sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Atendente de farmácia que aplicava medicamento injetável receberá adicional de insalubridade




O fato de as farmácias não se incluírem na lei como local de ambiente insalubre torna-se irrelevante quando a loja se propõe a prestar aos clientes o serviço de aplicação de medicamentos injetáveis. Nesse caso, se a empresa passa a explorar o atendimento e assistência à saúde, enquadra-se como estabelecimento destinado aos cuidados da saúde humana, previsto no Anexo 14 da NR-15.
Com esse entendimento, a 1ª Turma do TRT de Minas, acompanhando voto do desembargador Emerson José Alves Lage, reformou decisão de 1º grau e deu provimento ao recurso apresentado por um atendente de farmácia para reconhecer o seu direito ao adicional de insalubridade. No caso, além de vender medicamentos na farmácia, o trabalhador também aplicava medicamentos injetáveis em clientes da empresa, de maneira habitual e intermitente.
Desse modo, de acordo com a prova técnica, o trabalhador se expunha ao contato com clientes ou pessoas potencialmente portadoras de microorganismos e parasitas infecciosos que compareciam à farmácia para receber a aplicação de medicamentos injetáveis. Essa condição, conforme laudo pericial, é classificada na lei como sendo insalubre e de grau médio, tendo em vista a presença dos agentes biológicos normatizados (Anexo 14 da NR 15).
Como explicou o relator, se o vendedor da farmácia, entre outras atribuições, se dedica a aplicar medicamentos injetáveis aos clientes, doentes ou não, é inegável que sofre risco de contaminação, pela via cutânea, até pelo simples contato com o paciente, ou sanguínea, decorrente de uma perfuração causada por objetos utilizados na execução da tarefa. E, como explicou o julgador, a avaliação da insalubridade é quantitativa, tornando irrelevante a quantidade de vezes em que o trabalhador aplicava injeções nos clientes da farmácia. Assim, a farmácia assumiu as características de local destinado aos cuidados com a saúde humana e, conforme evidenciado pela prova, o contato do trabalhador não foi meramente provável, mas sim permanente.
Por essas razões, o julgador deu provimento para acrescer à condenação o adicional de insalubridade em grau médio, de 20% sobre o salário mínimo, por todo o período contratual, sendo devidos os reflexos em RSR, aviso prévio, férias com 1/3, 13º salário e FGTS com multa de 40%.

PJe: Processo nº 0010350-16.2015.5.03.0098. Acórdão em: 03/10/2016
Para acessar a decisão, digite o número do processo em:


Fonte: TRT3

terça-feira, 6 de dezembro de 2016

NJ Especial: TJP nº 13 do TRT-MG considera devidas horas extras por tempo de espera para início de jornada se condução é fornecida por empregador

 



Em Sessão Ordinária realizada no dia 08 de setembro de 2016, o Tribunal Pleno do TRT de Minas, com base no artigo 896, parágrafo 4º, da CLT, e 3º da Resolução GP 9/2015 do Tribunal, conheceu de Incidente de Uniformização de Jurisprudência (IUJ), determinando, por maioria simples de votos, a edição da Tese Jurídica Prevalecente nº 13, que ficou com a seguinte redação:
"TEMPO DE ESPERA. TRANSPORTE FORNECIDO PELO EMPREGADOR. INCIDENTE UNIF. JURISPRUDENCIA IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE OUTRO MEIO DE CONDUÇÃO. TEMPO À DISPOSIÇÃO. HORAS EXTRAORDINÁRIAS DEVIDAS. Constitui tempo à disposição o período em que o empregado, após desembarcar da condução concedida pelo empregador, aguarda o início da jornada e/ou o de espera pelo embarque, ao final do trabalho, desde que não seja possível a utilização de outro meio de transporte compatível com o horário de trabalho. Nessa hipótese, é devido o pagamento das respectivas horas extraordinárias, observados os limites impostos pelo § 1º do art. 58 da CLT e pela súmula n. 366 do TST.". Histórico do IUJO Ministro Relator da 6ª Turma do TST, Aloysio Corrêa da Veiga, ao examinar o recurso de revista interposto em face de acórdão do TRT mineiro (RO 1116-25.2014.5.03.0072), publicado após a vigência da Lei n. 13.015, de 21 de julho de 2014, constatou a existência de decisões divergentes no âmbito do TRT-MG e, com base nos §§ 3º, 4º e 5º do art. 896 da CLT, determinou ao Tribunal mineiro a uniformização da jurisprudência sobre o tema: "Horas extraordinárias. Tempo à disposição. Tempo de espera pelo transporte fornecido pelo empregador".
Na sequência, o 1º Vice-Presidente Judicial, Ricardo Antônio Mohallem, determinou a suspensão do andamento dos processos com idêntica discussão até o julgamento do incidente.
Após a distribuição ao desembargador Sércio da Silva Peçanha, para que atuasse como relator do incidente de uniformização de jurisprudência (IUJ), os autos foram remetidos à Comissão de Uniformização de Jurisprudência para emissão de parecer. O Ministério Público do Trabalho também emitiu o parecer, opinando pela uniformização Jurisprudência, com a adoção do verbete sugerido pela Comissão de Jurisprudência, em relação a 3ª corrente.
A empresa FCA FIAT CHRYSLER AUTOMÓVEIS BRASIL LTDA, ao argumento de que detém situação fática análoga ao tema discutido, requereu sua participação no processo como "amicus curiae" ("Amigo da Corte"), o que foi indeferido pelo relator.
O objeto do IUJ - CorrentesAo analisar a questão posta para a Unificação de Jurisprudência, a Comissão de Jurisprudência do TRT-MG concluiu que o cerne da controvérsia estava em definir se constitui (ou não) tempo à disposição do empregador: (I) o período em que o empregado aguarda nas dependências da empresa o início da jornada de trabalho, logo após chegar ao local de trabalho em transporte fornecido pelo empregador, e, também, (II) o período em que o trabalhador, ao final da jornada diária, espera a condução disponibilizada pela empresa para retornar à residência.
Após minucioso trabalho de pesquisa, a Comissão de Jurisprudência elaborou quadro com as correntes existentes no Tribunal mineiro sobre o tema, que podem ser resumidas:
1ª Corrente: O período transcorrido entre a chegada antecipada da condução fornecida pelo empregador e o início da jornada de trabalho ou o da espera pelo transporte, ao término do expediente, constituem tempo à disposição da empresa, nos termos do caput do art. 4º da CLT.
2ª Corrente: O período transcorrido entre a chegada antecipada da condução fornecida pelo empregador e o início da jornada de trabalho ou o da espera pelo transporte, ao término do expediente, não constituem tempo à disposição, nos termos do caput do art. 4º da CLT.
3ª Corrente: O tempo de espera no local de embarque ou desembarque do transporte fornecido pelo empregador somente pode ser considerado como à disposição (art. 4º da CLT) nas hipóteses em que o trabalhador não possa se utilizar de outro meio de transporte, tal como ocorre em relação às horas itinerantes.
4ª Corrente: Entende-se como tempo à disposição do empregador (art. 4º da CLT) apenas o período antecedente à jornada, no qual o empregado já se encontra nas dependências da empresa, em razão da chegada antecipada da condução fornecida por esta.
A Comissão sugeriu, então, diferentes redações para verbetes, contemplando os entendimentos expressados nas quatro correntes.
Entendimento do relatorPara o relator, a redação que mais estaria de acordo com a jurisprudência majoritária no TRT-MG, poderia ser construída por meio da junção de mais de uma das redações de verbete sugeridas pela Comissão. E, em sua análise, ele dividiu a situação em dois períodos:
a) O período em que o empregado aguarda nas dependências da empresa o início da jornada laboral, logo após chegar ao local de trabalho em transporte fornecido pelo empregador. Segundo o relator, em decorrência da aplicação da Súmula nº 366 do TST, é possível concluir que o tempo entre a chegada do empregado ao estabelecimento do empregador, por qualquer meio, e o início da jornada, é tido como tempo à disposição do empregador e, como tal, deve ser remunerado como extra. Ele ressaltou que, inclusive, há uma confluência entre a primeira, terceira e quarta correntes nesse sentido, sendo esta também a posição dominante no TST e também no TRT-MG, conforme todo o levantamento feito pela Comissão de Jurisprudência. E isso, esclareceu, independentemente, se o empregado tem ou não a possibilidade de se deslocar por outro meio.
Nessas situações de chegada antecipada -, o fato gerador do direito ao recebimento, como extra, do tempo em que o empregado aguarda o início da jornada é, unicamente, a utilização do transporte fornecido pelo empregador, explicou o relator. Ou seja, não importa se o empregado possui outra opção para o deslocamento (transporte público), o que importa é que ele faz uso do transporte fornecido pelo empregador.
Nesse quadro, na visão do desembargador, pelo menos no que se refere ao tempo de espera que antecede a jornada de trabalho do empregado, deveria ser firmada a jurisprudência no seguinte sentido: "O tempo despendido pelo empregado, após o desembarque em transporte fornecido pelo empregador, antes do início da jornada, constitui tempo a disposição e deve ser remunerado como horas extras, na forma do entendimento contido na Súmula 366 do TST e observado o disposto no art. 58, § 1º, da CLT".
b) Período em que o trabalhador, ao final da jornada diária, espera a condução disponibilizada pela empresa para retornar à residência. Conforme ponderou o desembargador relator, é comum que, ao término da jornada de trabalho, o empregado tenha que esperar pelo transporte fornecido pelo empregador. Mas, nesse caso, o direito do empregado de receber tal período de espera como extra, por ser tempo à disposição do empregado, gera mais polêmica. Isso porque o cidadão comum ao se deslocar nos diversos municípios também estão sujeitos a longos períodos de espera pelo transporte público. E, ao examinar a jurisprudência apresentada sobre o assunto, o julgador observou que a comparação ao empregado comum que necessita do transporte público para se deslocar é o principal fundamento utilizado pelas correntes que não consideram este período como tempo à disposição do empregador. "Realmente, não há como desprezar esta questão na análise da matéria, sob pena de onerar o empregador em situações que não destoam daquela vivida pela maioria dos empregados em seus deslocamentos", destacou o relator.
Para ele, no entanto, é preciso diferenciar a situação em que o empregado dispõe de outro meio de locomoção, podendo fazer uso do transporte público regular, compatível com o término da jornada de trabalho, daquela vivida por muitos empregados que são obrigados a utilizar o meio de transporte fornecido pelo empregador, por não terem a opção do transporte público, ou de sua compatibilidade com a jornada de trabalho. Em situações como estas, frisou o relator, o empregado fica a mercê do empregador, aguardando o momento de saída do transporte fornecido, sem qualquer outra opção. E, diante da impossibilidade do empregado optar pela utilização de transporte público regular (situação assemelhada definida na Súmula nº 90 do TST ao tratar das horas in itinere), o empregador, nesse caso, deve remunerar o tempo de espera como extraordinário, desde que ultrapassado o limite previsto no art. 58, § 1º, da CLT. Assim entendeu o relator, registrando que este também é o entendimento que prevalece no TST e no âmbito do TRT-MG, conforme notou dos julgados transcritos no acórdão.
Destacando a necessidade de compatibilizar as correntes existentes, com a edição de verbete que retrate o posicionamento majoritário do TRT mineiro sobre o tema, o relator decidiu acolher, em parte, o parecer da Comissão de Jurisprudência, com base no art. 896, §§3º e 4º da CLT, e propôs a edição de Súmula de Jurisprudência Uniforme com a seguinte redação:
"HORAS EXTRAORDINÁRIAS. TEMPO À DISPOSIÇÃO. TEMPO DE ESPERA. TRANSPORTE FORNECIDO PELO EMPREGADOR. I - O tempo de espera para o labor, antes do início da jornada e após o desembarque em transporte fornecido pelo empregador, constitui tempo à disposição do empregador e deve ser remunerado como horas extras, na forma do entendimento contido na Súmula nº 366 do TST e observado o disposto no art. 58 da CLT. II - O tempo de espera, após a jornada de trabalho, para o embarque em transporte fornecido pelo empregador, não é considerado como tempo à disposição do empregador, salvo a hipótese do empregado não poder se utilizar de transporte público regular e em horário compatível com o término da jornada, para deslocar-se do trabalho para casa, quando então referido tempo deverá ser remunerado como horas extras, observado o disposto no art. 58, § 1º, da CLT".
Entendimento do Tribunal PlenoNo entanto, o Pleno do TRT-MG, por maioria simples de votos, acolhendo os fundamentos expostos no parecer da Comissão de Jurisprudência, adotou o entendimento contido na terceira corrente jurisprudencial apontada pela Comissão de Jurisprudência e decidiu unificar a jurisprudência, com edição de verbete, com a seguinte redação:
"TEMPO DE ESPERA. TRANSPORTE FORNECIDO PELO EMPREGADOR. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE OUTRO MEIO DE CONDUÇÃO. TEMPO À DISPOSIÇÃO. HORAS EXTRAORDINÁRIAS DEVIDAS. Constitui tempo à disposição o período em que o empregado, após desembarcar da condução concedida pelo empregador, aguarda o início da jornada e/ou o de espera pelo embarque ao final do trabalho, desde que não seja possível a utilização de outro meio de transporte compatível com a jornada de trabalho. Nessa hipótese, é devido o pagamento das respectivas horas extraordinárias, observados os limites impostos pelo § 1º do art. 58 da CLT e pela Súmula n. 366 do TST".
Assim, tendo em vista a regra de que quando a decisão for tomada pela maioria absoluta dos membros do Tribunal Pleno, o verbete transforma-se em súmula do Tribunal Regional da 3ª Região e quando a decisão for tomada pela maioria simples, o verbete torna-se tese jurídica prevalecente, no caso, determinou-se a edição de tese jurídica prevalecente de nº 13, com redação acima.
IUJ-1116-25.2014.5.03.0072
Confira Notícias Jurídicas anteriores sobre o tema:
13/05/2013 06:03h - Turma concede horas extras a empregado que ficava esperando transporte da empresa para retorno do trabalho

27/11/2015 06:00h - Espera de ônibus da empresa no fim de expediente não caracteriza tempo à disposição do empregador

03/05/2011 06:01h - Tempo de espera de transporte da empresa ou de início de jornada deve ser remunerado como extra


Clique aqui e confira o acórdão que deu origem ao IUJ

Clique aqui e confira o acórdão que firmou a TJP nº 13

Clique aqui e confira a relação de todos os INCIDENTES DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA suscitados

Clique aqui para ler a jurisprudência do TRT-MG e do TST sobre o tema da TJP nº 13

Ação trabalhista pode ser ajuizada no foro próximo à residência do trabalhador se essa for a única possibilidade de acesso ao Judiciário


Embora não haja previsão expressa, não há impedimento para o ajuizamento da ação trabalhista no local de residência do trabalhador, principalmente quando se constata que essa é a única possibilidade de acesso concreto ao Judiciário.
Com esse entendimento, a 5ª Turma do TRT de Minas deu provimento ao recurso apresentado pela representante legal do espólio do trabalhador para reconhecer que o juízo do local da residência deste tem competência para julgar a ação trabalhista. Acompanhando o voto do juiz convocado Danilo Siqueira de Castro Faria, os julgadores modificaram a decisão de 1º grau que havia acolhido a alegação de incompetência em razão do lugar feita pela empresa e determinado a remessa dos autos à Vara de Lucas do Rio Verde/MT.
"A interpretação de um texto legal não pode ensejar, ainda que indiretamente, a violação de um dos direitos fundamentais assegurados constitucionalmente. Dessa forma, as regras de competência territorial não podem ser interpretadas de forma isolada, mas, devem ser interpretadas à luz do princípio constitucional que garante o livre e pleno acesso à justiça. Nessa seara, não é razoável impor ao empregado, no caso, a representante legal do espólio, parte hipossuficiente da relação laboral, o ônus de suportar as inúmeras e notórias despesas decorrentes da interposição de uma ação judicial em outra localidade (Lucas do Rio Verde-MT) que não aquela do seu domicílio (Lavras/MG)", registrou o relator.
Ponderou o magistrado que, no caso, acolher a alegação de incompetência importaria negar ao trabalhador a garantia constitucional de acesso ao Judiciário. Ele acrescentou que, contrariamente ao trabalhador, a empresa tem possibilidade de arcar com as despesas decorrentes de uma ação ajuizada em localidade distante da sua filial.
"Dessa forma, observada a interpretação sistemática do conjunto de leis vigentes em nosso ordenamento jurídico, é possível inferir que o real objetivo do legislador, ao redigir a norma disposta no artigo 651 da CLT, era facilitar o acesso à Justiça, facultando ao empregado ajuizar a ação no foro da celebração do contrato ou no da prestação do serviço, sobretudo, porque, quando do advento da CLT, a esmagadora maioria dos trabalhadores prestava serviço na mesma localidade em que residia", frisou o julgador, concluindo que o legislador celetista facultou a competência para o julgamento da lide ao juiz da localidade onde o empregado prestou serviços, objetivando a proteção do trabalhador e impedindo o ajuizamento de lides trabalhistas em local distante do domicílio do hipossuficiente.
Por essas razões, deu provimento ao recurso para declarar a competência da Vara do Trabalho de Lavras/MG para conhecer e julgar a ação, determinando o retorno dos autos à origem para regular processamento do feito.

PJe: Processo nº 0011073-03.2016.5.03.0065. Acórdão em: 25/10/2016Para acessar a decisão, digite o número do processo em: https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ConsultaProcessual.seam
        

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

PEC 241 tenta apenas executar a estrutura jurídica prevista na LRF





Por Vera Lúcia Chemim


A atual polêmica em torno da futura aprovação ou não da PEC 241, que pretende limitar o teto dos gastos públicos, envolve diferentes aspectos que valem a pena ser expostos e minimamente analisados no contexto do presente artigo.

Tais aspectos dizem respeito, em primeiro lugar, ao caráter macroeconômico do tema, mais precisamente às questões sensíveis inseridas nos objetivos de política econômica governamental: a promoção do crescimento econômico e da distribuição de renda, pari passu com a preocupação de estabilizar, isto é, equilibrar os fundamentos da economia, quais sejam: o combate à inflação e ao desemprego, sem prejudicar sobremaneira as relações comerciais do país com o resto do mundo, assim como a adoção de estratégias fiscais e monetárias adequadas à atual conjuntura econômica brasileira.

Em segundo lugar, e não menos importante, há que se remeter à natureza jurídico-política da PEC, quanto à sua legalidade constitucional e ao seu significado político institucional no longo prazo.

Essas questões levam inevitavelmente ao debate sobre a independência e harmonia entre os poderes públicos, à problemática da obrigatoriedade de se atender à Lei Orçamentária Anual, que, por sua vez, conduz imediatamente ao contexto da Lei de Responsabilidade Fiscal e ao infinito trade-off entre a satisfação dos direitos sociais constitucionais e ao objetivo de equilíbrio fiscal e financeiro da União e, por consequência, dos estados-membros, do Distrito Federal e dos municípios, visto que vivemos em uma república federativa.

Trata-se de um tema complexo, razão pela qual o debate no presente artigo pretende apenas provocar a reflexão acadêmica.

A limitação dos gastos públicos por meio de uma emenda constitucional visa restabelecer o frágil equilíbrio do orçamento público (LOA), tendo em vista a significativa presença de um déficit fiscal, ou seja: G – T: a receita corrente é menor do que a despesa corrente, daí aquela expressão algébrica, em que G representa os gastos públicos, e T, a receita pública, isto é, a arrecadação em forma de tributos, os quais representam a sua quase totalidade (cerca de 90% da receita corrente do Estado).

Constatado o déficit público referente aos exercícios anteriores recentes, bem como aos futuros, é necessário estabelecer metas para neutralizá-lo, especialmente no curto prazo, com o fim de viabilizar a operacionalização de políticas públicas por meio de investimentos diretos da União, dando ênfase às políticas de caráter afirmativo, como a execução de gastos voltados para a educação, saúde, segurança e transportes coletivos.

Para tal, os recursos do Estado precisam ser devidamente saneados.

Do ponto de vista da política monetária, há algumas opções de financiamento desse déficit, tais como a própria emissão de moeda ou a venda de títulos da dívida pública, além da manipulação da taxa Selic (Serviço de Liquidação e Custódia de Títulos da Dívida Pública) — a taxa de juros que serve de referência ao mercado monetário e financeiro.

É, contudo, de notório saber que a primeira alternativa é inviável num contexto inflacionário, até porque, historicamente, o país já tem uma dolorosa experiência nesse sentido, principalmente a dos anos 1980, em que se viveu uma inflação inercial que conseguiu abater todas as teorias econômicas neoliberais, desafiando os economistas do mundo inteiro, quando se constatou ao mesmo tempo, o desemprego dos fatores de produção, levando à chamada “estagflação”: estagnação do PIB num cenário de inflação galopante, em que todas as políticas convencionais adotadas fracassaram sucessivamente, cujos exemplos podem ser aqui lembrados: Plano Verão, Bresser, Cruzado I e II, Collor I e II... até chegar finalmente ao Plano Real, o qual adotou estratégias inéditas de início (o equilíbrio dos preços relativos da economia), para posteriormente repetir as antigas políticas monetárias, fiscais e cambiais clássicas para efetivar o seu sucesso de forma definitiva sobre aquela inflação.

Quanto à segunda alternativa, embora se caracterize como um tradicional instrumento de política monetária, é preciso ter prudência na atual conjuntura econômica, para não agravar ainda mais a situação das contas públicas, por meio de um excesso de pagamento de juros e serviço da dívida pública, decorrente da venda de tais títulos, os quais só fazem aumentar ainda mais a dívida pública total do Estado[1] (interna e externa).

Por último, resta a administração da Selic, pelo Banco Central, como uma forma relativamente eficiente no combate à inflação de natureza clássica, isto é, de demanda, embora se tenha restrições quanto a essa questão no atual contexto, visto que o mercado está constatando o mesmo fenômeno dos anos 1980: uma estagflação com natureza e razões diferentes daquela.

No atual momento brasileiro, o que está em evidência é uma crise obviamente fiscal (como a dos anos 1980), cuja origem decorre de uma grave crise político-institucional, com reflexos diretos sobre o comportamento da sociedade civil.

Nesse sentido, a falta de confiança dos agentes econômicos nos poderes públicos, especialmente no Poder Executivo e no Legislativo como um todo, levou a uma diminuição da oferta, a qual provocou proporcionalmente um aumento de preços que prejudicou a demanda, desembocando inevitavelmente na inflação com desemprego.

Portanto, nos anos 1980, a origem da crise fiscal era exclusivamente econômica, proveniente dos empréstimos externos pari passu com a crise do petróleo de 1973 e 1979, que provocou o aumento internacional de preços e de juros, levando à grave crise brasileira, a despeito da existência de dois fatores causais de natureza endógena, conforme Roberto Campos observara de forma perfeitamente correta: a péssima administração e o superado modelo de substituição de importações.

Hoje, a crise política institucional provocou a crise econômica.

Quanto à política fiscal propriamente dita, há dois possíveis caminhos: o aumento da receita pública por meio do aumento das alíquotas dos tributos ou até mesmo a criação de um tributo[2], como a CPMF, além de empréstimos compulsórios que fazem parte da nossa história passada e presente.

Levando-se em consideração a alta e crônica porcentagem da tributação em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) do país, a qual varia entre 32 e 36%, já tendo chegado a 38%, onerando significativamente os agentes econômicos (empresas e consumidores) e se caracterizando, portanto, como um dos fatores inibidores do crescimento econômico e da própria distribuição de renda, tal alternativa precisa e deve ser a ultima ratio para o governo federal.

Resta assim a estratégia igualmente dolorosa, principalmente para os investimentos privados, se nos lembrarmos de John Maynardes Keynes, de limitação dos gastos públicos, objeto de debate polêmico no Congresso Nacional e nos bastidores do Poder Judiciário.

No entanto, o remédio tem que ser aplicado proporcionalmente à gravidade da doença do paciente. De menos, o paciente continua doente, aumentando os seus riscos; demais, o remédio mata o doente, conforme bem observado no passado por Luís Carlos Bresser Pereira.

Quando se fala em limitar gastos públicos, é preciso focar nos gastos de consumo da máquina estatal, isto é, nos gastos relacionados à manutenção do funcionamento dos três Poderes, tanto na instância federal, quanto nas instâncias estaduais e municipais, o que leva imediatamente aos gastos referentes às despesas correntes de consumo, como por exemplo diárias de viagem, material de expediente, de limpeza, pagamento de prestação de serviços de terceiros, compras públicas em geral, excluindo o pagamento de juros e de serviços da dívida pública, pois a PEC foca as despesas primárias.

Se partirmos do pressuposto de que os investimentos públicos devem ser preservados, até por uma razão óbvia de que eles constituem o fundamento da intervenção do Estado na economia, os gastos de consumo devem inevitavelmente ser afetados de alguma forma, para se obter uma significativa racionalidade na sua gestão.

O que não se pode conceber é a redução de gastos correntes (de consumo) voltados especialmente às políticas sociais, tais como as transferências de renda para pessoas físicas que necessitam de suporte governamental, como as bolsas de estudo, Bolsa Família, assistência à saúde e à educação etc.

Os percentuais referentes às transferências da União para os estados e municípios, no que diz respeito à educação e saúde, estão previstos na Constituição Federal de 1988, não podendo, pois, serem desatendidos pelo governo federal.

Os investimentos dessa natureza devem ser priorizados, tanto pela União como pelos estados e municípios, pois constituem uma das principais formas de distribuição racional de renda: o acesso à saúde e à educação, para que se tenha um retorno a médio e longo prazo desses investimentos, inicialmente para as pessoas beneficiadas de forma individual e, por consequência, para o país, uma vez que um povo sadio e educado é garantia de uma mão de obra qualificada para que se obtenha o seu crescimento econômico pari passu com uma sociedade desenvolvida sob o ponto de vista social e político.

No curto prazo, os investimentos privados ainda sofrerão com a política fiscal restritiva. Porém, não mais do que já estavam prejudicados com as ações governamentais anteriores, uma vez que a confiança dos agentes econômicos (internos e externos) tem aumentado paulatinamente, criando um novo clima de otimismo que será determinante para a retomada do crescimento econômico e para o emprego dos fatores de produção.

Finalmente, no que se refere ao objetivo imediato de estabilidade econômica, mais especificamente o combate à inflação e ao desemprego, há que se estabelecer prioridades no atendimento das políticas públicas assumindo de forma quase que permanente o eterno conflito (trade off) entre os diversos interesses.

Nessa direção, cabe ao Poder Legislativo a tarefa de filtrar tais interesses e escolher os mais relevantes no contexto da presente crise, para que o Poder Executivo tenha condições de executá-los.

Portanto, a PEC 241 se caracteriza atualmente como um instrumento capaz de sanear as contas públicas no curto e médio prazo, possibilitando a retomada da economia brasileira para o caminho correto, para que se possa criar condições de aumentar o PIB e, por conseguinte, o emprego e a renda no longo prazo.

Por outro lado, a PEC 241 representa apenas o ponto de partida para a estabilidade econômica. Os objetivos de longo prazo, como o crescimento econômico e a distribuição de renda, só serão otimizados com o incremento de várias reformas, como a da Previdência e a política, além de outras que vêm sendo tentadas desde os anos 1960, sem sucesso, pois falta o principal ingrediente: o apoio político dos poderes Legislativo e Executivo, bem como o da participação efetiva da sociedade brasileira.

A segunda questão proposta por esse artigo é a natureza jurídico-política da PEC, isto é, as implicações legais e constitucionais que a acompanham e o seu papel político-institucional no longo prazo.

Do ponto de vista jurídico, a PEC, enquanto meio processual constitucional para se modificar um ou mais dispositivos constitucionais, é perfeitamente legal, atendendo às exigências elencadas no artigo 60 da Constituição Federal de 1988 para ser aprovada no Congresso Nacional.

Quanto ao mérito, a PEC estabelece padrões rígidos para o teto dos gastos públicos para os próximos anos, remetendo inevitavelmente para a disciplina já exaustivamente difundida pela criação da Lei de Responsabilidade Fiscal no governo FHC, com o mesmo fim, agora ratificado pela atual crise fiscal e pelo clamor do governo Temer para a importância da conscientização de se apoiar essa proposta.

É preciso destacar que a atual preocupação com o limite de gastos públicos não é uma inovação técnica do governo Temer, e sim uma tentativa de fazer valer a teoria contida na Lei de Responsabilidade Fiscal, que não foi respeitada em anos recentes.

Isso equivale a afirmar, por meio de Heraldo da Costa Reis e José Teixeira Machado Jr., em seu livro A Lei 4.320 comentada e a Lei de Responsabilidade Fiscal, que a LRF[3], além de já ter regulado os próprios artigos da Lei 4.320, inovou quanto à ótica técnico-contábil e política, ao reforçar juridicamente a exigência de prestação de contas entre os entes federativos e seus respectivos órgãos (federalismo fiscal), bem como evidenciar de forma clara e precisa os gastos em consonância com a receita pública de forma ampla, ou seja, abrangendo a administração pública direta e indireta (Princípio da Transparência e da Universalidade).

Princípios orçamentários tradicionais, tais como o da unidade e o da universalidade, são objeto de estudo das finanças públicas, embora nunca tenham sido levados a sério na prática da administração pública brasileira.

Da mesma forma, os dispositivos constitucionais constantes no artigo 165 da Carta Magna de 1988 parecem ter sido, até agora, relegados a segundo plano, especialmente do ponto de vista daqueles princípios, com o agravante de que os parágrafos 4º e 5º do referido artigo os traduzem.

A Lei de Responsabilidade Fiscal os contempla em vários de seus artigos, tais como o 1º, 2º e 3, que tratam das “Disposições Preliminares”, assim como o artigo 4º inserido no Capítulo II “Do Planejamento”, seção II “Da Lei de Diretrizes Orçamentárias”, além do artigo 9º, da seção IV “Da Execução Orçamentária e do Cumprimento das Metas”, com ênfase no parágrafo 3º e os artigos 15 e 16, do Capítulo IV “Da Despesa Pública”, seção I “Da Geração de Despesa”.

Todos eles dispõem as questões sensíveis discutidas atualmente em função da possível aprovação da PEC: a obrigatoriedade e conveniência da vinculação das Leis Orçamentárias Anuais (LOA’s) com os Planos Plurianuais (PP) e a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), e em consonância com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), no atendimento ao Princípio do Federalismo Fiscal, o qual diz respeito à interligação entre os Poderes e à intraligação em cada um deles, visando a compatibilidade entre receita e despesa pública, bem como o atingimento de metas fiscais, incluindo os riscos que lhe são inerentes, de modo a abranger toda a administração pública.

Em suma, a PEC 241 nada mais faz do que tentar executar a estrutura jurídica prevista na LRF, não ultrapassando os limites impostos pela Constituição Federal de 1988, especialmente as cláusulas pétreas, como o respeito ao princípio federativo e da separação de Poderes, contemplados no parágrafo 4º, incisos I e III, do artigo 60.

Ademais, é oportuna e relevante a observação de que os artigos a serem incorporados à ADCT constantes na PEC traduzem ipsis litteris os dispositivos constitucionais da Carta Magna.

Pode-se assinalar um fato novo que representa a principal medida a ser operacionalizada pela PEC: os gastos dos três Poderes estarão atrelados nos próximos 20 anos ao índice de inflação, caracterizando um mero reajuste (nominal), tendo-se estabelecido determinadas situações e alguns limites em percentuais para a justificação de um provável aumento real, embora criem também regras-sanções para os Poderes nas três instâncias que os ultrapassarem em cada exercício.

Isso remete novamente ao que poderá acontecer no curto prazo e especialmente no médio e longo prazo, no que diz respeito ao maior ou menor alcance das iniciativas de cada Poder quanto aos seus objetivos institucionais.

O que se questiona no interior de cada um daqueles Poderes é até que ponto as limitações financeiras impostas pelo governo federal, ou seja, pelo Poder Executivo, poderão caracterizar uma intervenção imperativa no âmbito dos demais Poderes.

O principal argumento direciona à ameaça, inicialmente potencial, de desequilíbrio das relações entre os poderes públicos, podendo ao longo do tempo estimado pela PEC ser efetiva, prejudicando a independência daqueles Poderes e desembocando num ativismo do Executivo.

No entanto, a restrição orçamentária é comum aos três Poderes, o que induz a se pensar que as dificuldades a serem enfrentadas serão isonômicas. Além disso, a PEC pode ser modificada no décimo ano, caso a situação venha a se normalizar ou pelo menos a ser amenizada do ponto de vista orçamentário.

Finalmente, a estratégia a ser operacionalizada por meio da PEC não pode ser taxada de política de direita, conservadora ou coisa que o valha. Até porque tais termos se encontram superados pelo tempo, desde que o Muro de Berlim foi destruído e não há mais razão para se manter o duelo entre os “ismos”: capitalismo, socialismo, comunismo..., pois a realidade acabou comprovando a fragilidade dessas ideologias, no sentido de que as políticas públicas serão inevitavelmente direcionadas para a prática de ações governamentais, ora de caráter estritamente econômico, se a conjuntura do país assim o exigir, ora em situação normal, de natureza voltada predominantemente às políticas sociais afirmativas, como o meio mais eficaz para uma justa e racional repartição de renda. É neste último contexto que se reforça a necessidade de se concretizar os direitos e garantias constitucionais previstos no artigo 5º pari passu com a incrementação dos direitos sociais dispostos nos artigos 6º ao 11º da Carta Magna



[1] Entenda-se como Estado o conjunto dos entes federativos, isto é, a União, estados-membros, Distrito Federal e municípios.
[2] Não esquecer que o conceito de tributos inclui os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria e as demais contribuições sociais e econômicas, além dos empréstimos compulsórios.
[3] Lei de Responsabilidade Fiscal.


Vera Lúcia Chemim é advogada constitucionalista.

Revista Consultor Jurídico, 29 de novembro de 2016, 7h07

"A criminalidade não é mais individual, é organizada, transnacional e globalizada"





Por Marcos de Vasconcellos


O Código Penal precisa mudar para permitir a punição penal de pessoas jurídicas, diz o juiz federal Roberto Veloso, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Para ele, o CP, editado em 1941, é de uma época em que o crime não se organizava, e por isso há o grande foco nos "criminosos individuais", que roubam, furtam ou matam. Mas o problema do Brasil de hoje é o crime organizado, acredita.

Para enfrentar essa realidade, Veloso defende, além de mudanças na lei, sua aplicação efetiva. "Na parte geral do Código Penal, que mecanismos temos para investigar uma empresa? E, constatando que a empresa está servindo para a prática de crimes, como puni-la criminalmente? No Brasil, é impossível", reclama o juiz, em entrevista à revista Consultor Jurídico.

Ele acredita que o sistema brasileiro, que diz ser garantista, é "perfeito", mas criou distorções. Ao dar ao réu todas as possibilidades de defesa antes da condenação, analisa, os pobres vão presos rapidamente e os ricos recorrem até a prescrição.

"Quem se beneficia desse entendimento é um número reduzidíssimo, e nesse total estão justamente os poderosos, quem tem dinheiro para bancar os grandes escritórios de advocacia", argumenta.

Leia a entrevista:

ConJur – O senhor acha que tem um novo Direito Penal em vigor no Brasil atualmente?
Roberto Veloso – Não. Mas nós precisamos de um novo Direito Penal. O nosso é de 1941, naquela época nós tínhamos outra realidade sociológica. Tínhamos uma população eminentemente rural. E esse Direito Penal tradicional tem um alicerce, que é punir as questões individuais, que visa punir o homicida, o latrocida, quem rouba, quem pratica lesão corporal.

ConJur – Crimes "de rua".
Roberto Veloso – É. Os crimes de rua, mas uma criminalidade que eu diria individual, não organizada. Em 1984 nós tivemos uma reforma do Código, mas quem estuda Direito Penal diz que a reforma de 84 foi apenas para se ajustar a uma nova teoria, chamada Teoria Finalista. Precisamos de um novo Direito Penal porque a criminalidade atual não é mais individual. É organizada, transnacional e globalizada. Na parte geral do Código Penal, que mecanismos temos para investigar uma empresa? E, constatando que a empresa está servindo para a prática de crimes, como puni-la criminalmente? No Brasil, é impossível. A Constituição só permite punir penalmente a empresa nos crimes ambientais. Uma grande construtora pode estar sendo usada para a prática de crimes, mas ela não sofrerá nada criminalmente.

ConJur – Mas a permissão à punição penal da pessoa jurídica não puniria também seus empregados ou sócios que não participaram da questão criminal?
Roberto Veloso – Pois é, mas já existem legislações mais avançadas que permitem a punição criminal da pessoa jurídica. Por exemplo, a da França. No Brasil, só pode punir a pessoa física. Nosso Direito Penal precisa evoluir nesse sentido. Só que para isso é preciso um novo Direito Penal, porque o nosso considera que o crime é ação humana típica ilícita e culpável. Ora, se ele parte do pressuposto que o crime é uma ação humana, como punir a pessoa jurídica? Essa não é uma opinião original minha, mas do Claus Roxin, que é um dos maiores expoentes vivos do Direito Penal.

ConJur – Essa punição dos sócios, por exemplo, não serviria como uma punição à empresa?
Roberto Veloso – Não, a empresa continua. Ela tem uma personalidade jurídica diferente, só é punida indiretamente.

ConJur – Por que a empresa deveria ser punida? Por que não punir os sócios?
Roberto Veloso – Como é que eu tenho uma empresa que serve para lavagem de dinheiro, puno o sócio, mas ela continua livre para agir? É uma discussão importante no Direito Penal. Precisamos de instrumentos. Às vezes até se questiona a “lava jato”, porque a operação estaria inovando. Na verdade, não são inovações da “lava jato”, são da própria legislação brasileira. A delação premiada mesmo é algo muito recente na vida jurídica do Brasil. Foram mudanças promovidas pelo Legislativo, e não pelo Judiciário.

ConJur – Então não há ativismo entre os juízes brasileiros?
Roberto Veloso – No penal, não. Há um dispositivo na Constituição que diz que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia combinação legal. Então estamos amarrados constitucionalmente no Direito Penal Criminal sancionador à lei. Não podemos fazer uma inovação jurisprudencial para criar crimes ou aumentar penas, temos que ficar restritos à lei. Muitos processos poderiam ser resolvidos com negociação, com acordo. Ou seja, o Ministério Público poder fazer um acordo com o acusado e o acordo ser homologado pelo juiz, e, a partir daquele momento, o processo não existir mais. É uma experiência extremamente exitosa nos Estados Unidos.

ConJur – Por que isso seria bom para o Estado? Só para encerrar o número de processos?
Roberto Veloso – Para encerrar o número de processos, e também para que a população tenha um sentimento maior de resolutibilidade do processo penal. A população tem uma descrença muito grande na Justiça, porque a Justiça é ineficiente, não dá vazão. As pessoas cometem crimes e depois não são punidas.

ConJur – O senhor é a favor do cumprimento de pena sem trânsito em julgado?
Roberto Veloso – Sou a favor. A Constituição fala que ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Só que esse dispositivo precisa ser interpretado. A interpretação do ministro Teori foi correta. Os fatos estão transitados em julgado depois da decisão de segundo grau, porque se nós fomos ver a Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça, ela diz: “Não cabe recurso especial para reexame de provas”. Por quê? Porque as provas já estão transitadas em julgado, e se as provas já estão transitadas em julgado não há mais presunção de inocência. Quem tem condições para contratar bons escritórios de advocacia vai cumprir a pena daqui a dez anos. Além dos recursos do Código de Processo Penal, que já são muitos, ainda temos os recursos previstos nos regimentos internos dos tribunais. Então, onde é que nós vamos chegar? Então, uma norma constitucional, que a princípio era para ser garantista, passa a permitir abusos. E esse abuso gera na população um sentimento de impunidade, um sentimento de que vale a pena delinquir.

ConJur – Mas a necessidade não seria de se mudar a Constituição, e não reinterepretar uma regra clara?
Roberto Veloso – Sim, mas o Supremo Tribunal Federal permitiu o casamento homossexual a partir de uma interpretação.

ConJur – Não seria papel do Legislativo fazer isso?
Roberto Veloso – Se o Legislativo não age, o Judiciário ocupa o lugar, é assim. Mas isso não é um privilégio brasileiro. Veja que o aborto nos Estados Unidos: é permitido por uma decisão da Suprema Corte, e não por uma lei ou por uma reforma constitucional. Não é um privilégio brasileiro esse tipo de interpretação. Há necessidade dessa interpretação, porque tudo o que leva a uma conclusão absurda precisa ser coibido.

ConJur – O Brasil ostenta uma das maiores populações carcerárias do mundo, e não é segredo para ninguém que o país prende muito mal. Se temos essa realidade, por que reinterpretar um texto para facilitar prisões?
Roberto Veloso – Vou dar um exemplo do prender mal: até 2006, nós tínhamos no Brasil a Lei do Tráfico de Entorpecentes, que é de 1976. Ela previa o seguinte: pena mínima para tráfico de três anos, pena máxima 15 anos. Mas a posse para consumo era de um a três anos. Veio a Lei 11.343, em 2006, e a pena para o tráfico ficou de cinco a quinze. Agravou a pena do tráfico, e para a posse, para o consumo, disse que não cabia mais prisão, agora eram penas restritivas de direito. O que aconteceu? As cadeias estão cheias de usuários que não deveriam estar lá. Pessoas que são pegas com pouca quantidade de droga, que poderiam ser aparentemente para consumo próprio, mas que a polícia enquadra no tráfico, porque o policial diz: “Se eu enquadrar na posse para consumo, vou ter que soltar. Prefiro pegar o sujeito que está com a posse para consumo e botar como traficante”.

ConJur – Isso também vem da sensação de impunidade?
Roberto Veloso – Isso. Por isso se diz que “prende mal”. Sou professor e sempre gosto de fazer uma pesquisa informal com os meus alunos. Pergunto quem já foi assaltado e a maioria levanta o braço. Aí faço a segunda pergunta: “Qual pessoa aqui assaltou vocês que está presa?”, e ninguém levanta o braço. Se tenho em uma sala de aula 50 alunos, 30 dizem que foram assaltados e nenhuma daquelas pessoas que os assaltaram está presa. Ao mesmo tempo nós temos uma das maiores populações carcerárias do mundo.

ConJur – Mas a sensação de impunidade não significa impunidade.
Roberto Veloso – Realmente existe a impunidade. A criminalidade é alta. Se fizer uma pesquisa, das pessoas que estão presas nas penitenciárias, 90% ou mais não passaram do segundo grau, muitas não passaram do primeiro grau. Quando se fala no cumprimento da pena após o julgamento em segundo grau de jurisdição, talvez não atinja 1% das pessoas que estão presas. Quem se beneficia desse entendimento é um número reduzidíssimo, e nesse total estão justamente os poderosos, quem tem dinheiro para bancar os grandes escritórios de advocacia.

ConJur – Qual a conclusão que o senhor tira disso?
Roberto Veloso – Quem está preso lá na comarca é o criminoso individual. Não o organizado. Esse se beneficia da norma. O criminoso individual não tem direito nem ao segundo grau. Deveria ter, mas isso não é a falha do sistema recursal, é a falha de não existir uma Defensoria Pública. Se nada funciona, como é que teremos uma boa defensoria pública? O sistema perfeito é o brasileiro, que permite a pessoa utilizar de todos os recursos para iniciar o cumprimento da pena, excelente. O que é que esse sistema perfeito, ideal, está fazendo? Qual é o resultado prático dessa adoção? Uma distorção, a de que a Justiça só é para o pobre. E isso é uma distorção que não como superar, então não há Justiça.

ConJur – Juízes e procuradores da República costumam reclamar da prescrição.
Roberto Veloso – O sistema brasileiro de prescrição tem duas penas, a pena em abstrato e a pena em concreto. A prescrição corre em abstrato. Vou dar o exemplo do crime de peculato. A população vê o peculato como uma corrupção, a pena mínima são dois anos e a máxima, 12. São dez anos de diferença. Até a decisão de primeiro grau, a prescrição corre com a pena máxima em abstrato (12 anos). Quando o juiz vai aplicar a pena, para conseguir subir do mínimo, é preciso que haja agravantes. Mas, como a pena mínima é muito pequena para peculato, bom, existindo muitas circunstâncias agravantes o juiz vai condenar a quatro anos, isto é só um caso. Muitas das vezes a pena vai fixada no mínimo, dois anos.

ConJur – E aí a prescrição passa a correr com a pena em concreto.
Roberto Veloso – Aí é que está o pulo do gato. Se eu passo a ter uma pena em concreto a partir da sentença de primeiro grau e sou advogado, o que é que eu vou fazer? Postergar esse início do cumprimento da pena com recursos a fim de que o prazo que conte a partir de agora e que a pena aplicada para o meu cliente prescreva. Se formos olhar as decisões condenatórias do Supremo Tribunal Federal, quantas o Supremo não condenou pessoas de foro privilegiado e teve que decretar a prescrição imediatamente, na mesma hora? Então, o cerne da construção perfeita a que me referi antes está todo furado, permitindo esse tipo de procedimento que não vou dizer que seja ilegal.

ConJur – São mecanismos legais.
Roberto Veloso – Exato. Mas são procedimentos de moral duvidosa. Se eu disser isso para um advogado, ele vai dizer para mim: “Não, doutor, mas o senhor está querendo cercear o direito de recorrer do meu cliente?" Só que o direito de recorrer está gerando essa distorção. Se o inquérito passa dez anos na polícia, o crime já prescreveu, já não adianta mais. Aí vem aquela história de o juiz dar uma pena elevada para não prescrever. Aí é errado.

ConJur – Uma discussão moral sobre o que é legal.
Roberto Veloso – Exatamente, e aí está errado. Tem que julgar de acordo com o que está nos autos, mas para o juiz isso é frustrante. Ele tem um trabalho imenso de ter ouvido testemunhas, interrogado o réu, expedido carta precatória, o processo está com três, quatro volumes e está prescrito. É esse tipo de distorção que precisa ser regularizada, daí a necessidade desse cumprimento da pena após o julgamento de segundo grau. Não quer dizer que a pessoa não vá ter condições de recorrer. Não haverá injustiças, porque ainda há o Habeas Corpus, as medidas cautelares, recurso extraordinário etc.

ConJur – Aumentar a pena, tipificar novos crimes ou transformá-los em hediondos ajuda a diminuir a criminalidade?
Roberto Veloso – Sempre dou o exemplo do álcool ao volante. O que faz a pessoa beber e não dirigir? É a pena que está fixada na lei ou é a fiscalização? A fiscalização. Se andarmos pelo Brasil, onde não há fiscalização, a lei é inócua. O Conselho Nacional de Justiça fez uma pesquisa e descobriu que apenas 8% dos homicídios do Brasil são levados a julgamento. É quase nada. Nós temos 500 mil presos, e somente 8% dos homicídios são julgados. Dados do Ministério da Saúde mostram que 40 mil pessoas são assassinadas no Brasil por ano, aproximadamente. Em três anos, são 120 mil pessoas assassinadas no Brasil. A Guerra do Iraque durou dez anos e 100 mil pessoas morreram. É aquela história da impunidade, ela está presente porque é reconhecida pelo próprio CNJ e envolve o crime individual mais grave, que é aquele que tira a vida das pessoas.

ConJur – A imprensa influencia o juiz?
Roberto Veloso – Não deveria. Pode ser que existam exceções, mas em regra não deveria influenciar, porque o juiz é contramajoritário, não deve se guiar pela opinião pública. A opinião pública muitas vezes age errado. Até se diz que a opinião pública condenou Jesus e absolveu Barrabás.

ConJur – O Judiciário tem preenchido vazios do Legislativo?
Roberto Veloso – Sim, ele tem sido chamado pela população. E a esse chamamento o Judiciário tem dado respostas. Por exemplo, à fidelidade partidária, foi uma resposta judicial a um apelo da sociedade. A sociedade apelou para isso e o Judiciário atendeu. Existem determinados reclames da sociedade que o Judiciário também tem atendido, mas em regra o Judiciário não deve. É quase um dogma para um juiz, que ele não se influencie pela opinião pública se ela está dissociada do processo.

ConJur – O senhor é a favor das dez medidas que estão propostas pela MP?
Roberto Veloso – Nós debatemos isso lá na Câmara. Existem as dez medidas como foram propostas pelo Ministério Público, como uma petição de princípios. Ela tem um apoio da Ajufe. Agora, um projeto de lei precisa de adequações. Nem tudo que está num projeto de lei a Ajufe defende.

ConJur – As provas obtidas de forma ilícita, desde que de boa fé, são uma possibilidade para o nosso Judiciário?
Roberto Veloso – Não entraria nessa questão material. Mas existem questões processuais que devem ser mais bem resolvidas. Por exemplo, as investigações promovidas pelo Ministério Público. Pelo projeto de lei, o MP instaura o procedimento investigatório e ele mesmo arquiva. Nós, juízes, entendemos que essa investigação deve ser arquivada no Judiciário, porque nenhum poder pode ser absoluto. O juiz é controlado pelo MP, que pode recorrer de todas as minhas decisões, se quiser. Se o MP passa a ser um poder sem controle, passa a ser um poder absoluto.

ConJur – O que o senhor acha do teste de integridade?
Roberto Veloso – O Brasil não está preparado para isso, objetivamente. Não temos pessoal para isso. Se já se investiga pouco no Brasil, como eu vou despender pessoal para ficar fazendo teste de integridade? Tenho minhas dúvidas se esse teste de integridade não serviria apenas para perseguições dentro das repartições públicas, e não algo efetivamente para se descobrir alguma coisa. A minha experiência é que a nossa estrutura não está preparada para isso. Existem outros mecanismos mais importantes.

ConJur – O momento é ruim para discutirmos uma lei de abuso de autoridade?
Roberto Veloso – O momento precisa ser mais bem discutido. Existem determinados dispositivos que podem levar a esse tipo de interpretação. Há um dispositivo que diz: “O juiz não pode levar para dentro do processo um diálogo travado entre o investigado e quem tem prerrogativa de foro”. Vou dar um exemplo bem dramático: um traficante de drogas conversa com um deputado federal. A polícia está com uma interceptação telefônica sobre o traficante de drogas, mas o traficante ligou para o deputado. Se aprovado o projeto, essa conversa não pode ir para dentro do processo. Isso não é possível. Tenho que levar para dentro do processo se entendo que a partir daquele momento o deputado está envolvido no caso. Pela atual legislação eu envio para o Supremo, mas não que eu não possa deixar dentro do processo.

ConJur – A prerrogativa de foro é um problema?
Roberto Veloso – Sim. Temos 22 mil pessoas com foro privilegiado no Brasil. Se pegarmos os países desenvolvidos do Ocidente, o foro privilegiado é usado restritivamente. Poderia haver foro privilegiado para os 11 ministros do Supremo, para o presidente da Câmara, para o presidente do Senado, para o presidente da República, para o vice-presidente da República. Passou dos limites, e esse foro privilegiado tem gerado uma situação muito incômoda para o Supremo, porque lá tramitam 302 inquéritos e cento e poucas ações penais em curso. O Supremo, quando foi julgar o mensalão gastou no julgamento 60 sessões. O tribunal parou durante um ano e meio. Quem deveria fazer a guarda da Constituição, e os seus ministros são vocacionados para isso, passa a discutir caso penal.

ConJur – A “lava jato” tem influenciado os juízes?
Roberto Veloso – Os juízes são bem cônscios das suas funções, pelo menos na Justiça Federal. Sei que todos os juízes federais têm a mesma disposição que Sérgio Moro tem. Evidente existem outros tantos fatores que influenciam, e é claro que eu não posso negar que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região tem dado apoio à operação “lava jato”, tanto é que deixou Moro exclusivo para essa operação. São medidas importantes, que influenciaram positivamente o sucesso da operação.

ConJur – O senhor não vê exageros na condução das investigações e dos processos? Há muitas reclamações sobre as prisões para delatar.
Roberto Veloso – Não existiu nenhuma prisão para delatar. Todas as prisões foram decretadas porque havia requisitos para se decretar e pelo menos um dos fundamentos. Tanto que se nós olharmos o conjunto das decisões de Sérgio Moro, 96% delas foram confirmadas pelas cortes superiores. É um dado que faz cair por terra esse tipo de argumento, porque se fossem decisões sem fundamentação, se fossem prisões apenas para delatar, como se acusa, essas decisões não teriam sido confirmadas.



Marcos de Vasconcellos é chefe de redação da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 27 de novembro de 2016, 8h00

JT é competente para julgar direito à nomeação de candidato aprovado em concurso público celetista




Após ser aprovado em um concurso de Técnico Bancário da Caixa Econômica Federal, um candidato ingressou na Justiça do Trabalho buscando o reconhecimento de seu direito à nomeação. Disse que, no curso da vigência do concurso, a CEF fez uso de diversos terceirizados para realização de tarefas exclusivas dos técnicos bancários, em afronta ao edital, à legislação e à jurisprudência.

A CEF defendeu-se, afirmando que a Justiça do Trabalho é incompetente para apreciar a causa, já que não há relação de trabalho envolvida e a discussão sobre o concurso público diz respeito a fase anterior à investidura no emprego público, razão pela qual a competência seria da Justiça Comum.

Ao examinar o pedido, na titularidade da 21ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, o juiz Cléber Lúcio de Almeida reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para julgar a causa. O julgador esclareceu que a demanda gira em torno da formação do vínculo de emprego e envolve discussão sobre a obrigatoriedade da CEF de contratar o candidato, ou seja, o objeto da ação é a própria formação do contrato de trabalho. Assim, concluiu, o exame da matéria, relativa à relação de emprego em seu nascedouro compete, sim, à Justiça do Trabalho.

"Ressalto que a efetiva existência da relação de emprego não é essencial para definir a competência da Justiça do Trabalho, pois essa se verifica também quando se discute a observância das condições negociais da promessa de contratar (fase pré-contratual) e até mesmo quando já tenha sido dissolvida a relação de trabalho (fase pós-contratual)", pontuou o julgador, frisando que, no caso, a questão não é a legalidade do concurso, mas o direito à nomeação de um candidato a emprego público, sob regime celetista. Ou seja, a lide encontra-se na fase pré-contratual. Assim, no entender do magistrado, é irrelevante, para se determinar a competência, que a relação de emprego não se tenha ainda concretizado, sendo a controvérsia de índole nitidamente trabalhista, e não administrativa.

Portanto, o magistrado rejeitou a preliminar de incompetência suscitada pela CEF. Da decisão ainda cabe recurso.
PJe: Processo nº 0010323-36.2016.503.0021.Para acessar a decisão, digite o número do processo em: https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ConsultaProcessual.seam

Fonte: TRT

JT-MG nega indenização substitutiva do vale transporte a trabalhador que morava próximo ao trabalho




O vale transporte constitui benefício de natureza não salarial, instituído pela Lei nº 7.418/85, que o empregador, pessoa física ou jurídica, antecipa ao empregado para utilização efetiva em despesas de deslocamento residência-trabalho e vice-versa, via sistema de transporte público coletivo (artigo 1º). O patrão participa com ajuda de custo equivale à parcela que exceder a 6% do salário-base (artigo 4º, parágrafo único).
A explicação é do juiz convocado Cléber Lúcio de Almeida, ao apreciar, na 7ª Turma do TRT de Minas, um recurso envolvendo o tema. No caso, o empregado insistia no direito à indenização substitutiva correspondente aos valores gastos nos deslocamentos entre sua residência e a oficina mecânica onde trabalhava. No entanto, após constatar que o empregado residia próximo ao trabalho, o magistrado não deu razão a ele.
De acordo com a defesa, as partes combinaram que o empregado se deslocaria a pé para o trabalho, em razão da proximidade de locais. Essa versão foi presumida verdadeira, uma vez que o trabalhador não compareceu à audiência de instrução. Ao caso, foi aplicada a chamada "confissão ficta".
De todo modo, o relator considerou plausível o alegado pela ré. É que os dados das partes registrados no processo demonstraram que, tanto a residência do trabalhador como a sede da empresa, estão situadas no Bairro Serra. Por sua vez, mapas juntados aos autos revelaram que a residência dele fica a 21 minutos de caminhada do local de trabalho, compreendendo ao todo 1,6 km.
Conforme ponderou o julgador, o deslocamento via transporte público demandaria, comparativamente, até mais tempo. Diante de todo o contexto apurado, concluiu não existir margem para pagamento de indenização substitutiva de vale-transporte. Segundo o magistrado, essa possibilidade só existiria diante da efetiva utilização do sistema de transporte público coletivo ou da frustração indevida do benefício.
Acompanhando o voto, a Turma de julgadores negou provimento ao recurso e manteve a sentença que indeferiu a pretensão.

PJe: Processo nº 0010235-10.2016.5.03.0114 (RO). Acórdão em: 01/09/2016Para acessar a decisão, digite o número do processo em: https://pje.trt3.jus.br/consultaprocessual/pages/consultas/ConsultaProcessual.seam

Fonte: TRT3

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...