sexta-feira, 11 de março de 2016

Turma nega bloqueio de conta bancária exclusiva para recebimento de salário



Em breve, o Novo CPC entrará em vigor e substituirá o Código de Processo Civil de 1973. Mas, por enquanto, os fatos são regidos pela Lei atual, que não permite o bloqueio de quantia existente em conta salário para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos. É esse o teor de decisão da 5ª Turma do TRT-MG, com base no voto do desembargador Manoel Barbosa da Silva. 

No caso, o reclamante requereu a reforma da decisão de Primeiro Grau para que fosse mantida a penhora em conta do executado, alegando que não foi comprovado que a conta corrente na qual tinha sido efetuado o bloqueio se destinava exclusivamente ao recebimento de salários. Mas a pretensão não foi acolhida pela Turma revisora. 

Ao analisar os extratos bancários, o relator notou que os valores depositados na conta do executado referiam-se apenas a salários, não existindo registros de outras movimentações de origem diversa, tais como aplicações financeiras ou investimentos, por exemplo. Conforme ressaltou o desembargador, o artigo 649, IV, do CPC estabelece a impenhorabilidade absoluta dos salários, a não ser no caso de pagamento de prestação alimentícia, que não se confunde com o crédito trabalhista. 

Para reforçar seu posicionamento, ele citou a OJ 08, da 1ª SDI do TRT/MG e a OJ 153, da SDI-II do TST, que consideram que ofende direito líquido e certo a decisão que determina o bloqueio de numerário existente em conta salário para pagamento de crédito trabalhista, mesmo que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a valor revertido para fundo de aplicação ou poupança. O fundamento é que o artigo 649, IV, do CPC contém norma imperativa que não admite interpretação ampliativa. De acordo com o relator, a exceção prevista no art. 649, § 2º, do CPC é espécie, e não gênero, de crédito de natureza alimentícia e, dessa forma, não engloba o crédito trabalhista. 

Acompanhando esse entendimento, a Turma negou provimento ao agravo de petição do trabalhador e manteve a sentença que determinou a liberação do valor bloqueado em conta bancária do executado. ( 0000354-62.2011.5.03.0153 AP )
Fonte: TRT3

quinta-feira, 10 de março de 2016

O canibalismo da Lei e Constituição: Quando Nebraska vira Caneca






Seriam as palavras flatus vocis?
Nestes tempos em que se diz qualquer coisa sobre os textos legais e constitucionais, faço uma reflexão sobre “o que é isto — o texto jurídico”. Por exemplo: Se está escrito que, para que ocorra a condução coercitiva, é necessário o pressuposto da prévia intimação e da negativa de atendê-la, pode o intérprete ignorar isso? Voltamos ao nominalismo, em que só há(via) coisas particulares e as palavras são (eram?) flatus vocis?

Afinal, mormente nestes tempos de distopia epistêmica, qual a importância do texto para a interpretação jurídica? Mais do que isso: num contexto em que a totalidade de nosso acesso ao mundo se dá na e pela linguagem, qual a importância do texto para o trabalho jurídico? As respostas para estas perguntas pressupõem uma abordagem hermenêutica. Isto porque, para além do duvidoso veredicto veiculado pela desgastada crítica desferida contra interpretações que se prendem à “literalidade” do texto (no sentido de que o texto de uma norma jurídica seria apenas um ponto de partida para o processo interpretativo que deveria, necessariamente, ser completado pelo intérprete), é preciso ter em mente que o trabalho interpretativo do jurista, de um ponto de vista hermenêutico, é um trabalho de mediação de sentidos que tem a ver, basicamente, com uma explicação ou tradução de “testemunhos do passado” — carregados por textos — para um horizonte do respectivo presente.

Explicando melhor: No caso da interpretação jurídica, temos que esse processo de mediação reveste-se, ainda, da peculiaridade de se manifestar na solução de um caso concreto, que, por sua vez, também tem seus conteúdos veiculados por textos, que carregam uma dimensão do passado e que precisam ser interpretados, etc. A atividade de mediação levada a cabo pelo intérprete do direito não está apenas associada à aproximação entre a generalidade da lei e a especificidade concreta do caso; ela implica, também, mediação temporal do evento passado carregado pelo texto da lei ou do caso em face da atualidade da interpretação que se está a realizar.

Daí que, sem o texto, não há sequer como se falar em interpretação: ele representa uma espécie de pressuposto hermenêutico para o desenvolvimento de toda e qualquer atividade interpretativa. Da relação entre texto da norma e âmbito da norma (Fr. Müller), descreve-se um movimento circular que vai da concretude do caso para a dimensão mais abstrata do programa da norma (Gadamer), devolvendo sentido normativo para o âmbito da norma.

Para a Crítica Hermenêutica do Direito, sustentada na fenomenologia hermenêutica, não existe norma sem texto.[1] O que equivale a dizer: não é possível, hermeneuticamente, admitir que a interpretação desconsidere o texto. Até porque, se ela, a interpretação, desconsiderar o texto, estará mediando o quê? Qual sentido? De algum modo, há um texto legal e/ou constitucional. Não há grau zero de sentido. Gadamer dizia que o texto é como a palavra do rei: sempre vem primeiro.

O texto, nessa medida, não é apenas um conjunto de palavras que possuem o sentido sintático-semântico guardados em um grande dicionário. Vale dizer, a mediação hermenêutica entre o texto e a atualidade do sentido não é uma atividade de disputa ou discordância acerca de termos equívocos que podem denotar diversos sentidos quando empregados em uma situação concreta. A atividade mediadora, aqui, tem um espectro muito mais amplo e está associada à tradição, à historicidade do texto e às controvérsias interpretativas precisam ser encaminhadas, não a partir de uma simples terapia conceitual (que poderia restringir a complexidade semântica de significados), mas, sim, por meio de um enfrentamento do sentido que compartilhamos enquanto comunidade política.[2]

Em suma, fora do texto — entendido conforme o exposto linhas acima — não há como se falar em interpretação jurídica. Se o texto é importante, isso implica, ainda, que a sua interpretação — ou a atualização de seu sentido — não pode ser aquela mais conveniente ao desejo do intérprete. Deve haver um sentido melhor — ou mais adequado — que possa ser atribuído ao texto é que possa ser compartilhado por uma comunidade de sentido.

Estou dizendo tudo isso para que possamos refletir — uma vez mais — sobre questões triviais que perpassam o cotidiano dos juristas e que se manifestam em expressões do tipo “nada mais foi feito além de se cumprir a lei”, ou ainda, “todos os atos praticamos neste processo estão amparados pela lei”. Ora, ambas as frases apontam para o resultado de um processo interpretativo que pressupõe uma mediação de sentido absolutamente complexa e que tem, como ponto de partida, textos. Daí que é importante perguntar: essas interpretações oferecem um sentido adequado para o(s) texto(s) interpretado(s)?

Gadamer dizia: “quem quiser interpretar um texto deve primeiro deixar o que o texto lhe diga algo”. Pois parece que nossos juristas têm resistindo à voz dos textos. Eles chamam e os juristas atendem apenas quando interessa. Por isso, temos um encontro de águas bem peculiar: tudo vira política e ideologia. Quando convém, os tribunais (e os juízes) apegam-se à letra da lei; no dia seguinte, também porque convém, fazem ouvidos moucos, canibalizando o próprio material que compõe o direito.

Os exemplos são incontáveis. Tanto de um lado (texto vale tudo, inclusive com justificativas como “in claris cessat...”) como de outro (texto nada vale ou é “apenas a ponta do iceberg", em que, é claro, a parte submersa do iceberg é repleta de “valores” do intérprete). Por vezes, dá-se cinco pais a uma criança; noutros, concede-se a metade da herança para a amante; usucapião em terras públicas, por que não?; onde está escrito presunção da inocência, leia-se “não-presunção”. A lei? Ora, a lei. A lei é o que eu digo que é... Por vezes, a lei diz “muito pouco” e se faz um ativismo escancarado; noutras, em atitude self restrainting, deixa-se que a lei diga mais do que a Constituição. A questão é saber: por que o cidadão deve ficar à mercê da subjetividade de juízes e membros do Ministério Público?

Textos, palavras e coisas
Portanto, repito a pergunta: “o que é isto — o texto jurídico”? Vivemos tempos em que, em vez de fazermos palavras com coisas, estamos fazendo “coisas com palavras”. Tempos de autoritarismo, em que o personagem solipsista Humpty Dumpty, de Alice Através do Espelho, nos assombra com seu fantasma, cujo mote era: dou às palavras o sentido que quero. Por aqui, no Pindorama law-sistem, nem isso fazemos. Aqui, nem precisamos das palavras. Elas já não valem.

Como dizia o poeta português Eugênio de Castro: Que fizeste das palavras? Que conta darás? Desde a aurora da civilização nos angustiamos com a relação “palavras e coisas”. Avançamos, pelo menos no campo da filosofia: chegamos à conclusão de que nem as coisas assujeitam as pessoas e nem as pessoas assujeitam as coisas. Traduzindo em quadrinhos: nem a lei diz tudo e nem a lei diz nada. Digo isso há mais de 25 anos. Hoje, perigosamente, estamos canibalizando o nosso próprio material de trabalho. Estamos devorando o nosso ferramental. Comportamo-nos como a ascídia, que é um animal marinho que devora o próprio cérebro após fixar residência num local que lhe pareça "tranquilo e favorável". Esse local tranquilo é o senso comum teórico. Há, pois, uma nova categoria no mundo: o juris-ascidium. O suprassumo do canibal. Eis o busílis: retrocedemos à condição de “canibalismo epistêmico”.

Repetindo-me, por causa de minha LEER: palavra é pá-que-lavra. Em grego, quem dava nome às coisas era o nomoteta. Nomos é lei. Dador de nomes. Em alemão, quem dá a lei é o legislador, não por nada chamado deGesetzgeber (dador de leis=legislador). E Gesetz é “assentado”. Pois se assentamos, civilizada e intersubjetivamente, que uma palavra significa x, não pode vir qualquer um e dizer, só porque quer, que o significado é y. Por isso, onde está escrito prévia intimação, devemos ler...prévia intimação.

A lei, a Constituição e a Sereníssima República
Busco na literatura um modo de tentar metaforizar esse “estado de natureza interpretativo” que tomou conta do Direito. Para isso, convoco o nosso Flaubert, Machado de Assis, com seu conto A Sereníssima República, na qual o Cônego Vargas relata sua descoberta: “aranhas falantes, que se organizaram politicamente”. Para quem não leu Machado, conto em quadrinhos: O Cônego lhes ofereceu um sistema eleitoral a partir de sorteio, onde eram colocadas bolas com os nomes dos candidatos em sacos. Chamou o “país das aranhas” de Sereníssima República. Claro que as aranhas arrumaram modos de driblar as próprias regras do sistema. As aranhas eram versadas no law-system pindoramense.

Com efeito, o inusitado ocorreu quando da eleição de um cargo importante para o qual concorreram dois candidatos: “Nebraska contra Caneca”. Em face de problemas anteriores — grafia errada de nomes de candidatos nas bolas — a lei estabeleceu que uma comissão de cinco assistentes poderia jurar ser o nome inscrito o próprio nome do candidato. Feito o sorteio, saiu a bola com o nome de Nebraska. Ocorre que faltava ao nome a última letra. As cinco testemunhas juraram que o nome vencedor era mesmo de Nebraska. Mas Caneca, o derrotado, impugnou o resultado. Contratou um grande filólogo, que apresentou a sua tese:

“— em primeiro lugar, não é fortuita a ausência da letra “a” do nome Nebraska. Não havia carência de espaço. Logo, a falta foi intencional. E qual a intenção? A de chamar a atenção para a letra “k”, desamparada, solteira, sem sentido. Ora, na mente, “k” e “ca” é a mesma coisa. Logo, quem lê o final lerá “ca”; imediatamente, volta-se ao início do nome, que é “ne”. Tem-se, assim, “cané”. Resta a sílaba do meio “bras”, cuja redução a esta outra sílaba “ca”, última do nome Caneca, é a coisa mais demonstrável do mundo. Mas não demonstrarei isso. É óbvio. Há consequências lógicas e sintáticas, dedutivas e indutivas... Vocês não entenderão. E, ai está a prova: a primeira afirmação mais as silabas “ca” e as duas “Cane”, dá o nome Caneca.” 

Eis o vencedor: Caneca! Bingo! Nebraska virou Caneca. Estava na cara, pois não? E tudo feito de acordo com a lei.

O que mais posso dizer? Apenas que está na hora de pararmos com esse canibalismo. E paremos de transformar Nebraska em Caneca. Se não for por nada, que deixemos de ser canibais... pelo menos para preservar a espécie. Salvemos o que resta: a Constituição. Fora dela, é o caos. E no caos, não há direito.


[1] Desenvolvo isso amiúde, com diálogos com as teses de Fr. Müller, em Hermenêutica Jurídica e(m) crise, 11ª. Ed. (Ed. Livraria do Advogado).


[2] Sobre o que é um texto, sugiro a leitura de Ernildo Stein, no seuAproximações Sobre Hermenêutica, 2ª. Ed. Edipucrs, em especial pp.111 e segs; também o excelente Diferença e Metafísica, Edipucrs, passim.



Lenio Luiz Streck é jurista, professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do Escritório Streck, Trindade e Rosenfield Advogados Associados:www.streckadvogados.com.br.



Revista Consultor Jurídico, 10 de março de 2016, 8h00

Repetição de indébito fruto de desconsideração e outras questões








Em uma ação judicial, foi discutido o reverso da medalha de uma desconsideração de uma operação feita pelo fisco federal.

É que um contribuinte “AA”” adquiriu debêntures de “BB”. Na época, os rendimentos dessas debêntures foram deduzidos como despesa por “BB” e tributados como receita financeira por “AA”.

Mas, devido às condições tidas como anormais de mercado, o caso foi tratado como planejamento tributário abusivo e “toda a operação foi questionada pela Receita Federal em dois processos administrativos. Um em face da “BB” no qual houve a glosa de despesas relativas à participação nos lucros de debenturistas e consequente cobrança de IRPJ e CSLL (processo 12448.728319/2012-75). No outro, em face da autora, o Fisco defendia que os rendimentos das debêntures deveriam ser tratados como "distribuição de lucros à controladora" (processo 16682.720703/2012-16)”.

Ou seja, para afastar a natureza de pagamento de prêmio de debênture, e glosar a dedução como despesa em “BB”, o fisco requalificou a parcela para “distribuição de lucros”.

Então, como a parcela recebida por “AA” foi tratada como “distribuição de lucros”, que é isenta, a contribuinte pleiteou judicialmente que lhe fossem devolvidos os tributos pagos; afinal já registrado que “como os fatos ocorridos foram qualificados de ofício de forma diversa, deve­se aplicar a nova qualificação com todas as suas consequências. Não é possível se contar a história pela metade, apenas na parte que aumenta a tributação”.

Apreciando o caso, houve sentença concedendo a repetição do que passou a ser indébito, e ainda afastando um complicador, pois “BB” tinha parcelado seu débito, o que gerou a alegação de que a confissão de “BB” afetaria o pedido de “AA”; assim fundamentada:

Ação 0119200-07.2015.4.02.5101 (publicada em 03.03.2016)
Na realidade a requalificação da operação gerou para a autora um crédito tributário, posto que recolheu IRPJ e CSLL em todo o período e que não eram devidos, considerando a natureza jurídica posteriormente reconhecida em âmbito administrativo fiscal, do valor que auferiu em função das debêntures adquiridas da “BB”. (...)

A ré alega, outrossim, que o fato de a “BB” ter requerido parcelamento do seu débito importaria em impossibilidade jurídica do pedido da “AA”, em razão da confissão de dívida imposta como condição para o acolhimento do pedido de parcelamento.

Embora engenhoso, não me parece possível acolher tal argumento.

Explico.

A situação fiscal da “BB”, apurada no processo no. 12448.728319/2012-75, embora seja correlacionada com a “AA”, não pode ser tratada como um débito único.

Em outras palavras, as decisões administrativas trazem efeitos diversos e individualizados para cada empresa.

A “BB” tem um débito fiscal a pagar e por isso pediu o parcelamento e o encerramento do processo no. 12448.728319/2012-75. A “AA” obteve, a partir da decisão proferida em seu processo administrativo, uma decisão que acabou por descaracterizar o fato gerador de IRPJ e CSLL.

Desse modo é evidente que possui o direito de ser restituída do que pagou indevidamente.

E mesmo que assim não fosse, há que se considerar que a confissão da dívida parcelada, assim me parece, é formulada rebus sic stantibus. Ocorrendo alteração da natureza jurídica do substrato fático do fato gerador do tributo, por interpretação do próprio Fisco, não seria razoável vincular o contribuinte à uma confissão de dívida de um tributo já descaracterizado, por assim dizer.

Ou seja, a citada confissão da “BB” não elide o direito à repetição almejado pela “AA”. (...)

O pedido, portanto, é procedente.

Decisões variadas
a) No Agravo de Instrumento 0008018-83.2016.4.01.0000 (publicado em 1.3.2016), apreciada ação de contribuinte que pediu anulação de acórdão do Carf por ofensa ao contraditório, já que Embargos de Declaração foram julgados com efeitos infringentes, sem ter sido aberta a oportunidade para contrarrazões. E decisão monocrática do Tribunal Regional Federal da 1ª Região mantém decisão de primeiro grau que antecipou a tutela; assim fundamentada: “O princípio do contraditório/ampla defesa também deve nortear o processo administrativo. Ainda que as contrarrazões não estejam previstas no regimento interno isso não afasta o direito assegurado na Constituição Federal, art. 5º/LV. Dessa forma, INDEFIRO o efeito suspensivo, ficando mantida a decisão recorrida”.

b) No Acórdão 9101-002.177 (publicado em 4.3.2016), analisados Embargos de Declaração que alegava haver contradição em anterior acórdão, pois “decisão da CSRF utilizou como fundamento a prática de simulação, argumento que não foi mencionado pela acusação fiscal. Assim, teria ocorrido, primeiro, inovação no critério jurídico, e segundo, cerceamento de defesa, vez que o assunto não foi trazido pelo recurso especial interposto pela PGFN”. Porém, a CSRF do Carf, por maioria, não conheceu os Declaratórios, pois inovação não caracterizaria contradição; assim ementado: “Contradição prevista na legislação processual refere-se aos fundamentos adotados pelo voto, ou seja, o cotejo encontra limites no corpo da decisão, numa acepção endógena. Elementos exógenos, como as razões apresentadas por uma das partes, por outras decisões anteriores, ou pela peça acusatória, encontram-se fora do alcance da admissibilidade”.

c) No Acórdão 9101-002.196 (publicado em 27.2.2016), discutida, para fins de IRPJ, a “dedutibilidade, ou não, de multas administrativas aplicadas por órgãos de regulação”. E a CSRF do Carf, por maioria, mantém a indedutibilidade, também porque um ato antijurídico não pode ser considerado necessário à atividade da empresa; assim ementado: “A dedução das multas administrativas das bases de cálculo dos tributos resultaria em verdadeiro benefício, eis que a empresa repassaria para a Administração Pública, e maior extensão, para a sociedade brasileira, parte dos custos pela sua desídia, o que ofenderia o sistema jurídico vigente, na medida em que a pena não pode passar da pessoa do infrator”.

d) No Acórdão 9101-002.185 (publicado em 4.3.2016), analisada glosa de amortização de ágio adquirido em operação societária, mas feita no tempo em que o fisco autuava quando a adquirida incorporava a adquirente, pois enxergava “inconsistência lógica” na operação; o que sofreu uma virada interpretativa, já que atualmente o fisco preconiza justamente o contrário, qual seja, que só pode deduzir o ágio se adquirente e adquirida desaparecerem para formar uma única pessoa jurídica, em estado deconfusão. E enfrentando autuação do período anterior, a CSRF do Carf, por maioria, não conhece recurso especial e assim mantém o cancelamento da autuação, exatamente porque a interpretação atual é que a Lei 9.532/97 imporia a junção de adquirente e adquirida, inclusive por incorporação inversa; assim ementado: “Estando a acusação fiscal da glosa da amortização de ágio baseada no desconhecimento dos arts. 7º e 8º da Lei 9.532/97, em juízos de valor e em digressões, impõe-se o cancelamento do lançamento”.



Mary Elbe Queiroz é pós-doutora e doutora em Direito Tributário. Membro do CONJUR da FIESP. Membro da Comissão de Juristas do Senado para estudar a Desburocratização. Membro Imortal da ANE. Presidente do IPET. Professora. Advogada sócia de Queiroz Advogados.

Antonio Elmo Queiroz é advogado, sócio do escritório Queiroz Advogados Associados e diretor do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil.



Revista Consultor Jurídico, 10 de março de 2016, 8h00

Endividamento também deve ser considerado em pedido de Justiça gratuita





A situação de pobreza de uma pessoa não leva em conta apenas sua renda, mas também seu nível de endividamento. Com esse entendimento, a 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho deferiu os benefícios da Justiça gratuita a um ex-empregado de banco e reconheceu a validade da declaração de hipossuficiência econômica que havia sido rejeitada nas decisões anteriores. Os ministros excluíram da condenação a multa aplicada ao bancário e o pagamento das custas processuais.

O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP) havia indeferido a Justiça gratuita, levando em conta o fato de que o bancário mantinha a filha em colégio particular de valor elevado e tinha alto padrão salarial quando trabalhava no banco. Assim, considerou falsa a declaração de hipossuficiência e aplicou a multa prevista no artigo 4º, parágrafo 1º, da Lei 1.060/50, que estabelece as regras para a concessão da assistência judiciária gratuita. Determinou, ainda, expedição de ofício ao Ministério Público Federal e à Receita Federal, para a averiguação de possível sonegação fiscal, uma vez que não foi juntada a declaração completa do Imposto de Renda.

No recurso ao TST, o empregado sustentou que está desempregado e não recebe salário igual ou superior ao dobro do mínimo legal. As reservas que possui, quando muito, são suficientes para garantir o sustento da família e manter a filha em boa escola.

O relator do recurso, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, destacou que o entendimento do TRT-15 não é suficiente para afastar a presunção de veracidade da declaração de pobreza firmada pelo trabalhador. "O simples fato de ter recebido renda elevada quando em atividade, bem como pagar escola particular para a filha, não afasta por si só a presunção de pobreza", esclareceu.

Segundo o ministro, a situação de pobreza não é medida única e exclusivamente pela renda obtida pelo trabalhador, "mas por uma somatória de fatores, como o nível de endividamento, por exemplo".

Por unanimidade, a 6ª Turma proveu o recurso e, além do deferimento do benefício, afastou a expedição dos ofícios ao MP e à Receita. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

RR 10166-16.2013.5.15.0092


Revista Consultor Jurídico, 9 de março de 2016, 15h19

Juiz deve propiciar produção de provas para instrução de processo, diz TJ-RS







O juiz deve propiciar a produção das provas que considera necessárias à instrução do processo, de ofício ou a requerimento das partes, bem como apreciá-las livremente para a formação de seu convencimento, segundo os artigos 130 e 131 do Código de Processo Civil. Considerando esses dispositivos, a 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Suldesconstituiu sentença que ignorou pedido de produção de provas para impugnar a assistência judiciária gratuita solicitada pela parte adversa. Com a decisão, os autos retornaram ao primeiro grau para o devido prosseguimento e instrução processual.

No incidente de impugnação de assistência judiciária gratuita, protocolado na 5ª Vara Cível da Comarca de Passo Fundo, o autor alegou que a parte ré não é ‘‘juridicamente pobre’’, pois exerce as funções de jornalista e radialista, além de manter comércio. Pediu que o Judiciário interviesse, enviando ofício à Receita Federal, para ter acesso a informações sobre seus ganhos nos últimos cinco anos.

O titular da vara disse que a diligência caberia à parte autora, e não ‘‘ao sobrecarregado Poder Judiciário, que não pode e não deve agir assistencialmente’’. A seu ver, o exercício concomitante de duas profissões, por si só, não presume boa condição financeira. Além disso, para a concessão do benefício da gratuidade processual se dispensa a comprovação de miserabilidade absoluta, conforme se depreende da leitura do artigo 2º, parágrafo único, da Lei 1.060/50.

Cerceamento da defesa
O relator da apelação na corte, desembargador Eduardo João Lima Costa, afirmou que o caso exigia ‘‘dilação probatória’’, diante dos fatos alegados e do pedido expresso da parte autora para que a vara enviasse ofício ao Fisco federal. Como sequer houve a intimação das partes sobre a produção de outras provas, antes da prolatação da sentença, o que motivaria o encerramento da instrução, Costa entendeu que seria prematuro o julgamento da ação no estado em que se encontrava.

‘‘Assim, na inexistência de provas, indubitável a ocorrência de cerceamento de defesa. Não se pode perder de vista que o processo destina-se à perquirição e conhecimento substancial da verdade e, daí, a busca do justo. No caso dos autos, a meu ver, a negativa na realização da prova oportunamente requerida configuraria cerceamento do seu direito de buscar a efetividade da jurisdição’’, escreveu em seu voto. O acórdão foi lavrado na sessão de 25 de fevereiro.

Clique aqui para ler o acórdão modificado.

Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.



Revista Consultor Jurídico, 9 de março de 2016, 15h45

Instauração da arbitragem depende de concordância expressa do consumidor




Nos contratos de consumo que prevejam a arbitragem (técnica de solução de conflitos em que as partes buscam um árbitro para a solução imparcial do litígio), ainda que o consumidor tenha aceitado a previsão no momento da assinatura do pacto, a instalação posterior do juízo arbitral depende de iniciativa ou de concordância expressa da parte consumidora. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou novo julgamento pela primeira instância de São Paulo de ação na qual o consumidor optou por não adotar a arbitragem prevista contratualmente.

O julgamento da Quarta Turma teve por base processo no qual o autor narra que firmou contrato com a MRV Engenharia em 2007 para compra de uma casa na cidade de São José dos Campos (SP). Juntamente com o contrato, foi estabelecido termo com cláusula compromissória que estabelecia o Tribunal de Arbitragem de São Paulo (Taesp) como juízo arbitral. Segundo o requerente, o contrato apresentava cláusulas abusivas e, além disso, a empreiteira não entregou ao comprador os documentos necessários para obtenção do financiamento imobiliário.

Pelas dificuldades encontradas no processo de aquisição do imóvel, o autor pediu judicialmente a nulidade de cláusulas do contrato de compra e venda, dentre elas aquela que estabelecia a arbitragem obrigatória. O requerente também pleiteou o ingresso imediato no imóvel e a indenização por danos morais e materiais.

Concordância expressa

A sentença de primeira instância julgou improcedente o pedido de anulação da cláusula que previa a arbitragem, por entender que o autor concordou de forma expressa com a discussão de eventual litígio por meio da justiça arbitral. Como considerou válida a eleição da arbitragem, o julgamento de primeiro grau não entrou no mérito das demais questões trazidas pelo comprador. O entendimento registrado pela sentença foi mantido na segunda instância.

O autor buscou a reforma do acórdão no STJ, com a alegação de que a cláusula sobre a justiça arbitral era parte integrante de um contrato padronizado, sem nenhum destaque para a eleição da arbitragem. Também destacou sua posição de vulnerabilidade no contrato de consumo, no qual o contratante acaba se sujeitando a cláusulas impostas pela pessoa jurídica que elabora o contrato. 

O ministro relator, Luis Felipe Salomão, centrou a análise da discussão em definir a validade de cláusula compromissória de arbitragem inserida em contrato de adesão, especialmente quando há relação de consumo. O ministro lembrou que a arbitragem assumiu novo patamar com a edição da Lei 9.307/96, que equiparou os efeitos da sentença arbitral aos da decisão judicial. O novo Código de Processo Civil também prevê expressamente a arbitragem.

Opção do consumidor

Em seu voto, o ministro Salomão buscou a conciliação da Lei 9.307 com as regras estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor, de forma que, sem que houvesse o desestímulo à arbitragem, os direitos do consumidor fossem preservados.

Ainda que entenda como válida a previsão da justiça arbitral em contratos de consumo, o ministro relator afirmou que cabe ao consumidor a ratificação posterior da arbitragem, ou que a própria parte consumidora busque a via arbitral. “Com isso, evita-se qualquer forma de abuso, na medida em o consumidor detém, caso desejar, o poder de libertar-se da via arbitral para solucionar eventual lide com o prestador de serviços ou fornecedor. É que a recusa do consumidor não exige qualquer motivação. Propondo ele ação no Judiciário, haverá negativa (ou renúncia) tácita da cláusula compromissória”, ressaltou o ministro.

No recurso especial analisado, a Quarta Turma entendeu que a propositura da ação pelo consumidor demonstrou o seu desinteresse pela arbitragem. Dessa forma, a turma, de forma unânime, reconheceu a nulidade da cláusula arbitral e determinou o retorno do processo à Justiça paulista.

RL
Destaques de hoje

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1189050
Fonte: STJ

TRT-MG confirma sentença que não concede vale-transporte a empregado que mora em município distante do local de trabalho e não servido por transporte público urbano





O empregador é obrigado a antecipar ao empregado vale-transporte pelo deslocamento residência-trabalho e vice-versa. Contudo, um dos requisitos para essa concessão é que esse deslocamento seja feito através do sistema de transporte coletivo público, urbano ou intermunicipal e/ou interestadual com características semelhantes aos urbanos. É o que dispõe o artigo 1º da Lei 7.418/85, citado pelo desembargador Luiz Antônio de Paula Iennaco ao julgar desfavoravelmente o recurso de um trabalhador, mantendo a decisão que negou pedido de indenização pelo vale-transporte não concedido, bem como por danos morais.

O trabalhador discordou do fundamento do juízo sentenciante de que inexistiria transporte público semelhante ao urbano entre a cidade de Pequeri até Bicas e deste último até Leopoldina, trajeto que ele percorria para ir trabalhar. Para o empregado, levando em conta as pequenas dimensões das localidades envolvidas e a dependência econômica entre elas, seria natural pedir o benefício do vale transporte considerando a contiguidade entre as cidades, como se fossem a mesma. Mas seus argumentos não convenceram o desembargador, para quem a opção do empregado em residir em município diverso daquele em que estabelecido o local de trabalho não pode acarretar ônus ao empregador. "A regra quer com isto dizer que ao empregador cumpre custear o transporte nos limites da zona urbana ou do aglomerado de cidades vizinhas que estabeleçam entre si ligação análoga a de uma mesma zona urbana ou região metropolitana, entendendo-se que o trabalhador reside nessas fronteiras", esclareceu o julgador, concluindo que, no caso do reclamante, não se poderia exigir da empresa o custeio do transporte.

Por fim, não verificando qualquer ilicitude na conduta da empregadora no que se refere ao vale transporte, o julgador também afastou a pretensão do trabalhador ao recebimento de indenização por danos morais. E arrematou dizendo que, de todo modo, o não fornecimento do vale importaria prejuízos tão somente de ordem material. O entendimento foi acompanhado pelos demais julgadores da Turma Recursal de Juiz de Fora.
PJe: Processo nº 0010888-86.2015.5.03.0036. Publicação da decisão: 02/02/2016
Fonte: TRT3

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...