segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Higi Serv é absolvida de pagar adicional de periculosidade por trabalho em altura



A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) absolveu a Higi Serv Limpeza e Conservação S.A., de Curitiba (PR), de pagar a um vidraceiro o adicional de periculosidade por trabalho em altura referente a período anterior a abril de 2012, quando a empresa passou a pagá-lo espontaneamente. O desembargador convocado Bruno Medeiros, relator do recurso, esclareceu que a Norma Regulamentadora 35 do Ministério do Trabalho e Emprego "não impõe obrigação de pagamento do adicional de periculosidade em virtude do trabalho desempenhado em altura".

Contratado inicialmente como auxiliar de serviços gerais, o trabalhador passou a fazer limpeza de janelas em altura em agosto de 2011 e, em abril de 2012, passou a receber o adicional de periculosidade. Ao ser informado de que não receberia o adicional pelos meses anteriores, pediu desligamento em junho de 2012 e ajuizou a reclamação trabalhista.

Seu pedido foi julgado procedente pela primeira instância. A sentença destacou que a empregadora, ao pagar o adicional, "fez presumir que a atividade de vidraceiro era perigosa". O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) manteve a sentença, o que provocou recurso empresarial ao TST.

Ao analisar o processo, o desembargador Bruno Medeiros ressaltou que, ao manter a condenação, o TRT contrariou o artigo 193 da CLT. Ele enfatizou que a NR 35 não obriga ao pagamento do adicional nesse caso, "limitando-se a estabelecer requisitos mínimos de segurança aos trabalhadores que se ativam nessas condições".

Na avaliação do relator, o pagamento espontâneo do adicional não torna o empregador devedor da parcela quanto ao período passado, ainda que o trabalho tenha se dado nas mesmas condições, como no caso, "uma vez que se trata de benesse concedida pela empresa ante a falta de determinação legal para que assim procedesse".

(Lourdes Tavares/CF)


Fonte: TST

Aposentado tem direito a manter plano de saúde nas mesmas condições vigentes no período da ativa



 

*Publicada originalmente em 31/03/2014 



Nos contratos individuais de trabalho a alteração das condições pactuadas só será considerada lícita se isso for feito por mútuo consentimento e, ainda assim, desde que não resultem em prejuízos ao empregado (artigo 468/CLT). Por esse fundamento, a juíza Gisele de Cássia Vieira Dias Macedo, em atuação na 2ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, considerou ilícita a alteração contratual imposta a um empregado que, após sua aposentadoria, teve o valor da contribuição paga ao plano de saúde aumentado, em face da alteração do plano de grupo familiar para individual. A juíza reconheceu ao ex-empregado aposentado o direito de se manter no plano de saúde nas mesmas condições que vigoraram durante o seu contrato de trabalho.

Conforme verificou a magistrada, a alteração contratual lesiva ocorreu após o término da relação de emprego no ano de 2013, quando o ex-empregado passou a contribuir como segurado individual, o que lhe acarretou significativa majoração no valor de custeio (de R$202,35 no Padrão Especial do grupo familiar para R$378,56 por pessoa no Padrão Básico, sendo que no Padrão Especial, o valor foi majorado para R$684,18 por pessoa). A magistrada também constatou que o trabalhador e seus dependentes se vincularam ao plano de saúde desde a data de admissão, permanecendo vinculados ao plano após a aposentadoria do ex-empregado por tempo de contribuição, quando ele optou pela manutenção do plano de saúde, na condição de aposentado, juntamente com sua esposa, sua mãe e duas filhas, no Padrão Básico.

O banco empregador e a Fundação de Saúde mantenedora do plano sustentaram que as contribuições dos usuários ativos são diferentes das contribuições dos usuários assistidos. Mas o argumento não foi acatado pela julgadora. Ela explicou que o Regulamento do Plano de Saúde aplicável ao caso e as disposições da Lei 9.656/98, que trata dos planos e seguros privados de assistência à saúde ao aposentado, garantem ao ex-empregado aposentado o direito de se manter no plano de saúde nas mesmas condições que vigoraram durante seu contrato de trabalho.

Assim, a juíza condenou o banco empregador e a fundação de saúde instituída e patrocinada pelo banco, de forma solidária, a manterem as mesmas condições contratuais, padrão e preços do plano de saúde médico-ambulatorial/hospitalar e odontológico anteriormente à alteração ilícita ocorrida (Padrão Especial), devendo ser aplicada ao ex-empregado o custeio integral do grupo familiar, conforme previsto no regulamento do plano de saúde, com a garantia dos benefícios do plano de saúde a seus dependentes e agregados, restringindo a alteração do valor de custeio apenas aos aumentos legais e as atualizações dos valores. Ela determinou ainda que o banco e a fundação se abstenham de alterar as cláusulas, normas e benefícios dos serviços do plano de saúde, bem como devolvam os valores pagos em excesso, com juros e correção monetária. O banco e o plano de saúde recorreram da decisão, que foi mantida pelo TRT de Minas.( 0002530-11.2013.5.03.0002 RO )
Fonte: TRT3

Em ações de seguro, juízes ignoram códigos para atender a questão social"







Quando Sergio Barroso de Mellocomeçou a advogar para empresas de seguro, verificou que o setor contribuía com míseros 0,5% para o Produto Interno Bruto brasileiro. Ficou surpreso ao perceber o salto para os atuais quase 5% da participação desse ramo no somatório de todas as riquezas do país. E não foi só a maior presença dessa área o que impressionou o especialista em quase 30 anos de atuação. A consolidação do Direito Securitário foi a grande e, na avaliação dele, a mais importante consequência desse crescimento.

Mello conta que o tão esperado marco legal dos seguros veio em 2003, com o novo Código Civil. De uma tacada só, um capítulo com 50 artigos dirimiu as principais dúvidas do setor. “Esse arcabouço jurídico entrou em vigor e provocou na Susep (Superintendência de Seguros Privados), que é o órgão regulador, um sem-número de circulares e orientações que adaptaram o mercado a essa nova norma. Isso se refletiu no Poder Judiciário, que hoje conta com um ambiente juridicamente seguro em relação a vários temas polêmicos”, explica o advogado.

A segurança jurídica contribuiu para a expansão do setor. Seguradoras internacionais investiram no país e produtos voltados para os mais diversos públicos foram lançados, inclusive para a população menos favorecida. De acordo com Mello, hoje o Brasil observa um efeito então não previsto: a concessão de indenizações, pelo Poder Judiciário, meramente por questões sociais.

“Há a interpretação dos contratos pelo Judiciário um pouco mais flexibilizada, feita com base em teorias modernas pelas quais, em casos de dúvida sobre as cláusulas, julga-se a favor do segurado. Particularmente acho correta essa teoria da interpretação do contrato em favor do segurado nos casos em que existam dúvidas. Essa tese foi consagrada pelo Código do Consumidor e temos que respeitá-la. Mas não é só isso: às vezes encontramos no Judiciário (...) decisão muito mais ligada a uma percepção social que à estrutura jurídica consagrada nos códigos”, afirma.

A tendência cada vez maior do Judiciário de julgar de “forma mais humana” os pedidos para o pagamento de sinistros, sobretudo os feitos pelos mais carentes, ainda não chega a ser considerada um problema para as seguradoras. Mas acendeu o alerta do setor, que vem acompanhando com cautela as decisões.

“Política social quem faz não é o Judiciário, mas os Poderes Executivo e Legislativo. O que Judiciário faz é interpretar a lei, o negócio jurídico e o contrato. E isso com base no direito e não em um sentimento social”, destaca o advogado com conhecimento de causa. É que ele acabou de assumir cargo na cúpula da principal entidade mundial do setor de seguros — a Associação Internacional do Direito do Seguro (Aida, sigla em inglês).

Presente em mais de 70 países, a Aida é uma entidade sem fins lucrativos, que desenvolve atividades de estudo e pesquisa em Direito de Seguro e Resseguro. Em outubro último, Mello assumiu a vice-presidência e se tornou o primeiro brasileiro a ocupar um alto posto na associação. À ConJur, ele fala sobre a importância para o Brasil dessa representação e os planos que tem para o seu mandato.

Leia na entrevista:

ConJur — Qual a importância para o Brasil ter um representante em uma entidade como a Aida?
Sergio Barroso de Mello — A Aida é uma associação de advogados que atuam fundamentalmente na área de seguros. A entidade tem 52 anos de existência, com sede em Londres, e está presente em 78 países. É uma associação acadêmico-científica, de apoio ao desenvolvimento desse setor. Ao longo de sua existência, muitos estudos foram produzidos: o que gerou novos produtos, assim também como a melhoria nas relações com os consumidores. Um exemplo é a franquia, criada após estudos técnicos e jurídicos da Aida nos anos de 1970. As regras de compliance também são outro exemplo. Nos últimos anos, a entidade tem tido uma preocupação grande de estudar regras e boas práticas para manter a indústria de seguros firme. O objetivo da entidade é ajudar no desenvolvimento saudável do mercado de seguros. Interessa a todos um mercado economicamente forte, mas com acesso fácil ao consumidor. Então, acho muito importante a participação efetiva do Brasil nessa associação porque ela é vista no mundo inteiro como uma grande companheira acadêmica e científica do mercado. Acho que o Brasil, carimbando sua presença lá, deixará bem claro que se preocupa com o desenvolvimento e a qualidade do setor de seguros. Por outro lado, essa presença garantirá ao país acesso a tudo que está acontecendo no setor em escala mundial. É claro que o mundo globalizado de hoje já nos facilita o acesso a informações, mas há práticas acontecendo que nem sempre encontramos na mídia da noite para o dia. Então, estando lá, poderemos ver de perto tudo o que está acontecendo.

ConJur — Como vice-presidente, o senhor pretende apresentar alguma pauta de trabalho?
Sergio Barroso de Mello — O próximo congresso mundial será no Rio de Janeiro, em 2018. E uma das minhas tarefas é fazer a ponte entre a Aida Brasil, que é a organizadora do evento, e a Aida mundial. Os congressos da Aida são preparados com muita antecedência, pois nele são examinados de 15 a 20 temas. Os congressos são muito ricos e profundos.

ConJur — Com relação ao arcabouço jurídico na área de seguros, como o senhor avalia o Brasil?
Sergio Barroso de Mello — O Brasil está muito bem estruturado no campo jurídico. Até 2002, o Código Civil era a nossa fonte principal para os contratos. Em 2003, com a atualização dessa lei, passamos a ter um capítulo específico, o de número 15, com 50 artigos, todos dedicados ao setor de seguros — de pessoas a propriedades em geral. Esse arcabouço jurídico entrou em vigor e provocou na Susep, que é o órgão regulador, um sem-número de circulares e orientações que adaptaram o mercado a essa nova norma. Isso se refletiu no Poder Judiciário, que hoje conta com um ambiente juridicamente seguro em relação a vários temas polêmicos. Temos também uma segurança jurídica enorme para efeito de operação na área de seguro e resseguro.

ConJur — Há algum tema ainda controverso para o setor e que necessitaria de lei específica?
Sergio Barroso de Mello — Acredito que não. Vejo a nossa legislação muito bem preparada. Se compararmos o Brasil não só com os nossos vizinhos — como a Argentina, Colômbia e Chile, que contam com boas legislações — mas também com os países europeus, veremos que a nossa legislação não é muito diferente. Na verdade, temos uma lei muito parecida com a dos países mais desenvolvidos. Isso até por conta do papel da Aida de promover a harmonização da legislação no mundo inteiro. A associação produziu vários projetos de lei, com linguagem e sistematização muito parecidas. Isso gerou e está gerando leis parecidas sobre contratos de seguros.

ConJur — Como o senhor avalia a jurisprudência brasileira na área?
Sergio Barroso de Mello — Vejo que existem algumas áreas de seguro, por exemplo como os de saúde, microsseguro, DPVAT e outros de massa, que a sociedade menos favorecida, digamos assim, adquire, mas tem certa dificuldade de interpretação. Há a interpretação dos contratos pelo Judiciário um pouco mais flexibilizada, feita com base em teorias modernas pelas quais, em casos de dúvida sobre as cláusulas, julga-se a favor do segurado. Particularmente acho correta essa teoria da interpretação do contrato em favor do segurado nos casos em que existam dúvidas. Essa tese foi consagrada pelo Código do Consumidor e temos que respeitá-la. Mas não é só isso: às vezes encontramos no Judiciário, talvez até por desconhecimento da técnica do seguro, decisão muito mais ligada a uma percepção social que à estrutura jurídica consagrada nos códigos. Então, não é raro vermos, por exemplo, uma decisão tecnicamente contrária ao Código Civil. Exemplos são as ações de responsabilidade civil, que hoje abarrotam os tribunais. Segundo estatísticas do CNJ, essas demandas são maioria no Judiciário e não raro a questão do seguro está por trás de boa parte delas. Temos visto que as interpretações adotadas, às vezes, ignoram a técnica do contrato: ou seja, o próprio código. De um lado há uma família muito carente, que não tem a menor condição de sobreviver, após o falecimento de um familiar, se não for por meio do pagamento de uma indenização... Essa é questão social que pode tocar um pouco mais o magistrado. Notamos aí essa percepção do Judiciário de julgar com base em uma visão menos jurídica e mais humana.

ConJur — Isso é ruim?
Sergio Barroso de Mello — Esse é o ponto. Quando falamos em negócios, falamos também em segurança jurídica. Nenhum empresário faz negócio se não houver segurança jurídica. E essa segurança é fundamental para todos, inclusive os beneficiários, para que possam saber o que é um direito, uma obrigação e até mesmo um dever. Então, quando há uma decisão fora da lei, há a consagração da insegurança jurídica, o que é ruim para todo mundo. Política social quem faz não é o Judiciário, mas os Poderes Executivos e Legislativo. O que Judiciário faz é interpretar a lei, o negócio jurídico e o contrato. E isso com base no direito e não em um sentimento social. Do contrário, ele poderá beneficiar um consumidor em um primeiro momento e em outro trazer prejuízos com insegurança jurídica que estará provocando ao acabar por afastar os consumidores da oportunidade de contratar novos negócios com preços e condições melhores. Então, esse é um reflexo indiscutível dessas decisões em seguro de massa.

ConJur — Essas interpretações ocorrem em qual escala? De fato tem preocupado as seguradoras?
Sergio Barroso de Mello — Acho que é uma coisa em menor escala. É mais um movimento que estamos observando. Se olharmos para o Judiciário como um todo, veremos que ele trabalha bem, que já teve uma percepção diferente da área de seguros. Isso também porque no Código Civil anterior havia uma regulação menor. O contrato de seguros era visto de uma maneira diferente, não se tratava tão bem dele como agora. Sobretudo a partir de 2003, quando o novo Código Civil entrou em vigor, a segurança jurídica chegou ao Judiciário, que se debruçou sobre a norma e passou a interpretá-la de maneira muito clara e tranquila. Isso fez com que o mercado de seguros pudesse ter segurança jurídica para produzir novos produtos, como os seguros populares. Os seguros massificados só vão funcionar com essa segurança jurídica. Assim como outros. 
Para fazermos um paralelo, temos os seguros de responsabilidade civil de empresários. Hoje temos esse problema da Petrobras. Quem está envolvido? Diretores, gerentes e conselheiros. Todos têm seguros de responsabilidade civil, o famoso D&O, que se desenvolveu no Brasil ao longo desses anos pela boa segurança jurídica que extraímos do capítulo de responsabilidade civil do novo Código Civil. Esse é um belíssimo produto. Já se pagou indenizações em milhões de reais nesse país, assim também como já se recolheu milhões de reais de prêmio. É um seguro que atende a todos. Claro que a má-fé não está coberta, mas muitas vezes o administrador de uma empresa pode se envolver numa situação de corrupção sem saber e nesse caso ele estará coberto.

ConJur — Mas como provar se houve ou não má-fé?
Sergio Barroso de Mello — É difícil. A prova é basicamente testemunhal e documental. Muitas vezes há um diretor financeiro que pode estar junto com uma equipe produzindo a ilicitude. Os diretores administrativo e comercial, por exemplo, não estão enxergando isso. Aí vem o escândalo, a denúncia contra a empresa é apresentada e o processo é aberto contra todos os diretores. O que vai fazer o segurador de D&O? Vai guardar a evolução desse processo criminal. Ao final, se perceber que a responsabilidade é de determinado diretor, aqueles que entraram de boa-fé e que não sabiam o que estava acontecendo vai ter garantia do seguro. Esse é só um exemplo.

ConJur — Com relação à tributação, como é que o senhor vê as seguradoras mundiais que querem atuar no Brasil? 
Sergio Barroso de Mello — Já tivemos uma discussão muito forte sobre tributação quando o mercado de resseguros abriu. A tributação acabou sendo consolidada. Confesso que não sou um especialista em tributos, mas o que vimos da discussão foi a interpretação equivocada sobre o aumento de alíquotas. Ao fim as alíquotas aplicadas até foram razoáveis e isso não impediu a vinda de resseguradores para o Brasil, tampouco o pagamento de indenizações.

ConJur — Para os advogados, como é o mercado de seguros?
Sergio Barroso de Mello — Faltam advogados com conhecimento de seguros e resseguros no mercado. Temos muito poucos que entendem a fundo a técnica e o direito desse setor. Quando eu comecei a exercer essa atividade, o setor de seguros representava 0,5% do PIB. Hoje chega quase a 5%. Foi um salto grande. E o potencial crescimento desse setor é enorme. Há, então, muitas áreas a explorar. Não existe nenhuma indústria que se sustente sem crédito e seguro. Esses são os dois pilares fundamentais do desenvolvimento de qualquer negócio. Precisamos de profissionais para dar sustentação a essa área. 


Giselle Souza é correspondente da ConJur no Rio de Janeiro.

Revista Consultor Jurídico, 4 de janeiro de 2015, 7h07

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Pensou-se no STF e no STJ, mas faltou ouvir o povo sobre o novo CPC





[Artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo de 17/12]

Melhorar a legislação do País é sempre providência salutar e bem­vinda, pois a todos interessa a existência de leis constitucionais e adequadas à realidade brasileira e, no caso específico do processo civil, que atendam às garantias constitucionais da celeridade processual e da razoável duração do processo.

Equívoco muito comum entre nós é pretender modificar a legislação como se, num passe de mágica, essa mudança fosse capaz de alterar a natureza e a realidade das coisas. Não é com mudança de legislação, apenas, que serão melhoradas as condições da Justiça brasileira e o tempo de duração dos processos, bem como a qualidade da prestação jurisdicional pelos juízes e tribunais do País.

Leis nós temos muitas. E boas. O CPC vigente, de 1973, é uma lei excelente. O novo, que foi aprovado pelo Senado, não foi feito porque a lei anterior era ruim, mas para tentar equacionar o problema do estoque dos processos nos escaninhos dos órgãos do Poder Judiciário, principalmente nos tribunais superiores.

A aplicação dessas leis e/ou sua efetividade é que sofrem das mazelas culturais, econômicas e sociais próprias de País em desenvolvimento e que está caminhando a passos lentos para a estabilização das instituições democráticas.

O Código de Defesa do Consumidor e a Lei da Ação Civil Pública são dois exemplos excepcionais, que têm prestado relevantes serviços à cidadania brasileira, mas que, por outro lado, não têm sido tão efetivos em virtude da utilização inadequada por todos aqueles que devem se servir dessas leis. Falamos de advogados, membros do Ministério Público, Magistrados em geral, órgãos da Administração Pública e Procuradores Públicos. Essa é a razão pela qual se pretende a reforma do CDC e da LACP. O problema não é de deficiência da lei, mas sim sua aplicação e efetividade. Em suma, o problema é cultural.

No caso do CPC, o cenário é um pouco diferente, mas a gênese é semelhante. Há um problema grave de acúmulo de processos no Poder Judiciário, o que vale dizer que há demora excessiva na solução dos casos submetidos ao exame dos juízes e tribunais.

Apesar da versão aprovada pelo Senado Federal ser muito melhor do que a de 2010, originariamente aprovada pelo mesmo Senado e que era extremamente ruim, pensou­se num novo CPC que privilegiasse a questão do estoque de processos e a hierarquia dos tribunais superiores sobre os tribunais regionais federais e estaduais e, destes, sobre os juízos singulares.

Essa visão, em meu modo de ver é, em princípio, distorcida, porque ataca o efeito mas não a causa. Há um número excessivo de processos, então tomam­se medidas para solucionar a questão. O problema é de outra ordem, nomeadamente, de natureza cultural. O exemplo vem de cima, pois o primeiro a descumprir a Constituição e as leis é o Poder Público. Ele não cumpre as leis e, com esse mau exemplo, os particulares também não cumprem, gerando a judicialização dos problemas originados por esse descumprimento. Se o Poder Público cumprisse a Constituição e as leis, tomando a iniciativa de decidir com responsabilidade questões cristalinas sobre as quais não há dúvida, a diminuição de demandas seria sensível e ocorreria automaticamente.

O projeto aprovado pelo Senado obedece a pauta dos tribunais superiores. Vale dizer, foi elaborado para desafogar os escaninhos principalmente do STF e do STJ, sem que se tivesse privilegiado o jurisdicionado, o povo, destinatário final da prestação jurisdicional.

Não se perguntou à população se ela quer a extinção de recursos ou a dificuldade em admitir­se recurso para qualquer tribunal. Ou seja, se deseja que seu direito constitucional de ação seja impedido por decisão liminar que julga improcedente sua pretensão, e colocando um ponto final na discussão se essa contraria súmula de tribunal!

Em meu entender, a população deveria ter sido consultada, de nada valendo a afirmação de que o projeto foi aprovado na "Casa do Povo", que é a Câmara dos Deputados. Estou falando de democracia verdadeira e não de democracia formal. Não se faz um Código de Processo Civil para atender interesses apenas de tribunais.

A questão da hierarquia é ainda mais aguda. Quer­se instituir o autoritarismo do processo com o denominado "direito jurisprudencial", termo que coloco entre aspas porque entendo ser pejorativo, já que não pode existir num País que adota como fundamento o estado constitucional, jurisprudência vinculante, seja de que tribunal partir essa determinação. O CPC de 1973, aprovado durante o regime da ditadura militar era e é ideologicamente democrático; o novo CPC, com a instituição de obediência hierárquica dos juízos aos tribunais, com a instituição de súmula vinculante, súmula impeditiva de recurso e outros expedientes assemelhados, será um código ideologicamente autoritário. Mais uma vez estaremos diante de um "estado democrático de direito" virtual, de uma democracia com punhos de renda.

No mais, naquilo que o projeto traz de melhoria dos institutos processuais, só pode receber elogios, pois, repito, ninguém pode colocar­se contra a melhoria da legislação. Mas isso é varejo. No atacado, o Código será autoritário, instalará a ditadura dos tribunais e descumprirá o já tão menosprezado direito de ação, garantia constitucional que deverá ser tratada como cláusula de algodão, porque de pétrea parece que não terá mais nenhum vestígio.

Boa sorte ao jurisdicionado brasileiro. É o quer posso humildemente desejar.


Nelson Nery Jr. é parecerista, professor titular das Faculdades de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC­-SP) e da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho (Unesp) e sócio do Nery Advogados



Revista Consultor Jurídico, 20 de dezembro de 2014, 13h16

O novo CPC e o processo judicial eletrônico

O novo CPC e o processo judicial eletrônico




O novo Código de Processo Civil pouco se ateve a tramitação processual por meio eletrônico, mesmo apesar dos sete anos de existência da Lei que instituiu o processo judicial informatizado.

A Lei 11.419/2006 se traduz em texto reduzido de 22 artigos, que delegou aos órgãos do Poder Judiciário sua regulamentação, no âmbito de suas respectivas competências.

Desde março de 2007 o exercício da advocacia em meio eletrônico se condiciona ao conhecimento da regulamentação concretizada por cada um dos 27 Tribunais de Justiça, pelos cinco Tribunais Regionais Federais, pelo Supremo Tribunal Federal, pelo Superior Tribunal de Justiça, além da Justiça Trabalhista, absolutamente díspares.

Invariavelmente a regulamentação protagonizada pelos Tribunais adentra a seara alheia, instituindo regras e exigências inexistentes no ecossistema do Direito Processual, fato que vem causando grave insegurança jurídica.

O novo CPC não trouxe a tão desejada unificação das regras e procedimentos da tramitação judicial por meio eletrônico. Perdeu-se rara oportunidade de exterminar essas dezenas de ilhas isoladas de normas internas.

Caberá ao Conselho Nacional de Justiça a competência de regulamentar supletiva aos tribunais quanto a prática e a comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico, cabendo velar pela compatibilidade dos sistemas, disciplinar a incorporação progressiva de novos avanços tecnológicos e editando, para esse fim, os atos que forem necessários, respeitadas as normas fundamentais do novo CPC.

Muito ainda será comentado e analisado. Viver para ver os resultados!

Selecionamos os artigos do novo CPC que fazem referência direta ao meio eletrônico. Clique aqui para ler. 


Ana Amelia Menna Barreto é advogada do Barros Ribeiro Advogados Associados e diretora de inclusão digital da OAB-RJ.



Revista Consultor Jurídico, 22 de dezembro de 2014, 9h53

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Proposta para o Novo CPC: Juiz pode fazer penhora online se houver fundamento






Se é verdade que a primeira versão do CPC, aprovada pelo Senado em 2009, institucionalizava um poder judicial quase sem limites para a decretação da penhora on line, e se é verdade também que a Câmara dos Deputados, após longos debates, resolveu restringir enormemente tais poderes, condicionando-os à existência de “decisão de tribunal”, o que resta agora aos senadores que se reúnem em sessão plenária na terça-feira (16/12) é encontrar uma solução de equilíbrio que favoreça e torne razoável o trânsito processual.

Para esse fim, lembramos que existe uma solução intermediária no substitutivo apresentado à Câmara pelo Deputado Miro Teixeira, de nossa lavra, e que pode constituir uma saída para o dilema da penhora on line sem ferir a norma regimental que impede a construção de novos textos, além dos aprovados em cada uma das casas legislativas.

A proposta de solução é a seguinte: a supressão dos §§ 9º e 10º do art. 870 que vieram da Câmara e que sujeitam a penhora on line à “decisão de tribunal” – supressão objeto de emenda recente de alguns senadores para fortalecer o juiz de primeiro grau em favor dos credores –, mas com o acréscimo ao caput do mesmo art. 870 da exigência de fundamentação cautelar (o condicionamento à ocorrência de “perigo na demora da prestação jurisdicional”) e de expressa justificação das “razões de seu convencimento de modo claro e preciso”, por parte do juiz ao decidir, tudo para assegurar o direito de não agressão liminar ao patrimônio dos devedores sem um motivo sério.

Observe-se que o acréscimo de fundamento cautelar ao caput do art. 870 nada mais significa do que a explicitação da razão da necessidade do bloqueio liminar e da justificativa da própria cláusula “sem dar ciência prévia do ato ao executado” que consta do texto. Em outras palavras, a exigência de periculum in mora apenas explica o cabimento do bloqueio on line que o texto original do Senado, de 2009, não fazia, mas também atende à preocupação da Câmara de não permitir bloqueios levianos.

O acréscimo proposto é o meio-termo entre o fortalecimento excessivo do poder do juiz (do Senado, de 2009) e o enfraquecimento excessivo do poder do juiz (da Câmara, de 2013). Trata-se do ponto de equilíbrio entre a vontade das duas casas legiferantes e a mera explicitação do que o Senado, em 2009, podia e devia ter dito, mas não disse. Afinal de contas, o bloqueio on line serve para situações perigosas e para executados perigosos (os que estão fugindo, escondendo bens, esvaziando contas) e não para quaisquer executados.

Além disto, a solução por nós cogitada também acaba justificando a emenda que propõe a supressão da cláusula final do parágrafo único do art. 298 do texto da Câmara que regula a tutela de urgência (“vedados o bloqueio e penhora de dinheiro, de aplicação financeira e outros ativos”), porque se o juiz pode liminarmente bloquear on line em sede executiva, é natural que ele possa bloquear on line em sede de tutela cautelar, sob a forma de arresto, como previsto pelo art. 301, §3º, do projeto aprovado pela Câmara dos Deputados em 2013.


Antônio Cláudio da Costa Machado é advogado e professor de Teoria Geral do Processo e Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da USP, professor de pós-graduação da Faculdade de Direito de Osasco, coordenador de Direito Processual Civil da Escola Paulista de Direito, mestre e doutor em Direito pela USP.



Revista Consultor Jurídico, 15 de dezembro de 2014, 12h02

Bem de família do fiador em contrato de aluguel é penhorável





É possível penhorar bem de família de fiador apontado em contrato de locação. Esse foi o entendimento da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recurso Especial afetado como recurso repetitivo — ou seja, todos os recursos que tratam da mesma questão jurídica que estavam sobrestados no STJ, nos tribunais de Justiça dos estados e nos tribunais regionais federais terão, agora, andamento.

De acordo com o artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/90, a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Com unanimidade, o colegiado seguiu a jurisprudência já firmada pelo STJ e pelo Supremo Tribunal Federal. Relator do caso, o ministro Luis Felipe Salomão destacou que, conforme o artigo 1º da Lei 8.009, o bem imóvel destinado à moradia da entidade familiar é impenhorável e não responderá pela dívida contraída pelos cônjuges, pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas no artigo 3º da norma.

“Infere-se, pois, que a legislação pátria, a par de estabelecer como regra a impossibilidade de se impor a penhora sobre bem imóvel destinado à moradia do indivíduo e de sua família, excetuou a hipótese do fiador em contrato de locação, permitindo que tal gravame seja lançado sobre o imóvel”, afirmou Salomão.

“A jurisprudência desta corte é clara no sentido de que é possível a penhora do bem de família de fiador de contrato de locação, mesmo quando pactuado antes da vigência da Lei 8.245/91, que alterou o artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009”, concluiu o ministro.

Entretanto, o ministro ressaltou que há divergência na doutrina sobre o tema em discussão. De um lado, autores como José Rogério Cruz e Tucci e Carlyle Popp entendem que o bem de família do fiador não pode ser penhorado para satisfação de débito em contrato de locação. Por outro lado e em conformidade com a jurisprudência do STJ e do STF, doutrinadores como Álvaro Villaça Azevedo, Alessandro Segalla e Araken de Assis defendem ser legítima a penhora, com base no artigo 3º da Lei 8.009.

O caso
No caso julgado pelo STJ, a ação de cobrança de aluguéis e encargos locatícios foi ajuizada por um espólio. O juízo de primeiro grau acolheu o pedido e declarou rescindido o contrato de locação, decretou o despejo e condenou todos os réus, solidariamente, ao pagamento dos aluguéis e encargos da locação vencidos e os vincendos até a data da desocupação do imóvel.

A sentença transitou em julgado, e o espólio iniciou o seu cumprimento, tendo sido penhorados imóveis dos fiadores, que apresentaram exceção de pré-executividade. Entre outras questões, sustentaram a inconstitucionalidade do artigo 3º da Lei 8.009. O juízo, no entanto, rejeitou a alegação de impenhorabilidade do bem de família em vista dos precedentes judiciais.

Os fiadores recorreram, e o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul tornou insubsistente a penhora que recaiu sobre um dos imóveis, por ele ser bem de família. A decisão, no entanto, foi revertida pelo STJ. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.


Revista Consultor Jurídico, 19 de novembro de 2014, 20h00

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...