caso, poderá saná-las, obedecendo às formalidades da lei.

Art. 1.154. O ato sujeito a registro, ressalvadas disposições especiais da lei, não pode, antes do cumprimento das respectivas formalidades, ser oposto a terceiro, salvo prova de que este o conhecia. 




2.2 - Juntas Comerciais 






As Juntas Comerciais, embora façam parte da estrutura administrativa dos Estados, executam e administram os registros que são regidos por normas e diretrizes de âmbito federal. Portanto, as Juntas Comerciais mantêm subordinação hierárquica híbrida. De um lado se submetem administrativamente ao governo da unidade federativa de sua jurisdição, de outro, no aspecto técnico e legal, se subordinam ao Departamento Nacional de Registro de Comércio, que é órgão federal.





Esta situação atípica se reflete no mundo jurídico e processual porque na hipótese de um empresário necessitar impetrar mandado de segurança contra a negativa do registro de uma alteração contratual, por exemplo, deverá fazê-lo perante a Justiça Federal, vez que embora a Junta tenha uma estrutura administrativa estadual, os serviços de registro de comércio têm natureza e subordinação federal. 



A Junta Comercial exerce como função preponderante o registro dos atos de registro dos empresários que são: matrícula; arquivamento e autenticação.

Matrícula - registro de profissionais específicos como leiloeiros; tradutores públicos; intérpretes; trapicheiros e administradores de armazéns gerais. 


Arquivamento - registro, em geral, relativo aos atos de constituição; alteração; dissolução e extinção de firmas individuais, sociedades mercantis e cooperativas, bem como os atos concernentes às empresas mercantis autorizadas a funcionar no Brasil; declaração de microempresas, entre outros. 



Autenticação - registro de instrumentos de escrituração contábil do empresário e dos agentes auxiliares do comércio (profissionais específicos). 



A função das Juntas Comerciais, nestes casos, é permitir a publicidade dos atos dos agentes econômicos, fazendo com que, uma vez regularizados conforme prescreve a lei, possam ser opostos a terceiros. 



A lei obriga as Juntas Comerciais a disponibilizar os assentamentos e inclusive fornecer certidões para qualquer pessoa, independente da prova de possuir interesse jurídico nos documentos.

O atraso no registro também produz efeitos jurídicos, art. 1.151, § 13º. do Código Civil. 


A Junta Comercial, eventualmente, ao analisar o cumprimento de formalidades legais, poderá negar registro a algum ato se constatar a existência de um vício insanável, por exemplo o desatendimento de alguma exigência legal que deveria preceder o ato, ou ainda colocá-lo em exigência quando o vício for sanável. 
















É oportuno destacar que o Código Civil dispensou o pequeno empresário de algumas exigências quanto à escrituração e, ainda, mais adiante, lhe assegurou um tratamento privilegiado.

Entretanto, a definição de pequeno empresário, com o advento da Lei Complementar 123/06, merece exame mais apurado para encontrar o enquadramento e seus reflexos respectivos com segurança.





2.3 - Nome Empresarial 


Conforme dispõe o artigo 1º. da Instrução Normativa do Departamento Nacional de Registro de Comércio nº. 104/07, o nome empresarial é aquele sob o qual o empresário e a sociedade empresária exercem sua atividade e se obrigam nos atos a elas pertinentes.
O nome empresarial tem duas funções de relevância no desenvolvimento da atividade empresarial. Em primeiro lugar identifica o empreendimento e a sua atividade, em segundo, é um instrumento de agregação da fama e da reputação do empresário ou da sociedade empresária. 


Entretanto não se pode confundir nome empresarial com a marca, com o nome fantasia ou qualquer imagem que identifica os produtos ou serviços do empresário. Estes, denominados de sinais de propaganda, são levados a registro perante os órgãos da propriedade industrial, embora de alguma forma também sejam elementos de identificação do empresário. 


Enquanto o nome empresarial está vinculado à identificação do empresário no âmbito social, fiscal, tributário e jurídico, os sinais de propaganda são destinados à identificação dos produtos e serviços do empresário em relação ao consumidor.

Portanto, as figuras de identificação do empresário são protegidas por normas diferentes, produzem efeitos jurídicos diversos e importam em alcance próprio e restrito para cada qual. 


A lei distingue o nome empresarial como firma ou denominação. 



Código Civil - art. 1.155. Considera-se nome empresarial a firma ou a denominação adotada, de conformidade com este Capítulo, para o exercício de empresa. 



Parágrafo único. Equipara-se ao nome empresarial, para os efeitos da proteção da lei, a denominação das sociedades simples, associações e fundações. 


A firma é uma espécie de nome empresarial, contudo, será sempre formada pelo nome civil do empresário quando se tratar de firma individual, ou de um ou mais sócios quando se tratar de firma social. 



A firma, mesmo quando individual, poderá acrescer o ramo de atividade. Por exemplo: José Antonio Braga Bombeiro Hidráulico, ou José dos Anzóis Secos e Molhados, etc. 



Pode ser observado que neste caso a firma é privativa do empresário individual e das sociedades de pessoas, e a denominação é privativa de sociedades de capital. 





A norma faculta o uso da firma pela sociedade limitada, contudo, há uma diferença substancial na utilização da firma e da denominação. Quando se assina pela firma nos atos empresariais o empresário não assinará o seu próprio nome e sim o nome empresarial, inclusive com a atividade. Por exemplo: José dos Anzóis Secos e Molhados. Já na assinatura mediante a denominação o empresário assinará o próprio nome sobre a denominação.








Por ficção legal as sociedades anônimas deverão operar sob a denominação designativa do seu objeto social acrescida da expressão "sociedade anônima" ou "companhia". Em ambos os casos as expressões poderão ser usadas por inteiro ou nas formas abreviadas.

Exemplo: José Silva Instrumentos Cirúrgicos S A, ou Companhia José Silva - Instrumentos Cirúrgicos.





O Código Civil regulou todas estas situações: 





Art. 1.158. Pode a sociedade limitada adotar firma ou denominação, integradas pela palavra final "limitada" ou a sua abreviatura. 




§ 1o A firma será composta com o nome de um ou mais sócios, desde que pessoas físicas, de modo indicativo da relação social. 




§ 2o A denominação deve designar o objeto da sociedade, sendo permitido nela figurar o nome de um ou mais sócios. 




§ 3o A omissão da palavra "limitada" determina a responsabilidade solidária e ilimitada dos administradores que assim empregarem a firma ou a denominação da sociedade. 




Art. 1.159. A sociedade cooperativa funciona sob denominação integrada pelo vocábulo "cooperativa". 




Art. 1.160. A sociedade anônima opera sob denominação designativa do objeto social, integrada pelas expressões "sociedade anônima" ou "companhia", por extenso ou abreviadamente. 




Parágrafo único. Pode constar da denominação o nome do fundador, acionista, ou pessoa que haja concorrido para o bom êxito da formação da empresa. 




Art. 1.161. A sociedade em comandita por ações pode, em lugar de firma, adotar denominação designativa do objeto social, aditada da expressão "comandita por ações". 




Art. 1.162. A sociedade em conta de participação não pode ter firma ou denominação. 



2.4 - Livros Empresariais 



Apesar da exigência legal de ampla publicidade com relação aos atos de registro empresariais, por outro lado, os livros empresariais ficaram protegidos pelo sigilo: 


Código Civil - art. 1.190. Ressalvados os casos previstos em lei, nenhuma autoridade, juiz ou tribunal, sob qualquer pretexto, poderá fazer ou ordenar diligência para verificar se o empresário ou a sociedade empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades prescritas em lei. 


Conforme consta, ficaram ressalvados os casos previstos em lei, principalmente com relação às autoridades fazendárias e, claro, outras situações excepcionais com relação aos interesses intrínsecos da sociedade, dos sócios ou de sucessores dos sócios. 



Código Civil - art. 1.191. O juiz só poderá autorizar a exibição integral dos livros e papéis de escrituração quando necessária para resolver questões relativas a sucessão, comunhão ou sociedade, administração ou gestão à conta de outrem, ou em caso de falência. 


Portanto, como pode ser observado, todas estas possibilidades dependem do pedido formal de um interessado, e mais, e somente nos casos que a lei expressamente o permita. 


- Empresa e Empresário 


3.1 – Conceito 






A empresa não é sujeito de direito, é apenas um sujeito abstrato. Empresa quer dizer uma atividade econômica organizada destinada a produção ou à circulação de bens ou de serviços. Entretanto, de forma imprópria, é comum o uso da expressão empresa como sinônimo de estabelecimento, ou de sociedade empresária.





O Código Civil de 2002 não definiu explicitamente o que seja empresa, contudo, em seu artigo 966, dispôs com objetividade o conceito de empresário, logo, estabeleceu por extensão a definição de empresa: 




Art. 966 - Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços. 



Os doutrinadores também enxergam a expressão empresa com este mesmo conceito.
Luiz Tzirulnik é objetivo: 



"... empresa é sinônimo absoluto de atividade econômica organizada para a produção de bens e serviços, nada tendo a ver com estabelecimento empresarial, a despeito de muitas vezes poder haver confusão de ordem semântica." Considerando que a lei não contém palavras inúteis, do conceito legal de empresário é possível concluir que alguns elementos são indispensáveis para que se possa caracterizar a qualidade de empresário. 



O exercício da atividade como profissão é um requisito lógico, além de legal. Somente poderá ser considerado empresário aquele que exerce uma atividade econômica de forma habitual, como profissão. Logo, não se submete aos efeitos legais da atividade empresarial aquele que exerce uma atividade econômica de forma apenas eventual. 



Por exemplo: quem compra ou vende uma casa ou um veículo automotor esporadicamente não é um empresário, embora se sujeite aos ônus tributários respectivos não está sujeito ao regime imposto ao empresário. 



A atividade econômica é outro requisito que deve ser examinado com cuidados especiais. É que a atividade econômica que a lei se refere não é apenas um fato econômico, é necessário que seja uma atividade econômica com objetivo de lucro. Assim, aquele que exerce uma atividade econômica sem a pretensão de obter lucro também não pode ser considerado empresário. 



Por exemplo: quem compra ou vende uma casa, um veículo automotor, ou ainda quem recebe ou aplica recursos sem o objetivo de lucro, embora se sujeite aos ônus tributários respectivos não está sujeito ao regime imposto ao empresário. 



Uma associação que recebe mensalidade de seus associados, um espólio que vende os bens da massa para partilhar os resultados entre os herdeiros, ou uma pessoa que vende ou compra bens de seu uso, embora exerça atividade econômica, não o faz com o intuito de lucro. Portanto, nenhuma destas figuras está sujeita ao regime jurídico empresarial. 


A última expressão - organizada, embora possa parecer que se trata de organização formal, trata-se apenas da realização do ato de articular os fatores de produção no exercício da atividade, como a aplicação de capital, a utilização de insumos, a aplicação de tecnologia ou o desenvolvimento de meios. 



Esta organização é fundamental para que a atividade abandone a característica do amadorismo e adentre a seara do interesse profissional. 



Por exemplo: vender os móveis antigos da família não exige aplicação de capital, ou utilização de insumos, nenhuma tecnologia e muito menos desenvolvimento de meios para tanto. Entretanto, adquirir móveis usados de terceiros, reformá-los para depois colocá-los à venda, exige uma sequência de planejamento, investimento e estratégia que, somados com os outros requisitos, ensejam a convicção de que se trata de uma atividade empresarial. 



3.2 - Agentes econômicos profissionais não empresários. 


O mesmo artigo do Código Civil de 2002 que define o empresário, no seu parágrafo único, exclui do regime jurídico empresarial os profissionais intelectuais, como os advogados, médicos, engenheiros, entre outros:

Artigo 966 do Código Civil - parágrafo único: Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. 





Isso quer dizer que o profissional que atua exercendo apenas sua atividade intelectual, mesmo com a ajuda de auxiliares, não é considerado um empresário para os efeitos da lei. Contudo, na hipótese da sua atividade implicar em manter outros profissionais, e o resultado do trabalho não for apenas fruto do seu intelecto, ou seja, sofrer contribuição também de terceiros, sua atividade será considerada empresarial.






Exemplo: O trabalho desenvolvido por um médico, ainda que tenha assistente e secretária, é meramente intelectual e não o confunde com a figura do empresário. Vários médicos atuando em conjunto, somando seus conhecimentos intelectuais, empregados um dos outros ou não, onde a relação com o consumidor não é com o profissional individual e sim com o conjunto de profissionais, caracteriza uma atuação empresarial. 



Portanto é a impessoalidade e fator organizacional da atividade econômica que caracteriza a atividade empresarial e impõe o atendimento às normas de direito empresarial. 



3.3 - Empresários e sociedades empresárias diferenciadas 



O Código Civil também criou figuras de empresários e sociedades empresariais diferenciadas, ou seja, empresários que não estão sujeitos ao atendimento dos requisitos gerais que a lei impõe aos demais empresários. 




Código Civil - artigo 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o artigo 968 e seus parágrafos, requerer a inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, casos em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito ao registro. 



É certo que os empresários de forma geral estão obrigados ao seu registro, em forma individual ou sociedade empresária, perante a Junta Comercial da unidade federativa à qual pertençam. 



Código Civil - artigo 967. É obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade. 



Código Civil - artigo 984. A sociedade que tenha por objeto o exercício de atividade própria de empresário rural e seja constituída ou transformada, de acordo com um dos tipos de sociedade empresária, pode, com as formalidades do artigo 968, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da sua sede, caso em que, depois de inscrita, ficará equiparada, para todos os efeitos, à sociedade empresária. 



Portanto, fica absolutamente claro que o registro na Junta Comercial não é o requisito básico para que alguém possa ser considerado empresário, vez que há exceções, mas, constitui obrigação legal a qual os praticantes de atividades econômicas se sujeitam. 



É importante observar que as sociedades empresárias são registradas na Junta comercial de sua sede e as sociedades que não exploram atividade empresarial são registradas no cartório de registro civil de pessoas jurídicas. 





Algumas atividades econômicas podem ser registradas nas Juntas Comerciais ou nos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, é o caso das cooperativas. A cooperativa deve ser registrada em princípio no cartório, contudo, se preencher os requisitos do art.966 do Código Civil, ou seja, se exercer atividade econômica organizada, com ânimo profissional e com a finalidade de produção ou distribuição de bens ou serviços, deverá ser registrada na Junta Comercial.





3.4 - Sociedades sujeitas às normas empresariais por ficção legal 



A lei pode estabelecer que algumas atividades econômicas se sujeitam a um regime jurídico próprio, independente de preencher os requisitos anteriormente previstos nas suas disposições gerais. É o caso das sociedades por ações. 



As sociedades anônimas, por ficção legal, independente do ramo e das características de sua atividade, são sociedades empresárias. Portanto, ainda que não se enquadrem nos requisitos previstos no artigo 966 do Código Civil, estarão obrigadas a cumprir as regras próprias das sociedades empresárias. 



As sociedades que exploram atividade rural, e que por disposição legal estariam excluídas da obrigatoriedade do registro na Junta Comercial, caso optem pela forma de sociedade por ações, perdem o direito a esta faculdade e passam a ser consideradas sociedades empresariais, portanto, sujeitas às regras próprias deste regime. 






Já a sociedade de advogados por ficção da Lei 8.906/94, que é o Estatuto da advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, dispõe que a sociedade de advogados é uma sociedade civil de prestação de serviço de advocacia. Portanto, uma sociedade simples. Neste caso, os contratos da sociedade são registrados na OAB e todos os sócios respondem de forma solidária e ilimitada pelas obrigações sociais.





3.5 - Vedações ao exercício de empresa. 



Repetindo a redação do Código Comercial de 1850, o Código Civil cuidou de estabelecer restrições ao exercício de empresa e também regulando a atuação do empresário casado. 


Código Civil - art. 972. Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da capacidade civil e não forem legalmente impedidos. 


Até este ponto não há qualquer novidade porque a disposição é natural, entretanto, mais adiante, as vedações avançam, inclusive para valorizar as relações de consumo. 



Código Civil - art. 1.011, § 1º. Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por lei especial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de Consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto durarem os efeitos da condenação.

Código Civil - art. 1.011, § 2º. Aplicam-se à atividade dos administradores, no que couber, as disposições concernentes ao mandato.

Código Civil - art. 1.012. O administrador, nomeado por instrumento em separado, deve averbá-lo à margem da inscrição da sociedade, e, pelos atos que praticar, antes de requerer a averbação, responde pessoal e solidariamente com a sociedade. 



As vedações estão esparsas pelo Código Civil e também por outras normas de direito público com o objetivo de proteger a coletividade e a fazenda pública.
Destarte, é bom anotar que não podem ser empresários: Os militares da ativa das Forças Armadas e das Polícias Militares; os funcionários públicos civis; os magistrados; os médicos, para o exercício simultâneo da medicina e farmácia, drogaria ou laboratório; os estrangeiros não-residentes no pais; os cônsules, salvo os não remunerados; os corretores; os leiloeiros; os falidos, enquanto não reabilitados, etc. 






É importante destacar, entretanto, que estas vedações são dirigidas aos empresários individuais e não se aplicam aos sócios ou à sociedade mas, exclusivamente ao exercício de empresa. Isso quer dizer que não atingem os meros sócios ou acionistas, contudo, em alguns casos, conforme previsto no Código Civil, há também vedação para o exercício da atividade de administrador.





Existem outros impedimentos legais que não são direcionados apenas para os empresários ou administradores, mas que atingem a própria atividade desenvolvida pela empresa. 



A Constituição Federal, por exemplo, cria restrições às atividades de pesquisa e lavra de recursos minerais e ainda para as atividades jornalísticas e de radiodifusão, de sons e imagens. As restrições são no sentido de que estas atividades devem ser exploradas por cidadãos natos ou naturalizados há mais de 10 anos e por pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no país. 


Também deve ser observado que a restrição no que se refere ao incapaz, artigo 972 do Código Civil, é relativa, pois poderá o juiz, consideradas as circunstâncias e o fato de ser necessária a continuidade das atividades, autorizar que a administração do empreendimento seja exercida por um representante ou assistente, dependendo do grau de incapacidade, depois de ouvir o Ministério Público, os pais, o tutor ou representantes legais do incapaz. 



É oportuno destacar, contudo, que estas possibilidades são voltadas exclusivamente para dar continuidade à atividade empresarial e nunca para iniciá-la. 


3.6 - Reflexos do casamento nas atividades empresariais 


O empresário, em sintonia com o art. 978 do Código Civil de 2002, pode, sem autorização do cônjuge, qualquer que seja o regime de bens, alienar os bens imóveis que integrem o patrimônio empresarial ou gravá-los de ônus real.

Código Civil - art. 978. O empresário casado pode, sem necessidade de outorga conjugal, qualquer que seja o regime de bens, alienar os imóveis que integrem o patrimônio da empresa ou gravá-los de ônus real. 



Todavia, o artigo logo seguinte impõe obrigações ao empresário que podem ser graves com relação ao patrimônio familiar. 



Código Civil - art. 979. Além do Registro Civil serão arquivados e averbados, no Registro Público de Empresas Mercantis, os pactos e declarações antenupciais do empresário, o título de doação, herança, ou legado, de bens clausulados de incomunicabilidade ou inalienabilidade. 



Esta disposição legal significa que estes atos devem ser registrados na Junta Comercial sob pena de o empresário não poder opô-los contra terceiros em caso de penhora, hipoteca judicial, falência, etc. 



Da mesma forma e com os mesmos reflexos dispõe o artigo 980 do Código Civil com relação à separação judicial. 



Código Civil - art. 980. A sentença que decretar ou homologar a separação judicial do empresário e o ato de reconciliação não podem ser opostos a terceiros, antes de arquivados e averbados no Registro Público de Empresas Mercantis. 


Não custa ressaltar que estas regras são próprias do empresário individual, vez que a sociedade empresarial não pode se casar. 


3.7 - Representantes legais do empresário. 


O Empresário, tanto pelo Código Civil, como pela Consolidação das Leis do Trabalho pode se fazer representar por seus auxiliares, colaboradores, empregados, prepostos ou procurador, dependendo da instância ou organismo no qual devam se apresentar. 



Em algumas situações, independente de mandato, mas, com o mero contrato de serviços, o contador poderá representar o empresário, da mesma forma o seu gerente, vendedor ou empregado nas relações de consumo. 






Os demais prepostos, bem como o advogado, deverão representar o empresário no limite dos poderes concedidos por instrumento formal.




O certo é que a lei disciplina estas relações, mesmo porque em todos os casos, o empresário responderá pelas ações desenvolvidas pelos seus representantes em seu nome.





A figura do gerente, por suas características especiais, recebeu do legislador responsabilidades adicionais mais complexas na extensão. Ressalte-se, por oportuno, que as eventuais limitações aos poderes do gerente deverão constar do registro de averbação perante a Junta Comercial. 


Código Civil - art. 1.169 a 1.178 –

Art. 1.169. O preposto não pode, sem autorização escrita, fazer-se substituir no desempenho da preposição, sob pena de responder pessoalmente pelos atos do substituto e pelas obrigações por ele contraídas.

Art. 1.170. O preposto, salvo autorização expressa, não pode negociar por conta própria ou de terceiro, nem participar, embora indiretamente, de operação do mesmo gênero da que lhe foi cometida, sob pena de responder por perdas e danos e de serem retidos pelo preponente os lucros da operação. 




Art. 1.171. Considera-se perfeita a entrega de papéis, bens ou valores ao preposto, encarregado pelo preponente, se os recebeu sem protesto, salvo nos casos em que haja prazo para reclamação. 




Art. 1.172. Considera-se gerente o preposto permanente no exercício da empresa, na sede desta, ou em sucursal, filial ou agência.

Art. 1.173. Quando a lei não exigir poderes especiais, considera-se o gerente autorizado a praticar todos os atos necessários ao exercício dos poderes que lhe foram outorgados. 




Parágrafo único. Na falta de estipulação diversa, consideram-se solidários os poderes conferidos a dois ou mais gerentes. 




Art. 1.174. As limitações contidas na outorga de poderes, para serem opostas a terceiros, dependem do arquivamento e averbação do instrumento no Registro Público de Empresas Mercantis, salvo se provado serem conhecidas da pessoa que tratou com o gerente. 




Parágrafo único. Para o mesmo efeito e com idêntica ressalva, deve a modificação ou revogação do mandato ser arquivada e averbada no Registro Público de Empresas Mercantis. 




Art. 1.175. O preponente responde com o gerente pelos atos que este pratique em seu próprio nome, mas à conta daquele. 




Art. 1.176. O gerente pode estar em juízo em nome do preponente, pelas obrigações resultantes do exercício da sua função. 




Art. 1.177. Os assentos lançados nos livros ou fichas do preponente, por qualquer dos prepostos encarregados de sua escrituração, produzem, salvo se houver procedido de má-fé, os mesmos efeitos como se o fossem por aquele. 




Parágrafo único. No exercício de suas funções, os prepostos são pessoalmente responsáveis, perante os preponentes, pelos atos culposos; e, perante terceiros, solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos. 




Art. 1.178. Os preponentes são responsáveis pelos atos de quaisquer prepostos, praticados nos seus estabelecimentos e relativos à atividade da empresa, ainda que não autorizados por escrito. 



Por outro lado, como visto, a lei também não deixou conferir também ao representante legal do empresário, em algumas hipóteses, a responsabilidade solidária pelos ônus decorrentes do exercício da representação.

Na justiça do trabalho o depoimento do preposto pode comprometer fortemente o empresário vez que é recebido como confissão. 


Consolidação das Leis do Trabalho - art. Art. 843 - Na audiência de julgamento deverão estar presentes o reclamante e o reclamado, independentemente do comparecimento de seus representantes salvo, nos casos de Reclamatórias Plúrimas ou Ações de Cumprimento, quando os empregados poderão fazer-se representar pelo Sindicato de sua categoria. 



§ 1º - É facultado ao empregador fazer-se substituir pelo gerente, ou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato, e cujas declarações obrigarão o proponente. 





O empresário, portanto, sempre deverá ficar atento ao nível de comprometimento e efeitos que podem produzir os seus representantes nomeados, e ainda aqueles simplesmente legais. De qualquer forma deve restringir formalmente o limite da representação, onde for possível, e providenciar a averbação do ato respectivo perante a Junta Comercial, sob pena de não prevalecer contra terceiros.





4 - Estabelecimento Empresarial 



4.1 – Definição 


Estabelecimento comercial não quer dizer apenas o local, sede e instalações onde é exercida a atividade empresarial, é bem mais que isso. 




A lei dispõe da seguinte forma: 




Código Civil - art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária. 






Os doutrinadores interpretam a norma e decantam a expressão estabelecimento empresarial sob o entendimento de que compreendem os bens móveis e imóveis; estoque; equipamentos; máquinas; marcas; patentes; direitos; pontos de vendas; arquivo de clientes e centenas de outros itens, impossíveis de serem inteiramente relacionados, mas que sejam utilizados para o exercício de empresa pelo empresário ou pela sociedade empresária.





Considerando a eventualidade de que o patrimônio pessoal do empresário, pessoa física, eventualmente possa ser confundido com a da empresa, importa salientar que compõe o estabelecimento empresarial somente os bens e direitos que são usados no exercício da atividade empresarial, não incluindo os bens particulares do empresário ou sócio que não afetem diretamente o desenvolvimento da atividade econômica. 



De qualquer forma é preciso diferenciar estabelecimento empresarial com patrimônio do empresário. 



4.2 - Trespasse do Estabelecimento Empresarial 


O exame desta questão se justifica vez que em algumas hipóteses pode haver o trespasse do estabelecimento empresarial, e nesse caso, claro, a forma e a extensão da operação pode ser livremente pactuada pelos interessados. Contudo, o Código Civil, atento aos reflexos jurídicos que possa produzir em relação a terceiros, credores, devedores ou interessados, dispõe com clareza: 



Código Civil - art. Art. 1.143. Pode o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e de negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza. 



Código Civil - art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial. 


4.3 - Efeitos da Sucessão Empresarial 


A norma busca também definir situações e a responsabilidade de cada parte com relação à sucessão empresarial: 




Código Civil - art. 1.145. Se ao alienante não restarem bens suficientes para solver o seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores, ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em trinta dias a partir de sua notificação. 




Código Civil - art. 1.146. O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento. 


Entretanto é necessário observar que estas disposições se aplicam apenas nas relações empresariais, próprias da atividade econômica, excluindo as obrigações decorrentes da sucessão trabalhista e tributária, vez que nestes casos dever-se-á observar os regimes jurídicos próprios, trabalhista e tributário, previstos nas normas respectivas. 


Código Tributário Nacional - art. 133 - A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato: 




I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade; 




II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão. 










Ainda, dentro da mesma identidade de propósitos da lei civil, e ainda com o objetivo de facilitar e estimular a possibilidade de aquisição de estabelecimentos empresariais de empresários ou sociedade empresárias em processo de falência, a Lei de Recuperação de Empresas, inovando, dispôs de forma clara e precisa:










Lei 11.101/05 - art. 141. Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas filiais, promovida sob qualquer das modalidades de que trata este artigo:

...

II - o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho.





O Código Civil, acompanhando a jurisprudência dominante e fortes manifestações doutrinárias, criou também um artigo, denominado pelos estudiosos de cláusula de não-concorrência ou cláusula de interdição da concorrência. Este artigo é destinado a proteger o empresário sucessor da possibilidade do empresário sucedido se estabelecer novamente com o mesmo ramo de negócio e fazer concorrência danosa ao adquirente do estabelecimento empresarial. 


Código Civil - Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subseqüentes à transferência. 




Tal imposição legal decorre do princípio da boa-fé, que deve permear a relações contratuais, e que já compõe o ordenamento jurídico de inúmeros países. 


É natural que no contrato de transferência do estabelecimento empresarial já poderia constar cláusulas com este mesmo efeito, contudo, entendeu o legislador que melhor seria inserir na norma um artigo que delineasse esse reflexo jurídico. 



Entretanto, como para não permitir que a disposição legal pudesse criar discussão em face de aparentemente confrontar com o princípio da livre concorrência, houve por bem o legislador de limitar o tempo de restrição da concorrência. 



4.4 - Ponto do Negócio 


O ponto de negócio, que é um dos mais importantes elementos do estabelecimento empresarial, também já recebeu do legislador, pela via da Lei do Inquilinato, oportuna e especial proteção quando se trata de imóvel alugado. 



Lei 8.245/91 - art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato por igual prazo, desde que, cumulativamente: 

I - o contrato a renovar tenha sido celebrado por escrito e com prazo determinado; 

II - o prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos seja de cinco anos; 

III - o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo e ininterrupto de três anos. 

1º O direito assegurado neste artigo poderá ser exercido pelos cessionários ou sucessores da locação... 



A lei define os direitos e obrigações do locador e locatário, alcançando inclusive a hipótese de sucessão do estabelecimento empresarial. Diante disso fixou condições e limites que, notoriamente, facilita a possibilidade de continuidade da locação. 



Entretanto, o locatário original ou o seu sucessor, quando desejar postular a Renovação Compulsória da locação, deverá ficar atento para o fato de que deverá comprovar, desde a propositura da ação, o cumprimento do contrato integralmente. 



Lei 8.245/91 - art. 71. Além dos demais requisitos exigidos no art. 282 do Código de Processo Civil, a petição inicial da ação renovatória deverá ser instruída com: 



I - prova do preenchimento dos requisitos dos incisos I, II e III do art. 51; 

II - prova do exato cumprimento do contrato em curso; 




III - prova da quitação dos impostos e taxas que incidiram sobre o imóvel e cujo pagamento lhe incumbia; 




IV - indicação clara e precisa das condições oferecidas para a renovação da locação; 



V - indicação de fiador quando houver no contrato a renovar e, quando não for o mesmo, com indicação do nome ou denominação completa, número de sua inscrição no Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, endereço e, tratando-se de pessoa natural, a nacionalidade, o estado civil, a profissão e o número da carteira de identidade, comprovando, em qualquer caso e desde logo, a idoneidade financeira; 

VI - prova de que o fiador do contrato ou o que o substituir na renovação aceita os encargos da fiança, autorizado por seu cônjuge, se casado for; 



VII - prova, quando for o caso, de ser cessionário ou sucessor, em virtude de título oponível ao proprietário. 



O locatário, portanto, deverá diligenciar no sentido de comprovar que pagou suas obrigações, conforme contratado, atendeu às exigências da convenção de condomínio, pagou sua parcela de seguros conforme tenha sido previsto em contrato, quitou devidamente os impostos municipais relativos ao imóvel, etc.; deverá ainda demonstrar, com clareza, as condições oferecidas para a renovação da locação, indicando os fiadores com toda a sua qualificação, identidade, CPF, renda mensal, propriedades que possuem e os bancos ou empresas com os quais mantém operações comerciais. 


O locatário somente ficará dispensado das informações e comprovações relativas a fiadores se, no contrato renovando, não tiver fiadores, ou os fiadores forem os mesmos.

A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CONSUMIDOR


A Proteção Constitucional dos Direitos Fundamentais do Consumidor

Ricardo Maurício Freire Soares

Ricardo Maurício Freire Soares

Doutorando e Mestre em Direito – UFBA; Professor  dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito da UFBA, da Faculdade Baiana de Direito e da Faculdade de Tecnologia Empresarial; Professor-Convidado da Università di Roma La Sapienza, Università Degli Studi di Roma Tre, Università Degli Studi di Roma Tor Vergata (Itália) e Martin-Luther Universität Halle Wittenberg  (Alemanha); Professor do Curso JusPODIVM de Preparação para Carreira Jurídica e da Rede LFG; Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros e do Instituto dos Advogados da Bahia.

Artigo publicado na Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor nº 20 – Abr/Maio de 2008.

RESUMO: O presente trabalho se propõe a repensar a interpretação de uma das legislações mais avançadas do Direito Econômico nacional – a Lei nº 8.078/90. Rompendo com os postulados individualistas e liberais do direito privado moderno, o surgimento das leis consumeristas, como o Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, simboliza a atualização do direito ocidental, na busca de uma maior isonomia fática entre fornecedores e consumidores. A efetividade da Lei nº 8.078/90 requer o exercício de práticas interpretativas progressistas, o que abre margem para a reformulação dos paradigmas hermenêuticos tradicionalmente oferecidos pela ciência jurídica, o que implica o uso dos princípios jurídicos, os quais, no âmbito das relações econômicas do mercado capitalista, adquirem enorme relevância ao concretizar e maximizar o espírito protetivo dessa codificação.

Palavras-chave: Interpretação; Lei; Código de Defesa do Consumidor; Relações Econômicas.

SUMÁRIO: 1 A Sociedade de Consumo e o Código Brasileiro de Defesa do Consumidor; 2 A Nova Visão do Contrato na Sociedade de Consumo; 3 O Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Como Discurso Principiológico; 4 O Princípio Constitucional de Defesa do Consumidor no Sistema Jurídico Brasileiro; 5 A Principiologia Consumerista Como Norte Hermenêutico do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor; 6 Notas Conclusivas: a Interpretação Principiológica e a Efetividade dos Direitos Fundamentais do Consumidor; 7 Referências.

1. A Sociedade de Consumo e o Código Brasileiro de Defesa do Consumidor

Os sistemas jurídicos costumam espelhar as transformações ocorridas no tecido das relações sociais. Verificou-se que a crise da modernidade rendeu ensejo para a configuração da sociedade de consumo, demandando o redimensionamento das instituições jurídicas. O surgimento do direito do consumidor decorre da manifestação dos desequilíbrios inerentes a este novo modelo de coexistência social.

Neste sentido, sustenta Ada Grinover (1998, p. 6) que o homem do século XX vive em função de um modelo novo de associativismo: a sociedade de consumo (mass consumption society ou konsumgesellschaft), caracterizada por um número crescente de produtos e serviços, pelo domínio do crédito e do marketing, assim como pelas dificuldades de acesso à justiça. São esses aspectos que marcaram o nascimento e desenvolvimento do direito do consumidor como disciplina autônoma.

O aparecimento da sociedade de consumo engendrou, assim, uma nova concepção de relações jurídicas, baseada na desigualdade fática entre os sujeitos de direito. O ordenamento jurídico modulou o paradigma da ordem pública econômica, disciplinando o intervencionismo do Estado no campo das relações privadas. Depois de manifestar-se com grande nitidez nas relações entre empregadores e assalariados, esta busca por uma maior isonomia jurídico-social passou a concentrar-se nas interações entre consumidores e fornecedores de produtos ou serviços.

Tratando do tema, Adriana Vieira (2002, p. 71) destaca que as grandes descobertas que prestaram serviços à Revolução Industrial vieram modificar, de modo fundamental, as relações de consumo. A propriedade passa por uma transformação, pois a atividade começa a evoluir, tornando-se industrial, e se sobrepõe à produção artesanal. Foi nessa época, com o desenvolvimento e expansão do comércio, que começou a se manifestar o desequilíbrio nas relações de consumo, exacerbado no século atual em função do fenômeno da concentração de grandes capitais. Polarizou-se o conflito no setor das relações entre produtor e consumidor, atraindo a atenção do legislador, em nível internacional e nacional, para a edificação do regime próprio e sem prejuízo dos mecanismos normais de defesa dos contratantes.

A conseqüência desta mudança social foi sentida primeiramente nos países desenvolvidos. No ano de 1962, foi dirigida mensagem presidencial ao Congresso Norte-Americano em que se anunciava um programa de reformas econômicas consoante os interesses dos consumidores. Também, durante a década de sessenta, difundiram-se na Europa associações de defesa do consumidor que ocasionaram a criação de entidades públicas voltadas para a tutela dos direitos do consumidor.

No sistema jurídico brasileiro, a Carta Magna de 1988 teve a primazia de contemplar os direitos do consumidor. No inciso XXII do art. 5º, dispôs o legislador constituinte que o Estado promoveria, na forma da lei, a defesa do consumidor. Não bastasse isso, a Constituição Federal consagrou, no art. 170, V, a defesa do consumidor como um princípio geral da ordem econômica. Ainda, o art. 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias determinou que o Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborasse o Código de Defesa do Consumidor. Assim sendo, foi promulgada a Lei nº 8.078/90, uma das mais avançadas legislações protetivas de consumo.

Neste diapasão, salienta Antônio Azevedo (1996, p. 17) que a demora na atualização do Código Civil fez com que o Código de Defesa do Consumidor, de uma certa forma, viesse a preencher a vasta lacuna que, no campo do direito privado brasileiro, a doutrina e a jurisprudência percebiam há muito tempo. Na impossibilidade de encontrar, no velho Código Civil, base para o desenvolvimento teórico do que há de mais apto para transformar o sistema fechado em sistema aberto – por exemplo, a referência expressa a cláusulas gerais, como a da boa-fé, e a princípios jurídicos, como o da exigência de igualdade real nos negócios jurídicos -, é no Código de Defesa do Consumidor que se pode encontrar um Ersatz do Código Civil que não veio ou, no mínimo, um ponto de apoio para alavancar a atualização principiológica do sistema jurídico brasileiro.

2 A Nova Visão do Contrato na Sociedade de Consumo

A interpretação do significado de contrato, no ordenamento jurídico-consumerista, vem sendo reformulada em conformidade com as transformações ocorridas na sociedade capitalista ocidental.

Como ensina Enzo Ropo (1988, p. 24), uma vez que o contrato reflete, pela sua natureza, operações econômicas, é evidente que o seu papel no quadro do sistema resulta determinado pelo gênero e pela quantidade das operações econômicas a que é chamado a conferir dignidade legal, para além do modo como, entre si, se relacionam – numa palavra pelo modelo de organização econômica a cada momento prevalecente. Analogamente, se é verdade que a sua disciplina jurídica – que resulta definida pelas leis e pelas regras jurisprudenciais – corresponde instrumentalmente à realização dos objetivos e interesses valorados consoante as opções políticas e, por isso mesmo, contingentes e historicamente mutáveis, daí resulta que o próprio modo de ser e de se conformar do contrato como instituto jurídico não pode deixar de sofrer a influência decisiva do tipo de organização político-social a cada momento afirmada.

Com efeito, no contexto da modernidade, sob os influxos das revoluções burguesas, o jusnaturalismo lançou as bases para a clássica definição de contrato. A moderna exaltação à liberdade e à igualdade, traduzindo os direitos naturais do ser humano, acrescida do contratualismo como base fundante da organização política, implicou na afirmação do princípio da autonomia da vontade. Estava consolidado o dogma da livre manifestação do consentimento individual, pedra de toque do direito privado tradicional. O liberalismo dominante propugnava pela livre circulação da riqueza, despontando o contrato como o instrumento jurídico capaz de operacionalizar as transações econômicas. Tinha-se como verdadeira a crença de que as avenças contratuais potencializariam o equilíbrio harmônico dos interesses sociais, sem a necessidade do Estado promover ingerências no mercado, concebido como o espaço cativo das relações privadas.

A modernidade jurídica sedimentou também o primado da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda). Ora, se o ser humano, igual aos seus pares, seria livre para exprimir a sua vontade, a força matriz do consentimento teria que preponderar sobre as prescrições estatais. O contrato foi, então, vislumbrado como verdadeira lei entre as partes. As normas legais, assim, teriam mera função supletória ante as manifestações volitivas. Com o agravamento dos problemas sociais do sistema capitalista, emergiu a reação aos postulados jurídicos da modernidade. Rompeu-se com a concepção individualista e liberal do direito das obrigações, introduzindo uma nova leitura hermenêutica do contrato.

O significado de igualdade jurídica foi repensado. Voltada à limitação do absolutismo monárquico, a igualdade atomística dos homens, consagrada nas modernas constituições e declarações de direitos, pecava pela total discrepância com a realidade cambiante. A previsão da isonomia, em termos puramente abstratos e formais, não se coadunava com as desigualdades produzidas pelo capitalismo liberal, seja nas relações entre os proprietários dos meios de produção e trabalhadores, seja nas interações entre fornecedores e consumidores de mercadorias e serviços.

A concentração do capital permitiu uma produção em massa, que não poderia jamais ser dirigida a pessoas individualizadas. Era preciso, através de mecanismos de publicidade e marketing, induzir o consumidor a necessidades artificiais. Para cercear o acesso às informações de produtos e serviços – qualidade, quantidade, especificidade e preço – foi criado o contrato de adesão, com evidente prejuízo aos vulneráveis consumidores. Essa situação de flagrante desequilíbrio entre os agentes econômicos do mercado de consumo tornou imperiosa a pronta ingerência estatal, mormente pela via legislativa, de sorte a relativizar os princípios da autonomia da vontade, da obrigatoriedade do contrato e da igualdade formal.

Sobre esta reformulação principiológica, refere Georges Ripert (1937, p. 313-314) que o declínio do contrato não provém unicamente da limitação cada vez mais estreita do seu domínio; tem outra causa: a negação audaciosa da força contratual. O contrato já não é considerado como o ato criador da obrigação e o vínculo obrigacional já não dá ao credor poder sobre o devedor. O reconhecimento da força contratual é, diz-se, uma concepção do individualismo jurídico, e a idéia dum direito subjetivo conferido ao credor é arcaica. O contrato cria simplesmente uma situação jurídica, que não poderá ser mais imutável que a situação legal. Esta situação jurídica gera conseqüências que o legislador determina soberanamente. O ato da vontade consiste unicamente em submeter-se à lei do contrato, mas não pertence às partes decidir para sempre, e em todos os casos, qual seja essa lei.

No vórtice destas transformações, já nos albores do século XX, o espaço social ocupado pelo Estado se expande. Verifica-se então um maior equilíbrio entre o Estado, agente de regulamentação social, e o mercado, espaço de produção e distribuição de riqueza. A consolidação do movimento operário, o fortalecimento dos sindicatos, o movimento consumerista e a crise estrutural do sistema financeiro capitalista alteram o perfil estatal. O Estado-mínimo do liberalismo burguês, mero ente ordenador das relações sociais, é substituído pelo Estado-providência, que passa a intervir na sociedade. Assume, pois, duas funções básicas: a promoção do progresso econômico e a tutela dos cidadãos mais desfavorecidos. No que se refere a esta última vertente, o Estado intervencionista, mediante prestações positivas, potencializa o exercício dos direitos fundamentais de segunda geração.

Descrevendo o intervencionismo do Estado, assinala Orlando Gomes (1986, p. 15) que, ao longo do processo de consolidação dessas transformações, legitimou-se a intervenção do Estado na vida econômica como a forma por excelência de obtê-las. Orientou-se, desse modo, para a limitação da propriedade privada e da liberdade de contratar. Passou-se a admitir que a propriedade tem função social e que a autonomia privada deve ser comprimida em todos os modos do seu exercício.

As legislações consumeristas surgem, portanto, na transição histórica do Estado liberal para Estado-providência, organizado para desenvolver políticas públicas de concretização da igualdade material. Deste modo, o intervencionismo estatal passa a objetivar a busca de uma isonomia fática, mediante o implemento de prestações positivas. Na sociedade de massas e de economia oligopolizada, a ingerência estatal, para a tutela do equilíbrio consumerista, tornou-se cada vez mais necessária, mormente nos contratos de adesão, ante o estreito campo negocial, a impessoalidade e a discrepância de poderes entre o fornecedor e o consumidor.

Impôs-se, assim, normas de ordem pública, de natureza cogente, para a promoção do chamado dirigismo contratual. O contrato, assim como a propriedade, foi limitado e eficazmente disciplinado, tendo em vista o reconhecimento da função social destes institutos. Esta nova concepção social de contrato não só valoriza o momento da cristalização do consenso, mas também os efeitos contratuais são levados em conta, atentando-se, igualmente, para a condição econômica das partes contratantes. O espaço reservado para que os particulares auto-regulem suas relações – autonomia da vontade – é reduzido por normas imperativas, como as constantes da legislação consumerista. É uma nova concepção de contrato em que a vontade perde a condição de elemento nuclear, surgindo em seu lugar um vetor hemenêutico que transcende os sujeitos de direito – o interesse público.

Atenta para este redimensionamento axiológico, elucida Judith Martins-Costa (1992, p.141) que, contemporaneamente, modificado tal panorama, a autonomia contratual não é mais vista como um fetiche impeditivo da função de adequação dos casos concretos aos princípios substanciais contidos na Constituição e às novas funções que lhe são reconhecidas. Por esta razão desloca-se o eixo da relação contratual da tutela subjetiva da vontade à tutela objetiva da confiança, diretriz indispensável para a concretização, entre outros, dos princípios de superioridade do interesse comum sobre o particular, da igualdade positiva e da boa-fé em sua feição objetiva.

Sendo assim, ao procurar o equilíbrio contratual, no âmbito da sociedade de consumo, o direito passa a destacar o papel da lei como limitadora e legitimadora da autonomia da vontade. O contrato de consumo é, pois, iluminado por novos valores, admitindo-se a supremacia do interesse público, o respeito à vulnerabilidade, a transparência, a igualdade material, a boa-fé, a eqüidade e a confiança como diretrizes a serem realizadas no mercado de consumo.

3 O Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Como Discurso Principiológico

As legislações contemporâneas que tutelam os direitos fundamentais costumam ser estruturadas através de proposições principiológicas, as quais sinalizam para os valores e fins maiores a serem tutelados pela ordem jurídica. O microssistema do direito do consumidor, enquanto manifestação da cultura jurídica pátria, absorve, naturalmente, uma carga expressiva de valores. Estas estimativas comunitárias são cristalizadas em pautas de comportamento, exigindo uma interpretação capaz de atender à realização das finalidades deste ramo jurídico. A interpretação das normas consumeristas deve, igualmente, apresentar uma natureza teleológica, operacionalizando a busca de significados socialmente aceitos.

Sem o trabalho de mediação e de concretização, que se impõe ao intérprete-aplicador do direito, o direito do consumidor não logra realizar os seus valores fundantes, satisfazendo aos anseios da sociedade. O sentido jurídico, sendo externo às normas jurídicas, em certa medida, embora não possa contrariar de todo o seu enunciado, exige a sensibilidade do intérprete para se revelar completamente. Com a positivação histórica dos direitos humanos, nas esferas constitucional e infraconstitucional, a interpretação dos direitos do consumidor se colocou como problema a partir do momento em que os diplomas legais deixaram de ser apenas catálogos de competências do Estado para se converterem em verdadeiras cartas de cidadania. Cuidaram os juristas de oferecer uma teoria hermenêutica que pudesse responder à necessidade de interpretar e aplicar princípios. A interpretação passou a ser entendida como uma hermenêutica de princípios, baseada em pautas axiológicas, para cuja efetividade se deve substituir a idéia retrospectiva de interpretação pela idéia prospectiva de concretização.

Destacaram-se, assim, pela ingente função fundamentadora e hermenêutica, os princípios consumeristas. Decerto, o art. 4º do CDC, ao prescrever o objetivo da Política Nacional de Relações de Consumo, afigura-se como referencial teleológico para a interpretação de todo o arcabouço normativo do Código de Defesa do Consumidor, visto que, mediante a compreensão dos princípios jurídicos catalogados no art. 4º, o hermeneuta logra apreender os fins maiores que imantam a legislação consumerista. Por informar todo o conjunto normativo do CDC, os princípios consumeristas funcionam como reguladores teleológicos da atividade interpretativa, iluminando a aplicação das normas jurídicas estampadas neste diploma legal.

Não é outro o magistério de Luiz Rizzatto Nunes (2002, p. 19), para quem os princípios são, dentre as formulações deônticas de todo o sistema ético-jurídico, os mais importantes a serem considerados, não só pelo aplicador do direito, mas por todos aqueles que, de alguma forma, ao sistema jurídico se dirijam. E essa influência tem uma eficácia efetiva, real e concreta. Não faz parte apenas do plano abstrato do sistema. É de ser levada em conta na determinação do sentido de qualquer norma, como exigência de influência plena e direta. Vale dizer: o princípio, em qualquer caso concreto de aplicação das normas jurídicas, da mais simples à mais complexa, desce das altas esferas do sistema ético-jurídico em que se encontra para imediata e concretamente ser implementado no caso real que se está a analisar.

Em se tratando dos princípios jurídicos do CDC, porque a sua estrutura normativo-material é necessariamente aberta e indeterminada, a atuação do intérprete é condição de possibilidade para se concretizar as finalidades indicadas e corporificadas pela legislação consumerista. Decerto, a incapacidade humana de prever o futuro é a base da indeterminação dos princípios jurídicos. Há situações de via deliberada de escape interpretativo, com o emprego de expressões lingüísticas valorativas que podem ser interpretadas de diversos modos num contexto específico. Esta base principiológica torna flexível e dinâmica a interpretação dos direitos do consumidor.

Sendo assim, o significado normativo das legislações consumeristas, longe de ser um dado objetivamente dissociado do hermeneuta, emerge no âmbito da própria atividade interpretativa. Guiado pela principiologia, exerce o intérprete um relevante papel na reconstrução do sentido do microssistema do CDC, mormente no que se refere à necessária abertura aos valores sociais. A substituição da referência hermenêutica da voluntas legislatoris por uma viva e objetiva voluntas legis, institucionalmente valorada, abre espaço para uma interpretação atual, porque orientada pelos princípios jurídicos.

Neste sentido, refere Eduardo de Enterría (1986, p. 20) que “la autonomía de esa supuesta voluntad de la ley respecto de su autor y el hecho de su movilidad en el tiempo no podrían explicarse si la ley misma no fuese vista como expresión de algo substancial y más profundo, lo cual, por serlo, es capaz de someter y relativizar lo que no es más que una simple manifestación o formalización suya; aquí aparecen ya los famosos principios generales del derecho (sobre los que hemos de hablar luego), sin cuya realidad todo ese proceso esencial de la traducción de la ley en vida jurídica efectiva y su incesante movilidad no tendrían explicación posible; sería, en rigor, una arbitrariedad de los intérpretes sin norte posible, la misma cabalmente que el legalismo quiso en su momento desalojar”.

4 O Princípio Constitucional de Defesa do Consumidor no Sistema Jurídico Brasileiro

Com a inserção dos princípios nos textos constitucionais, operou-se uma revolução de juridicidade no constitucionalismo ocidental contemporâneo, visto que os princípios gerais do direito se transformaram em normas positivadas em Cartas Magnas. Sendo assim, as novas Constituições passaram a acentuar a hegemonia axiológica dos princípios constitucionais sobre todas as normas do direito positivo. Hoje, não há mais como pensar numa hermenêutica jurídico-constitucional sem referir-se a princípios como referências valorativas para a interpretação teleológica do direito.

Conforme adverte Glauco Magalhães Filho (2002, p. 11), a nova hermenêutica constitucional volta-se para as normas com estrutura de princípios (Constituição Material). Ela aproxima dialeticamente interpretação da aplicação. Objetiva, acima de tudo, a concretização de valores, e não a imediata submissão de fatos a disposições normativas. Assim, enquanto a interpretação teleológica da hermenêutica clássica busca a fixação do sentido da norma pelo seu fim imediato, a interpretação conforme a Constituição remete a norma aos fins do ordenamento jurídico e do Estado Democrático de Direito, gerando uma sistematização (unidade) axiológica do ordenamento jurídico.

No âmbito do sistema constitucional contemporâneo, a positivação dos princípios ocorreu, em larga medida, na ordem econômica de cada Carta Magna, estabelecendo os marcos do intervencionismo estatal para a satisfação dos direitos fundamentais de segunda geração, tendente a instaurar um regime de democracia substancial ao determinarem a realização de fins sociais, através da atuação de programas de intervenção na ordem econômica, com vistas à realização da justiça social.

A ordem econômica adquiriu dimensão jurídica a partir do momento em que as constituições passaram a discipliná-la sistematicamente, o que teve início com a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição Alemã de Weimar em 1919. No Brasil, com o advento da Carta Magna de 1988, a ordem econômica passou a ser disciplinada nos arts. 170 a 192. A Constituição enunciou que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na iniciativa privada, tendo por escopo assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. No art. 170, ocorreu a constitucionalização de inúmeros princípios, dentre eles, o primado da defesa do consumidor.

A este princípio da ordem econômica confere a Constituição Federal, desde logo, concreção nas regras constitucionais estampadas nos seus arts. 5º, XXXII: “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”; 24, VIII: “responsabilidade por dano ao consumidor”; 150, § 5º: “a lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços”; e 48 da ADCT: “o Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias, elaborará Código de Defesa do Consumidor”. Ademais, o parágrafo único, II, do art. 175 insere entre as matérias sobre as quais deverá dispor a lei que trate da concessão ou permissão de serviço público os direitos dos usuários.

Sobre seu substrato ideológico, sublinha Eros Grau (2003, p. 216-217) que, a par de consubstanciar, a defesa do consumidor, um modismo modernizante do capitalismo – a ideologia do consumo contemporizada (a regra “acumulai, acumulai” impõe o ditame “consumi, consumi”, agora porém sob proteção jurídica de quem consome) -, afeta todo o exercício de atividade econômica, inclusive tomada a expressão em sentido amplo, como se apura da leitura do parágrafo único, II, do art. 175. O caráter constitucional conformador da ordem econômica, deste como dos demais princípios de que tenho cogitado, é inquestionável.

Trata-se de uma proposta de conciliação dialética entre diversos elementos sócio-ideológicos, ora apontando para o capitalismo e a configuração de um Estado liberal, ora indicando uma opção pelo socialismo e pela organização de um Estado intervencionista. Certo é que a previsão de alguns princípios, como o da defesa do consumidor, revelam um compromisso entre as forças políticas liberais e as reivindicações populares de justiça social no mercado de consumo, possibilitando que o capitalismo seja domado e humanizado.

Além desta conotação na Carta Magna, a defesa do consumidor constitui-se em um dos princípios a ser seguido para o desenvolvimento da atividade econômica, sendo um meio para se atingir o desiderato constitucional em que ela se fundamenta, que é a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa, para que possa assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Com efeito, a realização do princípio constitucional da defesa do consumidor não elide as demais normas principiológicas do art. 170 da CF/88, ainda que, aparentemente, polarizem um conflito inconciliável.

Neste sentido, ressalta Ricardo Camargo (1992, p. 52) que não se pode perder de vista que o CDC tem seu fundamento de validade na Constituição Econômica, de sorte que sua aplicação não pode conduzir a uma nulificação dos demais princípios que a informam. Se a defesa do consumidor constitui um dos modos pelos quais a propriedade dos bens de produção cumpre a sua função social e o poder econômico se põe em seus justos trilhos, não pode ela chegar ao cúmulo de comprometer a soberania nacional nem de tornar enunciados puramente ornamentais, os concernentes à propriedade privada, à livre iniciativa e à livre concorrência. Afinal, são apenas aparentes as contradições da Constituição Econômica, já que nenhum de seus princípios se aplica sem restrições.

5 A Principiologia Consumerista Como Norte Hermenêutico do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor

A elevação da defesa do consumidor à categoria de princípio constitucional demanda que as normas infraconstitucionais se apresentem como realizando algo, da melhor forma possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas, pois os princípios não proíbem, permitem ou exigem algo em termos de tudo ou nada, impondo, em verdade, a otimização dos valores jurídicos.

O princípio constitucional da defesa do consumidor não se esgota na densificação promovida pelo legislador ao elaborar o CDC. Torna-se imperiosa a concretização da defesa do consumidor na miríade das relações sociais, o que exige o esforço do operador do direito na correta interpretação e aplicação do referido diploma legal, capilarizando o mandamento constitucional. Logo, também no plano infraconstitucional, serão relevantes os princípios jurídicos, mormente aqueles positivados na própria legislação consumerista, no desenvolvimento de suas funções fundamentadora e hermenêutica. Neste sentido, o CDC contempla, além das normas de conduta e de organização, uma terceira categoria normativa, denominada de normas-objetivo, que ostenta uma inegável tessitura principiológica.

Tratando do tema, sustenta Eros Grau (2002, p. 35) que o direito passa a ser operacionalizado, tendo em vista a implementação de políticas públicas, políticas referidas a fins múltiplos e específicos. Pois a definição dos fins dessas políticas é enunciada precisamente em textos normativos que consubstanciam normas-objetivo e que, mercê disto, passam a determinar os processos de interpretação do direito, reduzindo a amplitude da moldura do texto e dos fatos, de modo que nela não cabem soluções que não sejam absolutamente adequadas a tais normas-objetivo.

A norma que se depreende do art. 4º do CDC se enquadra nesta última tipologia, pois estabelece a responsabilidade dos poderes públicos e agentes econômicos na realização dos princípios consumeristas, configurando a verdadeira ratio essendi do diploma legal. Com efeito, o art. 4º condiciona a incidência e a aplicação das normas da lei a estes princípios/objetivos, que passam a ser finalidades jurídicas prioritárias. Por isso que é uma norma-objetivo. Dado ao caráter imperativo das regras do CDC, o art. 4º vincula o intérprete aos resultados pretendidos, o qual fica na contingência de aplicar o CDC teleologicamente, não por sua opção hermenêutica, mas pela própria determinação legal.

Neste sentido, assinala Newton de Lucca (1995, p. 42) que o art. 4º define uma série de princípios, e, como tais, orientam a interpretação dos demais dispositivos do Código no sentido de que eles sejam efetivamente preservados, não podendo uma simples regra jurídica sobrepor-se à idéia contida no princípio. O universo jurídico é composto por normas. Estas podem ser simples regras ou verdadeiros princípios. Estes últimos afastarão a aplicação das primeiras se tal procedimento contrariar o seu princípio fundamental.

Por essa razão, o legislador estabeleceu, no art. 4º do CDC, uma política nacional de consumo, adotando princípios específicos a serem seguidos pelo hermeneuta, que definem os direitos fundamentais do consumidor, tais como a transparência, a vulnerabilidade, a igualdade, a boa-fé objetiva, a repressão eficiente a abusos, a harmonia do mercado, a eqüidade e a confiança nas relações de consumo. A obediência a tais princípios é imperativa, pelo que as relações de consumo devem se desenvolver e ser interpretadas sem qualquer afastamento dos propósitos que os revestem e os caracterizam.

As dicções do art. 4º da Lei nº 8.078/90 não são programáticas, como alguns autores sustentam, a indicar os valores básicos que o Estado, entendendo relevantes, concretiza como metas a alcançar no tocante a relações de consumo. Não há outorga ao Estado de atividade discricionária pelo referido dispositivo, produzindo, ao revés, uma força cogente obrigatória não só para os órgãos estatais, mas também para os agentes econômicos que integram uma dada relação de consumo.

6 Notas Conclusivas: a Interpretação Principiológica e a Efetividade dos Direitos Fundamentais do Consumidor

A eficácia social do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor se vincula diretamente às práticas interpretativas. A interpretação, como atividade mediadora entre o legislador e o mercado de consumo, exterioriza as mensagens normativas do CDC. Ao delimitar o significado de seus modelos normativos, o hermeneuta concretiza os valores e objetivos da legislação consumerista. Para que seja potencializada a índole protetiva do CDC, a compreensão interpretativa de seu arcabouço normativo requer o uso dos princípios jurídicos constitucionais e infraconstitucionais. A principiologia oferece ao intérprete os vetores axiológicos de orientação hermenêutica, embasando a interpretação teleológica da lei consumerista. Os princípios jurídicos, imbuídos que são de uma reserva ética, maximizam a tutela do consumidor, minimizando as desigualdades inerentes ao mercado capitalista.

A efetividade dos direitos do consumidor pode ser garantida pela própria textura aberta dos princípios jurídicos, característica não encontrada nas regras de direito. Com efeito, os princípios jurídicos ostentam uma estrutura dialógica, capaz de apreender as mudanças da realidade circundante, e uma permeabilidade aos conteúdos valorativos, o que melhor permite a realização da justiça. Esta abertura, também encontrada nos princípios consumeristas, faz com que o CDC cumpra o seu papel na disciplina da realidade social, sem amarrar os atores sociais aos modelos inflexíveis e definitivos das regras jurídicas.

Decerto, os princípios norteadores das relações de consumo, tais como a transparência, a vulnerabilidade, a igualdade, a boa-fé objetiva, a repressão eficiente a abusos, a harmonia do mercado de consumo, a eqüidade e a confiança, oferecem importante norte hermenêutico para a compreensão do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor.

Logo, a interpretação principiológica do Código de Defesa do Consumidor enseja a construção de novos paradigmas de convivência socioeconômica entre fornecedores e consumidores, descortinando um horizonte mais promissor para a realização da justiça no âmbito do mercado capitalista brasileiro.

7 Referências

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ROPPO, Enzo. O contrato. Coimbra: Almedina, 1988.

VIEIRA, Adriana Carvalho Pinto. O princípio constitucional da igualdade e o direito do consumidor. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.


A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR COMO DIREITO FUNDAMENTAL EM TEMPOS DE GLOBALIZAÇÃO

AUTOR: Heraldo Felipe de Faria

RESUMO

O processo de tutela do consumidor desenvolveu-se paralelamente à abertura de mercados, contrapondo a ideia de que a maior proteção do consumidor equivaleria à barreira ao comércio. O estabelecimento de medidas protecionistas levou os países a produzir produtos de maior qualidade e de maior aceitação internacional, protegendo o mercado interno de produtos estrangeiros não preparados para esta competição. Em 1985, a ONU positivou o princípio da vulnerabilidade do consumidor, influenciando vários países na elaboração de suas legislações consumeristas. A preocupação com respeito aos direitos fundamentais e, conseqüentemente, com a tutela do consumidor consolida os direitos do cidadão e promove o desenvolvimento econômico e social. Por ser direito fundamental, a proteção do consumidor vincula o restante do ordenamento jurídico brasileiro. Portanto, normas que decorrerem dos acordos comerciais, que não estiverem em sintonia com nossa Constituição deverão ser desconsideradas, enquanto as que ampliarem o grau de proteção à pessoa humana têm aplicabilidade imediata, conforme a CF/ 1988. Há, ainda, longo caminho a ser percorrido em termos de harmonização ou convergência de legislações para que o consumidor esteja protegido dentro e fora dos blocos regionais.  O importante é que as garantias já positivadas sejam ampliadas e não restringidas pelas novas normas internacionais.

PALAVRAS-CHAVES

Proteção do consumidor, direito fundamental, globalização.

Para acessar o texto na íntegra, clique no link abaixo:
http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br/index.php/rdfd/article/view/41

segunda-feira, 30 de julho de 2012

PJe-JT em Minas será implantado em 5 de setembro de 2012

PJe-JT em Minas será implantado em 5 de setembro (09/07/2012)

A implantação do Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT), na 3ª Região - TRT (Módulo de 2º Grau) e Vara do Trabalho de Nova Lima (Módulo de 1º Grau) será no dia 5 de setembro de 2012, de acordo com cronograma nacional estabelecido pela presidência do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT).
A Justiça do Trabalho aderiu oficialmente ao Processo Judicial Eletrônico em 29 de março de 2010 com a celebração do Termo de Acordo de Cooperação Técnica nº 51/2010 entre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). O projeto tem como meta elaborar um sistema único de tramitação eletrônica de processos judiciais: o papel será substituído por um sistema informatizado fácil e seguro, proporcionando rapidez às decisões judiciais e ampliando as formas de acesso à Justiça.
A primeira versão do PJe para a Justiça do Trabalho (PJe-JT) priorizou a fase de execução das ações trabalhistas. Após o desenvolvimento de funcionalidades e treinamento de servidores, o módulo piloto do sistema foi lançado em Cuiabá-MT em 10 de fevereiro de 2011, sendo que a primeira unidade judiciária a instalar o PJe-JT de forma piloto foi a de Navegantes, em Santa Catarina, inaugurada em 5 de dezembro de 2011.
Segundo o desembargador Ricardo Antônio Mohallem, coordenador do Grupo Gestor do Sistema E-gestão e presidente do Comitê Gestor Regional do PJe-JT, o TRT de Minas, juntamente com a OAB e o Ministério Público do Trabalho, está direcionando todos os esforços para cumprir as metas do CNJ e tornar o PJe uma realidade efetiva na 3ª Região, a partir de 5 de setembro deste ano. No entendimento do magistrado - que conheceu, recentemente, a infraestrutura do PJe-JT em Santa Catarina - "o PJe é um programa em contínuo desenvolvimento, em prol da diminuição de tempo gasto com questões burocráticas, com reflexo no aprimoramento da já excelente prestação jurisdicional: "O que há de mais moderno, mais avançado, está sendo incorporado a esse programa, que a cada dia ganha uma ferramenta nova, um acessório novo, para alcançar o nível mais elevado de desenvolvimento técnico, com o objetivo de permitir que os magistrados tenham mais tempo para se dedicarem às questões mais substanciais do processo".
O desembargador pondera que mudanças desse porte trazem inquietações mas assegura que, depois de tudo implantado e assimilado, os melhoramentos são sentidos por todos. "Nos tribunais e varas onde já houve a implantação a receptividade tem sido muito grande", garante Ricardo Mohallem.
Comitê do PJe-JT em Minas
Instituído por meio de portaria, o Comitê Gestor Regional do PJe-JT tem como atribuição administrar o processo eletrônico em Minas Gerais nos aspectos relacionados à sua estrutura, implementação e funcionamento. O Comitê vai avaliar a necessidade de manutenção corretiva e evolutiva, bem como propor aprimoramento do sistema do PJ-e; organizar a estrutura de atendimento às demandas de seus usuários internos e externos e determinar a realização de auditorias, sempre com observância das normas do CSJT (Conselho Superior da Justiça do Trabalho) e do Comitê Gestor Nacional.
Integram o Comitê, além do seu presidente, desembargador Ricardo Mohallem, o juiz substituto Fabiano de Abreu Pfeilsticker, o procurador do trabalho Genderson Silveira Lisboa, o advogado Carlos Schirmer Cardoso, os diretores Sandra Pimentel Mendes (Judiciária), Gilberto Atman Picardi Faria (Informática) e Adalberto Mendes Salles (19ª VT).
Escola Judicial e RH preparam magistrados e servidores para implantação do PJe
O desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior, integrante do Conselho Consultivo e coordenador do Processo Judicial Eletrônico na EJ, vem coordenando reuniões do grupo focal a quem compete construir o itinerário de capacitação em Processo Judicial Eletrônico - PJe. Dele participam Eliel Negromonte Filho, secretário-geral da Presidência, Sandra Pimentel Mendes, diretora judiciária, magistrados, diretores de secretaria, assessores, assistentes, digitadores de audiência e servidores da Escola Judicial e das diretorias de Informática e Recursos Humanos que juntos traçam ementas dos cursos básicos de Informática, Processo do Trabalho Aplicado e Processo Judicial Eletrônico que serão oferecidos a partir de agosto. Os cursos estão sendo planejados de maneira a oferecer formação essencial para que a transição para o PJe-JT seja feita de forma bem tranquila.
Entre os encaminhamentos dados pelo grupo está a constituição de equipes de trabalho responsáveis por temas estratégicos da formação para essa nova modalidade de processo, como a capacitação no processo (fluxo, rotinas críticas, Teoria Geral do Processo, formação básica em Direito Material, redação de minutas de decisão, sentenças e despachos, elaboração e análise de cálculos), capacitação em informática (básica e avançada), capacitação do público externo (advogados) e gestão da mudança.
Confira página do Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT) no portal do CSJT. (com informações do site www.csjt.jus.br).

PORTE DE REMESSA E RETORNO EM PROCESSOS ELETRÔNICOS - STJ

Tribunal esclarece dúvidas sobre porte de remessa e retorno de autos no contexto eletrônico
A digitalização da Justiça caminha a passos largos. A remessa e devolução de processos físicos, em pouco tempo, serão realidade nos museus. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já está inserido na era virtual e, para dar ciência da forma de pagamento de remessa e retorno de autos neste contexto eletrônico, editou a Resolução 8, de 23 de abril de 2012. A cobrança tem o objetivo de ressarcir o erário pelas despesas com o envio de processos ao STJ e a devolução desses autos ao tribunal de origem, depois de julgados os recursos.

A resolução esclarece que o recurso interposto em processo físico e transmitido eletronicamente ao STJ tem o porte de remessa e retorno reduzido: apenas 50% do valor fixado na Tabela C para até 180 folhas – 1kg, no que diz respeito ao retorno, via correio (por mídia eletrônica), das peças aqui produzidas.

Entretanto, os processos encaminhados ao STJ e devolvidos ao tribunal de origem de forma integralmente eletrônica são isentos do porte de remessa e retorno. Qualquer valor indevidamente recolhido será objeto de restituição mediante pedido do interessado, conforme previsto no artigo 8º da resolução.

Atualmente, nove tribunais já aderiram ao procedimento de baixa eletrônica dos processos. São eles: Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN), Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO), Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) e Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).

O presidente do STJ promoverá, por meio de portarias, a atualização da lista de tribunais que já fazem parte da devolução eletrônica de autos.

Acesse aqui a íntegra da Resolução 8/2012 do STJ.

Acesse aqui a Portaria 175/2012, que alterou o anexo II da Resolução 8/2012.

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...