terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

ATUALIZAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR




Fonte: tviab

No dia 24/09/2012, foi aberto o CICLO DE PALESTRAS SOBRE A ATUALIZAÇÃO DO CDC no IAB, com palestra da Profª. Cláudia Lima Marques, que discorreu sobre ATUALIZAÇÃO: PRINCÍPIOS E PANORAMA GERAL. Fez menção ao protagonismo do IAB nos trabalhos de Atualização do CDC que foram em grande parte acolhidos pela comissão de notáveis que elaborou os 3 Anteprojetos que hoje constituem os PLS 281/2012-







Propaganda de imóvel que decepciona comprador não é enganosa, julga TRF-2



Um produto que não atende à expectativa do consumidor não caracteriza propaganda enganosa. No entanto, reclamar disso na Justiça também não é litigância de má-fé. O entendimento é da 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que reformou decisão de instância anterior no caso um homem que processou um banco estatal e uma empreiteira por considerar que foi lesado na compra de um imóvel.

Na primeira instância o consumidor não só perdeu o processo como foi sentenciado a pagar 5% do valor da causa por litigância de má-fé. Esse foi o único ponto reformado em segunda instância. O relator do processo no TRF-2, desembargador Guilherme Calmon, entendeu não estarem presentes os pressupostos que caracterizariam a má-fé: “Não se vislumbra a prática de conduta típica, consubstanciada em suposta alteração da verdade dos fatos jurídicos alegados em juízo ou prática de conduta de modo temerário”, pontuou o magistrado.

O consumidor procurou a Justiça Federal em busca de reparação por conta de sua decepção com a qualidade da obra, pela falta do Habite-se (documento comprobatório de que a obra realizada está pronta para morar e de acordo com as exigências expostas na lei) e por suposta cobrança indevida. Ele pretendia ser indenizado por propaganda enganosa e danos morais, e pedia que as prestações do imóvel fossem refinanciadas.

O acórdão confirmou o restante da sentença, tendo em vista que o relator entendeu que apesar das alegações defendidas em sua petição inicial, o autor não comprovou que houve propaganda enganosa, nem que as condições do imóvel estejam em desacordo com aquelas combinadas no momento que foi fechado o financiamento. Quanto ao pedido de indenização por danos morais, Calmon considerou que a cobrança das prestações é válida, afinal não houve atraso na entrega do imóvel e nem mesmo a ausência do Habite-se chegou a prejudicar ao autor, que ocupou o imóvel, mesmo sem o documento. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-2. 

Processo 0019890-67.2011.4.02.5101

Fonte: Brasilcon

Tribunal mantém decisão que responsabiliza concessionária por acidente em estrada mal sinalizada




A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, manter o acórdão emitido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que responsabilizou solidariamente a Autopista Litoral Sul por um acidente em rodovia pedagiada, decorrente de má sinalização de obras.

Em primeira instância, apenas o condutor do veículo que causou o acidente havia sido condenado a indenizar a vítima. O acidente ocorreu em 2009, em um trecho da BR 101, próximo a Florianópolis (SC). Um veículo fez uma conversão proibida, atravessando cones que sinalizavam a obra, e chocou-se contra uma moto. A condutora da moto ficou tetraplégica em decorrência do acidente.

Sentença reformada

Ao recorrer para o TRF4, a vítima obteve sucesso, tendo a sentença sido reformada em acórdão que condenou solidariamente a concessionária responsável pelo trecho (Autopista Litoral Sul) e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT). Além de pensão, os réus foram condenados ao pagamento de indenização por danos estéticos e morais, mais a aquisição de uma cadeira de rodas para a vítima.

Inconformada com a decisão, a Autopista Litoral Sul recorreu para o STJ alegando que o acidente fora causado em um trecho em obras de responsabilidade do DNIT – o que, portanto eximiria sua responsabilidade – e que não era possível estabelecer o nexo causal entre a possível falha de sinalização na rodovia e o acidente causador da lesão permanente na vítima.

Os argumentos foram rejeitados pelos ministros. Para o relator do recurso, o desembargador convocado Olindo Menezes, não há indícios de irregularidade no acórdão do TRF4, e não é possível reexaminar o mérito da questão. Logo, não é possível fazer novo questionamento com relação à existência ou não de nexo causal entre a má sinalização da obra e o acidente. Também não é possível discutir o valor da indenização por danos estéticos e morais.

Caso semelhante

O desembargador apontou que o STJ já examinou de forma detalhada uma situação semelhante envolvendo a responsabilidade de empresas que administram rodovias. A conclusão foi enfática ao estabelecer o vínculo de responsabilidade.

O voto destacou decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que, ao julgar o RE 327.904-1/SP adotou a tese da dupla garantia, de forma a garantir ao particular a possibilidade de ingressar com ação indenizatória contra a pessoa jurídica de direito público ou de direito privado que preste serviço público. O STF frisou a possibilidade quase certa de obtenção do pagamento do dano.

Com a decisão, é mantido o entendimento de que a empresa detentora da concessão para explorar rodovia é responsável solidária no caso de acidente em que foi comprovado, no decorrer do processo, que a falta de sinalização em obra provocou acidente, causando lesão permanente a pessoas. Destacou o relator que “se estabeleceu automaticamente uma relação de consumo entre a vítima do evento e a recorrente (concessionária do serviço público)”.

Fonte: STJ

Juiz nega adicional de transferência a trabalhador que continuou residindo na cidade para a qual foi transferido



O adicional de transferência é devido sempre que o empregador transferir o empregado, por necessidade de serviço, para localidade diversa da que resultar do contrato, enquanto durar a transferência. Ou seja, ela tem de ser, obrigatoriamente, provisória. Isso, aliás, é o que dispõe o artigo 469 da CLT, que é expresso ao não considerar como "transferência" a que não acarretar necessariamente a mudança do domicílio do empregado.

Com base nesses fundamentos, a juíza Cristiana Soares Campos, titular da 5ª Vara de Trabalho de Uberlândia-MG, negou o pedido de um trabalhador que pretendia receber o adicional de transferência. A magistrada constatou que, mesmo mais de um ano após o encerramento do contrato de trabalho com a ré, o trabalhador ainda continuava morando na cidade para a qual ele havia sido transferido. Assim, ela concluiu que a transferência do reclamante foi definitiva, não lhe gerando o direito ao recebimento do adicional.

No caso, o reclamante alegou que foi admitido em Divinópolis, na função de vendedor, e depois assumiu a função de gerente, quando foi transferido para Uberlândia-MG, sem que lhe fosse pago o adicional de transferência que lhe era devido. Mas, segundo concluiu a julgadora, a transferência do reclamante para a cidade de Uberlândia não pode ser considerada provisória. Em sua análise, ela observou que a mudança ocorreu a requerimento do próprio trabalhador, que se inscreveu para concorrer à vaga de gerente aberta em Uberlândia e, pelo menos até a data de ajuizamento da ação (09.07.2014), mais de um ano depois da rescisão do contrato de trabalho (04.06.2013), ele ainda residia nessa cidade. "Tal circunstância demonstra que a transferência foi definitiva, caso contrário o reclamante não mais residiria em Uberlândia. Dessa forma, ele não tem direito ao adicional de transferência", destacou a magistrada.

A juíza ressaltou ainda que a Orientação Jurisprudencial 113/SDI/TST consagrou o entendimento de que o fato de o empregado exercer cargo de confiança ou a existência de previsão de transferência no contrato de trabalho não exclui o direito ao adicional. "O pressuposto legal apto a legitimar a percepção do mencionado adicional é a transferência provisória", finalizou. Ainda cabe recurso da decisão ao TRT de Minas.
Processo nº 01232-2014-134-03-00-8. Data de publicação da decisão: 22/01/2016
Fonte: TRT3

Turma acolhe contradita de testemunha que formulou pedidos de danos morais em outra ação contra o mesmo empregador





O simples fato de a testemunha estar demandando contra o mesmo empregador não a torna suspeita, sendo seu depoimento perfeitamente válido. Esse é o entendimento pacificado na Súmula 357 do TST. Mas e se a testemunha formular pedido de indenização por dano moral em face do empregador? Continua ela com isenção de ânimo para depor?

Segundo entendimento adotado pela 5ª Turma do TRT mineiro, expresso em voto do juiz convocado Frederico Leopoldo Pereira, se a testemunha pedir indenização por danos morais decorrentes de sofrimento imposto pelo empregador, deve ser acolhida a contradita. Isso em razão de presumirem um provável ressentimento nutrido pela testemunha em face do ex-empregador, fato esse que denotaria a ausência de imparcialidade para elucidação dos fatos. Como esclareceu o julgador, o dano patrimonial pode ser resolvido com o pagamento, o mesmo não ocorrendo em relação à ofensa que desencadeia o dano moral, a qual não há como ser relevada. Isso afasta a necessária isenção de ânimo da testemunha ao depor e, assim, a aplicação do disposto a Súmula 357 do TST.

Adotando essa linha de pensamento, o magistrado considerou que o depoimento prestado pela única testemunha ouvida no processo, contraditada pela empregadora, não prevalece como meio de prova hábil, devendo ser considerado como de um mero informante. Assim, na análise dos fatos narrados pelas partes, o juiz sentenciante deverá conferir ao depoimento o valor que possa merecer como informação, e não como prova.

Considerando que a única testemunha ouvida nos autos teve a contradita acolhida, e que o juiz de 1º Grau indeferiu a oitiva de outra testemunha sobre os mesmos fatos por já ter formado seu convencimento, o julgador, visando a evitar prejuízos para o trabalhador, determinou a reabertura da instrução com o fim exclusivo de que seja ouvida a segunda testemunha do trabalhador para que, só então, seja proferida nova sentença.( 0000805-92.2014.5.03.0182 RO )
Fonte: TRT3

NJ Especial: Rastreamento de dados e controle patronal do computador usado em serviço pelo empregado configuram invasão de privacidade?






Com a evolução da tecnologia da informação, muitas empresas passaram a exercer vigilância contínua sobre o que o empregado faz no computador utilizado no trabalho. As justificativas apresentadas para tanto são muitas, sendo as principais delas a defesa do patrimônio e questões de segurança. O respaldo para essa prática estaria na prerrogativa que a legislação confere ao empregador de conduzir o seu empreendimento.

De fato, o empregador possui o que se denomina "poder diretivo". São poderes inerentes à direção do negócio. Mas não se trata de um poder absoluto. O patrão não pode se esquecer de que suas ações devem se pautar pelo respeito aos direitos da personalidade do trabalhador, que são aqueles inerentes à pessoa ou personalidade humana, protegidos pela Constituição da República: honra, moral, integridade física e psíquica, nome, imagem, privacidade, intimidade, entre outros.

No que toca à questão específica da vigilância sobre computadores usados pelos empregados, em serviço, o assunto não é regulamentado e tem gerado polêmicas. Pouco a pouco, vai integrando a pauta da Justiça do Trabalho. Nesta NJ especial, veremos alguns casos envolvendo esse contexto e as soluções adotadas no âmbito do TRT da 3ª Região.Direito de fiscalização do empregador X direito à intimidade e privacidade do empregado

Sob alegação de desaparecimento de um software, uma empresa do ramo de informática registrou uma ocorrência policial e ainda instalou programas para rastrear dados e senhas dos usuários no computador em que o empregado trabalhava. Esta conduta foi detectada pelo próprio trabalhador, profissional da área de informática que, incomodado, ajuizou reclamação trabalhista pedindo a rescisão indireta do contrato de trabalho e o pagamento de indenização por danos morais.

A tese apresentada, de invasão de privacidade, foi acatada tanto pela juíza de 1º Grau quanto pelo TRT de Minas. Dois fatores pesaram para esse desfecho: a ré não negou os fatos alegados pelo trabalhador e uma perícia técnica confirmou a instalação dos programas de monitoramento no computador de trabalho logo após o registro da ocorrência policial. A condenação envolveu a declaração da rescisão indireta, por quebra da confiança entre as partes, e uma reparação por danos morais no valor de R$5 mil.

Em 1ª Instância, a reclamação foi examinada pela juíza Maritza Eliane Isidoro, na titularidade da 1ª Vara do Trabalho de Contagem. Com base nas informações prestadas pelo perito, a julgadora entendeu que a instalação de programas no computador usado pelo reclamante configurou invasão à privacidade dele. Na sentença, ponderou que a espionagem constatada só não durou mais tempo porque o reclamante é profissional da área e conseguiu identificar os fatos assim que ligou o computador no dia seguinte.

Para a magistrada, a conduta adotada, envolvendo o instrumento de trabalho do reclamante, foi considerada abuso do direito de fiscalização do empregador e um desrespeito à pessoa do trabalhador, além de invasão de privacidade.

Com base nesse contexto, o pedido de declaração da rescisão indireta do contrato de trabalho foi julgado procedente, sendo a reclamada condenada a cumprir obrigações próprias da dispensa sem justa causa. Consoante fundamentou a magistrada, "Deveras o liame de emprego entre as partes resta intolerável e insustentável, pois o ato de a reclamada instalar ou mandar instalar programas no microcomputador de trabalho do autor com o objetivo, que se não for no sentido de investigá-lo, no mínimo corresponde a ato de espionagem ou um meio de manter o empregado sob vigilância e às escondidas".

A juíza sentenciante também reconheceu que o reclamante sofreu dor e constrangimento pela invasão de sua privacidade e sensação de estar sendo vigiado, ¿espionado mesmo¿, conforme registrou. Por esta razão, a ré foi condenada a pagar indenização por danos morais no valor de R$5 mil ao ex-empregado.

A ré apresentou recurso, mas a 8ª Turma do TRT-MG manteve a sentença. Acompanhando o voto da juíza convocada Luciana Alves Viotti, os julgadores também reconheceram que o reclamante teve sua privacidade violada pela instalação furtiva/às escondidas de programas espiões na sua máquina de trabalho."Comprovado o ato antijurídico e o seu nexo de causalidade com a ofensa evidente ao patrimônio moral do Autor, sendo inquestionáveis, no caso, os danos (artigos 186 e 927 do CC c/c artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal)", foi registrado no acórdão. (Processo nº 02643-2011-029-03-00-4 - 18/12/2013)Monitoramento e chantagem

Em outro recurso examinado pela 8ª Turma, os julgadores confirmaram a sentença que condenou um sindicato a pagar indenização por danos morais no valor de R$10 mil a duas ex-empregadas. O caso também envolveu instalação pelo empregador de programa de monitoramento no computador utilizado pelas trabalhadoras no ambiente de trabalho. De posse de informações e conversas particulares obtidas, uma representante do sindicato chantageou as empregadas no sentido de pedirem demissão. Considerando ilícita a conduta, o juiz José Barbosa Neto Fonseca Suett, em atuação na 3ª Vara do Trabalho de Coronel Fabriciano, declarou a nulidade dos pedidos de demissão e converteu a dispensa em imotivada. Também nestes aspectos a sentença foi mantida, sendo o voto proferido pelo desembargador José Marlon de Freitas.

As provas revelaram que as reclamantes utilizavam o sistema disponibilizado pela empresa para travar conversas particulares, valendo-se de palavras inconvenientes ao se referirem às pessoas que compunham o ambiente de trabalho. Para o relator, contudo, esse comportamento não autoriza o empregador a constranger as empregadas a assinar um pedido de demissão. ¿A conduta patronal expôs as demandantes a situação degradante e vexatória incompatível com o momento atual vivenciado pela sociedade que prima pela proteção dos direitos da personalidade com destaque para a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho¿, destacou.

O relator repudiou veementemente a instalação pelo empregador de programa de monitoramento no computador que as reclamantes usavam, o qual permitia captar todas as informações digitadas. No seu modo de entender, a prática configura invasão de privacidade. "Considero que a Resolução nº 26/2007 do Conselho Estadual de Trabalho e Geração de Renda de Minas Gerais CETER não pode servir de escudo à pratica de monitoramento exercida pelo Sindicato, pois a adoção da Política de Segurança da Informática (PSI) vinculada à participação no Sistema de Gestão de Ações de Emprego - IGAE não pode representar autorização geral e irrestrita para a fiscalização perpetrada, inclusive de e-mails e bate papos particulares, sob pena de invasão de privacidade", destacou no voto, rebatendo argumentos do réu.

A decisão também levou em consideração o fato de não haver qualquer prova de que as reclamantes tivessem ciência da política praticada pelo réu, muito menos que tenham autorizado as gravações das conversas particulares (bate papo pelo Gmail, que é um serviço de correio eletrônico pessoal e não corporativo).

"A situação vivenciada pelas reclamantes foi passível de acarretar-lhes sofrimento de ordem moral, ficando, pois, configurados os elementos ensejadores da reparação, nos termos do artigo 186 do Código Civil", concluiu o julgador, confirmando o valor da indenização, fixada em R$10 mil. Para tanto, considerou não apenas o fato de ter havido monitoramento indiscriminado dos computadores e coação praticada pelo empregador, mas também a conduta antiprofissional praticada pelas autoras, ao travarem conversas particulares utilizando a ferramenta corporativa de trabalho. A decisão se referiu aos artigos 944, 953 e 884 do Código Civil". (Processo nº 00685-2013-089-03-00-6 - 04/02/2015).Bloqueio de e-mail corporativo e retenção de dados pessoais do empregado: conduta abusiva.

Outra situação que suscita muito ainda a pensar e discutir foi encontrada num caso julgado pela 1ª Turma do TRT de Minas. Uma empresa de fios esmaltados e produtos químicos dispensou um empregado, sem permitir que ele retirasse seus arquivos, fotos e documentos pessoais do notebook que utilizava no trabalho. O e-mail do trabalhador foi bloqueado, sendo solicitado que devolvesse o equipamento imediatamente. Ao analisar os pormenores do caso, a Turma considerou ilícita a conduta praticada pela ré. Dando provimento parcial ao recurso do reclamante, os julgadores modificaram a sentença para deferir indenização no valor de R$10 mil.

Atuando como relator, o desembargador José Eduardo de Resende Chaves Júnior reconheceu que a empregadora tem o direito de requisitar o notebook entregue para o desempenho das funções. Mas não poderia impedir o acesso do reclamante ao conteúdo ali depositado por vários anos. "A ré exerceu com excesso o seu direito de propriedade, configurando o abuso de direito passível, como tal, de indenização, na literalidade do artigo 187 do Código Civil, c/c art. 8° da CLT",concluiu.

A ré argumentou que seria ilógico o reclamante manter e-mails e arquivos pessoais no computador da empresa, por se tratar de ferramenta de trabalho. No entanto, o magistrado não viu nada de errado nessa conduta. É que o reclamante cumpria jornada estendida, trabalhando inclusive em feriados e fins de semana. Ele ficava com o notebook da empresa de forma contínua. O relator considerou muito natural que utilizasse o computador, bem como seu e-mail empresarial para fins pessoais.

"Não se vislumbra, aqui, motivo para que tal devolução e o bloqueio do e-mail fosse feita de forma abrupta, de molde a impedir que o autor pudesse retirar do equipamento suas informações pessoais", destacou, considerando abusiva e arbitrária a medida tomada pela empresa. Segundo ele, uma conduta que não pode ser tolerada pelo Judiciário, razão pela qual condenou a empresa a pagar ao reclamante indenização por dano moral, no valor de R$10 mil, tendo em vista a extensão do dano sofrido pelo reclamante, a culpa, o porte da reclamada e o caráter pedagógico da penalidade. (Processo nº 01466-2013-147-03-00-0 - 29/09/2014).Uso do PC para controle de pausas no trabalho: constrangimento e violação da intimidade.

Veja só essa história: depois de um tempo pré-fixado, o computador era bloqueado e os empregados tinham que se dirigir ao supervisor para desbloqueá-lo, informando o motivo da pausa. No programa havia campos para coffee break,treinamento, banheiro e reunião, que deveriam ser preenchidos pelo chefe. Esse foi o cenário que levou a 8ª Turma a dar provimento ao recurso de uma trabalhadora e condenar as duas empresas envolvidas ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 1 mil.

No entender da desembargadora Ana Maria Amorim Rebouças, a conduta violou a intimidade e privacidade da reclamante. "A limitação do tempo de uso do banheiro por meio do sistema de bloqueio dos computadores dos empregados, comprovado por prova documental e testemunhal, mesmo que tenha o objetivo de segurança para a empresa, caracteriza um constrangimento para a reclamante e para os demais funcionários, visto que, o simples fato de dar explicações pela demora na utilização dos sanitários deixa claro um objetivo de controle dos funcionários, além de violar direitos fundamentais como o da intimidade e o da privacidade", destacou no voto.

O valor da indenização foi fixado levando em consideração diversos aspectos, tendo como objetivo inclusive coibir práticas de constranger o empregado a explicar a demora na utilização dos sanitários. (Processo nº 0010435-82.2015.5.03.0039 - 29/07/2015).Violação pelo empregado de normas de segurança da informação: justa causa confirmada.

Uma situação diferente foi a constatada pela 8ª Turma do TRT-MG, ao julgar o recurso de uma reclamante que não se conformava com a decisão que manteve a sua dispensa por justa causa. Neste caso, o monitoramento das atividades dos computadores pela empresa de móveis reclamada foi acolhido como prova de que a empregada teria apagado e copiado arquivos. Após analisar as provas, o relator, desembargador Márcio Ribeiro do Valle, considerou correta a conduta e manteve a aplicação da pena.

Ouvido como testemunha, o responsável pelo monitoramento dos computadores da ré esclareceu como tudo aconteceu. Segundo ele, a cada minuto recebe um e-mail com um printdas operações realizadas pelo usuário. Em julho de 2014, percebeu pela via remota que vários arquivos estavam sendo deletados e copiados em um HD externo. Eram projetos e contratos, além de imagens.

A testemunha constatou que a reclamante figurava como usuária, sendo que a empresa não utiliza HD externo em seus computadores. O fato foi comunicado à administração da ré, que solicitou o bloqueio do usuário na respectiva máquina. Menos de 60% dos arquivos deletados foram recuperados. A testemunha esclareceu que os empregados eram advertidos de que seus arquivos pessoais salvos nos computadores da empresa não estavam submetidos a segurança.

Somado a isso, o julgador registrou que a própria reclamante deixou claro em seu depoimento que tinha interesse de deixar os quadros da reclamada. Ela contou que depois de tentar fazer, sem êxito, um acordo com a empresa ré para a sua saída, deletou arquivos de projetos de propriedade da empresa, sem autorização patronal. O relator constatou que este ato é expressamente proibido no Manual de Conduta Ética da empresa.

Também foram juntados ao processo um Termo de Ciência e Comprometimento e o contrato de trabalho assinados pela reclamante, todos no sentido de dar cumprimento ao Manual de Conduta Ética e Regulamento Interno da Empresa.

Portanto, o vasto acervo probatório levou o relator a reconhecer que a trabalhadora violou, direta e gravemente, as normas internas, bem como a propriedade intelectual da empresa, causando potenciais prejuízos comerciais a ela. A Turma reconheceu que a reclamante incidiu em grave ato de indisciplina e de desobediência, capaz de justificar, por si só, a aplicação da justa causa. (Proc. n. 02866-2014-186-03-00-7 - 14/10/2015).

Notícias jurídicas anteriores sobre o tema ou similares: 

28/08/2015 06:05h - NJ Especial: As redes sociais entram no processo 

19/08/2009 06:07h - Vigilância eletrônica abusiva gera indenização por danos morais 

14/01/2016 06:02h - Juiz mantém justa causa aplicada à empregada grávida que viajou durante período coberto por atestado médico 

28/12/2015 06:02h - Juíza desconsidera depoimento de testemunha ao constatar amizade íntima com a reclamante em fotos no Facebook 

10/07/2015 10:45h - NJ Especial: Liberdade de expressão no trabalho 

19/06/2015 08:40h - NJ Especial - Princípio da conexão liga o processo ao mundo de informações virtuais 

19/09/2014 06:06h - Relacionamento em Facebook não caracteriza amizade íntima capaz de invalidar depoimento de testemunha 


Fonte: TRT3

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Existe montinho artilheiro epistêmico na teoria da decisão jurídica?







A grande temática sobre a qual venho me debruçando é a teoria da decisão jurídica. Sou adepto de um tipo de tese que pretende, a partir de uma criteriologia e apostas na responsabilidade política dos juízes, controlar as decisões, diminuindo consideravelmente o grau de subjetivismo, discricionariedade, para não falar da arbitrariedade. Falo sobre isso em Verdade e Consenso e Jurisdição Constitucional e Decisão Jurídica (cinco princípios-padrões a serem obedecidos, seis hipóteses de [des]aplicação da lei, três perguntas iniciais, demais perguntas que estão no capítulo específico no JC&DJ, etc.). O rechaço de qualquer relativismo parece ser um bom início nessa caminhada. Falo de teoria da decisão e não de um agir estratégico reservado ao advogado.


Do mesmo modo que, no cotidiano, o juiz não pode chamar um copo d’agua de ônibus, igualmente não pode dizer que, onde está escrito x, leia-se y (isso independe de critérios; aqui entra a autoridade da tradição). Por isso aposto em uma criteriologia que tenha o condão de fazer certo controle dos e nos “inconscientes”, “dos e nos subjetivismos”, “da fome dos juízes que ainda não almoçaram”, etc.. Juiz tem subjetividade, óbvio (mas, atenção: pré-compreensão não é o mesmo que subjetividade, preconceitos, ideologia, vontade);[1] tem inconsciente, evidente; mas não pode dizer o que quer sobre o Direito.


Para mim, é nisso que reside o papel do “fator Julia Roberts”: constranger epistemicamente. Não podemos sufragar, em tempos de linguistic turn, teses pelas quais, ao fim e ao cabo, o Direito (só) se realiza na decisão. No fundo, isso é reforçar o privilégio cognitivo dos juízes (PCJ). Se o Direito só se realiza na decisão, só resta aos juristas voltarem para casa. E aos clientes... contratar legal coaches e personal trainers jurídicos.


E aqui chego no ponto de hoje. Esta coluna tem o intuito de fazer uma reflexão, com muito carinho e profundo respeito, para com o que disse o meu querido Alexandre Morais da Rosa na coluna No jogo processual, é importante conhecer o fator Julia Roberts (ler aqui). Transcrevo a parte mais incisiva e que vai “no rim” de minha concepção, porque inclui na decisão exatamente o que, para mim, deve ficar de fora:


“A Teoria da Tomada de Decisão precisa ser atualizada, justamente para inserir os mecanismos contingentes do contexto, do sujeito humano julgador (mapa mental e emoções), que podem mudar a decisão pelo detalhe (efeito borboleta)”.


Em um parágrafo, Morais da Rosa lança o desafio e faz a crítica da década à hermenêutica. A provocação é ótima. Isso me permite fazer um pequeno esclarecimento na perspectiva de marcar uma posição hermenêutica, para que se possa abrir um canal de discussão de posições que — como bem já disseram Aury Lopes Jr. e Claudio Melim — objetivam uma profunda democracia, só que os caminhos são distintos.


Como demarco minha posição para diferenciar dessa tese de Morais da Rosa? Vamos lá. Parece-me claro que Morais da Rosa está propugnando por uma retomada do subjetivismo para compor um quadro de análise do processo decisional. O trecho ressalta uma dimensão quase personalista, que, ao fim e ao cabo, se sobrepõe aos instrumentos “exteriores” de limitação do poder decisório. É nisso que ocorre uma bifurcação em nossos caminhos.[2] E esse retorno de Morais da Rosa ao esquema sujeito-objeto fica mais nítido ainda quando fala sobre a importância dos gestos e atitudes das testemunhas, na sua coluna Engane-me se puder: a linguagem corporal entra no jogo processual? (ler aqui). Essa volta ao paradigma da subjetividade é tão flagrante que ele chega a sugerir, ao se referir à decisão do juiz do trabalho de Porto Alegre que anulou um testemunho por causa dos seus gestos (ler aqui), que, diante disso, o advogado deveria levar isso em conta e se preparar para a próxima audiência. Se entendi bem, Morais da Rosa quis dizer: o juiz não está errado. Isso é assim mesmo. O advogado é que deve se adaptar ao “jogo”. E montar uma estratégia. Logo, processo é um jogo. Mas, permito-me indagar: esse não é um jogo antidemocrático, em que a regra é feita pelo juiz (por sua intuição/cognição)? Particularmente, para enfrentar esse juiz, eu tomaria uma medida judicial para afastá-lo por pré-julgamento e total ausência de imparcialidade (entendida comofairness). Não vai funcionar? Bom, para isso que luto. Para mudar isso. Por isso tanto lutei para colocar coerência e integridade no novo Código de Processo Civil, tirar o “livre” do convencimento e ajudei no artigo 489.


Explico, no pequeno espaço da coluna, as razões pelas quais essa questão dos “mecanismos contingentes” (o aleatório), as emoções do sujeito-julgador, etc. é vista de outro modo pela hermenêutica. Heidegger e Gadamer levam o pensamento para uma dimensão na qual não se tenha como ponto de partida a subjetividade assujeitadora do mundo. A propalada contingência decisional está assentada nos elementos volitivos do agente decisor. É o velho problema que ocupa os filósofos desde o medievo: afinal, a Razão controla a vontade ou, ao contrário, a Razão está sempre assujeitada pela vontade? A hermenêutica (fenomenologia hermenêutica e a CHD dela derivada) que ir além desse dualismo, buscando colocar o problema retratado para além (ou fora) do sujeito, num espaço em que os projetos de sentido são controlados pela linguagem. Não se mata o sujeito da relação de objetos, como bem já explicou tantas vezes Ernildo Stein. Mas nos obrigamos a retirar essa subjetividade que assujeita os objetos. Como afirma Gadamer, na modernidade emerge uma espécie de “cegueira da vontade” (“diabolia da vontade”, nas palavras de Heidegger). É preciso se contrapor a essa “compulsividade” da vontade, sempre sujeita às contingências. E isso se faz em uma abertura com a linguagem pública, intersubjetiva, em um mundo que não é meu, é sempre compartilhado.[3] Ou seja, trazendo isso para a decisão jurídica, em vez de nos perdemos no universo particularista das vontades individuais e emoções do sujeito julgador, deve(ría)mos investir na prospecção e descrição fenomenológica do sentido publicamente compartilhado e que deve(ria) sustentar/legitimar as decisões judiciais.


Voltando para o belo, sedutor e erudito — como é do seu feitio — texto de Morais da Rosa: o paradoxo está no fato de que, se ele tem razão — pode ter, mas espero que não tenha — não haverá propriamente uma teoria da tomada da decisão. De que modo posso teorizar algo se o imponderável (fazendo uma alegoria com o futebol, uma espécie de montinho artilheiro epistêmico) pode mudar a decisão? Morais da Rosa diz que a decisão exige um certo jogo. Mas, permito-me indagar: mas algo há de sustentar o jogo que, por sua vez, sempre tem regras, pois não?


Como “teorizar” os gestos, o detalhe ou o efeito do efeito borboleta, que pode ser um tropeço em uma pedra que o juiz deu pela manhã ou qualquer outra coisa? Lembro-me que, quando menino — meu pai era uma fera — fui encarregado por minha irmã para pedir a ele para que a deixasse ir ao baile no salão da vila. Com meu jeito brincalhão e fazendo os pedidos no estilo de narração de futebol, por vezes obtinha sucesso. Lembro que, no momento em que havia terminado a narração (usava o “abrem-se as cortinas” do Fiori Giuliotti), meu pai, que estava carregando uma tábua em direção ao estábulo, tropeçou violentamente em uma pedra. E, em vez de dar a permissão à minha irmã, deu-me um tabefe. Sim, contingencias. Efeito borboleta.[4] Só que meu pai não era juiz. Nem havia regras ou Constituição que lhe pudessem constranger a agir de modo correto. E não havia, para mim e minha irmã, uma corregedoria ou instância recursal. Não havia um duty, um dever, que impusesse ao meu pai agir de outro modo” — meu pai não tinha esse dever — ao contrário dos juízes, que detém responsabilidade política e que, portanto, have a duty to, ou seja, têm o dever de aplicar o Direito corretamente. Por isso, minha insistência em uma teoria da decisão com “objetividades hermenêuticas” (texto-evento, tradição, etc.) que consigam amarrar “as emoções” do sujeito-julgador. Afinal, o esquema sujeito-objeto já foi superado. Ou não?


Por isso, uma teoria da decisão deve procurar criar condições de previsibilidade. Garantir que uma coisa simples do direito seja cumprido: as regras do jogo (ah, como isso está faltando atualmente, pois não?). Deve procurar criar condições para que o direito seja aplicado de forma equânime. E que, mesmo que o juiz esteja “p” da vida com o mundo, tenha brigado com sua mulher, ele tem de suspender isso tudo e decidir de acordo com as regras. Decisão não é escolha, como muito bem diz Heinrich Rombach, conforme explico detalhadamente nos Comentários ao artigo 489 do CPC (Comentários ao Código de Processo Civil, no prelo, Saraiva, 2016).


Isto porque o Direito não está à disposição do julgador. O jurisdicionado não pode ficar à mercê justamente das contingências, do tropeço na pedra, da “sede de ser justiceiro” ou da vontade de ser um “juiz Magnaud”. Não há sorte ou azar nisso, como no filme Match Point, de Wooddy Allen. Ora, se alguém vai arrogante para a audiência e com a camisa para fora da calça, isso significa que é culpado? Ou que é inocente? Diz o estimado Morais da Rosa que “sabemos, todavia, a diferença entre um sorriso sincero e um falso/forçado”. Desculpem, mas eu não sei, até porque, pergunto, quais seriam os critérios de diferenciação? De novo: se o processo é um jogo e você precisa estar preparado para isso, uma coisa é certa: não é de Direito que se trata. Técnicas de valoração probatória podem ser úteis, mas não são teoria da decisão, convenhamos. Talvez Morais da Rosa e eu tenhamos apenas que acertar os termos de diferenciação daquilo que ambos queremos.


É evidente que todos os dias acontece esse tipo de fenômeno do qual fala Morais da Rosa (a decisão do juiz do trabalho de Porto Alegre é um bom exemplo). Só que isso está fora do Direito. Por exemplo, se você passa a perna e engana um juiz, isso é uma coisa que pode ocorrer e, como resultado, você “ganha a causa”. Mas “ganhou” fora das regras do jogo (já que se quer usar a palavra “jogo”). Ora, o Direito deve servir justamente para que isso não aconteça. O Direito não pode ser compatível com algo que se não possa prever e escape de uma racionalidade (chamemo-la de discursiva, comunicativa, hermenêutica, etc.).


O irônico nessa história de gestos, atitudes corporais, etc., é que mesmo eles são sintomas que exigem interpretação. Não há ontologia que permita acessar a uma “essência dessas coisas”. Ainda que esses comportamentos e atitudes pudessem contar para efeito da decisão, eles mesmos não estão à disposição do juiz. Se são sintomas, expressam uma "linguagem corporal" que, como tal, remetem-se a uma vivência ou experiência intersubjetivamente compartilhada sem a qual seriam completamente destituídos de sentido. Em outras palavras, nada disso é meramente subjetivo e o juiz não tem acesso privilegiado à "verdade corporal". Afinal, quer o juiz dizer "a" verdade dos corpos dos outros? Como diz R. Palmer: quando o subjetivismo se coloca na base da situação interpretativa, o que é interpretado senão uma objetificação?


Proponho, pois, a partir da CHD, contestar isso com elementos exógenos, já que sobre os endógenos não tenho controle. Se no futebol existe o montinho artilheiro como contingência ou “o imponderável”, a solução é passar uma máquina roçadeira para reduzir a sua incidência. A questão é saber se podemos admitir que, no Direito, na hora de decidir, a decisão possa ser produto de um montinho epistêmico contingente.


Em síntese: teoria jurídica, como diz Dworkin, é teoria normativa, prescritiva de critérios para a decisão. E estes critérios devem estar radicados em boas justificativas para o uso da coerção oficial. Não me bastadescrever o fenômeno; quero é fornecer critérios para que se decida corretamente. Boa parte do debate Hart v. Dworkin, como sabem, gira em torno desta discussão.[5] O que me interessa investigar é: sob quais condições as pessoas adquirem direitos e obrigações genuínas, a serem reconhecidos diretamente numa demanda judicial?


Poder-se-á alegar que essa “questão da análise de gestos, sorrisos com o canto da boca, etc.” deve ser feita mesmo a partir do PCJ, porque, afinal, é ele quem está vendo tudo. Neste caso, o juiz usaria a psicologia cognitiva ou qualquer outra teoria behaviorista. Mas, na hora da sentença, “funcionará” a intersubjetividade? Haveria, assim, dois juízes: o que usa a psicologia cognitiva, com o aproveitamento de esquemas mentais, efeito borboleta, etc. e o que elabora a decisão? Bem, não creio nisso. Essa cisão (bipolaridade) é impossível. Não há essa figura que, a um tempo é subjetivista na audiência e, ao depois, transforma-se em intersubjetivo na elaboração da decisão propriamente dita. Não é possível ter uma padrão confiável sobre o comportamento gestual, etc., de uma pessoa em dado ambiente, pela simples razão de que não é possível teorizar ou criar padrões sobre essa imponderabilidade do comportamento humano. Mas sobre o que diz a jurisprudência e a lei, sim, podemos teorizar. Sobre o imponderável e o efeito borboleta, não.


Claro que isso que acabei de dizer vem de um lugar de fala: a hermenêutica. E ela, como diz Gadamer, não quer ter a última palavra. Nem pode. O papel das teorias em geral (teorias da argumentação, teorias sistêmicas, discursivas em geral) e da inovadora tese desenvolvida por Morais da Rosa é de suma importância. Todos queremos aprimorar a democracia. E queremos mais justiça. Os caminhos para lá chegar é que são diferentes.


Só uma coisa a mais: se tudo o que Morais da Rosa falou está certo, como vamos explicar nossa contundente crítica à condenação de Meursault, em oEstrangeiro de Camus? Ele foi condenado... porque não chorou no enterro da mãe.


Post scriptum. Quase esqueci: como vamos explicar nossas críticas ao clássico sentença vem de sentire? Teremos que dar razão a quem diz isso? Afinal, interpretar gestos, piscadelas e esfregação de mãos não põe à prova um-juiz-que-sente?[6] Leiamos o que diz Morais da Rosa:


“pois basta um único sinal, certa arrogância, risinho de canto de boca, roupa fora do contexto, postura, contato visual, para que tenhamos um julgamento sobre o sujeito, naquilo que a psicologia cognitiva denomina de heurística e vieses, com os quais diminuímos a carga de trabalho mental e manejamos melhor o dia a dia. São atalhos mentais pelos quais o complexo processo de decisão é facilitado”.


Tenho apenas uma pergunta sobre isso: Quem deu esse poder ao juiz?




[1] Em Verdade e Consenso deixo isso bem claro, mormente na crítica à Daniel Sarmento, que, em uma crítica a mim, confundiu os conceitos.




[2] Para registro: 1. Não ignoro a importância da Psicologia Cognitiva e seus estudos; 2. Não ignoro que o corpo fala; 3. O que questiono é a transposição para o direito, cuja pretensão é regular condutas, preservar liberdades e impor regras que sejam aplicadas de forma equânime; 4. Sim, sei que advogado faz um agir estratégico; sua defesa deve ser feita levando em conta milhares de variáveis, nem mesmo importando se seu cliente tem ou não razão (lembremos do filme The Bridge of Spies - ver aqui); 5. Ocorre que uma teoria da decisão não trata do agir estratégico das partes; trata, sim, do agir por princípio e com responsabilidade política do juiz.




[3] GADAMER, Hans-Georg. Hermenêutica em Retrospectiva: Heidegger em retrospectiva. Vol. I Tradução de Marco Antônio Casanova. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 37.




[4] Vejam o problema do efeito borboleta: vamos supor que meu pai tenha desviado seu caminho porque uma galinha atravessou e, assim, não tropeçou. Assim, em vez de me dar um tabefe, deixou minha irmã ir ao baile. Ela conheceu uma pessoa que não o meu cunhado e com ele se casou. Com isso, não saio do meio do mato e não vou morar com ela na cidade. E não continuo meus estudos. Não faço faculdade de Direito, mestrado, doutorado, etc e nem tenho esta coluna no ConJur. Neste caso, o paradoxo: eu não estaria escrevendo este texto e nem teria conhecido pessoas tão queridas como Alexandre Morais da Rosa e tantos outros Amigos por esse mundão de Deus. Ou escrevi esta Coluna justamente por causa do efeito borboleta? Quem vai saber...




[5] Aqui remeto o leitor à excelente tese de doutorado (UNISINOS) de Francisco José Borges Motta. Ronald Dworkin e a decisão jurídica, que está no prelo pela Juspodivm. 




[6] Sem entrar na discussão da tradução e do sentido correto da palavra “sentire”.



Lenio Luiz Streck é jurista, professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do Escritório Streck, Trindade e Rosenfield Advogados Associados:www.streckadvogados.com.br.






Revista Consultor Jurídico, 18 de fevereiro de 2016, 8h00

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