Há quem diga que a Justiça do Trabalho protege o trabalhador. No entanto, para o presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Lorival Ferreira dos Santos, isso é um equívoco. Em sua opinião, os juízes apenas cumprem o seu dever de aplicar a lei que, esta sim, por opção dos legisladores, protege os trabalhadores.
Natural de Clementina (SP), Lorival dos Santos começou a trabalhar cedo, aos 12 anos, para ajudar a família. “O mote era: é melhor trabalhar do que estar na rua”, conta. Hoje, depois de 29 anos dedicados à Justiça do Trabalho, ele enxerga que a afirmativa deveria ser outra: “É melhor estudar, é melhor brincar”. Uma criança sadia e que estudou, garante o presidente do TRT-15, não será o criminoso de amanhã.
Com a missão de comandar o segundo maior TRT do país, com sede em Campinas e abrangência de 95% do estado de São Paulo, Lorival dos Santos aponta que um dos maiores desafios é respeitar a duração razoável do processo com uma estrutura deficiente: faltam servidores e magistrados. Em seus cálculos, o tribunal precisaria de pelo menos mais onze desembargadores para acompanhar o ritmo da demanda.
Para diminuir o número de processos que chegam à Justiça, o presidente sugere dois caminhos: incentivar as soluções extrajudiciais e mudar a sistemática dos recursos. “Aquele que recorrer e perder tem que pagar um pouco a mais”, defende. Assim, acabariam os recursos que servem para retardar a execução.
Lorival Ferreira dos Santos tomou posse como presidente do TRT-15 em dezembro de 2014. Para esta entrevista, ele recebeu a revista Consultor Jurídico no tribunal.
Leia a entrevista:
ConJur — Quais têm sido os principais desafios do senhor nesse início de gestão?
Lorival Ferreira dos Santos — O desafio não é pequeno. O nosso tribunal é o segundo maior do país. Procuramos julgar dentro do que diz a Constituição, respeitando a duração razoável de um processo. Para isso, contamos com servidores abnegados e com juízes comprometidos. Mas temos problemas históricos na corte, como os déficits de servidores e magistrados.
ConJur — Seria possível determinar um prazo para essa duração razoável do processo?
Lorival Ferreira dos Santos — Não, porque isso depende do processo. Em varas mais pesadas, com mais de 1,5 mil processos, a audiência de cognição pode demorar um pouco mais, mas na maioria das varas, acontece dentro de 30 dias. Muitas vezes, temos o resultado do processo entre 60 a 90 dias, no primeiro grau. E, no segundo grau, no máximo em 120 dias tem uma solução do conflito. Por óbvio que existe uma outra fase, aquela mais dificultosa, que é dar a efetividade ao processo, efetuando o pagamento ao trabalhador.
ConJur — A fase de execução.
Lorival Ferreira dos Santos — Isso. Muitas vezes executamos a dívida e o devedor não tem bens. Hoje, existe uma série de ferramentas que nós utilizamos, como o Bacenjud e outros, que facilitam a execução, mas quando o devedor não tem meios, o processo fica estagnado.
ConJur — O relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça, mostra que a execução é o principal desafio da Justiça do Trabalho. Como resolver isso?
Lorival Ferreira dos Santos — Sou de uma época da Justiça do Trabalho em que citávamos, o empresário pedia as guias, recolhia e pagava. Eu não sei se é a situação econômica que gera muitas dificuldades. O empresário hoje tem mais medo da fiscalização e das multas do que da Justiça. Por isso sempre dizemos que é melhor conciliar do que, de repente, ter uma sentença nas mãos, sem a certeza da execução do pagamento. Na conciliação já há uma predisposição de conciliar e pagar.
ConJur — Quais são as dificuldades para suprir o déficit de magistrados e servidores?
Lorival Ferreira dos Santos — O primeiro desafio é a aprovação do projeto. Por exemplo, mandamos um projeto para o Conselho Superior da Justiça do Trabalho de [criação de] 66 varas do Trabalho. Foram aprovadas 33, cada uma com um juiz titular e um substituto. No Conselho Nacional de Justiça, conseguimos uma modificação para ter mais 33 substitutos, e o processo voltou para o Tribunal Superior do Trabalho para ser avaliado. Quanto aos servidores, conseguimos a aprovação de 973 cargos. Esse projeto está no Congresso Nacional, que, agora, depende de inclusão de verba na Lei Orçamentária Anual. Com isso, conseguiremos praticamente resolver o nosso déficit de mil servidores. Nós estamos produzindo muito, com poucos servidores. Os gabinetes deveriam ter 16 servidores. Hoje, há, em média, dez.
ConJur — Quais são os projetos para a sua gestão?
Lorival Ferreira dos Santos — Estamos fazendo uma gestão de processos e de pessoas, o que inclui um aperfeiçoamento da qualificação profissional dos servidores por meio de nossa Escola Judicial. Outro objetivo é atacar na área dos precatórios, dando continuidade ao trabalho feito pelo ex-presidente Flavio Cooper. Ele fez uma audiência com os devedores, que são entes públicos, e isso tem facilitado o pagamento dos precatórios. Outro aspecto que queremos dar ênfase é com relação à conciliação. A Justiça do Trabalho tem vocação conciliatória. Devemos lançar um novo olhar para a conciliação e quebrar o paradigma da cultura da sentença que existe no país. Para isso criamos recentemente dois Centros Integrados de Conciliação, CICs, um no primeiro grau de jurisdição, que funciona no Fórum Trabalhista de Campinas e outro, atuando no segundo grau. Queremos criar mais sete centros como este, um em cada circunscrição do TRT no estado de São Paulo.
ConJur — Como funciona esse centro?
Lorival Ferreira dos Santos — Precisamos ir além das tentativas de conciliação nas audiências normais. A principal atribuição desse centro é propor a mediação e a conciliação em qualquer fase processual. Para isso, conta com estrutura composta por magistrados e servidores, atuando em mesas redondas. O projeto almeja também solucionar por acordo ações em que são parte grandes grupos empresariais com unidades instaladas na 15ª Região, sob coordenação da Vice-Presidência Judicial da Corte.
ConJur — Qual é a maior dificuldade da Justiça do Trabalho?
Lorival Ferreira dos Santos — As maiores dificuldades não são os temas, dos mais variados. O juiz do Trabalho está preparado para isso. O problema maior nosso é o número de ações. Há um volume elevado causado pela quantidade de recursos. Se existisse uma forma alternativa de solução de conflitos, esse número talvez fosse menor. Uma forma alternativa para solucionar os conflitos de menor complexidade.
ConJur — Que forma seria essa?
Lorival Ferreira dos Santos — Extrajudicial. É preciso aperfeiçoar o projeto das comissões de conciliação prévia, que foi desvirtuado. Hoje o instituto das comissões de conciliação prévia funciona como se fosse um órgão de homologação. Vai ao Ministério do Trabalho, ao sindicato e homologa. Além disso, é preciso mudar a sistemática dos recursos. Aquele que quer recorrer, pode recorrer, mas se perder tem que pagar um pouquinho mais porque, muitas vezes, o cidadão litiga para ganhar tempo e isso não é razoável. Há, no Congresso, um projeto nesse sentido. Algo que também precisamos é aumentar o número de fiscais do trabalho. Se tivesse um número suficiente para uma atuação mais eficaz, não teríamos esse grande número de reclamações trabalhistas.
ConJur — Alguns ministros do Tribunal Superior do Trabalho assinaram um manifesto contra o projeto de lei sobre terceirização. É papel do ministro, ou do juiz, se manifestar contra um projeto de lei?
Lorival Ferreira dos Santos — O TST fez muito bem em apontar os caminhos. Quem entende bem dessa matéria são os magistrados que lidam com ela quase que diariamente. O magistrado não é um extraterrestre. Ele vive na sociedade, tem responsabilidade social e deve apontar caminhos. Sabemos que a terceirização não tem volta, mas precisamos e vamos cuidar para que ela não seja prejudicial ao trabalhador.
ConJur — Como assim?
Lorival Ferreira dos Santos — Não é razoável que aquele que prestou serviços fique sem receber. No serviço público, por exemplo, às vezes a empresa que vence um contrato tem um capital pequeno e desaparece. Os trabalhadores não vão receber? Parece razoável que a lei permita a inclusão da empresa beneficiária da prestação de serviço no polo passivo, mesmo que seja pública. Nesse ponto o Congresso Nacional já deveria ter atuado faz tempo, mas ele não coloca o dedo na ferida.
ConJur — Com isso, as discussões são levadas ao Judiciário.
Lorival Ferreira dos Santos — À míngua de uma legislação específica, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 256 e a aperfeiçoou para a 331.
ConJur — Há um receio a respeito da decisão que o Supremo Tribunal Federal pode dar no ARE 713.211, ação na qual a corte discute os limites da terceirização?
Lorival Ferreira dos Santos — O STF saberá bem resolver isso, haverá bom senso. O Supremo tem utilizado bons recursos como as audiências públicas para debater questões complicadas. Além disso, há ministros que passaram pela Justiça do Trabalho como Marco Aurélio e Rosa Weber. Há uma expectativa positiva apesar da pressão do empresariado.
ConJur — Que a análise o senhor faz do processo eletrônico?
Lorival Ferreira dos Santos — Em um primeiro momento, ficamos temerosos com a novidade, no entanto hoje, aqui no TRT-15, entendemos que é benéfico, pois reduz o tempo morto do processo. O advogado, com uma boa ferramenta, consegue ingressar com a petição a qualquer momento, não há aquele acúmulo de pessoas que tínhamos no balcão. Esse é o ganho para o jurisdicionado: celeridade, otimização do serviço, sem contar ainda a preservação do meio ambiente. Quantas árvores deixaram de ser cortadas? Contamos com a parceria da Ordem dos Advogados do Brasil em nosso comitê que trata do PJe-JT.
ConJur — O PJe-JT já está instalado em todo o TRT-15?
Lorival Ferreira dos Santos — Já implantamos 100%. Primeiro no tribunal e depois nas varas, gradativamente, de maneira que somente os processos antigos continuam físicos. É uma ferramenta na qual nós buscamos, diuturnamente, o aperfeiçoamento. Isso é necessário porque, com essa facilitação de acesso, está aumentando o número de ações em decorrência do processo judicial eletrônico. Constatamos isso em um levantamento interno que fizemos.
ConJur — Isso é bom ou ruim?
Lorival Ferreira dos Santos — Eu não diria se é bom ou se é ruim, porque o magistrado que prestou concurso, está aqui para prestar o serviço ao jurisdicionado. Porém, se houver alguma distorção, alguém ficar sobrecarregado, precisamos corrigir.
ConJur — Qual é avaliação que o doutor faz da CLT? Ela precisa ser reformada?
Lorival Ferreira dos Santos — Aqueles que criaram a CLT — Getúlio Vargas e os seus ministros — tiveram uma sensibilidade para perceber e elaborar uma norma em que houvesse uma proteção jurídica em favor do trabalhador, para compensar o poder econômico. Porque, senão, o que seria do trabalhador para litigar contra uma grande devedora? A CLT é uma bela senhora que está muito atualizada porque, ao contrário do que muitos dizem, ela vem sendo aperfeiçoada. Há questões, como os acidentes, a previdência, que estão na CLT e hoje são atuais. É lógico que há pontos que ainda necessitam de aperfeiçoamento e adequação, mas a CLT em si, não.
ConJur — Não precisaria de uma grande reforma?
Lorival Ferreira dos Santos — Não, absolutamente. Tem alguns artigos emblemáticos ali que são a verdadeira espinha dorsal do contrato de trabalho. O artigo 9º, por exemplo: são nulos de pleno direito os atos praticados com objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar os preceitos da CLT. Puxa vida, olha que coisa maravilhosa! Porque se estiver desempregado, a família passando fome e alguém oferece um emprego, o trabalhador assina qualquer coisa. Depois não pode buscar uma reparação quando já não há mais aquela suposta coação econômica? Lógico que pode. A alteração no curso do contrato, onde não há garantia de emprego — e nem poderia dizer que vai ter uma estabilidade porque também não queremos engessar a vida dos empresários —, o trabalhador fica muito vulnerável. As alterações ocorridas no curso do contrato são feitas de forma unilateral e se trouxer prejuízo econômico financeiro, não pode buscar reparação? Pode, a CLT protege isso. Então temos vários artigos que eu costumo dizer que são a verdadeira linha dorsal do contrato de trabalho.
ConJur — A CLT e a Justiça do Trabalho, elas não protegem demais o trabalhador?
Lorival Ferreira dos Santos — Isto é um equívoco. A Justiça do Trabalho não protege ninguém, porque, quando o magistrado presta o concurso, nós juramos a Constituição e as leis da República. E assim é feito, julgamos de acordo com a CLT, esta sim, protecionista. E não é só ela, o Código de Defesa do Consumidor não é protecionista? As leis de previdência não são protecionistas? O Estatuto do Idoso não é protecionista? Do trabalho infantil não é protecionista? Então nós temos um arcabouço de proteções que o legislador chega e fala: “olha, aqui essa, aqui aquela, aqui aquela”. E assim foi com a CLT.
ConJur — Recentemente houve um debate acerca da portaria do Ministério do Trabalho que cria a chamada lista suja do trabalho escravo. O ministério poderia ter criado essa lista por meio de uma portaria? O senhor é favorável a essa divulgação?
Lorival Ferreira dos Santos — Não entro no mérito da criação da portaria, porque isso está sub judice. O que eu penso é o seguinte: se existe uma decisão, transitada em julgado, por que não se pode divulgar isso? Não há por que. É perfeitamente possível essa divulgação. A questão é se isso pode ser criado por portaria. Porque se formos esperar uma lei, jamais virá uma lei para fazer isso.
ConJur — Cabe arbitragem na Justiça do Trabalho?
Lorival Ferreira dos Santos — Cabe no âmbito do dissídio coletivo. A Constituição da República é muito taxativa, estando prevista a arbitragem no artigo 114. No âmbito do dissídio individual, não.
ConJur — Há projetos de lei no Congresso propondo a arbitragem em casos individuais também.
Lorival Ferreira dos Santos — No nosso entender, não cabe a arbitragem no âmbito trabalhista do dissídio individual, haja vista que não é preservada a autonomia da vontade do cidadão, essa autonomia da vontade estaria viciada. A arbitragem é feita de acordo com uma eleição, as partes elegem um árbitro. Dá para imaginar o trabalhador à mercê de uma grande empresa que tem centenas de empregados elegendo um árbitro juntamente com o dono da empresa? Como é que seria essa eleição do árbitro?
ConJur — E nos casos de cargos de relevância, como gerência, diretoria?
Lorival Ferreira dos Santos — Nesses casos acredito que não há vício porque a autonomia da vontade está preservada. Um grande diretor de uma multinacional ou de uma grande empresa nacional, ele pode, perfeitamente, estar em um impasse. Não dar entrada na Justiça do Trabalho e eleger um árbitro. Tudo bem. Mas, no âmbito geral, dos trabalhadores, não.
ConJur — O trabalho infantil é um tema que chega muito no TRT-15?
Lorival Ferreira dos Santos — O trabalho infantil é uma situação interessante. Eu, por exemplo, comecei a trabalhar aos 12 anos, mas recebi o apoio, o carinho do meu pai, da minha mãe, educação, acompanhamento. É lógico que queria brincar, mas, em uma família grande, trabalhar era uma necessidade e eu não senti nessa época. Apesar disso, acredito que a criança deve estudar e ter uma atividade lúdica. Por isso temos uma campanha aqui no tribunal contra o trabalho infantil.
ConJur — A experiência que teve em sua vida seria considerada trabalho infantil?
Lorival Ferreira dos Santos — Seria, porque eu comecei a trabalhar aos 12. Mas naquele tempo o mote era: é melhor trabalhar do que estar na rua. No meu entendimento, é melhor estudar, é melhor brincar. A criança sadia, bem nutrida, que estudou, terá oportunidades e não será o criminoso de amanhã. Nós tivemos um caso emblemático de trabalho infantil aqui na 15ª Região.
ConJur — O senhor pode nos contar?
Lorival Ferreira dos Santos — Um garoto, o Gedeão, com cerca de dez anos de idade, trabalhava pregando caixas que serviam para o transporte de hortifrutigranjeiros. Certo dia, um prego escapou e perfurou um dos olhos dele. Então ele procurou a Justiça do Trabalho. Os pais dele tentaram obter a carteira de trabalho para ele, mas foi negada porque não tinha mais de 16 anos. A Constituição diz que o trabalho é permitido para quem tem mais de 16, salvo na condição de aprendiz, que é a partir de 14 anos. Mas a Constituição diz isso para proteger o menor e não para ser contra ele. Os pais da criança buscaram a Justiça do Trabalho e uma colega nossa, brilhante, concedeu uma liminar para que fosse expedida a carteira. Foi expedida e houve uma ação na Justiça do Trabalho, com a participação do Ministério Público. Depois de algum tempo foi fechado um acordo em que envolveu até imóveis e pagamentos. Encerrado o caso, nunca mais vi o Gedeão. Até hoje fico curioso para conhecê-lo depois de adulto. Diziam que ele queria ser advogado ou juiz. Foi um caso emblemático que chamou toda a atenção da Justiça do Trabalho. Hoje, nós estamos implantando na 15ª Região os chamados JEIAs: Juizados Especiais da Infância e Adolescência, que têm como uma de suas funções fazer esse controle da autorização para o trabalho. Esses juizados também buscam um envolvimento com a comunidade, viabilizando locais onde possam receber essas crianças para estudar e atuar como aprendizes. Serão implantados ao todo dez JEIAs em nossa jurisdição, com um juiz em cada um deles que tenha esse viés social. Não basta apenas proibir o trabalho infantil. Vamos conversar com os pais e fazer o encaminhamento para escolas de aprendizagem.
ConJur — A liberdade sindical deveria ser plena no Brasil ou esse modelo de sindicato único vigente atende às necessidades?
Lorival Ferreira dos Santos — Isso é uma incógnita, porque tem a unicidade sindical no Brasil e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) prega a pluralidade sindical. Depois de alguns anos de experiência, chego à conclusão que é melhor a pluralidade sindical, com sindicatos mais combativos e representativos. Mas isso depende de uma reforma na Constituição porque o artigo 8º aborda claramente da unicidade. A maioria dos sindicatos é boa — às vezes ficamos orgulhosos em uma sessão de julgamento de dissídio coletivo quando comparece um dirigente bem preparado, que não fica apenas na dependência do advogado. Mas há também muitos sindicatos de carimbo, que não representam nada, apenas arrecadam.
ConJur — Por que a Justiça do Trabalho impede o trabalhador de negociar os direitos chamados indisponíveis, como o horário de almoço?
Lorival Ferreira dos Santos — Existem aqueles direitos que envolvem a própria higidez do corpo humano. Vamos imaginar que alguém queira negociar a jornada de 12 horas ou de 14 horas por dia. “Não, eu estou novo, eu consigo”. Por quanto tempo ele vai conseguir fazer isso? Eu vejo aqui processos em que o cortador de cana, às vezes, trabalha por dez horas ou mais. Quanto tempo ele vai conseguir fazer isso? O ganho por produtividade o estimula a trabalhar mais, fazendo um intervalo para refeição de vinte minutos. Cinco anos, seis anos, depois de dez anos ele é mandado embora porque a produção cai. A Constituição da República traz um princípio fabuloso, artigo 1º, o princípio da dignidade da pessoa humana. Por isso, o Tribunal Superior do Trabalho editou uma súmula que não permite a flexibilização, para proteger o ser humano.
ConJur — Qual é o reflexo das crises econômicas na Justiça do Trabalho?
Lorival Ferreira dos Santos — Lamentavelmente, há uma cultura do empresário que, quando há uma crise econômica, a primeira iniciativa é demitir. Com isso, aumenta o número de dissídios coletivos. Ao julgar um caso da Embraer, que demitiu quatro mil trabalhadores de uma só vez em 2009, o TRT entendeu que a empresa não poderia simplesmente fazer uma demissão coletiva sem justa causa, como no âmbito individual. Isso porque a empresa tem responsabilidade social. Nós construímos um entendimento de que é necessário negociar com o sindicato da categoria profissional, buscando alternativas. Essa decisão foi levada ao TST, que manteve a jurisprudência.
Tadeu Rover é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 24 de maio de 2015, 8h23