sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

OAB contestará prisão antes do trânsito em julgado



quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016 às 12h41


Brasília – O plenário do Conselho Federal da OAB decidiu nesta quarta-feira (24) ingressar no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) para questionar o entendimento da corte, tomado em 17 de fevereiro, que autoriza a prisão do réu logo após decisão em segunda instância. O ajuizamento da ADPF por parte entidade se dará em breve, em data a ser estudada pela diretoria da OAB.

O presidente nacional da Ordem, Claudio Lamachia, exteriorizou a posição do plenário. “Somos voz da advocacia e somos também a voz do cidadão. Quando uma condenação acontece sem derivar do respectivo trânsito em julgado, tira-se a oportunidade do cidadão de defender-se em todas as instâncias que lhe couber por meio da atuação de seu advogado. O Conselho Pleno entende que devemos ajuizar a ação”, apontou.

O relator da matéria no Plenário da OAB, conselheiro federal Luiz Saraiva Correia (AC), entende que a decisão do STF é contrária à vontade cristalina da Constituição Federal. “O réu só pode ser efetivamente apenado após o trânsito em julgado da sentença. Não se pode inverter a presunção de inocência. O forte impacto de antecipação da pena viola direitos humanos e constitucionais. Descumpre-se também o Pacto de San José da Costa Rica”, votou.

Fonte: OAB

Juiz considera válidos cartões de ponto sem assinatura



Se a empresa tem mais de dez empregados, a lei determina que mantenha controle de ponto, com anotação da hora de entrada e saída, em registros mecânicos ou não (artigo 74, §20º, da CLT). Esse controle tem dupla finalidade: para a empresa saber quantas horas o empregado trabalhou e para o empregado checar se o seu salário corresponde às horas efetivamente trabalhadas. Mas os cartões de ponto devem ser necessariamente assinados pelo empregado?

Para o juiz Cristiano Daniel Muzzi, não. Na sua visão, a CLT não prevê a obrigatoriedade de assinatura dos cartões de ponto, tampouco que a anotação seja feita pelo próprio empregado, prevendo apenas que cabe ao empregador controlar os horários de entrada e saída. Nesse sentido, o magistrado citou jurisprudência do TST, frisando que a mera ausência de assinatura nos registros de frequência não induz à sua invalidade, já que não há imposição legal no sentido de que os controles sejam chancelados pelo empregado.

No caso analisado, um servente pediu o pagamento de horas extras, argumentando que extrapolava a jornada, uma vez que a empregadora não observou a jornada contratual que visava à compensação do trabalho aos sábados. A empregadora, uma empresa de engenharia, se opôs ao pedido apresentando os cartões de ponto, que foram impugnados sob o fundamento de que não estão assinados pelo empregado. Por outro lado, em audiência, o servente admitiu que chegava na empresa, tomava café e registrava no cartão de ponto a entrada, a saída e o intervalo.

Nesse contexto, o julgador não teve dúvidas de que deveriam prevalecer os horários registrados no cartão de ponto, ainda que apócrifos. Ele observou ainda que o simples fato de o registro da jornada de trabalho ficar a cargo de um empregado da reclamada, especificamente designado para essa função, não significa descumprimento da obrigação prevista na CLT, já que atendido pelo empregador o dever imposto a ele pela norma, que é, simplesmente, o de controlar a jornada.

Para o magistrado, é descabida a pretensão do trabalhador de que o tempo gasto para tomar café da manhã fosse computado como tempo de serviço, já que ele não estava aguardando ordens, mas apenas usufruindo de um benefício concedido pela empresa. O juiz não viu razão para desconsiderar a compensação de jornada, em face do acordo celebrado com o sindicato da classe, conforme CCT da categoria.

Concluindo que o servente não comprovou a realização de labor extraordinário, o magistrado indeferiu o pedido de horas extras. Ainda cabe recurso da decisão.
PJe: Processo nº 0010855-24.2015.5.03.0060. Data de publicação da decisão: 28/01/2016

Para acessar a decisão, digite o número do processo em: 
Fonte: TRT3

Prova do estado de disponibilidade em regime de plantão gera direito a horas de sobreaviso





Para caracterizar o regime de sobreaviso não é mais necessário que o empregado permaneça em casa, aguardando ordens do empregador. Mas é imprescindível a comprovação do alegado "estado de disponibilidade", em regime de plantão. Esse o teor da Súmula 428 do TST, item II, aplicada pela 5ª Turma do TRT-MG, com base no voto do juiz convocado João Alberto de Almeida, ao confirmar decisão de 1º grau que entendeu devido o pagamento de horas de sobreaviso ao trabalhador, negando provimento ao recurso empresarial.

A empregadora, uma empresa de telefonia, insistia na tese de que o regime de plantão, para fins de aplicação da súmula, só se caracteriza se o empregado for obrigado a permanecer em um local, sem poder se ausentar, à espera de chamados. Alegou ainda que o mero fato de o empregado, um consultor de segurança, receber ligações em seu telefone celular fora da jornada contratual não caracteriza o sobreaviso. Além do quê, pagou todas as horas extras devidas, relativas ao período em que o trabalhador foi realmente acionado.

Mas esses argumentos não convenceram o julgador, que entendeu clara a existência de diferenças a serem pagas em favor do trabalhador. Isto porque somente as horas de efetivo trabalho foram supostamente pagas pela empresa."Ficar disponível em sua residência, aguardando eventual comunicação para comparecer ao labor, inclusive noturno, evidencia nítida disponibilidade pessoal reduzida do empregado, configurando-se, assim, uma situação jurídica típica de 'sobreaviso', em analogia ao disposto no artigo 244, § 2º, da CLT e tal como confessado pelo preposto", ponderou o julgador, frisando que no caso, sequer ficou comprovado o pagamento das horas efetivamente laboradas.

Por fim, segundo destacou o magistrado, ao confirmar a ocorrência de labor extraordinário, a empregadora atraiu para si o ônus de comprovar o pagamento, o que não foi feito. Acompanhando esse entendimento, a Turma julgadora manteve a condenação da empresa ao pagamento de horas de sobreaviso ao reclamante que, por seu turno, comprovou que permanecia em estado de disponibilidade, em regime de plantão.( 0002725-66.2013.5.03.0108 RO )
Fonte: TRT3

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Hermenêutica e positivismo contra o estado de exceção interpretativo





Ainda o julgamento do STF
A semana passada foi intensa. O Supremo Tribunal Federal proferiu duas decisões que impactam a cidadania. Uma que flexibiliza fortemente o sigilo bancário, que pode ser quebrado pelo fisco e a outra que diz respeito à flexibilização da presunção da inocência. Escrevi sobre isso (ler aqui). Alertei para o fato de que devemos levar o texto constitucional a sério. Textos são importantes. Não há norma sem texto. O texto não contém a norma. Mas a norma atribuída não pode ser qualquer uma. Mostrei, inclusive, a partir das seis hipóteses pelas quais o Judiciário pode deixar de aplicar a lei, presentes em minha (tentativa de fazer uma) teoria da decisão, que um juiz só pode deixar de aplicar uma lei se esta for declarada formalmente inconstitucional. Pois no HC da semana passada, ocorreu o inverso: o artigo 283, que trata claramente da presunção da inocência, sequer foi tocado. Logo, a decisão fere a jurisdição constitucional.

A decisão do STF provocou uma enxurrada de textos. Há textos oportunistas, textos repetitivos e outros muito sérios. De minha parte, sou otimista. Creio que o constrangimento epistemológico que está sendo feito em relação à decisão fará, em breve, com que o STF revise a sua posição.

Já do lado dos que se colocam a favor da decisão, o que mais me chamou a atenção foi o de Vladimir Passos de Freitas, que, para afastar os argumentos contrários à decisão, disse, de forma peremptória, que “A Justiça não é lugar para discussão de teses jurídicas, mas sim para promover a pacificação social. Correta, pois, a decisão do STF, pois restaurou o equilíbrio entre o direito à liberdade e a eficiência” (ler aqui). Fiquei pensando no que disse o simpático e ilustre colunista. Se a justiça não deve discutir teses jurídicas, para que ela serve? Em outra coluna, voltarei a esse assunto.

Um juiz federal comparou a decisão do STF com um jogo de futebol de 180 minutos (ler aqui). Por que ninguém pensou nisso antes? Vejam o que ele sentenciou: “Como nas fases eliminatórias são dois jogos, a decisão do STF garantiu a presunção de inocência na primeira e segunda instância. Lá é encerrado o jogo de futebol. Quando o jogo vai para os pênaltis a regra é outra. Ninguém fala em pênaltis quando da expressão ‘jogo de 180 minutos’. A presunção de inocência acaba no segundo jogo”. Bingo. Como diria Fiori Giuglioti: Crepúsculo de jogo. Fecham-se as cortinas e termina o espetáculo. Derrota da presunção da inocência nos pênaltis!

Há também quem sustente a necessidade de fazer a ponderação entre a liberdade individual e o interesse público (sic). Mas, permito-me não falar em ponderação, essa katchanga real pós-moderna (ler aqui) com a qual posso encerrar o jogo e apitar pênalti na hora em que quero.

Para não esquecer, há quem defenda a decisão do STF dizendo que se tratou de mutação constitucional. A estes, sugiro a leitura de um texto escrito em 2007, por Martonio Barreto Lima, Marcelo Cattoni e por mim, em que criticamos duramente a tentativa de mutação constitucional na Recl 4.335. Duvido que alguém ainda fale em mutação depois de ler esse texto (ler aqui).

A importância da lei, do texto, enfim da legalidade constitucional
Fazendo um rescaldo, vou repetir o que venho dizendo. No Estado Democrático de Direito, precisamos levar o texto “em sério”. Já apontando a todo momento as práticas ativistas e decisionistas, clamava pela “legalidade constitucional”. Dizia eu: "Quando uso a expressão legalidade constitucional, com base em Elias Díaz, refiro-me ao fato de que saltamos de um legalismo rasteiro, que reduzia o elemento central do direito ora a um conceito estrito de lei (como no caso dos códigos oitocentistas, base para o positivismo primitivo), ora a um conceito abstrato-universalizante de norma, para uma concepção da legalidade que só se constitui sob o manto da constitucionalidade. Afinal, não seríamos capazes, nesta quadra da história, de admitir uma legalidade inconstitucional. Seria um contrassenso afirmar uma legalidade que não manifestasse a consagração de uma constitucionalidade — e pela efetividade das decisões judiciais sob o marco de uma legitimidade democrática”.

Sendo mais claro e citando um petardo de Díaz: “Parece-me desde logo muito importante essa zona de convergência formada pelo poder constituinte, a Constituição e os grandes pactos políticos e sociais; se depois disso, se depois sobretudo da Constituição, as concretas decisões legais majoritárias vão contra ela (contra essa legitimidade e essa justiça), sensivelmente tais decisões ficam anuladas ao se provar sua inconstitucionalidade pelo Tribunal competente. E conclui Díaz: “Essas maiorias concretas, portanto — mesmo que ‘enlouqueçam’ — coisa que os contumazes antidemocratas alegam sempre e incansavelmente — não poderão fazer nada, por vias legais e democráticas contra a Constituição”.[1] Um bingo a mais para Diaz!

A violação dos pressupostos do processo e da jurisdição constitucional
Vou tentar explicar. O STF não levou em conta nem a história institucional, nem a teoria processual. Nunca, para a teoria do processo ou mesmo para a história institucional, trânsito em julgado significará o mesmo que condenação em segundo grau. Isso porque condenação em segundo grau, sem trânsito em julgado, nunca será decisão definitiva.

Todavia, no tema em questão, essa exigência de diferenciação com base em argumento histórico e na lição da teoria processual — e a lição é de Marcelo Cattoni — traz consigo uma questão de princípio que dá o seu verdadeiro sentido normativo: a presunção de inocência prevalece até o trânsito em julgado de sentença condenatória; ou seja, para a Constituição a presunção de inocência prevalece até decisão judicial definitiva ou condenação judicial definitiva. O que, do ponto de vista do devido processo legal, significa que o ônus da prova é de quem acusa, não de quem se defende.

Entretanto, o STF desconsiderou o argumento histórico e a lição doutrinária que exigem não confundir decisão definitiva com condenação em segundo grau. E, para isso, desconsiderou, justamente, o sentido normativo da garantia da presunção de inocência.

Com base no argumento utilitarista do combate à impunidade, reside a pretensiosa justificativa do STF para desconsiderar a história e a doutrina que ensinam que nem toda decisão de segundo grau, por ser em segundo grau, seja definitiva. Não há ponderação alguma a fazer. O ponto fulcral é: a presunção de inocência é, antes de qualquer coisa, uma garantia processual; é uma questão de processo; é uma regra da argumentação processual. Significa, como diz Cattoni em brilhante palestra na Unisinos, que quem tem o ônus da prova é quem acusa e não quem se defende. Isso é a base do sistema acusatório ou, se preferimos, do processo penal dos Estados Democráticos de Direito. Por isso, quando o ministro Barroso afirma que a condenação em segundo grau inverte o ônus da prova, ele não apenas relativiza a presunção de inocência, mas acaba com ela. E arrisca destruir com isso o sistema acusatório típico do Estado Democrático de Direito.

O combate ao inimigo comum ou aunque mayorias «enloquezcan»
Nesta altura, depois de tantos anos combatendo o ativismo (e seus derivativos), [2] em face da dramaticidade da situação das práticas decisionistas, talvez tenha chegado a hora de buscar alianças estratégicas com os positivistas exclusivos. Isso pode parecer estranho vindo de mim, mas é o contexto que vai ajudar a explicar essa minha denúncia. Convenhamos: estamos esticando a corda no limite do limite. Aliás, poderia citar aqui um conjunto de decisões de tribunais que ultrapassam os limites semânticos (para dizer o mínimo, sem precisar explicar o que entendo por esses limites). Por que é tão difícil cumprir a Constituição naquilo que são os mínimos limites interpretativos (por exemplo, o que é presunção da inocência)? É difícil entender que o Código Civil não pode ser substituído por princípios construídos à revelia de qualquer fonte social confiável (vejam minha concessão teórica neste ponto)?

Portanto, em face desse estado d’arte dramático — por exemplo, os requisitos para a decretação de prisões já de há muito estão sendo ignorados (e esses limites constam na lei) — talvez tenhamos que fazer uma aliança estratégica entre a hermenêutica (na forma antirrelativista que venho propondo, em que se deve decidir por princípio e não por politica, moral, etc.) e alguns pressupostos do positivismo exclusivo, mormente na versão de Raz e Shapiro, defendido no Brasil por autores como Bruno Torrano [3] e André Coelho [4], que consideram que o positivismo é uma análise viável — quem sabe ainda a melhor — da e para a teoria do direito. Discordâncias à parte e examinando a decisão do STF, reconheço que o positivismo exclusivo pode contribuir sobremodo para uma crítica eficaz à essa decisão e ao ativismo que se espalha cada dia mais no país. Isto porque o Direito Penal e Processo Penal são questões de legalidade formal e material e não é o positivismo ou a hermenêutica que vão fazer que isso seja melhor ou pior. Isso tem a ver, sim, com o fato de que a jurisdição só pode ampliar e não restringir direitos. De novo: eis a legalidade indispensável, aunque mayorias «enloquezcan», como diz Diaz. Dizendo de outro modo: face a uma epidemia epistêmica que coloca em risco o direito, lutemos juntos.

Sempre levando em conta o contexto — e isso não quer dizer que cada uma das posturas abra mão de premissas e conceitos —, admito que Raz tem teses que podem servir para melhorar a prática judicial (claro que há outras teses que podem ser úteis, como, por exemplo, as teorias discursivas e a teoria dos jogos de Alexandre Morais da Rosa; mas aqui falo de uma inserção mais radical contra esse EEI - Estado de Exceção Interpretativo, esseinterpretative black holl que que tomou conta do direito brasileiro). Deve haver possibilidades de determinações objetivas no direito. Falei disso na coluna passada, ao fazer críticas a teoria dos jogos no processo, de Alexandre Morais da Rosa (ler aqui). Parece-me que o conceito de preempção de Raz pode contribuir na discussão sobre a presunção da inocência. Razões pessoais, políticas, argumentos de segurança pública, etc.,não podem valer mais do que a Constituição, para ficar no ponto contextualizado. Eis o ponto em comum para meu “plano salvacionista”.[5]

Portanto, em face de um inimigo comum, estendo a mão. [6] Se muitas coisas já vão mal no país, não podemos deixar que argumentos de política, pessoais (moral individual) e utilitaristas — e tenho escrito sobre isso à saciedade — venham a colocar em risco aquilo que de mais precioso construímos: a Constituição de 1988 e seu catálogo de direito e garantias fundamentais.Salvemos e preservemos o direito! E não repitamos erros do passado, quando a doutrina aplaudiu decisões “criativas” porque eram “do bem”. Quando se admite violar a Constituição para cima, já quebramos a cláusula que impede que a Constituição seja violada para “baixo”. De novo: pau que bate em Chico...

Post scriptum: Curiosidade — o pau que bate na "lava jato" bate no japonês?
Não. Não bate. O japonês da federal (JdF) é a prova viva de que o sistema é seletivo. O problema é a lei e a CF ou a sua aplicação? Claro que é a sua aplicação. Bom, no caso JdF, este se beneficiou de tudo aquilo que a justiça federal, hoje, critica e nega para os demais (ler aqui). A justiça federal e o MPF dizem que meras irregularidades (sic) não anulam provas. Pois o JdF se beneficiou da anulação de PAD por “mera irregularidade” (sic). Se não fossem os 12 anos de atraso nesse processo, JdF não teria se beneficiado de prescrição de parte da pena. E como seu recurso está no STJ, poderia estar cumprindo pena... justamente em face da nova posição do STF. Bingo. Em vez disso, desfila todo pimpão liderando os atos de aprisionamento, virando até ídolo. Pobre país em que pau que bate em alguns, não bate em outros. A propósito, Elio Gaspari lembra de uma questão bizarra. É que “a defesa de Ishii [é o nome do JdF] diz que, entre as provas apresentadas contra ele, há transcrições adulteradas de telefonemas interceptados (alô, alô, "lava jato")” (ler aqui) Binguíssimo!


1 DÍAZ, Elias. Socialismo democrático: instituciones políticas y movimientos sociales. Revista de Estudios Políticos (Nueva Epoca), n. 62, out-nov, 1988. p. 50-51.


2 Aqui me refiro aos meus textos e livros, assim como os de meus ex-alunos, alunos e parceiros – todos brilhantes - como Rafael Tomaz de Oliveira -Decisão Judicial e o Conceito de Princípio; Francisco Borges Motta - Levando o Direito a Sério: uma crítica hermenêutica ao protagonismo judicial; Clarissa Tassinari - Jurisdição e ativismo judicial: limites da atuação do Judiciário; Mauricio Ramirez - Crítica à aplicação de precedentes judiciais no Direito Brasileiro. Porto. Alegre: Livraria do Advogado, 2010; Danilo Pereira Lima – Constituição e Poder, todos da Editora Livraria do Advogado; Dierle Nunes - Processo Jurisdicional democrático: uma análise crítica das reformas processuais (Juruá Editora); Alexandre Bahia - Recursos extraordinários no STF e STJ (Juruá Editora; Marcelo Cattoni - Devido Processo Legislativo: Uma justificação democrática do controle jurisdicional de constitucionalidade das leis e do processo legislativo. (Editora Fórum); Georges Abboud – Discricionariedade Administratriva e Judicial (RT) e tantos outros que aqui não há espaço para referir. Que se sintam citados.

3 Embora Torrano seja um crítico ferrenho de algumas posições minhas, penso que temos um inimigo comum. Por todos, veja-se a interessante crítica ao decisionismo no artigo intitulado Supremo Tribunal Federal não pode ter papel iluminista no Estado; também O direito não é o que você pensa ser justo; e Regra de reconhecimento como contenção ao ativismo judicial

4 Também crítico da hermenêutica, André Luiz de Souza Coelho é um teórico versado na explicitação do que seja o positivismo exclusivo. Dele, sugiro: Raz: Direito, autoridade e positivismo exclusivo, 20 nov 2012. Também importante ler: Raz: razões de primeira, de segunda ordem e autoridade; ainda: "Legality", de Scott J. Shapiro: Uma Introdução".


5 Há um texto muito interessante de Wil Waluchow, Constitutional Rights and the Possibility of Detached Constructive Interpretation, em que ele tenta aproximar Raz e Dworkin para dissolver o conflito entre jurisdição constitucional e democracia (ler aqui). Nessa linha de ligação ou pontos comuns entre Dworkin e Raz, Torrano admite que talvez o maior problema esteja no fato de Raz não estabelecer um modus interpretativo tão claro e convincente como Dworkin fez no Império do Direito, e muitas vezes fica restrito a coisas que acha ser meras “descrições”, quando na verdade há um potencial “normativo” muito forte.


6 De minha parte, como é sabido, minhas diferenças teóricas em relação aos diversos positivismos são de cunho paradigmático-filosófico. Na especificidade, em relação ao positivismo exclusivo o problema reside no seu objetivismo. Mas são questões que não interessam, aqui, neste momento. Quem quer ler mais sobre o positivismo exclusivo, sugiro os textos de Thomas Bustamante - A breve história do positivismo descritivo: o que resta do positivismo jurídico depois de H. L. A. Hart? Novos Estudos Jurídicos (Online), v. 20, p. 307-327, 2015 e deste com Igor Eneiquez - Direito, Estado e Autoridade em Kelsen, Schmitt e Raz. Revista Direito e Práxis, v. 6, p. 81-110, 2015.


Lenio Luiz Streck é jurista, professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do Escritório Streck, Trindade e Rosenfield Advogados Associados:www.streckadvogados.com.br.



Revista Consultor Jurídico, 25 de fevereiro de 2016, 8h00

Obama sofrerá resistência atípica na indicação de juiz para a Suprema Corte







Há pouco mais de uma semana, faleceu o justice Antonin Gregory Scalia, da Suprema Corte norte-americana. Nomeado pelo republicano Ronald Reagan, Scalia era conhecido sobretudo por seu notável conhecimento jurídico e por suas ideias conservadoras.

Os anais da corte registram um sem número de casos de grande repercussão em que Scalia se manifestou. Citem-se os precedentes envolvendo direitos de homossexuais, a adoção de sistema público de saúde, ações afirmativas, imigração, controle de armas, pena de morte e aborto. Em todos esses, Scalia manifestou-se favoravelmente aos interesses conservadores, hoje em dia capitaneados pelos partidários republicanos.

Em 2000, no julgamento de Bush v. Gore [1], Scalia se uniu à corrente vencedora, quando a Corte determinou a suspensão da recontagem dos votos suspeitos captados em favor do candidato republicano George W. Bush.

Como se sabe, o poder de tomar decisões políticas é atribuído, normalmente, a órgãos representativos, cujos membros são depositários de votos populares. Os mandatos dos membros dos órgãos representativos, ademais, são temporários, para que possam ser substituídos, na hipótese de não mais representarem aqueles que neles confiaram.

Scalia estava no cargo há quase 30 anos e nele foi alçado sem receber nenhum voto dos americanos. Não obstante isso, a sua convicção política alterou, significativamente, a forma com que milhões de cidadãos iriam viver as suas vidas.

De onde vinha a legitimidade democrática de Scalia e dos membros da Suprema Corte para tomarem decisões políticas?[2]

Essa pergunta comporta algumas respostas possíveis. Uma delas é a do mecanismo de seleção dos magistrados.

Nos Estados Unidos, como no Brasil, o método de investidura dos juízes de Suprema Corte é composto da indicação do presidente da República e da aprovação do nome indicado pela maioria absoluta dos membros do Senado. Nos Estados Unidos, a sabatina dos indicados é um procedimento altamente politizado. A vida pregressa, inclusive a conduta política dos candidatos, é examinada e debatida exaustivamente. Por isso, os nomeados são, em regra, juristas ideologicamente alinhados com o chefe do Executivo e com o Parlamento.

Nesse sentido, quando o assunto é método de escolhas, uma pergunta que costuma vir à tona é esta: por que não um método exclusivamente meritocrático de seleção de juízes constitucionais? A resposta é simples.

Anualmente, a Suprema Corte julga dezenas de hard cases, assim chamados os casos onde não há resposta pronta na Constituição e que, por isso, transcendem a fronteira do direito e penetram na seara política, no que se incluem os casos citados acima. Isso significa que os desideratos ideológicos dos nove membros que compõem a Corte vão influenciar substancialmente a vida dos cidadãos.

A figura dworkiana do juiz Hércules [3], capaz de lutar contra tudo e contra todos para proferir uma decisão absolutamente neutra [4], está superada. Há muito, a hermenêutica constitucional comprovou a influência que as pré-compreensões exercem sobre a produção de conhecimento.

Assim, atribuir aos detentores de legitimidade eleitoral o poder de investidura faz com que os membros dos tribunais não estejam muito afastados ideologicamente da opinião pública majoritária. A importância disso decorre do fato de que, afinal, a Suprema Corte não consiste em órgão meramente legal, mas instituição política, na medida em que decide questões politicamenterelevantes [5].

É claro que o procedimento não está isento de falhas. Poder-se-ia dizer que a opinião pública majoritária do momento em que Scalia foi sabatinado e a atual são diferentes, opostas até. Com efeito, nenhum sistema será perfeito, na medida em que o excesso de alinhamento político entre o magistrado e a opinião pública acabaria comprometendo a independência judicial, igualmente necessária à jurisdição constitucional. O que se busca é uma escolha proporcional entre independência e alinhamento político.

Em suma: a escolha presidencial e a arguição altamente politizada [6] do Senado, que leva em conta diversos fatores, como o passado, a vida pública e privada e a personalidade do candidato, é essencial à democracia, além de mitigar a crítica, comumente atribuída à jurisdição constitucional, dadificuldade majoritária e da legitimidade que decorre do voto dos cidadãos.

Por que, então, Obama sofrerá resistência no Senado?

Primeiro, porque o partido democrata detém 44% (do total de 100, os republicanos têm 54 e os democratas 44 e dois são independentes) das cadeiras no Senado. Isso significa que, em tese, a maioria absoluta dos membros do Senado só aprovaria um candidato cuja ideologia seria alinhada com os republicanos.

Some-se a isso o fato de que o presidente se encontra no último ano de mandato. Quando o presidente está em vias de deixar o cargo, a legitimidade democrática, que poderia ser transferida ao candidato, é proporcional ao tempo de mandato remanescente. É que, em pouco tempo, outro presidente será o detentor das credenciais democráticas de que goza um presidente eleito. Ele será democrata ou republicano. Haveria, assim, a carência de um dos pilares de transferência de legitimidade democrática ao sabatinado.

Imagine-se, assim, a seguinte situação. A posse do presidente dos Estados Unidos ocorre no dia 19 de janeiro do ano seguinte às eleições. Contudo, em outubro do ano eleitoral já é possível saber o nome do candidato eleito. Suponha-se que o presidente eleito seja ideologicamente diferente do presidente que deixa o cargo. Entre outubro e o dia 19 de janeiro do ano seguinte, o presidente derrotado pode escolher um juiz para a Suprema Corte. Todavia, essa escolha poderá carecer de credenciais democráticas que os juízes constitucionais recebem da legitimidade presidencial. No Brasil, esse ponto é menos evidente, uma vez que, em virtude sobretudo da existência da figura da aposentadoria compulsória, os presidentes nomeiam, normalmente, bem mais juízes que os presidentes norte-americanos. Portanto, não há nada de estranho que a resistência ao candidato de Obama seja de certo modo atípica na atual conjuntura.

Caso o presidente Obama decida escolher o sucessor de Scalia, ele deverá indicar jurista técnico e neutro, que seja palatável aos senadores republicanos.

Sendo assim, um candidato como Laurence Tribe, conhecido por ser um acadêmico liberal, dificilmente veria seu nome aprovado, a despeito de ser um dos mais respeitados professores de direito constitucional dos Estados Unidos.

Srikanth Srinivasan, juiz do segundo tribunal mais importante dos Estados Unidos, o District Columbia District Court. Srinivasan foi indicado e nomeado ao Tribunal de Apelação por Obama, após votação unânime no Senado, composto por republicanos como Ted Cruz e Marco Rubio. Além disso, Srinivasan exerceu cargo importantíssimo na chefia do Ministério Público, no governo Bush, o que lhe confere característica de neutralidade ideológica. É um dos nomes que, segundo especialistas, teria menos dificuldade em alçar ao “templo de mármore”.


1 Bush v. Gore (531 U.S. 98 (2000))


2 Para uma análise pormenorizada, V. Rodrigo Brandão, Supremacia judicial versus Diálogos constitucionais: a quem cabe a última palavra sobre o sentido da Constituição?.


3 V. Ronald Dworkin, o império do Direito.


4 Essa síntese da figura extraída de Ronald Dworkin, o império do Direito, é colhida de Patrícia Perrone Campos Mello. Cf. http://www.conjur.com.br/2016-jan-17/entrevista-patricia-campos-mello-professora-direito-uerj


5 Robert Dahl, Democracy and its critics.

6 Desde a independência norte-americana, o Senado já rejeitou 25 indicados para o Supremo Tribunal, cerca de 20% dos nomes escolhidos.


João Carlos Velloso é advogado e membro do Centro Brasileiro de Estudos Constitucionais (CBEC).



Revista Consultor Jurídico, 25 de fevereiro de 2016, 7h45

Justiça do Trabalho é competente para julgar recurso contra sentença federal





A Justiça do Trabalho é competente para julgar recurso em processo cuja sentença foi dada pela Justiça Federal. Esse foi o entendimento firmado pela 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho ao negar provimento a agravo da União. A ação diz respeito a uma penalidade administrativa imposta a uma empresa por um subdelegado do Trabalho em 1995, antes da Emenda Constitucional 45/2004, que ampliou a competência da Justiça do Trabalho.

De acordo com o processo, o caso aconteceu em São Bernardo do Campo (SP). Na época, as ações judiciais sobre penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização eram julgadas pela Justiça Federal. O processo chegou a ser sentenciado por um juiz federal antes da entrada em vigor da EC 45/04. No entanto, durante a tramitação de recursos, a emenda entrou em vigor, e a Justiça Federal declinou da competência e encaminhou os autos à Justiça do Trabalho.

A Advocacia-Geral da União apresentou recurso questionando a competência da Justiça do Trabalho e solicitando que o processo continuasse na Justiça Federal. O argumento era o de que, como já havia decisão de mérito proferida por juiz federal, o recurso deveria ser processado pelo Tribunal Regional Federal, em observância ao direito processual adquirido.

A AGU chegou a citar entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal de que as ações que tramitam perante a Justiça comum e Federal, com sentença de mérito anterior ao deslocamento da competência, deveriam continuar até o trânsito em julgado e correspondente execução. No entanto, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) manteve a competência da Justiça do Trabalho.

O processo chegou ao TST em novo recurso da União. O relator, ministro Walmir Oliveira da Costa, explicou que a questão não tem qualquer pertinência com a competência recursal do TRF, mas com a competência atribuída à Justiça do Trabalho pela Emenda 45. Assim, afastou a alegação de violação dos artigos 5º, inciso XXXVI, e 108, inciso II, da Constituição Federal, conforme exige o artigo 896 da CLT, e observou que, por se tratar de decisão proferida pela Justiça do Trabalho, seria necessário apontar violação do artigo 114, inciso VII, que trata da matéria.

Segundo o relator, a União não apresentou nenhum argumento jurídico capaz de afastar a fundamentação da decisão do TRT-2. Ao negar provimento ao agravo, Walmir Oliveira da Costa advertiu "para as penalidades previstas em lei à parte que se utiliza abusivamente dos meios recursais disponíveis". Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

Processo 112340-92.2005.5.02.0465



Revista Consultor Jurídico, 25 de fevereiro de 2016, 8h58

Juiz não reconhece fraude à execução em venda de imóvel antes do início da ação trabalhista





Na 2ª Vara do Trabalho de Uberaba, o juiz Henrique Alves Vilela acolheu os embargos de terceiro opostos pela proprietária de um imóvel residencial que havia sido penhorado em uma ação trabalhista. Ele constatou que o imóvel foi vendido à embargante por dois dos executados (réus) no processo, mas antes do início da ação que gerou a dívida trabalhista. Assim, o julgador entendeu que a embargante adquiriu o imóvel de boa-fé e descartou a existência de fraude à execução, determinando a desconstituição da penhora efetuada sobre o bem.

A fraude à execução consiste na alienação de bens quando já estiver em curso ação capaz de reduzir o devedor à insolvência, ou seja, quando ele não mais consegue saldar suas dívidas ou cumprir suas obrigações. É que a venda de bem imóvel no curso da ação leva à diminuição do patrimônio do devedor, de forma a tipificar a fraude à execução.

Mas, no caso, ficou comprovado que o bem foi negociado pelos executados antes do início da reclamatória trabalhista movida contra eles. Isso pôde ser verificado pelo juiz pela data da escritura pública de compra e venda do imóvel, anterior ao ajuizamento da ação, levando-o a concluir que a embargante o adquiriu de boa-fé.

Para o julgador, o fato de a embargante não ter registrado a escritura de compra e venda - o que acabou levando à penhora do bem por se presumir que ainda pertencia aos executados - não afasta a existência da transação do imóvel em maio de 2009, muito anterior a 2011, ano em que teve início a reclamação trabalhista movida contra os executados. "Dessa forma, não se pode dizer que os antigos proprietários alienaram o imóvel para a Embargante quando contra eles existia processo capaz de reduzi-los à insolvência, razão de não se aplicar o disposto no artigo 593, inciso II, do CPC, que trata da fraude à execução", finalizou o juiz. Ainda poderá haver recurso da decisão ao TRT/MG.
PJe: Processo nº 0011289-67.2015.5.03.0042. Data de publicação da decisão: 20/01/2016

Para acessar a decisão, digite o número do processo em: 






Fonte: TRT3

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