quinta-feira, 20 de junho de 2013

A METAFÍSICA JURÍDICA, O MINEIRINHO E O CASO CONCRETO

Esperando Godot
E o Cego de Paris ainda ficará para depois. Terá que esperar mais um pouco. Isto porque a coluna de hoje é light. Na linha do Combo de Palavras.

A estandardização em marcha
A coluna de hoje é sobre aquilo que todos os professores dizem para seu alunos e, no fundo, sabem que isso é uma ficção e que é uma “quase-fraude”: que o Direito é uma questão de caso concreto. Vamos falar sobre isso?

Examinando o projeto do novo Código de Processo Civil – sobre o qual em breve apontarei as baterias do Senso Incomum — é fácil constatar como a estandardização tomou conta do imaginário dos juristas. Interessante mesmo é ver, no projeto — que nada mais faz do que ratificar o habitus dogmaticus[1]que conforma a cotidianidade das práticas jurídicas (doutrina e jurisprudência) — o modo como são recuperadas duas formas de positivismo: o velho exegetismo, porque aposta em uma espécie de conceptualização (seriam saudades da Bregriffjurisprudenz?[2]), e o positivismo pós-exegético de perfil normativista, porque aposta no poder discricionário dos juízes (eis aí o protagonismo judicial). Veja-se: de um lado, um capítulo sobre Precedentes (artigos 520 e seguintes), apostando no conceptualismo; de outro, o livre convencimento na apreciação das provas... Como coadunar isso? Alguém pode explicar? Ou seja, sob pretexto de se livrarem das velhas posturas positivistas, o projeto reafirma tanto o velho como o “novo” (sic) positivismo. Isso apenas mostra que parcela da comunidade jurídica ainda não entendeu o “que é isto — o positivismo”.
A propósito do conceptualismo ou da vontade de regressar a uma jurisprudência analítica ou, quem sabe, a uma Begriffjurisprudenz, parece que o novo CPC incentiva a que se construam súmulas e que nos encaminhemos, definitivamente, a um direito commonlizado. Isso me entristece. Isso enfraquece a doutrina. E fragiliza a autonomia do direito. Com efeito, os artigos 520 e seguintes me deram essa nítida impressão. Mas não quero adiantar maiores críticas ao projeto do CPC. O que é dele está guardado, como se diz por aí.
Qual é o pior dos positivismos?
Efetivamente, isso eu não sei. Mas parece que há um fascínio brasileiro pelo pandectismo alemão. Aliás, disso não escapa nem um sedizente pós-positivista (ou não-positivista) como Alexy, ou seja, o que é a regra da ponderação (ou o produto dela) senão uma espécie de “conceito” (nova regra geral) que será aplicado por subsunção (a exemplo daquilo que acontece nos easy cases)? No fundo, esse é o flerte de Alexy com a velha Begriffjurisprudenz.

Veja-se como os juristas — inseridos no habitus dogmaticus — são apaixonados pela cisão metafísica (dualismo) como essência e aparência, questão de fato e questão de Direito, etc. Os professores dizem em sala de aula que não dá mais para cindir fato e Direito (ou questão de fato e questão de Direito). Muitos chegam a referir a notável tese de Castanheira Neves sobre o assunto, que serviu de base para a declaração da inconstitucionalidade dos assentos portugueses (não resisto à blague: trata-se de assentos e não acentos; assentos, em Portugal, correspondiam às súmulas de terra brasilis).
Mas, se isso é assim, por que as petições e sentenças falam em “dos fatos” e, depois, “do direito”? Já notaram isso? Por que será? Não seria um problema de índole (a)paradigmática? Ou é somente umhabitus (homenageio Bourdieu)?
Macro-lide ou “puxadinho” hermenêutico?
Tudo isso aliado à crescente abstratalização, espécie de neoconceptualismo que pode ser visto na proliferação de enunciados jurisprudenciais (e até doutrinários) e súmulas (vinculantes ou não). E todos querem incidentes de demandas repetitivas. O STJ já fala em “macro-lide”, como pode ser visto no recente REsp 1.251.331-RS. E no afã abstrativista cabe tudo. Tudo em nome da eficiência. Nesse clima utilitarista, aliás, a ilustre relatora do citado Recurso Especial, ministra Isabel Galotti, aproveitou para suspender não somente feitos passíveis de recurso especial. Explico: como é sabido, inclusive sumulado pelo próprio STJ, Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais (Súmula 203). Assim, paradoxalmente, a decisão no REsp 1.251.331-RS contraria esse entendimento e abarca feitos que tramitam nas turmas recursais, a despeito também da — absoluta — ausência de previsão legal de alcance do instituto dos recursos repetitivos às demandas dos juizados especiais (artigo 543-C do CPC).

E como isso foi feito? Sempre há uma analogia para resolver o problema de modo realista (no sentido do realismo jurídico, que, como se sabe, é um positivismo fático). Um “puxadinho hermenêutico”: já que não dá para usar o parágrafo 3º do artigo 543-B, do CPC, que abarca as turmas recursais, pois se refere ao recurso extraordinário no STF, dá-se um jeito e utiliza-se o artigo 328 do Regimento Interno, não do STJ, mas, sim, do STF. Desse modo, encobre-se melhor o contorcionismo hermenêutico, interpretando o CPC de acordo com o Regimento Interno do STF. Assim, cabe quase tudo em nome da “macro-lide”. Será que cabe o respeito à normatividade nessa ordem de ideias?
Afinal, causas ou teses abstratas?
Como venho referindo — o Alexandre Bahia, constitucionalista e processualista mineiro trabalha isso em vários textos — já não julgamos causas. Tratamos só de... teses. Pois é. Passamos a lidar com conceitos... sem as coisas. Isso é o que se pode chamar de “metafísica jurídica”. O caso concreto — a coisa concreta, o “senhor fato” — sumiu! Foi para as calendas. Nem a valorosa classe dos estagiários consegue mais encontrá-lo.

Parece que os juristas se encontram no entremeio de um mix positivista: um pé na metafísica clássica, porque querem aprisionar o mundo em conceitos, e outro na vulgata da filosofia da consciência, no voluntarismo. Primeiro constroem os conceitos (sem coisas); depois, aplicam-nos como uma espécie de “mito do dado”. Como se existisse o “sentido” em geral. Como se as coisas tivessem essências ou as palavras pudessem carregar “as coisas”. Como se a palavra água molhasse ou pingasse; a palavra bomba explodisse, a palavra pé deixasse pegadas e o tipo penal do estupro (con)tivesse a “essência de estuprez”.
E, para piorar, a moléstia contemporânea dos resumos jurídicos (e dos resumos dos resumos). Esse “neo-resumismo” representa bem o imaginário fragmentado da “pós-modernidade”. Trata-se de um direito siliconado. Mais ou menos como a “mulher pera” ou a “mulher melão”. Sabemos que é fake.Mas andam por aí. Nas capas de revistas. E nas salas de aula (respectivamente). Os sanduíches do McDonald’d são assim também: na foto são uma coisa... O Direito entrou nessa onda já há muito tempo.
O sábio mineirinho e o “caso concreto”
A estória que conto está no site www.tirodeletra.com.br e pode ser uma excelente alegoria para os alunos (não só eles) aprenderem o que é um caso concreto e do que estou falando hoje nesta coluna.

Seu Zé, mineirinho, pensou bem e decidiu que os ferimentos que sofreu num acidente de trânsito eram sérios o suficiente para levar o dono do outro carro ao tribunal. No tribunal, o advogado do réu começou a inquirir seu Zé:
— O senhor não disse na hora do acidente ‘estou ótimo’?

E seu Zé responde:
— Bão, vô ti contá o que aconteceu. Eu tinha acabado di colocá minha mula favorita na caminhonete...

— Eu não pedi detalhes! — interrompeu o advogado — Só responda à pergunta: O senhor não disse na cena do acidente: ‘estou ótimo’?
— Bão, eu coloquei a mula na caminhonete e tava descendo a rodovia...
O advogado interrompe novamente e diz:
— Meritíssimo, estou tentando estabelecer os fatos aqui. Na cena do acidente este homem disse ao patrulheiro rodoviário que estava bem. Agora, várias semanas após o acidente ele está tentando processar meu cliente, e isso é uma fraude. Por favor, poderia dizer a ele que simplesmente responda à pergunta? Mas, a essa altura, o Juiz estava muito interessado na resposta de seu Zé e disse ao advogado:

— Eu gostaria de ouvir o que ele tem a dizer.
Seu Zé agradeceu ao juiz e prosseguiu:
— Como eu tava dizendo, coloquei a mula na caminhonete e tava descendo a rodovia quando uma picape travessô o sinal vermeio e bateu na minha caminhonete bem du lado. Eu fui lançado fora do carro prum lado da rodovia e a mula foi lançada pro outro lado. Eu tava muito ferido e não podia me movê. Mais eu podia ouvir a mula zurrano e grunhino e, pelo baruio, percebi que o estado dela era muito feio. Em seguida o patrulheiro rodoviário chegou. Ele ouviu a mula gritano e zurrano e foi até onde ela tava. Depois de dá uma oiada nela, ele pegou o revorve e atirou 3 vezes bem no meio dos ôio dela. Depois ele travessô a estrada com a arma na mão, oiô para mim e disse: - ‘Sua mula estava muito mal e eu tive que atirar nela. E o senhor, como está se sentindo?” - Aí eu pensei bem e falei:  “tô ótimo...!”

Então? Viram como é importante o tal de “caso concreto”? Como se diz em Minas, “uai”. Texto e contexto. Texto e norma. O século XIX e parte dos sucedâneos positivistas que ingressaram no século XX e persistem no XXI apostava na tese de que o texto trazia consigo a própria norma. Lei era igual a direito e direito era igual a lei. A tese de que a norma é o produto da interpretação do texto (lei), de Müller, veio para azeitar o caminho pós-positivista. Claro que correndo o risco — e isso acabou ocorrendo — de a tal “norma a ser atribuída ao texto” se descolasse totalmente deste. Bom, o resto da história conhecemos. Tenho gastado rios de tinta para contar isso.
Quando o projeto do CPC nitidamente aposta em conceitualizações/abstratalizações, buscandocommonlizar o Direito (sem a responsabilidade do caso concreto daquela família de direito), penso no risco dos conceitos sem coisas. Do “paraíso dos conceitos” já denunciado por Hart.
Por isso, deixemos que o mineirinho conte a sua história. Deixemos que ele conte o “seu caso concreto”. Porque nem tudo que parece, é!
As consequências vêm sempre depois...
Post Scriptum 1: meu orientando Márcio Gil dos Santos, de Juiz de Fora (MG), manda notícia (clique aqui para ler) dando conta de que o governo de Minas Gerais obteve, dia 14 de junho de 2013, liminar do Tribunal de Justiça proibindo qualquer manifestação durante a Copa da Confederações. Aí está. Deve ter utilizado a Constituição da FIFA e não a da República Federativa do Brasil! Veja-se como a coisa da abstratalização pega: uma decisão judicial, que deveria ser umaapplicatio, uma concretização, é emitida com caráter de “norma geral”.

A decisão tem eficácia erga omnes e é dotada de autoexecutoriedade no caso de descumprimento... Ah, a tentação “dos passados” (disso que você está pensando, o passado recente e do passado mais distante, o positivismo exegético). Seria como na antiga propaganda do Nescafé Casagrande, “a volta dos bons tempos”? Aquele mineirinho perguntaria: “— Bons tempos para quem, cara pálida?” Invocando de novo o nosso mineirinho, o Messi do caso concreto, pergunto: Decretaram o estado de sítio nas alterosas?
Post Scriptum 2: e leio na Internet que o governador de Goiás obteve liminar na Justiça proibindo uma estudante de jornalismo de citar seu nome em qualquer documento. É isso mesmo! Uma decisão, que deveria ser concretização, é posta como norma geral — uma proibição geral e irrestrita... Pronto!
E, de novo, digo: And I rest my case! Ou, em sânscrito clássico: Eu não disse?
Post Scriptum 3: sobre as manifestações de rua escreverei nos próximos dias. Mientras, sugiro a leitura do texto de Rosivaldo Toscano . Está tudo muito confuso, ainda. Mas tenho receio de frases de ordem do tipo “não voto em partidos, voto em pessoas”; “tudo está errado”... (tenho medo que Pedro Bial venha a ser alçado a líder dos movimentos – peço que entendam a metaforização que estou fazendo!). Democracia tem mais a ver com Locke do que com Hobbes. Guillermo O’Donnel já denunciava de há muito o perigo das democracias delegativas. Ruim com partidos... pior sem eles. Parcela considerável dos que hoje marcham nas ruas não lembra em quem votou... mas odeia assim mesmo os políticos. Mas não quero pré-julgar, assim, sem uma reflexão mais aprofundada.
De todo modo, vai uma pergunta, feita com todo o cuidado e respeito: será que essas coisas como “macro-lide” — e outras do gênero — não tem a ver com a formação de um imaginário que insta esse povo a ir às ruas? Não estaríamos esquecendo o “Brasil concreto”, do mesmo modo como esquecemos o “caso concreto” no direito?
Li recente decisão que me faz pensar se isso também não colabora para o esquecimento do “Brasil concreto”, que é, no fundo, a alegoria do que aqui estou tratando: o esquecimento do caso concreto, das coisas, daquilo que é palpável, do que machuca as pessoas, que move suas vidas: ‘O sistema normativo pátrio utiliza o princípio do livre convencimento motivado do juiz, o que significa dizer que o magistrado não fica preso ao formalismo da lei nem adstrito ao laudo pericial produzido nos autos, devendo o julgador analisar o caso concreto, levando em conta sua livre convicção pessoal.' (5001367-22.2011.404.7119).
De novo me permito invocar a sabedoria do grande Conselheiro Acácio, do romance O Primo Basílio:as consequências vêm sempre depois... Já não estariam vino, perguntaria o nosso sábio mineirinho Zé, engolin(d)o a letra “d”? Já eu vou invocar o mexicano Eráclio Zepeda: “quando as águas da enchente descem e cobrem a tudo e a todos, é porque de há muito começou a chover na serra. Nós é que não nos demos conta”.

[1] Expressão que criei quando do lançamento da primeira edição do Hermenêutica Jurídica em Crisehá mais de dez anos.
[2] Jurisprudência dos conceitos.
Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine oFacebook.

Revista Consultor Jurídico, 20 de junho de 2013

terça-feira, 18 de junho de 2013

VEJA COMO CRIPTOGRAFAR COMUNICAÇÕES PELA INTERNET

A ampla divulgação de que o governo americano espiona e terceiriza o trabalho de monitoramento de usuários da internet a empresas mostrou que qualquer agente de órgãos de segurança ou qualquerhacker com o equipamento apropriado e o software certo pode interceptar comunicações pela internet, seja por meio de conexão a cabo ou sem fio. Para a população em geral, isso é grampo. Para a comunidade da computação, isso é "packet sniffing" (farejamento de pacotes) ou "traffic sniffing" (farejamento de tráfego). Seja o que for, a melhor maneira de proteger comunicações confidenciais contra bisbilhoteiros de todas as laias é a criptografia.
É claro que não existe sistema de criptografia que não possa ser quebrado. Foi sempre assim com qualquer tipo de código. Entretanto, os sistemas de criptografia modernos são muito difíceis de ser decifrados. Eles envolvem matemática muito complexa e a posse da chave certa. Decifrá-los exige muito esforço técnico e financeiro. Ou seja, comunicações criptografadas não são inexpugnáveis, mas o custo para capturá-las é alto.
Criptografar é dificultar o roubo de informações ou a quebra do sigilo das comunicações. Mesmo que um governo ou um hacker consiga interceptar suas comunicações, é impossível visualizá-las, estejam elas percorrendo o tráfego da internet ou armazenadas no servidor da provedora de serviços.
Mas criptografar nem sempre é uma tarefa fácil. Por isso, é necessário pesar a inconveniência da criptografia com os benefícios de segurança que ela traz para as comunicações e documentos confidenciais, para saber se vale a pena se dar ao trabalho. Porém, há sistemas fáceis de configurar e usar, como o de criptografia OTR para mensagens instantâneas, o Tor, o protocolo HTTPS e algumas ferramentas de criptografia de e-mails.
site Surveillance Self-Defense, da "Electronic Frontier Foundation (EFF)", fundação dedicada a educar o público sobre as tecnologias e leis relacionadas aos programas de espionagem do governo, apresenta algumas recomendações para os usuários reduzirem suas vulnerabilidades na internet:
WI-FI
Comunicações feitas via sistemas sem fio (wireless) são particularmente vulneráveis. São comparáveis a transmissões por rádio: vão ao ar. Para interceptá-las, basta ter um software desniffing. Sequer é preciso algum equipamento especial. A única maneira de protegê-las é com criptografia. Sem isso, não se pode supor que as comunicações estejam protegidas.

A maioria dos pontos de acesso de sistemas wireless já vem com um software de criptografia instalado, o WEP (Wired Equivalent Privacy) ou o WPA (Wi-Fi Protected Access). Ele criptografa as comunicações apenas no percurso do computador ao ponto de acesso. O WEP não é grande coisa. É facilmente vencido por hackers. Mas, pelo menos, pode-se alegar que as comunicações são protegidas. O WAP é bem melhor, mas também só cobre o primeiro passo das comunicações.
Rede privada Virtual (VPN – virtual private network) 
A VPN é uma extensão de uma rede privada, como a de uma firma ou grupo de firmas, para uma rede pública, como a internet. VPNs usam protocolos de criptografia por "tunelamento". Isto é, suas comunicações trafegam pelas vias públicas da internet por uma espécie de "túnel", que lhes garante confidencialidade, autenticação e integridade.

A VPN pode ser uma ferramenta eficaz de criptografia para comunicações entre escritórios de uma mesma banca de advocacia, ou entre computadores de um mesmo escritório. Mas os clientes não são conectados a ela. Portanto, não há garantia de privacidade nas comunicações entre a banca e seus clientes, só com o uso de uma VPN. Todos os computadores conectados à rede devem usar o mesmosoftware e devem ser configurados corretamente para se comunicarem com segurança entre si. Isso significa que a rede exige administração constante do sistema. Os clientes não estão conectados à VPN do escritório.
Navegadores da Internet
Algumas comunicações por meio de navegadores da internet podem ser criptografadas, para proteção contra invasores. Sem proteção, qualquer coisa que você faça na internet, com o uso do navegador, é registrada em seu computador, nos servidores da web com os quais se conecta e é obtida com certa facilidade por bisbilhoteiros que monitoram sua conexão pela rede.

Algumas configurações podem ser feitas em "opções da internet" no navegador, para aumentar a segurança. Uma delas é bloquear os cookies que os sites enviam para seu navegador. Se você os aceita, eles são reenviados ao site toda vez que você acessa uma página, uma imagem ou um script. Mas não é possível bloquear cookies de todos os sites se você quer acessar lojas virtuais e suas contas bancárias, por exemplo. Uma ideia é usar dois navegadores: um que você bloqueia cookiescom exceções para os sites em que faz operações bancárias, pagamento de contas, gestão do cartão de crédito etc., e outro que você bloqueia tudo e usa para entrar em todos os sites que quiser.
Geralmente os bancos e operadoras de cartão utilizam sites com protocolo HTTPS, em vez de HTTP, o que é uma boa medida. O protocolo HTTP não é criptografado e é sujeito a invasões. O HTTPS é uma alternativa mais segura. Ele criptografa páginas e tenta assegurar três coisas: 1) terceiros não podem ver o conteúdo da página; 2) a página não pode ser modificada por terceiros; 3) a página é realmente enviada pelo servidor da web listado na barra da URL. Mas o servidor da web tem de ser configurado para dar suporte a HTTPS.
Para enviar informações confidenciais — ou "sensíveis" — é preciso se certificar de que se está usando HTTPS. Caso contrário, não envie. Cheque três indicadores de que a página é HTTPS: 1) a URL começa com https://; 2) há um ícone (às vezes de um cadeado) antes do https://; 3) a barra da URL/localização é colorida. Se você receber uma advertência sobre certificados ou vê um ícone quebrado, pode assumir que qualquer das propriedades de segurança da página pode estar quebrada.
E-mail
São ferramentas básicas para criptografia de e-mails o Pretty Good Privacy (PGP), pago, com alguns recursos gratuitos; e o GNU Privacy Guard (GnuPG), gratuito. Ambos oferecem proteção aos e-mailsem trânsito e também a dados armazenados contra interceptação e também contra acesso a cópias de seus conteúdos em seu computador e nos computadores de terceiros. A maioria dos programas de e-mail podem ser configurados para funcionar bem com softwares de criptografia, tornando a operação apenas uma questão de clicar em um botão para assinar, verificar, criptografar e descriptografar as mensagens de e-mail.

Há dois problemas naturais com a dupla GnuPG/PGP. O primeiro é que esses programas só são úteis se forem usados pelas duas partes que se comunicam. Qualquer deles pode ser instalado em toda o escritório, mas se o cliente não o usar, as comunicações não podem ser criptografadas. É preciso convencer o cliente a instalá-lo. O segundo é que você precisa encontrar e verificar chaves públicas para assegurar que bisbilhoteiros não o induzam a usar a chave errada. Esse artifício é conhecido como ataque "man in the middle" (MITM).
Mensagens instantâneas
É mais fácil proteger uma mensagem instantânea do que um e-mail — embora um telefonema bata os dois. A maneira mais fácil de interceptar comunicações é obtê-las de você mesmo, da pessoa com a qual você se comunica ou de sua provedora de serviços, se qualquer dessas partes armazena as mensagens. A maneira mais difícil é obtê-las quando estão trafegando pela internet. Se as duas pessoas que se comunicam usam criptografia, a provedora de serviços não conseguirá arquivar as mensagens.

Um bom sistema popular para criptografar mensagens instantâneas é o chamado OTR (Off The Record). O Google tem um sistema também chamado "Off the Record", mas é diferente do OTR. Por isso, há quem chame um sistema de "OTR encryption" e o outro de "Gooble OTR". Ambos podem ser usados ao mesmo tempo.
A maneira mais fácil de usar criptografia OTR é com os programas Pidgin ou Adium X para mensagens instantâneas. Com o Pidgen, o usuário pode criptografar mensagens enviadas por redes MSN, Yahoo!, Google, Jabber e AIM. O Adam X é específico para o Mac OS X e faz praticamente a mesma coisa. Se você vai usar o Pidgin, tem de instalar o plugin de criptografia OTR. No Adium X, o OTR já vem embutido.
Projeto Tor
Esse software de criptografia é gratuito, eficaz e ajuda você a proteger seu anonimato na internet. É uma ferramenta fácil de usar, que criptografa as comunicações para protegê-las contra bisbilhoteiros, quando trafegam pela internet.

Com o Tor, as transmissões de informações são mais seguras porque saltam de um servidor para outro de uma rede distribuída, os chamados "roteadores cebola" (onion routers). Isso garante o anonimato porque o computador com o qual você está se comunicando nunca irá ver seu endereço de IP, só irá ver o endereço de IP do último roteador, pelo qual as comunicações passaram. Esse procedimento, impede que intermediários descubram a origem, o destino e o conteúdo da mensagem.
O Tor ajuda a defender as comunicações contra análises de tráfego, ao criptografá-las diversas vezes, ao roteá-las por um conjunto aleatoriamente selecionado de roteadores intermediários. A ideia é a mesma de uma pessoa seguida que despista o perseguidor, fazendo-se um caminho improvável e, de vez em quando, apagando os rastros.
Cada servidor-roteador no circuito sabe apenas que servidor lhe enviou os dados e para qual servidor deverá enviá-los a seguir. Nenhum servidor consegue registrar todo o percurso das comunicações ou o conjunto de chaves de criptografia empregadas. Se algum bisbilhoteiro conseguir entrar em um dos servidores, irá ver apenas uma mensagem criptografada e será difícil saber de onde veio e para onde vai.
No entanto, o Tor não é um salvador do mundo. Ele não pode defender o usuário, por exemplo, contra malwares. Se invasores conseguirem operar programas em seu computador, provavelmente podem ver onde você está e como você o está usando. Se você instalou o Tor em seu computador, mas está usando aplicativos que não sabem como usá-lo ou não foram configurados para usá-lo, você não terá proteção quando usar esses aplicativos.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.

Revista Consultor Jurídico, 18 de junho de 2013

quinta-feira, 13 de junho de 2013

SERVIDORA PÚBLICA NÃO SERÁ INDENIZADA POR FOTOS NO FACEBOOK

Com base na liberdade de expressão, o cidadão tem o direito de denunciar as falhas do serviço público. Com base neste argumento, o juiz Fabrício Simão da Cunha Araújo, do Juizado Especial de Unaí (MG) negou um pedido de indenização movido por uma servidora pública que se sentiu prejudicada por ter fotos suas divulgadas no Facebook. Cabe recurso da decisão.
A mulher foi fotografada enquanto conversava ao telefone, durante o horário de trabalho, e estava sentada, com as pernas levantadas e apoiadas em outra cadeira. As imagens foram feitas por um homem insatisfeito com a demora em ser atendido.
No pedido de indenização, a funcionária do Hospital Municipal de Unaí anexou as cópias das fotos e mostrou comentários que acompanharam uma entrevista dada em outro site pela pessoa que publicou as imagens. O responsável pela publicação relatou ter aguardado 20 minutos para ser atendido no hospital. A servidora argumentou que a divulgação das fotos na internet foi ilegítima e causou-lhe diversos danos.
O juiz entendeu que não há violação de direito de imagem, intimidade ou privacidade da servidora, já que as fotos foram tiradas em local público, na sede da repartição em que ela trabalha e no horário do expediente. 
Ao analisar o material publicado, o juiz destacou que o texto teve o intuito de transmitir informação e não de prejudicar a imagem da servidora pública. “Não há palavras ofensivas à pessoa da parte autora, mas, sim, palavras que demonstram indignação com o serviço público que se alega estar sendo prestado inadequadamente”, escreveu o juiz.
Segundo o juiz Fabrício Simão Araújo, em sua decisão, o cidadão pode e deve denunciar as impropriedades do serviço público. Para ele, negar este entendimento significa negar a primazia que a Constituição conferiu ao povo na construção do Estado Democrático de Direito e a eficácia das normas que garantem os direitos fundamentais.
O juiz registrou também que não basta afirmar que o poder emana do povo de forma retórica, “mantendo-o com caráter icônico e, consequentemente, abstrato e inofensivo. É necessário que o povo seja enxergado 'como instância global de legitimidade democrática', ou seja, conjunto de agentes a serem ouvidos de forma ampla em todos os discursos de produção, aplicação, modificação e extinção dos direitos”. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-MG.
Revista Consultor Jurídico, 13 de junho de 2013

TRIBUNAIS DE JUSTIÇA OFERECEM MAIS DE 320 VAGAS PARA JUIZ SUBSTITUTO

Tribunais de Justiça de três estados (Paraná, Rio de Janeiro e São Paulo) oferecem, juntos, 322 vagas para o cargo de juiz, com salários acima de R$ 20 mil. Todos exigem do candidato bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos.
Somente no TJ-SP são oferecidas 234 vagas de juiz substituto. O salário é de R$ 20,6 mil. As inscrições para este concurso vão até o dia 5 julho. A taxa é de R$ 200.
O segundo tribunal com mais vagas é o TJ-PR. O concurso irá preencher 60 vagas disponíveis para juiz substituto. As inscrições serão abertas no dia 1º de julho. A taxa é de R$ 150.
Já o TJ-RJ está com inscrições abertas, até o dia 28 de junho, para o preenchimento de 28 vagas de juiz. A remuneração divulgada é de R$ 21,7 mil. A taxa de inscrição para este concurso é de R$ 200 mil.

Agente técnico no MP-AM
O Ministério Público do Amazonas lançou novo concurso público com oferta de 50 vagas e formação de cadastro de reserva para cargos de níveis médio e superior. Para a área de Direito estão disponíveis 17 vagas para o cargo de Agente Técnico Jurídico. O salário é de R$ 6.377,14. Os interessados devem se inscrever entre os dias 20 de junho e 22 de julho pelo site da Fundação Carlos Chagas (FCC). A taxa é de R$ 132,70.


Concurso do MPU
Foi publicado no Diário Oficial da União da última sexta-feira (7/6) a Portaria 332 do Ministério Público da União, que traz o nome dos componentes da comissão responsável pelo VIII Concurso Público do MPU. Esta comissão deve delegar competências, assinar contratos, ajustes termos de cooperação, editais e celebrar convênios de caráter administrativo de interesse do MPU, que estejam relacionados ao andamento do certame. A comissão é composta pelo procurador da República Bruno Freire de Carvalho Calabrich, que atuará como presidente, e pelos servidores Sabrina de Araújo Maiolino e Bruno Gouveia de Lima.


Veja os concursos em andamento para área jurídica:
Nacional
Ministério Público do Trabalho (MPT)
Cargo: Procurador do Trabalho 
Vagas: 23
Remuneração: Não divulgada
Requisitos: Bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos
Inscrições: Até 19 de junho pelo site do MPT — Clique aqui para acessar 
Taxa de inscrição: R$ 200


Região Centro-Oeste
Ministério Público do Distrito Federal (MP-DF) 
Cargo: Promotor adjunto
Vagas: Nove
Remuneração: R$ 22.854,46
Requisitos: Bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos
Inscrições: Até 26 de junho pelo site do MP-DF — Clique aqui para acessar 
Taxa de inscrição: R$ 230

Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) 
Cargo: Analista administrativo – Direito
Vagas: Três
Remuneração: R$ 9.263,20
Requisitos: Bacharelado em Direito
Inscrições: Até 2 de julho pelo site do Cespe — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 95

Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) 
Cargo: Especialista em regulação – Direito
Vagas: 16
Remuneração: R$ 10.019,20
Requisitos: Bacharelado em Direito
Inscrições: Até 2 de julho pelo site do Cespe — Clique aqui para acessar 
Taxa de inscrição: R$ 100

Tribunal Regional do Trabalho de Goiás (18ª Região) 
Cargo: Oficial de Justiça avaliador federal
Vagas: Uma
Remuneração: R$ 8.140,08
Requisitos: Bacharel em Direito
Inscrições: De 18 de junho a 18 de julho pelo site da FCC — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 70

Tribunal Regional do Trabalho de Goiás (18ª Região) 
Cargo: Analista judiciário 
Vagas: Duas
Remuneração: R$ 7.566,42
Requisitos: Bacharel em Direito
Inscrições: De 18 de junho a 18 de julho pelo site da FCC — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 70 


Região Nordeste
Tribunal Regional do Trabalho do Piauí (22ª Região) 
Cargo: Juiz substituto 
Vagas: Uma
Remuneração: R$ 21.766,15
Requisitos: Bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos
Inscrições: Até 25 de junho pelo site do TRT-PI — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 200

Tribunal Regional do Trabalho do Pernambuco (6ª Região) 
Cargo: Juiz substituto
Vagas: Oito
Remuneração: R$ 22.854,46
Requisitos: Bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos
Inscrições: Até 18 de junho pelo site da FCC — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 200


Região Norte
Tribunal de Contas de Rondônia 
Cargo: Auditor de controle externo 
Vagas: Seis
Remuneração: R$ 4.397,01
Requisitos: Bacharelado em Direito
Inscrições: Até 24 de junho pelo site do Cespe — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 90

Ministério Público do Amazonas (MP-AM)
Cargo: Agente Técnico Jurídico 
Vagas: 17
Remuneração: R$ 6.377,14
Requisitos: Bacharelado em Direito
Inscrições: De 20 de junho a 22 de julho pelo site da FCC — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 132,70


Região Sudeste
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) 
Cargo: Juiz substituto
Vagas: 234
Remuneração: R$ 20.625,99
Requisitos: Bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos
Inscrições: Até 5 de julho pelo site da Vunesp — Clique aqui para acessar 
Taxa de inscrição: R$ 206

Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) 
Cargo: Advogado da Comarca da Capital
Vagas: Duas
Remuneração: R$ 11.703,63
Requisitos: Bacharelado em Direito e estar inscrito na OAB há pelo menos cinco anos consecutivos
Inscrições: Até  28 de junho pelo site da Vunesp — Clique aqui para acessar 
Taxa de inscrição: R$ 68

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) 
Cargo: Juiz substituto
Vagas: 28
Remuneração: R$ 21.711,74
Requisitos: Bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos, a partir da conclusão do bacharelado
Inscrições: Até 28 de junho pelo site da Vunesp — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 200


Região Sul
Tribunal de Justiça do Paraná 
Cargo: Juiz substituto 
Vagas: 60
Remuneração: Não divulgado
Requisitos: Bacharelado em Direito e exercício de atividades jurídicas por pelo menos três anos
Inscrições: De 1º a 30 de julho pelo site do TJ-PR — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 150

Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina (12ª Região) 
Cargo: Oficial de Justiça avaliador federal
Vagas: Sete
Remuneração: R$ 9.228,70
Requisitos: Bacharel em Direito
Inscrições: Até 13 de junho pelo site da FCC — Clique aqui para acessar
Taxa de inscrição: R$ 77,80

Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina (12ª Região) 
Cargo: Analista judiciário 
Vagas: 29
Remuneração: R$ 7.566,22
Requisitos: Bacharel em Direito
Inscrições: Até 13 de junho pelo site da FCC — Clique aqui para acessar 
Taxa de inscrição: R$ 77,80
Tadeu Rover é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 12 de junho de 2013

terça-feira, 11 de junho de 2013

BENS IMATERIAIS NÃO DÃO DIREITO A ARREPENDIMENTO

No dia 14 de maio, entrou em vigor o Decreto Federal 7.962/2013, que dispõe sobre a proteção do consumidor na contratação no comércio eletrônico, adaptando regras já existentes no Código de Defesa do Consumidor à realidade do comércio eletrônico.
Dentre inúmeras disposições, o Decreto traz exigências específicas sobre o direito de arrependimento, o qual já se encontrava previsto artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, e consiste no direito de o consumidor cancelar sua compra em um prazo de sete dias contados da contratação ou do recebimento do produto, sempre que esta ocorrer fora do estabelecimento comercial, a exemplo das operações pela internet. É uma regra criada em favor do consumidor, que muitas vezes está sujeito, em tais ocasiões, a aquisições às cegas, correndo o risco de ocorrer surpresas desagradáveis no momento da entrega.
Mas a pergunta que fica é: há exceções ao direito de arrependimento quando a compra é feita pela internet?
Vamos considerar a compra virtual convencional, na qual o consumidor adquire determinado produto em um site de um fornecedor, responsável pela posterior remessa do material adquirido. Nesse caso clássico, o direito de arrependimento nos parece de fácil e correta aplicação. A ideia central do direito de arrependimento é conceder ao consumidor a segurança jurídica de fazer compras fora do estabelecimento comercial, situação em que não se pode, naquele momento, analisar, provar, testar, tocar, e ver se é, de fato, aquele produto que o consumidor está buscando; fornecendo uma espécie de contrapartida em razão da ausência de importantes elementos para decidir a respeito da compra.
Mas existem situações especiais, nas quais a aplicação do direito de arrependimento torna a relação excessivamente benéfica ao consumidor, o que claramente não é o propósito do Código de Defesa do Consumidor ou qualquer outra norma consumerista. As normas de proteção ao consumidor buscam o equilíbrio da relação, e não favorecer o consumidor de forma excessiva e desigual. Como exemplos dessas situações desiguais podemos citar a desistência da compra de passagens aéreas pela internet, compra de músicas, filmes, seriados, programas de TV, jogos eletrônicos, dentre muitos outros. Em todas essas ocasiões o consumidor se encontraria na mesma posição se a aquisição acontecesse em um estabelecimento físico. Não existem elementos adicionais que possam influenciar na decisão de compra. Ele não pode provar, testar ou tocar a passagem aérea, por exemplo. O cliente não está em uma posição de desvantagem ao comprar tais bens no ambiente virtual em relação ao estabelecimento físico. Muito pelo contrário, eis que em todos esses casos, a web apresenta muito mais vantagens.
Ao comprar uma passagem área pela internet, por exemplo, o consumidor tem recursos à sua disposição que não existem no estabelecimento físico, como a opção de, ao mesmo tempo, acessar sites de diferentes companhias aéreas, diferentes agências de turismo, utilizar ferramentas de comparação de preços etc. Na grande maioria dos sites do ramo, há, inclusive, ferramentas que indicam os valores e a disponibilidade não só da data específica escolhida, mas também de datas próximas, dando uma flexibilidade de escolha considerando critérios econômicos, se este for o caso.
No exemplo acima não existe prejuízo algum ao consumidor em comprar pela internet. Assim, faz sentido garantir-lhe o direito de arrependimento? Existe alguma disparidade a ser equilibrada pelo direito de arrependimento? Penso que não.
O mesmo se aplica ao caso de bens imateriais, como filmes, jogos, músicas etc. Ao final de sete dias após comprar uma música ou um filme, pode-se dizer que o consumidor já viu o filme e ouviu a música inúmeras vezes. Os jogos eletrônicos também já terão sido jogados por muitas vezes. Se aplicarmos o direito de arrependimento ao pé da letra, mesmo após utilizar o bem exaustivamente, o bem poderá ser devolvido e o dinheiro, ressarcido. Dessa forma, o consumidor pode comprar um filme, assistir e pedir seu dinheiro de volta e assim sucessivamente.
Desse modo, nos casos dos bens imateriais referidos, me parece que o direito de arrependimento não deve também ser aplicado ao pé da letra, eis que o consumidor não se encontra em uma posição vulnerável ao comprar pela internet. Uma alternativa para o caso dos bens imateriais é disponibilizar pequenas amostras dos bens, como a possibilidade de ouvir alguns segundos da música, assistir ao trailer do filme, jogar algumas etapas do jogo, para que o consumidor tenha ainda mais elementos para a compra virtual e cada vez mais se afaste a discussão acerca da vulnerabilidade.
Conforme descrito acima, é preciso que se estabeleçam, caso a caso, exceções para o direito de arrependimento. O Poder Judiciário já vem dando indicativos de que reconhece situações nas quais o direito de arrependimento deve ser flexibilizado, considerando como critério fundamental nessa análise a vulnerabilidade do consumidor na compra virtual. Caso comprovada, aplica-se o direito de arrependimento como forma de equilibrar a relação. Caso essa vulnerabilidade não exista (como nos casos que citamos aqui), o direito de arrependimento não deve ser aplicado.
Alessandro da Cruz é advogado associado à área de meio ambiente e Direito do Consumo de Trench, Rossi e Watanabe Advogados.

Revista Consultor Jurídico, 9 de junho de 2013

DEVER CONSTITUCIONAL OBRIGA JUIZ A FUNDAMENTAR DECISÕES

No Mercador de Veneza, William Shakespeare alerta-nos que o demônio pode citar as Escrituras para seus fins. Nada mais correto. Não há nenhuma norma mais elevada ou ideia democrática que não possa ser usada com alguma técnica mais ou menos sofisticada pelo autoritarismo. Não deixa de ser irônico que o decisionismo judicial hoje imperante tenha por apoio normas que nada mais são do que reflexos necessários da garantia constitucional do contraditório.
Com base na garantia de fundamentação das decisões judiciais prevista no inciso IX do artigo 93 da Constituição da República, os tribunais tem repetido à exaustão a cantilena de que não é necessário que o juiz enfrente todas as teses e questões levantadas pelas partes, contanto que venha a decidir fundamentadamente. Daí, admite-se frequentemente que o juiz deixe de enfrentar todas as teses apresentadas pelas partes.
Semelhante fenômeno tem acontecido quanto à norma do artigo 131 do Código de Processo Civil, que determina que o juiz apreciará livremente a prova, atentando aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, a qual vem sendo aplicada como uma franquia a um discricionarismo judicial de impossível controle pela via recursal.
Em apoio a essa postura, os discursos judiciais costumam ser entremeados por citações de expressões latinas como narra mihi factum dabo tibi jus (narra-me os fatos que te darei o direito),como forma de libertar os juízes do dever de prestar contas sobre o que foi debatido no processo. Usando essa expressão, os julgadores entendem-se desobrigados de deliberar sobre os argumentos jurídicos apresentados pelas partes, pois a palavra por eles dita seria inevitavelmente o direito. A decisão judicial, nesse estado de coisas, não deriva propriamente da dinâmica do processo, nem da ação, nem da defesa, assemelhando-se, em verdade, a um dito divino ou mágico. O princípio é o verbo, puro e simples, e não o diálogo ou a deliberação.
Entretanto, a partir da percepção de que é o contraditório o princípio basilar e inarredável de todo o direito processual, nota-se que a norma do inciso IX do artigo 93 da CF, os dizeres do artigo 131 do CPC, e as expressões latinas citadas são, em verdade, fatores de constrição do discricionarismo judicial. Encerram deveres e limites à magistratura e direitos às partes e à sociedade em geral. O contraditório, muito mais do que uma franquia de simples participação formal no processo, é a possibilidade de influir na construção de uma decisão estatal, garantida com o dever de os órgãos de decisão deliberarem a respeito dos argumentos produzidos. É, enfim, fator de legitimação do exercício do poder estatal.
Com efeito, o dever de fundamentação das decisões judiciais (inciso IX do artigo 93 da CF) não permite que os julgadores fundamentem de qualquer modo, aleatoriamente, de forma desconectada da discussão engendrada pelas partes. Não basta que haja uma coerência abstratamente considerada entre a decisão e o fundamento produzido, como se a sentença fosse um texto independente. A fundamentação de que trata o comando do artigo 93, IX, da CF, é uma coerência entre o que se decide e todo o processo, com todas as suas vicissitudes, o que repugna a prática tão difundida de decisões estandardizadas, que pouco se referem à concretude da discussão travada nos autos.
A partir da percepção de que o ordenamento processual exige das partes, por seus advogados, a apresentação de arrazoados sobre questões de fato e também de direito tendentes a fundamentar seus pedidos aos órgãos judiciários, percebe-se que o dever de fundamentação das decisões judiciais é a contraparte do ônus de fundamentar suportado pelas partes. O contraditório, afinal, envolve, não só a oportunidade de falar, como também a de ser ouvido. A garantia do contraditório exige dos órgãos judiciários atenção e deliberação a respeito do que dizem as partes sobre os fatos e sobre o direito. Além de demonstrar que compulsou os autos, que leu os arrazoados das partes, por meio dos relatórios das decisões, devem os julgadores verter em palavras a deliberação que fazem sobre os fundamentos de fato e de direito que as partes apresentam.
Num quadro em que o princípio é o verbo da autoridade, não é de se estranhar que haja tantos recursos em que as partes questionam a total ausência de deliberação sobre suas teses. Ao decidirem esses recursos, costumam os tribunais enunciar, à exaustão, é certo, que “o juiz não está obrigado a deliberar sobre todas as teses apresentadas pelas partes, conquanto que decida de forma fundamentada nos termos do inciso IX do art. 93 da Constituição”, e citam-se aos borbotões julgados que repetiram essa cantilena enfadonha e antipática, mas uma ideia como essa frustra frontalmente o princípio do contraditório, a título de dar cumprimento à regra do artigo 93, IX, da Constituição.
Efetivamente, a partir de uma leitura bem literal e fragmentária da regra da fundamentação das decisões judiciais, ninguém diria que seria desfundamentada uma sentença que se limitasse a transcrever, a título de fundamentação, o que disse a parte autora como causa de pedir. Atender-se-ia à literalidade do inciso IX do artigo 93, mas se desatenderia o postulado maior do contraditório, sobretudo naqueles casos em que o réu vem a juízo, contesta, produz prova, alegações finais, etc. Fundamentar uma decisão unicamente com os fundamentos da parte autora, tratando o réu que se mostra cioso na defesa de seus interesses como se revel fosse, significa fraudar o princípio do contraditório e a verdadeira razão de existir do disposto no inciso IX do artigo constitucional 93.
Tristemente, também a regra do artigo 131 do CPC vem sendo aplicada tortuosamente em afronta ao contraditório. Quando se diz que o juiz apreciará livremente a prova presente dos autos, significa, antes, um alerta ao julgador para que não julgue com base em fatos e circunstâncias não constantes dos autos. A norma do artigo 131, antes de conferir liberdade de apreciação das provas ao magistrado, limita-lhe o conhecimento aos elementos que estão efetivamente presentes nos autos e que, por esta razão, foram ou puderam ser objeto de debate pelas partes.
Além disso, normas como a do artigo 131 que estipulam a livre apreciação da prova significam a necessidade de fechamento do sistema processual de influências externas. Apreciar livremente, significa, deliberar sem pressões externas. Trata-se de garantia aos indivíduos de que o judiciário irá apreciar suas postulações de forma independente, desinteressada, e dentro de parâmetros estreitos, previsíveis e controláveis: aquilo que consta documentado nos autos.
Conexa à norma do artigo 131 do CPC, apresenta-se a expressão latina narra mihi factum dabo tibi jus. Não se trata de um penhor de confiança adredemente conferido aos juízes no sentido de que será tido como o justo aquilo que porventura venha por eles decidido, o que, no limite, justifica a própria supressão do direito de recorrer. Bem diversamente, significa mais uma constrição ao decisionismo judicial, a partir da colocação de uma baliza para além da qual não pode ir o julgador: os fatos alegados pelas partes. Além de estar limitado pelos elementos de prova constantes dos autos, o magistrado encontra-se acicatado pelas alegações das partes. Não podem os juízes abandonarem a postura de inércia para deflagrarem, eles próprios, demandas judiciais. Por isso se diz que o processo depende da iniciativa das partes. Devem elas narrar o fatos como condição sem a qual os juízes não podem dizer o direito. Assim, nunca o direito será dito pelos juízes se o interessado a quem beneficiaria alguma decisão judicial não se anima de, pelo menos, narrar os fatos. Esse é o conteúdo limitador da arbitrariedade judicial da expressão latina.
É evidente que o juiz não está limitado pelos fundamentos de direito da ação nem da defesa, podendo dar a qualificação jurídica que reputar mais adequada à demanda deduzida. No entanto, isso não significa que o juiz não precise prestar conta às alegações jurídicas apresentadas pelas partes, demonstrando que o direito evocado por elas não é o mais adequado. Não se admite a discordância gratuita, desfundamentada, sobre os fundamentos jurídicos aduzidos pelas partes.
Sobretudo num modelo constitucional de contraditório influenciado pela posição proeminente da advocacia, erigida à condição de função essencial à justiça, não se podem aceitar por trás do narra mihi factum dabo tibi jus disposições judiciais autoritárias que reduzem o papel dos causídicos ao de mero narradores de histórias. Mais do que narrar os fatos, os advogados contribuem com a decisão judicial com propostas de enquadramento desses fatos nas normas jurídicas, as quais merecem ser objeto de deliberação pelos destinatários. Aliás, não é demais lembrar que é inepta a petição inicial que não traga os fundamentos jurídicos do pedido (CPC, arts. 283, III c/c 295, parágrafo único, I), a significar que, desde o nível infraconstitucional, atribui-se à advocacia um papel muito mais relevante do que o de mera instituição contadora de fatos para um futuro e mágico enquadramento jurídico a ser feito pela autoridade judicial.
A narrativa dos fatos pelos postulantes é condição necessária para o exercício da jurisdição. É uma condição necessária, porém não suficiente. Jamais será o direito aquilo que vier a ser dito pelo juiz se não houver deliberação sobre os argumentos apresentados pelas partes, por seus advogados.
Bem vistas as coisas, embora as normas dos artsigos 93, IX, da CF e do artigo 131 do CPC estejam sendo evocadas para destruir o contraditório, chega-se até a pensar, num gesto mais radical, em revoga-las. Porém, sem tais normas, a compreensão do contraditório ficaria na absoluta dependência de uma doutrina pujante que conquistasse os corações e as mentes dos estudantes e professores de Direito, e a crítica ao autoritarismo perderia alguns de seus mais importantes esteios. Os demônios não precisariam de malabarismos argumentativos para dominar tudo. É, enfim, preciso não perder de vista que as Escrituras não deixam de ser santas se o demônio as usa para seus fins.
Pablo Bezerra Luciano é procurador do Banco Central e presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Banco Central do Brasil.

Revista Consultor Jurídico, 11 de junho de 2013

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...