segunda-feira, 3 de agosto de 2015

ESPECIAL - Adicionais de insalubridade e periculosidade: é possível receber os dois cumuladamente?



A vida é o mais fundamental dos direitos do homem, base para todos os demais direitos do cidadão. E, para que possamos gozar a vida com qualidade, como assegurado em nossa Constituição, é essencial que se garanta trabalho digno e em condições seguras e salubres. Assim, a busca de melhoria das condições adequadas de trabalho, a fim de preservar a saúde e integridade física do trabalhador, é uma meta a ser perseguida por toda a sociedade, como prática diária. Afinal, desde 1998, a saúde passou a ser"direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e outros agravos..." (artigo 196, CF/88).

Em relação ao meio ambiente de trabalho, é direito expresso a "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança"(artigo 7º, XXII, da CF/88). O meio ambiente do trabalho adequado e seguro é, pois, um direito fundamental do cidadão trabalhador. É um direito de todos e de cada um, ao mesmo tempo. E, uma vez afrontado, a agressão atinge toda a sociedade.

Mas apesar de todos os esforços empreendidos pelos Poderes Públicos e pela sociedade civil organizada, no sentido de priorizar e adequar o meio ambiente de trabalho, a realidade nos mostra que as inadequadas condições de trabalho ainda persistem em números alarmantes.

Em prol da defesa e reparação dos danos à saúde do trabalhador incide todo um sistema de responsabilização de natureza administrativa, previdenciária, civil e trabalhista. E é justamente aí que se enquadra o pagamento de adicionais de insalubridade e periculosidade. Esses adicionais são devidos sempre que a prestação de serviço se der em circunstâncias tidas como mais gravosas. É esse gravame decorrente do exercício do trabalho em circunstâncias desfavoráveis que enseja o pagamento da parcela.

O contato com agentes insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, gera o direito ao adicional de insalubridade à base de 10%, 20% ou 40% (graus mínimo, médio e máximo, respectivamente) sobre o salário mínimo (artigo 189 da CLT). Ele objetiva compensar o trabalhador pelos danos causados à sua saúde pelo contato paulatino com os respectivos agentes agressivos, como ruído, calor, agentes biológicos e químicos.

Já o adicional de periculosidade é devido na forma da lei, havendo reconhecimento expresso desse direito em três hipóteses: aos trabalhadores que atuam em atividades de exposição e contato com explosivos e inflamáveis; no setor elétrico e em atividades radioativas (com aparelhos de raio x). Ele visa à compensação pelo risco iminente de vida do trabalhador que desempenha suas atividades em contato com o agente perigoso.

Por vezes, ocorre de o trabalhador executar as suas atividades em contato com mais de um agente, insalubre e perigoso. Nesse caso, ele teria o direito a receber o pagamento de um único adicional ou de receber os dois, o de insalubridade e o de periculosidade, acumuladamente?

Nesta NJ especial procuramos expor a divergência jurisprudencial acerca da possibilidade de cumulação do pagamento dos dois adicionais. O entendimento clássico e predominante é no sentido de não ser possível a cumulação. Esse posicionamento se baseia no disposto no §2º do artigo 193 da CLT que diz "O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido". Para essa corrente, o empregado que pleiteia o adicional de insalubridade na Justiça do Trabalho deve renunciar ao adicional de periculosidade e vice-versa, pois os dois não se cumulam.

Em sentindo contrário, pela possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, há também expressivo número de julgados, como os exemplos que listamos a seguir. Essa corrente adota como fundamento principal uma interpretação evolutiva do artigo 193, §2º, da CLT, de acordo com princípios constitucionais e do Direito Internacional do Trabalho, em especial a Convenção 155 da OIT, ratificada pelo Brasil.

Vale conferir a jurisprudência nos dois sentidos:

Decisões das 2ª, 3ª, 4ª, 5ª, 6ª, 9ª e 10ª Turmas do TRT-MG pela impossibilidade de cumulação: 

EMENTA: CUMULAÇÃO DE ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. IMPOSSIBILIDADE. Os adicionais de insalubridade e periculosidade não podem ser cumulados, cabendo o pagamento daquele mais benéfico ao empregado (art. 192, § 2º, da CLT). (01766-2014-180-03-00-5 RO - Data da publicação:12/06/2015 - 2ª Turma - Relator: Lucas Vanucci Lins) 

ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. O artigo 193, parágrafo segundo, da CLT, versa que "§ 2º - O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido.". Resta claro, portanto, que a legislação aplicável afasta a hipótese de acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, devendo o empregado optar pelo mais vantajoso (0011129-47.2014.5.03.0084 - Data da publicação: 02/06/2015 - 2ª Turma - Relatora: Juíza Convocada Sabrina de Faria Fróes Leão) 

EMENTA: IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE. O § 2º do artigo 193 da CLT assegura ao empregado a possibilidade de optar, caso a função desempenhada seja concomitantemente insalubre e perigosa, pelo adicional que lhe seja mais vantajoso, o de periculosidade ou insalubridade. (0010835-09.2014.5.03.0144 - Data da publicação: 26/05/2015 - 3ª Turma - Relator: Milton Vasques Thibau de Almeida) 

EMENTA: ADICIONAL DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. CUMULAÇÃO. Na dicção do § 2º do art. 193 da CLT, proíbe-se a percepção cumulativa de adicionais de periculosidade e de insalubridade. Na hipótese, é vedada a acumulação do adicional de periculosidade com aquele previsto no art. 16 da Lei nº 7.394/85, denominado adicional de risco de vida e insalubridade, conferido àqueles que se enquadram na profissão de Técnico em Radiologia, sendo, todavia, facultado ao autor o recebimento do adicional mais vantajoso. (00268-014-113-03-00-3 RO - Data da publicação: 03/11/2014 - 4ª Turma - Lucilde D'Ajuda Lyra de Almeida) 

EMENTA: ADICIONAL DE INSALUBRIDADE - PERICULOSIDADE - CUMULAÇÃO - PAGAMENTO INDEVIDO - Provado o labor em condições insalubres e periculosas, não há que se falar no pagamento cumulado de tais adicionais, tendo em vista o disposto no artigo 193, § 2º, da CLT. Saliente-se que referido dispositivo legal confere ao empregado optar por receber o adicional que lhe for mais favorável, o que implica reconhecer que o legislador afastou a possibilidade de superposição do pagamento dos adicionais. Em relação à Convenção n. 155 da OIT - Organização Internacional do Trabalho -, extrai de seu texto que referida Convenção trata, tão-somente, da individualização de riscos e, não, da cumulação de adicionais. (TRT da 3.ª Região; 0001311-35.2013.5.03.0075 RO; Data de Publicação: 24/11/2014; 5ª T.; Rel. Convocada Ana Maria Amorim Rebouças) 

EMENTA: ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. NÃO CUMULAÇÃO - Por expressa determinação do parágrafo 2º do art. 193, da CLT, ainda vigente, por compatível com as normas constitucionais, o empregado que se submete a riscos de periculosidade pode fazer a opção pelo adicional de insalubridade, se esse lhe for mais benéfico, o que implica dizer que o legislador considerou a possibilidade de cumulação do risco, mas descartou a da superposição de adicionais. A Convenção 155, da OIT, promulgada pelo Decreto 1254/94, não prevê a possibilidade de cumulação dos adicionais e, por isso, mesmo tendo ingressado no nosso ordenamento pela ratificação, não revogou a disposição celetista mencionada. Ali tão-somente ficou determinado que sejam considerados os riscos para a saúde do empregado decorrentes de exposição simultânea a diversas substâncias e agentes (art. 11, alínea b), o que não é incompatível com as normas celetistas ou com regulamentação respectiva vigente (Portaria 3.214/78 e Anexos) (TRT da 3.ª Região; Processo: 00918-2008-087-03-00-0 RO; Data de Publicação: 08/09/2009; Órgão Julgador: Sexta Turma; Relator: Anemar Pereira Amaral) 

EMENTA: ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. A pretensão de cumulaçãodos adicionais de insalubridade e de periculosidade encontra impedimento no art. 193, §2º, da CLT, sendo que, em tais situações, é devido apenas o pagamento do adicional de periculosidade, porque é o mais vantajoso para o trabalhador. O dispositivo legal confere ao empregado o direito de optar pelo adicional de insalubridade se lhe for mais favorável, o que importa na conclusão de que o legislador afastou a possibilidade de superposição de adicionais quando verificada a cumulação de riscos, regra legal que se manteve íntegra mesmo depois da promulgação da Constituição da República. (TRT da 3.ª Região; Processo: 0000900-25.2013.5.03.0064 RO; Data de Publicação: 08/10/2014; Órgão Julgador: Nona Turma; Relator: Monica Sette Lopes) 

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. NÃO CUMULAÇÃO. Por disposição expressa de lei, caso o empregado trabalhe em condições perigosas e insalubres simultaneamente, os adicionais não se acumulam, podendo o empregado optar pelo adicional que lhe for mais favorável (artigo 193, parágrafo 2º, da CLT). Frise-se que a Convenção 155 da OIT - Organização Internacional do Trabalho - não trata da cumulação de adicionais. Portanto, não revoga a disposição celetista antes mencionada nem é com ela incompatível ou a com regulamentação respectiva vigente (Portaria 3.214/78 e Anexos). (TRT da 3.ª Região; Pje: 0010052-26.2014.5.03.0044 (RO); Disponibilização: 06/07/2015; Órgão Julgador: Decima Turma; Relator: Deoclecia Amorelli Dias) 


Entendimento das 1ª e 7ª Turmas do TRT-MG é pela possibilidade de cumulação: 

EMENTA: 1) ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. EFICÁCIA HORIZONTAL DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. Interpretação evolutiva do art. 193, par. 2º da CLT, de acordo com os ditames da Constituição (art. 5º, par. 2º, art. 7º, "XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança", direito fundamental, que se prepondera sobre os demais) e do Direito Internacional do Trabalho (Convenção 155 da OIT, ratificada pelo Brasil e, portanto, possuindo eficácia pelo menos supralegal, conforme já estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal) leva à conclusão acerca da possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e de periculosidade - a exemplo de outros adicionais, como de horas extras e de horas noturnas - , sobretudo quando se argumenta sob o prisma da proteção à saúde do trabalhador. A monetização dos riscos é medida insuficiente para a prevenção de doenças e acidentes no trabalho. Mais efetivas são medidas preventivas, destinadas a assegurar o ideário da preservação da dignidade da pessoa humana e do avanço que deve permear as relações de trabalho. A possibilidade de recebimento cumulado estimula o empregador na melhoria das condições do meio ambiente de trabalho - prevenção -, o que está no coração das normas de proteção à saúde do trabalhador no Brasil e no mundo, favorecendo, de outro lado, a redução dos custos para a empresa. 2) RESCISÃO INDIRETA. Para a configuração da rescisão indireta é necessário que a falta cometida pelo empregador seja de tal monta que abale ou torne impossível a continuidade do contrato, o que ficou provado nos autos. No caso em tela, o réu não quitou o adicional de periculosidade e horas extras; não recolheu o FGTS, além de reiteradamente atrasar no pagamento dos salários ao longo do contrato de emprego. Evidencia-se, portanto, descumprimento de obrigações legais e contratuais suficientemente graves para justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho. (TRT da 3.ª Região; Processo: 0002444-31.2013.5.03.0005 RO; Data de Publicação: 02/12/2014; Órgão Julgador: Setima Turma; Relator:Convocada Martha Halfeld F. de Mendonca Schmidt; Revisor: Fernando Luiz G.Rios Neto) 

EMENTA: CUMULAÇÃO DE ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE JURÍDICA. O Direito do Trabalho adota como princípio fundamental a aplicação da norma mais favorável ao trabalhador. Com isto, incidindo sobre a mesma situação fática duas ou mais normas, deve ser aplicada aquela que for mais benéfica ao trabalhador. É certo que o art. 193 da CLT veda a cumulação de adicional de insalubridade com o adicional de periculosidade. No entanto, também compõe o nosso ordenamento jurídico a Convenção n. 155 da OIT, que admite esta cumulação, desde que presente a exposição simultânea a agentes insalubres e condições periculosas (art. 11, "b"). Por força do aludido princípio, deve prevalecer a citada Convenção da OIT. Convenção que, ademais, tem status supralegal, o que, ainda que não fosse o princípio invocado, a faria prevalecer sobre a CLT. (TRT da 3.ª Região; Processo: 0001911-19.2012.5.03.0131 RO; Data de Publicação: 23/06/2015; Órgão Julgador: Setima Turma; Relator:Convocado Cleber Lucio de Almeida; Revisor: Paulo Roberto de Castro) 

ADICIONAL DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. EFICÁCIA HORIZONTAL DE DIREITOS FUNDAMENTAIS. De acordo com precedentes desta Turma e também da 7ª Turma do TST, considerando o disposto nos arts. 1º, III e 7º, XXII da CF e nas Convenções 148 e 155 da OIT e visando a redução dos riscos inerentes ao trabalho, além da necessária desmonetização da saúde da pessoa humana, é possível a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade no caso de trabalhador submetido à atividade duplamente nociva (interpretação evolutiva do art. 193, §2º, da CLT). (TRT da 3.ª Região; Pje: 0010963-63.2014.5.03.0165 (RO); Disponibilização: 19/05/2015, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 184; Órgão Julgador: Setima Turma; Relator: Fernando Luiz G.Rios Neto) 

EMENTA: ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E DE INSALUBRIDADE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. A vedação contida no art. 193 da CLT encontra-se suplantada pelos princípios constitucionais, especialmente o da dignidade da pessoa humana. Se o empregado, submetido a condições insalubres no ambiente de trabalho, tem agravada essa situação pela exposição à condição de risco, de forma habitual e decorrente da atividade exercida, não é aceitável (ou justo) que tenha de optar o trabalhador por receber apenas um dos adicionais. Ou seja, se na execução das atividades laborativas o empregado se submete, concomitantemente, a duas condições gravosas à sua saúde, deve receber remuneração condizente com essa situação, que, a toda evidência, não configura bis in idem, haja vista a existência de fatos geradores distintos: exposição a agente insalubre (agentes agressivos à saúde) e exposição à condição de risco de vida. (00927-2013-152-03-00-3 RO - acórdão em 17/07/2015 - 1ª Turma - Relator: Emerson Jose Alves Lage Revisor: Jose Eduardo Resende Chaves Jr.) 


Entendimentos divergentes do TST sobre a matéria 

RECURSO DE REVISTA. CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE. PREVALÊNCIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E SUPRALEGAIS SOBRE A CLT. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO STF QUANTO AO EFEITO PARALISANTE DAS NORMAS INTERNAS EM DESCOMPASSO COM OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INCOMPATIBILIDADE MATERIAL. CONVENÇÕES NOS 148 E 155 DA OIT. NORMAS DE DIREITO SOCIAL. CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE. NOVA FORMA DE VERIFICAÇÃO DE COMPATIBILIDADE DAS NORMAS INTEGRANTES DO ORDENAMENTO JURÍDICO. A previsão contida no artigo 193, § 2º, da CLT não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, que, em seu artigo 7º, XXIII, garantiu de forma plena o direito ao recebimento dos adicionais de penosidade, insalubridade e periculosidade, sem qualquer ressalva no que tange à cumulação, ainda que tenha remetido sua regulação à lei ordinária. A possibilidade da aludida cumulação se justifica em virtude de os fatos geradores dos direitos serem diversos. Não se há de falar em bis in idem. No caso da insalubridade, o bem tutelado é a saúde do obreiro, haja vista as condições nocivas presentes no meio ambiente de trabalho; já a periculosidade traduz situação de perigo iminente que, uma vez ocorrida, pode ceifar a vida do trabalhador, sendo este o bem a que se visa proteger. A regulamentação complementar prevista no citado preceito da Lei Maior deve se pautar pelos princípios e valores insculpidos no texto constitucional, como forma de alcançar, efetivamente, a finalidade da norma. Outro fator que sustenta a inaplicabilidade do preceito celetista é a introdução no sistema jurídico interno das Convenções Internacionais nos 148 e 155, com status de norma materialmente constitucional ou, pelo menos, supralegal, como decidido pelo STF. A primeira consagra a necessidade de atualização constante da legislação sobre as condições nocivas de trabalho e a segunda determina que sejam levados em conta os riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes. Nesse contexto, não há mais espaço para a aplicação do artigo 193, § 2º, da CLT. Recurso de revista de que se conhece e a que se nega provimento. - Processo TST-RR-1072-72.2011.5.02.0384 - 7ª Turma - Ministro Renato de Lacerda Paiva. Publicação em 03/10/2014. 

ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. PAGAMENTO NÃO CUMULATÓRIO. OPÇÃO POR UM DOS ADICIONAIS. Ressalvado o entendimento do Relator, o fato é que, segundo a jurisprudência dominante nesta Corte, é válida a regra do art. 193, § 2º, da CLT, que dispõe sobre a não cumulação entre os adicionais de periculosidade e de insalubridade, cabendo a opção, pelo empregado, entre os dois adicionais. Assim, se o obreiro já percebia o adicional de insalubridade, porém entende que a percepção do adicional de periculosidade lhe será mais vantajosa, pode requerê-lo, ou o contrário. O recebimento daquele adicional não é óbice para o acolhimento do pedido de pagamento deste, na medida em que a lei veda apenas a percepção cumulativa de ambos os adicionais. Todavia, nessa situação, a condenação deve estar limitada ao pagamento de diferenças entre um e outro adicional. Para o Relator, caberia o pagamento das duas verbas efetivamente diferenciadas (adicional de periculosidade e o de insalubridade), à luz do art. 7º, XXIII, da CF, e do art. 11-b da Convenção 155 da OIT, por se tratar de fatores e, principalmente, de verbas/parcelas manifestamente diferentes, não havendo bis in idem. Recurso de revista conhecido e provido no particular. Processo: ARR ¿ 62-32.2013.5.04.0007 Data de Julgamento: 06/05/2015, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 08/05/2015. 




Notícias Jurídicas anteriores sobre o tema






Fonte: TRT3


Turma indefere depósitos do FGTS a empregado aposentado por invalidez

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho isentou a Empresa de Transportes Joevanza Ltda. da condenação ao depósito do FGTS de um empregado aposentado por invalidez. A decisão fundamentou-se no artigo 15, parágrafo 5º, da Lei 8.036/90, que determina a obrigatoriedade do recolhimento apenas nas situações de afastamento para prestação do serviço militar obrigatório e de licença por acidente de trabalho.

A empresa havia sido condenada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA) a efetuar o depósito do fundo desde a data em que o empregado foi aposentado por invalidez, até o fim da suspensão do seu contrato de trabalho. No recurso ao TST, a empresa violação da Lei 8.036/90, que rege o FGTS.

O relator, ministro Fernando Eizo Ono, deu razão à empresa, afirmando que não existe previsão legal que obrigue o recolhimento do fundo no período de aposentadoria por invalidez. Ele esclareceu que, nesses casos, a jurisprudência do TST considera que a suspensão do contrato de trabalho decorrente não se in
sere nas hipóteses de obrigatoriedade.

A decisão foi por unanimidade.

(Mário Correia/CF)


O TST possui oito Turmas julgadoras, cada uma composta por três ministros, com a atribuição de analisar recursos de revista, agravos, agravos de instrumento, agravos regimentais e recursos ordinários em ação cautelar. Das decisões das Turmas, a parte ainda pode, em alguns casos, recorrer à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1).

Fonte: TST

Sadia é condenada por estabelecer tempo de uso de banheiro a operadora de produção


A Sadia S.A. terá que indenizar uma operadora de produção por limitar em dez minutos o tempo para o uso de banheiros durante a jornada de trabalho. A condenação foi arbitrada pela Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que entendeu que a conduta expôs a trabalhadora a um constrangimento desnecessário e degradante.

Na ação trabalhista, a operadora alegou que ficava constrangida de ter que avisar ao supervisor toda vez que precisava ir ao banheiro, e que a limitação de tempo imposta pela empresa feria o princípio da dignidade humana. Em defesa, Sadia sustentou que o acesso aos banheiros era livre, permitido em qualquer momento da jornada, bastando comunicar ao auxiliar de supervisor para que outra pessoa assumisse o posto de trabalho, para não parar a produção. Ao longo do processo, testemunhas disseram que não havia sanção aos empregados, mas confirmaram que só tinham de cinco a sete minutos para usar o toalete quando necessário.

Por entender que a mera organização das ausências no setor não caracteriza impedimento ou restrição do uso do banheiro capaz de gerar dano moral, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) manteve a sentença que julgou improcedente o pedido de indenização. Em recurso ao TST, a operadora insistiu que a conduta da empresa caracterizava "nítida violação a sua intimidade".

Os argumentos convenceram a relatora do recurso, ministra Delaíde Miranda Arantes. Ao fixar a indenização de R$ 10 mil, a magistrada explicou que a limitação ao uso de toaletes não é conduta razoável do empregador, pois expõe o trabalhador a constrangimento desnecessário e degradante, violando a sua privacidade e ofendendo a sua dignidade. "Não se pode tolerar a prática de atos que transgridam os direitos de personalidade do empregado, a partir do argumento de que tal conduta é crucial para o desenvolvimento empresarial," descreveu. A decisão foi por maioria, vencido o ministro Renato de Lacerda Paiva.


(Taciana Giesel/CF)

O TST possui oito Turmas julgadoras, cada uma composta por três ministros, com a atribuição de analisar recursos de revista, agravos, agravos de instrumento, agravos regimentais e recursos ordinários em ação cautelar. Das decisões das Turmas, a parte ainda pode, em alguns casos, recorrer à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1).

Fonte: TST

STJ inicia segundo semestre forense com pauta cheia de temas relevantes para a sociedade




Aplicação do Código de Defesa do Consumidor nas previdências privadas fechadas, pagamento de honorários advocatícios extrajudiciais, regras para ocupação de áreas públicas e fraude em concurso público tipificada como crime são alguns dos temas que serão analisados neste semestre pelos colegiados do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O segundo semestre forense de 2015 começa nesta segunda-feira (3) e já no dia seguinte as seis turmas do tribunal reiniciam os julgamentos que repercutirão na vida de muitos brasileiros.

A Corte Especial deve retomar o julgamento sobre a flexibilização da Súmula 418 para interposição de recurso, mesmo sem a publicação dos embargos de declaração, quando estes não tiverem efeito modificativo. Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso, a decisão do tribunal vai afetar milhares de processos nas instâncias ordinárias (AgRg no EAREsp 300.967).

O julgamento já foi interrompido duas vezes em junho deste ano por pedidos de vista dos ministros Humberto Martins e Og Fernandes.

Ainda nesta semana, o colegiado vai decidir se cabe ação rescisória para discutir verba honorária exorbitante ou irrisória fixada pela sentença. O recurso especial da Fazenda Nacional foi afetado à Corte porque o tema é de interesse de mais de uma seção do tribunal (REsp 1.388.768).

Acessibilidade

Na pauta de julgamentos da Segunda Turma desta semana está previsto o julgamento de recurso especial sobre acessibilidade para deficiente físico em transporte público. O município do Rio de Janeiro recorre contra decisão que o obrigou a impedir a circulação de veículos da empresa Auto Viação Tijuca que não estejam devidamente adaptados para portadores de deficiência física (REsp 1.536.412).

Também nesta semana está previsto na Quarta Turma o julgamento de um recurso especial sobre usucapião de imóvel rural por pessoa estrangeira. A empresa Del Monte Fresh Produce Brasil – que é 100% brasileira, mas tem seu capital social integrado por sócios estrangeiros – pretende usucapir várias propriedades em regiões rurais do Ceará (REsp 1.537.926).

Presídio

Ainda neste mês, os ministros da Terceira Seção decidirão conflito negativo de competência entre os juízos da comarca de Cuiabá (MT) e de Porto Velho (RO) sobre a transferência ou não de João Arcanjo Ribeiro do Presídio Federal de Segurança Máxima de Porto Velho.

Conhecido como “Comendador”, as autoridades de Mato Grosso o consideram líder de organização criminosa de alta periculosidade e grande poder econômico, com elevado grau de articulação dentro e fora de penitenciárias do estado.

A permanência já foi prorrogada por cinco vezes, cada uma com prazo de 360 dias. O relator do conflito é o ministro Reynaldo Soares da Fonseca (CC 132.277).

Indenização

A Primeira Seção deve continuar o julgamento da ação rescisória proposta pelo município do Rio de Janeiro com objetivo de desconstituir acórdão da Primeira Turma do STJ, no REsp 750.988, que manteve indenização milionária pela desapropriação de terreno no bairro Jardim Botânico, adquirido para construção de empreendimento imobiliário, que foi declarado área não edificante.

O julgamento foi interrompido pelo pedido de vista do ministro Og Fernandes após os ministros Humberto Martins, Herman Benjamin e Napoleão Nunes Maia Filho votarem pelo provimento parcial da ação rescisória (AR 4.486).

Está prevista também a apreciação de diversos recursos repetitivos que discutirão temas como atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza (REsp 1.495.146; REsp 1.495.144; REsp 1.492.221), isenção da Cofins nas receitas de instituições de ensino recebidas diretamente dos alunos a título de mensalidade (REsp 1.353.111), e concessão de aposentadoria rural por idade a segurado que não atuou sempre como trabalhador rural (REsp 1.354.908).

Quiosque na praia

A Segunda Turma vai dar continuidade à apreciação de um recurso especial do Ministério Público Federal a respeito das regras para ocupação de áreas públicas por barraqueiros e afins. No caso, a União ajuizou ação com pedido demolitório contra o dono do quiosque Amendoeira, localizado na praia de Geribá, em Búzios (RJ), devido à ocupação irregular de uma faixa de areia da praia.

A ministra Assusete Magalhães apresentou o primeiro pedido de vista em junho deste ano, quando divergiu parcialmente do relator, ministro Mauro Campbell – que deu provimento aos recursos da União e do Ministério Público. A discussão será retomada com a apresentação do voto-vista do ministro Herman Benjamin (REsp 1.432.486).

Desapropriação indireta

A Primeira Turma aguarda a apresentação do voto-vista do ministro Napoleão Nunes Maia Filho a respeito do prazo prescricional para ajuizamento de ação de indenização por desapropriação indireta. Os ministros definirão se é de 20 anos (Código Civil de 1916), 10 anos (regra de transição) ou 5 anos (regra geral do novo código).

Em junho deste ano, o relator, ministro Benedito Gonçalves, aplicou a regra de transição e votou dando provimento ao recurso especial para afastar a prescrição (REsp 1.300.702).

O colegiado também dará continuidade ao julgamento do recurso em mandado de segurança de um cabo do Corpo de Bombeiros de Pernambuco que queria assegurar sua participação no concurso para formação de soldado bombeiro militar, embora tivesse sido considerado inapto no exame de saúde por problemas de visão. Ele argumentou que seu problema poderia ser corrigido por meio de cirurgia ou com o uso de óculos (RMS 43.741). 

Honorários extrajudiciais

Na Quarta Turma, os ministros darão prosseguimento à discussão sobre a abusividade ou não de cláusula em contrato de financiamento que prevê o pagamento de honorários advocatícios extrajudiciais. Em junho, o ministro Antonio Carlos Ferreira, relator, apresentou vista regimental para retificar parte do voto proferido anteriormente. Desta vez, considerou que os honorários só podem ser cobrados se houver a efetiva prestação do serviço advocatício (REsp 1.002.445).

O colegiado também continuará o julgamento a respeito da desconsideração da personalidade jurídica da empresa Cobrasol Companhia Brasileira de Óleos e Derivados, imputada ao empresário Naji Nahas. A ministra Isabel Gallotti está com pedido de vista.

A empresa alega que não foram preenchidos os requisitos necessários para a decretação da desconsideração e que o empresário não poderia ser responsabilizado pelos atos fraudulentos, porque não seria o administrador ou diretor da empresa na época questionada (REsp 1.358.432).

Fraude em concurso

A Quinta Turma decidirá se um candidato que colou na prova da Ordem dos Advogados do Brasil em 2009 responderá por crime. Ele foi denunciado pela fraude após operação realizada pela Polícia Federal. Contudo, à época, o ilícito não era tipificado como crime, o que ocorreu apenas após a edição da Lei 12.550/11. Diante disso, o Ministério Público fez aditamento à denúncia para que o candidato responda penalmente.

Após o voto do relator, ministro Gurgel de Faria, negando provimento ao recurso do candidato e o voto-vista do ministro Newton Trisotto dando parcial provimento ao recurso, o ministro Felix Fischer pediu vista do processo (RHC 41.555).

Também está Quinta Turma o julgamento de diversos habeas corpus de envolvidos na operação Lava Jato, que investiga o grande esquema de corrupção na Petrobrás. No último dia 24, o presidente do STJ, ministro Francisco Falcão, pediu informações urgentes sobre o caso, que está sob a relatoria do desembargador convocado Newton Trisotto (HC 330.231; HC 330.283; HC 330.650; HC 330.653; HC 330.655; HC 330.657; HC 330.761; HC 330.749; HC 330.191).

Fonte: STJ

Prequestionamento ficto é um dos temas da Pesquisa Pronta desta semana




Declaração de inconstitucionalidade como condição para aplicação da cláusula de reserva de plenário e prequestionamento ficto: aplicação da Súmula 211 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e das Súmulas 282 e 284 do Supremo Tribunal Federal (STF) são os temas da Pesquisa Pronta disponibilizados nesta segunda-feira (3) na página do STJ.

Quanto ao primeiro tema, sobre controle de constitucionalidade, o STJ já decidiu que não ofende a cláusula de reserva de plenário, prevista no artigo 97 da Constituição Federal, e muito menos a Súmula Vinculante 10 do STF quando não houver declaração de inconstitucionalidade de dispositivos legais tidos por violados, mas somente a interpretação do direito infraconstitucional aplicável à espécie.

Na segunda pesquisa, de direito processual civil, há precedentes do tribunal que inadmitem o prequestionamento ficto – ou seja, a matéria não é considerada prequestionada pela simples oposição de Embargos Declaratórios.

Conheça a Pesquisa Pronta

A Pesquisa Pronta foi criada para facilitar o trabalho de interessados em conhecer a jurisprudência do STJ. O serviço é online e está totalmente integrado à base de jurisprudência do tribunal.

Como sugere o nome, a página oferece consultas a pesquisas prontamente disponíveis sobre temas jurídicos relevantes, bem como a acórdãos com julgamento de casos notórios.

Embora os parâmetros de pesquisa sejam pré-definidos, a busca dos documentos é feita em tempo real, o que possibilita que os resultados fornecidos estejam sempre atualizados.

Como utilizar a ferramenta

A Pesquisa Pronta está permanentemente disponível no portal do STJ. Basta acessar Jurisprudência > Pesquisa Pronta, na página inicial do site, a partir do menu principal de navegação.

As últimas pesquisas realizadas podem ser encontradas emAssuntos Recentes. A página lista temas selecionados por relevância jurídica de acordo com o ramo do direito ao qual pertencem.

Já o link Casos Notórios fornece um rol de temas que alcançaram grande repercussão nos meios de comunicação.Ao clicar em um assunto de interesse, o usuário é direcionado a uma nova página com os espelhos de acórdãos do tribunal que dizem respeito ao tema escolhido.
Fonte: STJ

quarta-feira, 15 de julho de 2015

"Papel do CNJ é melhorar a gestão e não cuidar de questões salariais do Judiciário"





Embora seja dos ministros mais antigos da composição atual do Supremo Tribunal Federal,Gilmar Mendes parece enxergar o Judiciário pela lente de um sociólogo. Isso quer dizer que se trata de um ministro que sequer considera o senso comum para dar resposta aos conhecidos problemas do Poder da República do qual já foi o comandante.

Não à toa, o ministro presidiu a mais agitada gestão que o Conselho Nacional de Justiça já teve. A gestão de Gilmar Mendes é reconhecida como das poucas que começou e acabou no mesmo ritmo acelerado. Ele ficou à frente do órgão – e do Supremo – de abril de 2008 a abril de 2010 e vêm dessa época algumas das principais contribuições do CNJ para a Justiça: Mutirão Carcerário, Começar de Novo e Justiça em Números, por exemplo.

Em retrospecto, o ministro avalia o legado que o CNJ deixou nesses dez anos. E conclui que “um papel muito importante do órgão é inviabilizar soluções do tipo ‘mais do mesmo’”. “Precisamos olhar com senso crítico”, afirma, em entrevista à revista Consultor Jurídico.

Gilmar Mendes acredita que, no conjunto, o conselho mostrou resultados positivos e possibilitou avanços hoje difíceis de reverter. O exemplo mais evidente é incutir na mentalidade de quem pensa o Judiciário de que o problema é de gestão, não de orçamento. E que a solução está na desjudicialização, não no aumento da estrutura.

Entretanto, o ministro aponta problemas de identidade da instituição e lamenta os caminhos que têm sido tomados nos últimos anos. “Até pouco tempo atrás o CNJ não se tinha envolvido em questões salariais, e depois passou a emitir resolução para equiparações salariais, ou recentemente na questão do auxílio moradia”, comenta. “São decisões que, acredito, não honram a tradição do CNJ nesses dez anos.”

Leia a entrevista:

ConJur — Dez anos depois, o senhor avalia que o CNJ cumpre com a função para a qual ele foi desenhado e criado?
Gilmar Mendes — Se fizermos uma avaliação das atividades desempenhadas nesses dez anos, o resultado do trabalho do CNJ terá que ser reconhecido como positivo. Se olharmos as conquistas que tivemos, em termos de maior transparência da atividade judicial, da ideia de accountability, ou prestação de contas, a verificação das atividades disciplinares, a possível punição de abusos no âmbito no próprio poder Judiciário, a ideia de planejamento, organização, creio que tudo isso milita em prol do resultado do CNJ.

ConJur — Mas o senhor notadamente vê problemas.
Gilmar Mendes — Temos que reconhecer que esse desenvolvimento não se dá de forma homogênea e simétrica. O CNJ tem se tornado uma instituição “presidencialista”, depende muito de sua presidência. Talvez a própria formação díspar, com juízes, ministros, advogados contribua um pouco para a influência da pessoa do presidente. Se formos rigorosos, podemos dizer que no atual momento há um decréscimo de atividades, uma falta de aproveitamento do potencial institucional de que dispõe o CNJ, no planejamento, na construção de metas. O CNJ demonstrou grande influência na questão do sistema prisional, mesmo na questão da segurança pública.

ConJur — E hoje já não tem mais?
Gilmar Mendes — Houve muitos problemas internos. Por exemplo, as disputas ocorridas entre corregedoria e presidência, notadamente na gestão do ministro Cezar Peluso e da ministra Eliana Calmon. Depois houve certa descontinuidade administrativa, uma não prioridade ao CNJ, e o seu envolvimento com questões corporativas. Até pouco tempo atrás o CNJ não se tinha envolvido em questões salariais, e depois passou a emitir resolução para equiparações salariais, ou recentemente na questão do auxílio moradia. São decisões que, acredito, não honram a tradição do CNJ nesses dez anos. Mas é importante assinalar que o resultado ainda é altamente favorável, se considerarmos o conjunto da obra.

ConJur — O que o senhor considera, então, o papel do conselho?
Gilmar Mendes — São alguns. Um papel muito importante é inviabilizar soluções do tipo “mais do mesmo”. “Aumentou o número de processos, vamos aumentar o número de juízes.” Às vezes a demanda aumenta por uma causa específica, uma demanda concentrada que daqui a pouco passa, como causas tributárias. Inclusive certas causas às vezes aumentam porque determinado juiz é vagaroso. Então não posso criar uma causa automática de desdobramento de vara, como alguns imaginam. Vamos premiar a ineficiência e dividir uma vara em cinco? Não pode ser esse o critério. Precisamos olhar isso com senso crítico, e por isso órgãos como o CNJ são importantes, para que se faça esse tipo de aferição, o adequado dimensionamento de comarcas, de seções judiciárias, por exemplo.

ConJur — O senhor falou em alguns papéis. Destaca outro?
Gilmar Mendes — Sem dúvida nenhuma intensificar esse trabalho programático, pedagógico, de desjudicialização. Já temos paradigmas, por que insistir na repetição? Se já há um entendimento em prol do consumidor, numa área de seguro, de banco, de comércio em geral, por que não estimular nessas unidades uma práxis condizente com essa jurisprudência? Seja na Justiça local, no STJ [Superior Tribunal de Justiça] ou no Supremo Tribunal Federal. O impacto disso é tirar do Judiciário a responsabilidade total da coisa, de se fazer microjustiça. Para quê levar ao Juizado Especial uma demanda para qual o desfecho eu já conheço? Isso vale tanto para as entidades privadas como para os entes públicos. E já temos alguma consciência em relação a isso, e temos alguns comandos. A própria AGU já tem isso, seria muito importante estender, pois diminuiria custos e permitiria que alocássemos a máquina da Justiça aos setores deficitários.

ConJur — Em que sentido?
Gilmar Mendes — Em muitas das discussões que colocamos, como falta de recursos. Mas por que falta recurso? Será que vamos ter capacidade de prover recursos para as necessidades que estimamos sem fazermos os devidos ajustes? O grande trabalho do CNJ pode ser esse, de inteligência e de alocação adequada de recursos. E até de prover recursos em alguns estados. Por exemplo, em Alagoas verificamos que havia homicídios sem inquérito aberto. Talvez tenha que haver mais do que um provimento apenas de recursos humanos, como um fundo que ajude no desenvolvimento da própria Justiça. Em outras unidades é mais uma questão de diretriz, de prioridade. Tudo feito de maneira consensual. A experiência que eu tive nos anos à frente do CNJ indica que há boa receptividade.

ConJur — Qual foi a maior contribuição do senhor ao CNJ?
Gilmar Mendes — O planejamento estratégico é fundamental, e precisa ter seguimento e prosseguimento. Talvez seja uma das atividades mais importantes do CNJ: contribuir para o planejamento e verificar onde estão as debilidades do sistema, já que temos forças diversas no Judiciário, principalmente no estadual. Temos também a assimetrias no Judiciário Federal, uma estrutura quase que megalômana na Justiça do Trabalho. Isso vai precisar ser discutido em algum momento. Temos também estruturas muito débeis em alguns estados. Não adianta nada determinar que eles tenham um dado desempenho sem saber qual é a capacidade de cada unidade. Isso precisa ser contemplado e para isso o CNJ precisa conhecer bem a realidade dos órgãos e talvez até prover recursos adicionais.

ConJur — Isso até já é feito, não é?
Gilmar Mendes — Sim, por exemplo na informatização, distribuição de bens ligados à informática, meio que numa atividade supletiva. Mas talvez se devesse até pensar num fundo complementar para fazer certa equalização, especialmente no que diz respeito a fundos de modernização e coisas do tipo. A força financeira de cada unidade é diferente, e isso precisa ser visto. De alguma forma passou a ser olhado e vivenciado depois do estabelecimento das metas. A meta 2, por exemplo, que era julgar todos os processos que entraram até 2005 e saber por que não eram julgados esses processos. Na época criamos inclusive o Projeto Integrar, uma forma de cooperar com as unidades estaduais menos fortes, ou mais débeis. Treinamento, preparação de pessoal de cartório etc. Não adianta determinar simplesmente que um paraplégico corra.

ConJur — Outra iniciativa da gestão do senhor foi o mutirão carcerário...
Gilmar Mendes — Ali pela primeira vez mexemos no contexto do caótico sistema prisional. Fizemos inclusive um levantamento de informações que não existiam antes, como o número de presos, quem era preso provisório, os atrasos na Justiça criminal, a necessidade de termos um programa de ressocialização de fato – e aí lançamos o Começar de Novo. Em suma, foi a partir dali que fizemos uma proposta, que hoje é lei, de criar um departamento de acompanhamento do sistema prisional. Criamos uma série de medidas concernentes a limite temporal da prisão, a obrigatoriedade de o juiz fazer a verificação da situação do preso etc. Veja, o Brasil tem hoje perto de 600 mil presos, mas praticamente a metade, mais de 40%, é de presos provisórios. Foi nesse contexto que apresentamos também a proposta das medidas alternativas à prisão, de alteração do artigo 319 do Código de Processo Penal.

ConJur — Interessante é que a maioria desses programas aconteceu justamente sem grandes reformas de sistema, mudança em lei, nem nada disso.
Gilmar Mendes — Exatamente, e tivemos bons resultados. O programa Começar de Novo é de relativo baixo custo e teve bons resultados. Até aqui no Supremo. O próprio Estado teria um papel indutor, como poder fixar que 5% da mão de obra terceirizada possam ser de egressos do sistema prisional, ou que obras como as da Copa do Mundo pudessem contar com egressos, ou com pessoas do regime semiaberto. É mais um papel de coordenação e de legitimação. E isso precisa ser retomado. Num país que tem esse alto índice de reincidência esse tema precisa ser enfrentado.

Costumo dizer que isso não é um tema de direitos humanos, ou não só de direitos humanos. É um tema de segurança pública. Por isso lamento muito essa descontinuidade, que imagino ser apenas uma suspensão provisória. Acho que no futuro vamos voltar, o que pode ser inclusive coordenado com o CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público]. Veja que apenas com o mutirão carcerário conseguimos tirar 22 mil pessoas da prisão e algumas estavam presas há 14 anos.

ConJur — Mas nem todos os Judiciários estaduais se emocionam muito com esse tema. Dá para concluir isso até pela falta de informações que prestam ao Ministério da Justiça, ou à resistência a certa jurisprudência do STJ. O Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, teve algumas brigas com o CNJ.
Gilmar — Pois é, e talvez tenha sido até essa a causa dos tais conflitos corporativos. Mas ao mesmo tempo também o TJ de São Paulo vem passando por mudanças significativas. Quem poderia imaginar que São Paulo implantaria mudanças como as audiências de custódia [projeto que fixa prazo de 24 horas para juiz ouvir preso em flagrante e avaliar se a continuidade da medida é necessária]?

Era uma das travas que já apontávamos para reduzir o numero de prisões provisórias e sempre se falava “mas como vai fazer isso em São Paulo?”, tendo em vista a quantidade de presos, seu tamanho. Mas veja que São Paulo é justamente o estado líder nesse processo de reforma, com bons resultados. A ConJur mesmo tem publicado que as audiências têm reduzido em 40% o índice de prisões provisórias. Na base disso está o trabalho do CNJ. O ideal é que lográssemos nacionalizar isso e tivéssemos controle do sistema. Até porque as audiências foram implantadas sem grandes reformas, graças ao empenho de alguns juízes auxiliares com a coordenação do CNJ e a cooperação dos juízes de primeiro grau também.

ConJur — Não precisou nem mesmo de orçamento.
Gilmar Mendes — Não, não mesmo. É capaz até que tenha havido um crescimento do orçamento do CNJ desde então, pelo que ouço inclusive, e talvez haja um quadro de servidores muito maior do que tínhamos em 2010. E não obstante as atividades do órgão arrefeceram.

ConJur — Por quê?
Gilmar Mendes — Acredito que tenha a ver com esse presidencialismo, a questão das prioridades, e talvez a esse jogo de contrapressão das corporações. Por exemplo, juízes que aderiam ao projeto de metas e depois começam a criticar as metas. E alguns ouvidos são mais sensíveis que outros a esse tipo de reclamação. Também a leitura que dão à ideia da autonomia do juiz, quando na verdade a própria Constituição optou por um modelo de coordenação geral pelo CNJ, com participação dos tribunais locais. A própria fixação de metas, fazíamos na presença de todos os tribunais. Até hoje temos valores importantes, como o Justiça em Números e a sua própria avaliação a cada ano. É um trabalho que teve continuidade e é um material valioso de estudo, embora percebamos de um tempo para cá uma perda de ritmo na superação do estoque.

ConJur — E que também vem mostrando uma judicialização cada vez maior de conflitos.
Gilmar Mendes — É preciso haver algum tipo de reformulação. É outro papel que reputo fundamental do CNJ, o de reformulações institucionais. Não vamos sair dessas situações sem uma forte desjudicialização. Por isso o efeito vinculante das decisões, as próprias súmulas vinculantes, a valorização dos precedentes e do direito em si mesmo, independente da judicialização. Não podemos trabalhar com 100 milhões de ações, com 25 milhões ações novas por ano.

ConJur — E o que poderia ser feito?
Gilmar Mendes — Um fortalecimento dessas decisões, um efeito vinculante virtual. No momento que reduzirmos, e vamos conseguir reduzir, certamente, priorizando ações coletivas, fazer alguns controles de políticas públicas, mas no dia que conseguirmos isso vamos ter também de redimensionar a máquina judicial. Realocá-la para outras finalidades. Talvez não precise de tantos juízes numa determinada especialidade. Também se pode fazer muito hoje com o próprio processo eletrônico. Não precisamos ter pessoas para carregar processos.

ConJur — Mas ainda não os vemos nos corredores dos tribunais?
Gilmar Mendes — É que estamos vivendo o que na sociologia e na antropologia se chama de "contemporaneidade dos não coetâneos". São idades diferentes convivendo num mesmo momento. No Sul do país, na 4ª região, eles já têm o chamado protocolo avançado, que é a possibilidade de protocolar um processo numa prefeitura. Tem um totem lá para você protocolar, não precisa de uma estrutura fixa para armazenar o processo e isso permite uma nacionalização da presença da Justiça.

Há muito o que fazer em termos de gestão, mas a partir do momento em que resolvermos o excesso de judicialização, alocação do juiz, ter um juiz na fronteira etc, passa a ser uma ser uma decisão geoestratégica, geopolítica, não necessariamente ligada à prestação jurisdicional efetiva. Amanhã podemos dizer “recebemos tantos processos de determinada localidade, então vamos fazer a audiência de conciliação naquele local”.

Pedro Canário é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Marcelo Galli é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 12 de julho de 2015, 9h26

Talento e expertise do advogado na citação das decisões dos tribunais






Na minha assídua atividade profissional tenho me deparado, ao longo do tempo, com excelentes colegas que enchem de orgulho os quadros da advocacia brasileira. São causídicos que conhecem muito bem o relevante papel que o advogado desempenha em prol da construção da cidadania no seio de uma sociedade livre, plural e democrática. São profissionais que sabem lidar com o direito de seus respectivos clientes, jamais se afastando dos importantes princípios deontológicos que vivificam o exercício da defesa de direitos alheios.

Discorrendo sobre as boas relações entre juízes e advogados, afirmava Calamandrei que a postura ética do advogado é fundamental para o crescimento do prestígio social de toda uma classe. Nesta mesma linha, asseverava que, assim como os magistrados, porta-vozes da soberania estatal, não devem se afastar da sobriedade que reveste os atos decisórios, os advogados também não podem fazer pilhéria, mínima que seja, em seus arrazoados.

O capricho, aliás, é recomendável em toda petição, por mais simples que seja a demanda. Torna-se criticável, sob todos os aspectos, a apresentação de um requerimento com equívoco de digitação ou mesmo — o que é muito pior — com erro de português. Negligência, preguiça e desleixo definitivamente não combinam com o precioso ofício tão valorizado por Rui Barbosa, em seu famoso Dever do Advogado!

Ressalte-se, nesse particular, que os advogados devem cooperar com o julgador, procurando esclarecer, com clareza e coerência, qual a tese jurídica que embasa o direito de seu cliente. O artigo 6º do novo Código de Processo Civil, que encerra o denominado princípio da cooperação, tem, de fato, como corolário, o dever de esclarecimento das partes, pelo qual os respectivos patronos, como é curial, têm a “obrigação” profissional de zelar pela boa interpretação das normas jurídicas aplicáveis à causa.

Assim também, devem demonstrar ao juiz, tanto quanto possível, quais decisões — jurisprudência, precedente ou súmula — incidem no caso concreto, fazendo sempre o cotejo entre os elementos fáticos da questão a ser julgada e uma precedente decisão que tenha o condão de iluminar a melhor interpretação da regra de direito que embasa os argumentos deduzidos.

Cumprindo esta relevante tarefa, com o devido afinco e cuidado, torna-se bem mais reconhecida e produtiva a atuação profissional desempenhada pelo patrono.

A minha experiência de advogado aconselha os colegas mais jovens, quando oportuna a referência aos pronunciamentos dos tribunais, que invoquem, preferencialmente, nas hipóteses em que pertinente, a súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal por sua evidente eficácia vertical, em tudo equiparada à lei. Incidindo a súmula vinculante num caso concreto, cuja demonstração é ônus do advogado, não se exige citação de qualquer outra decisão para reforçar a argumentação expendida.

Não havendo súmula vinculante, torna-se necessário verificar se existe “súmula persuasiva”, editada pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça, a qual, embora não tendo a mesma força da vinculante, ostenta inegável importância intrínseca.

Na sequência, um acórdão atual, colacionado como paradigma, numa hipótese concreta análoga, mesmo com a sua eficácia simplesmente persuasiva, constitui significativo subsídio. Nesta situação, cabe ao advogado cotejar os fatos do precedente judicial com aqueles do caso a ser julgado. Não se deve citar simplesmente a ementa. O advogado deve esquadrinhar a ratio decidendi e procurar demonstrar ao juiz a tese jurídica sufragada pela turma julgadora que, em tudo, abona aquela por ele sustentada na defesa do direito de seu cliente. Saliente-se, a propósito, que o precedente das cortes superiores, diante da autoridade que decorre da hierarquia judiciária (precedente vertical), possui, em tese, um valor persuasivo maior do que um julgado proveniente de tribunal postado no mesmo grau hierárquico (precedente horizontal). De qualquer modo, quanto mais recente for a decisão, tanto melhor para o fim a que se destina a sua respectiva citação.

É certo que em qualquer uma destas situações, a quantidade conspira contra a qualidade. Não é necessária a alusão a muitos julgados; basta que aqueles colacionados retratem o “mesmo caso” sub judice.

Já naquelas hipóteses nas quais as cortes superiores não tiveram oportunidade de proferir decisões, o advogado deve selecionar julgados dos tribunais de segundo grau, optando, antes de outros mais prestigiados, pelos acórdãos do tribunal em que tramita o recurso ou mesmo daquele ao qual o juiz de primeiro grau encontra-se hierarquicamente subordinado. Aqui também a quantidade não deve prevalecer sobre a qualidade. O advogado deve garimpar os mais recentes julgados e trabalhar com a fundamentação das decisões invocadas como paradigma, inclusive declinando o nome dos integrantes da turma julgadora, sobretudo quando gozar ela de prestígio perante a comunidade jurídica.

É assim imprescindível que se tenha esse mínimo de zelo, marcado por absoluta precisão, fidelidade e ética profissional nas respectivas citações das decisões judiciais, visando a persuadir o julgador a favor da tese defendida.


José Rogério Cruz e Tucci é advogado, diretor e professor titular da Faculdade de Direito da USP e ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo.



Revista Consultor Jurídico, 14 de julho de 2015, 8h05

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...