quinta-feira, 3 de julho de 2014

Ministério da Justiça lança estratégia para diminuir quantidade de ações


Ministério da Justiça lança estratégia para diminuir quantidade de ações



Para facilitar a resolução de conflitos sem a intervenção do Poder Judiciário e, assim, diminuir a quantidade de processos pendentes, o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria de Reforma do Judiciário, lançou a Estratégia Nacional de Não Judicialização (Enajud). O evento de lançamento foi nesta quarta-feira (2/7), em Brasília.

O setor público, empresas de telecomunicações e bancos são partes em cerca de 95% das demandas judiciais, e é por isso que serão firmados acordos de cooperação com as instituições financeiras e as telefônicas para que desenvolvam as estratégias em conjunto.

Presente no lançamento, a presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Leila Mariano, explica que "da forma tradicional" não é possível dar conta da quantidade de ações na Justiça. "E isso não significa que os juízes não trabalham, muito pelo contrário”, afirma, lembrando que o TJ-RJ é um dos parceiros da Enajud.

A abertura do evento foi feita pelo secretário de Reforma do Judiciário,Flávio Crocce Caetano (foto). Ele ressaltou que o próposito do projeto é promover a mediação, a conciliação e a negociação. “Vamos treinar servidores públicos e servidores privados para resolver pequenos conflitos”, disse o secretário.

Ao lado dele estavam o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o ministro da Previdência Social, Garibaldi Alves Filho, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Para Adams, a tarefa tem uma repercussão muito significativa não só para o Judiciário, mas para todo o Estado. “As pessoas vão para a Justiça porque o Estado produz um déficit na Justiça. Vamos tornar o Brasil menos custoso para o brasileiro e [para o] estrangeiro também”, disse o ministro.

Também presente, o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Alexandre da Silva Gluher disse que a iniciativa da Enajud é “brilhante”, pois vai diminuir as demandas jurídicas que podem ser resolvidas com mais agilidade.

Em parceria com o MJ, a Enajud também será instituída pela Advocacia-Geral da União e pelo Ministério da Previdência Social, e contará com a colaboração do Conselho Nacional de Justiça, do Conselho Nacional do Ministério Público e de instituições do Sistema de Justiça e privadas. 

Para o presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito (Acrefi), Érico Sodré Quirino, “esse é um grande passo para melhorar a Justiça do nosso Brasil”. O presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Luiz Carlos Trabuco Cappi, acrescentou que “este é o primeiro passo e bendito é o fruto que nasce agora”.

Acesso à Justiça
No lançamento, Flávio Caetano apresentou, também, um aplicativo para celulares que informa a localização do serviço público mais perto para que o cidadão possa resolver uma demanda judicial.

Chamado de Atlas de Acesso à Justiça, além de dar informações básicas sobre a Justiça no Brasil, o aplicativo vai oferecer ao usuário o percurso até a unidade desejada. Serão disponibilizados mais de 60 mil endereços com telefones e o site do órgão.

Se o usuário clicar no botão “Essencial à Justiça”, por exemplo, terá de prontidão o acesso ao Ministério Público, Ministério Público do Trabalho, seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil e defensorias públicas.

O programa já está disponivel para o sistema operacional Android e, em 15 dias, estará disponível também para o sistema IOS. Para baixar, basta procurar por “Atlas à Justiça” ou "Acesso à Justiça" no Google Play.


Renata Teodoro é repórter da revista Consultor Jurídico.



Revista Consultor Jurídico, 02 de julho de 2014, 19:44h

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Turma anula julgamento de TRT que não permitiu sustentação oral de advogado


Turma anula julgamento de TRT que não permitiu sustentação oral de advogado


A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho acolheu recurso da Montesiro Empreendimentos Imobiliários Ltda. e anulou julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC) no qual a empresa foi impedida de fazer a sustentação oral por não ter se inscrito pra isso antes do começo da audiência de julgamento. Para a Turma, a situação caracterizou cerceamento do direito de defesa.

A inscrição antecipada para a sustentação consta no Regimento Interno do TRT (artigo 105, parágrafo 1º). No entanto, de acordo com o ministro Emmanoel Pereira, recurso da empresa na Turma, o advogado tem o direito de fazer a sustentação oral em favor de seus clientes. Para o relator, a inscrição "é um mero procedimento inserido nos Regimentos Internos dos Tribunais, como condição para que o advogado tenha preferência no julgamento".

Emmanoel Pereira citou decisões anteriores do TST nesse sentido, como a da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) de julho de 2013, (RR-131000-35.2005.5.03.0004). "Aos advogados assiste o direito público subjetivo de, em processo judicial, valer-se da prerrogativa de utilizar a palavra, da tribuna, em favor de seus clientes, mesmo nas hipóteses em que não externada tal intenção mediante inscrição prévia para o exercício da sustentação oral", destacou o acórdão da SDI-1. "Trata-se de prerrogativa jurídica de essencial importância, que compõe o estatuto constitucional do direito de defesa".

Ao acolher o recurso da Monstesiro Empreendimentos, a Quinta Turma do TST determinou o retorno do processo ao Tribunal Regional do Trabalho para a realização de novo julgamento, assegurando ao advogado o exercício do direito à sustentação oral.

Processo: RR-2582-64.2011.5.12.0054

(Augusto Fontenele/CF)

Fonte: TST

Cooperação inédita com TRTs contribui para melhora no desempenho do TST


Cooperação inédita com TRTs contribui para melhora no desempenho do TST






Ao encerrar o primeiro semestre judiciário de 2014, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Barros Levenhagen, ressaltou a melhoria no desempenho processual do Tribunal, que, apesar de ter recebido maior número de processos em relação ao mesmo período no ano anterior, conseguiu aumentar a quantidade de processos julgados. O presidente destacou que foram julgados 123.392 processos, o que representa 4,7% a mais que no primeiro semestre de 2013.

Parceria inédita

Parte deste desempenho é atribuída pelo ministro Levenhagen a uma parceria inédita firmada entre o TST e 16 Tribunais Regionais do Trabalho por meio de acordo de cooperação técnica pelo qual 16 desembargadores passaram a receber, a partir de 12 de maio, cem processos por semana cada um, totalizando, até agora, 11.200 agravos de instrumento distribuídos. O objetivo principal é o de baixar o número de agravos de instrumento em recursos de revista (AIRRs), classe processual mais numerosa no TST.

O ineditismo do acordo, esclarece o ministro, está no fato de os desembargadores permanecerem em seus estados de origem, deslocando-se para o TST apenas uma vez por mês para julgamento dos agravos. O trabalho à distância reduziu drasticamente a despesa do TST se este adotasse o sistema convencional de permanência de magistrados por 30 dias seguidos, mediante pagamento de diárias corridas e necessidade de obras para acomodação dos convocados. Com a medida, já há registro de diminuição de 47% dos processos autuados e distribuídos aos ministros.

Neste semestre, o TST recebeu 152.988 processos, 6,9% a mais que no mesmo período em 2013. Cada ministro recebeu, em média, 4.874 processos e julgou 4.788. No total, foram distribuídos 104.566 processos, 0,7% mais que em 2013.

Consistência

Para o ministro Levenhagen, o aumento na quantidade de julgados não significa prejuízo na consistência nas decisões. "Embora tenhamos consciência do nosso dever de imprimir celeridade aos julgamentos, não podemos perder de vista que as decisões têm que ser consistentes", afirmou. "Somos magistrados, e não é admissível que um magistrado imprima celeridade em detrimento da qualidade que sempre notabilizou as decisões do TST".

Ainda segundo o presidente, os dados estatísticos revelam que, em decorrência do esforço concentrado dos ministros e do aumento de AIRRs julgados pela Presidência, houve um desempenho processual maior no TST, se comparado ao do exercício anterior.

Compromisso

O ministro lembrou que assumiu a Presidência com o compromisso de dar ênfase à atividade fim do Tribunal, e que vem tomando as providências para aumentar a quantidade de julgamentos de AIRR de forma a reduzir o estoque de processos. O ministro informou que, no primeiro semestre, a Presidência julgou 42,3% mais AIRRs que no mesmo período de 2013 e afirmou que, no segundo semestre, o aumento na produtividade poderá ser ainda maior.

Dados da Coordenadoria de Estatística e Pesquisa apontam que o tribunal deverá julgar mais de 160 mil processos no próximo semestre, representando aumento de mais de 30% em relação ao primeiro semestre. "Esses dados são alvissareiros no sentido de que o TST terá um resultado positivo na diminuição do acervo processual existente no exercício de 2015", avalia o presidente.

PJe

Levenhagen informou que o Processo Judicial Eletrônico (PJE) poderá estar implantado em todos os órgãos fracionários do TST até fevereiro de 2015. Mas ressaltou que a transição será progressiva para que todos os ministros possam se inteirar do sistema. Segundo ele, os primeiros órgãos a adotarem o PJE serão a Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC), a Subseção 2 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) e o Órgão Especial. 

(Pedro Rocha e Carmem Feijó. Foto: Fellipe Sampaio)

Fonte: TST

Sem proa de fraude, Turma entende inaplicável desconsideração da pessoa jurídica a entidade sem fins lucrativos




Sem prova de fraude, Turma entende inaplicável desconsideração da pessoa jurídica a entidade sem fins lucrativos. 


O artigo 28, parágrafo 5º, do Código de Defesa do Consumidor, determina que os sócios devem responder com seu patrimônio pessoal pelos débitos contraídos pela sociedade, em caso de inadimplência desta. Trata-se de instituto jurídico conhecido como "desconsideração da personalidade jurídica" da empresa. No mesmo sentido o artigo 50 do Código Civil, pelo qual, em casos considerados abusivos, o juiz pode determinar que a responsabilidade pelas obrigações da sociedade sejam estendidas aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Mas, sendo a executada uma associação civil sem fins lucrativos e não havendo prova da responsabilidade de seus administradores, não se pode falar em aplicação da teoria da desconsideração da pessoa jurídica, nos termos desses artigos. Adotando esse entendimento, expresso no voto da desembargadora Deoclecia Amorelli Dias, a 2ª Turma do TRT-MG negou provimento ao agravo de petição interposto pela trabalhadora.

No caso, foram feitas várias tentativas frustradas de penhorar bens da executada, uma associação filantrópica, sem fins lucrativos. Por essa razão, a ex-empregada requereu a inclusão dos dirigentes/associados da devedora no polo passivo da ação, para aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

O Juízo de 1º Grau indeferiu o requerimento, esclarecendo que se trata de execução trabalhista movida contra entidade associativa sem fins lucrativos. A credora interpôs agravo de petição sustentando ser possível a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, mesmo que as atividades da devedora sejam de natureza filantrópica.

Em seu voto, a relatora ressaltou que os documentos anexados demonstram que a executada é entidade sem fins lucrativos e, nesta perspectiva, os associados não respondem, nem mesmo subsidiariamente, pelos encargos da associação. Isso só seria possível se comprovada a prática de atos no intuito de fraudar a lei ou lesar terceiros, "seja por abuso de direito, gestão fraudulenta, excesso de poder, desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, a teor do que dispõe o art. 28, 'caput', do Código de Defesa do Consumidor c/c art. 50 do Código Civil".

A magistrada esclareceu que nesta espécie de entidade não há distribuição de lucros ou de quaisquer outras vantagens entre os associados, inexistindo aumento do patrimônio particular destes em razão da transferência de recursos da sociedade, o que impede que a execução se direcione para eles. Frisou ainda a relatora que não existem elementos no processo que possam demonstrar a responsabilidade dos administradores da executada, nos termos dos artigos 50 do Código Civil e 28 do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, fica afastada a possibilidade de aplicação da "Teoria da Despersonalização da Pessoa Jurídica".( 0001165-14.2012.5.03.0015 AP )

Fonte: TRT3ª Região

terça-feira, 1 de julho de 2014

E a raposa-juiza, baseada em presunções, mandou esfolar o carneiro!


E a raposa-juíza, baseada em presunções, mandou esfolar o carneiro!



Esta fábula de Liev Tolstói (99 contos e fábulas) me foi remetida pelo meu amigo Carlos Alberto Nahas, Promotor de Justiça de Santa Catarina, que me inspirou para esta coluna (o texto foi traduzido do francês por um juiz amigo de Nahas). Ei-la:


Um mujique (camponês) entrou com uma ação contra o carneiro. A raposa ocupava naquele momento as funções de juíza. Ela fez comparecer na sua presença o mujique e o carneiro. Explicou o caso.
- Fale, do que reclamas, oh Mujique?
-Veja isso, disse o mujique, na outra manhã eu percebi que me faltavam duas galinhas; eu não encontrei delas nada além dos ovos e das penas, e durante a noite, o carneiro era o único no quintal. 
A raposa, então, interroga o carneiro. O acusado, tremendo rogou graça e proteção à juíza.
-Esta noite, disse ele, eu me encontrava, é verdade, sozinho no quintal, mas eu não saberia responder a respeito das galinhas; elas me são, aliás, inúteis, pois eu não como carne. Chame todos os vizinhos, ajuntou ele, e eles dirão que jamais me tiveram por um ladrão. 
A raposa questionou ainda o mujique e o carneiro longamente sobre o assunto, e depois ela sentenciou:
-Toda noite, o carneiro ficou com as galinhas, e como as galinhas são muito apetitosas, a ocasião era favorável, eu julgo, segundo a minha consciência, que o carneiro não pôde resistir à tentação. Por consequência, eu ordeno que se execute o carneiro e que se dê a carne ao tribunal e, a pele, ao mujique. 

Esta fábula de Tolstói me faz lembrar do julgamento do mensalão, quando lá se disse, em um determinado momento, mediante a invocação de Nicola Malatesta de que o ordinário se presume; e só o extraordinário se prova. Claro que, de tão confuso que é o livro, o próprio Malatesta diz o contrário, folhas adiante. Duas questões exsurgem de Mala-atesta: um, que não se deve utilizar um autor “por partes”, em “fatias”; dois, que não se pode dizer que o ordinário se presume. Presunções são próprias de sistemas inquisitoriais. Isso para dizer o menos.

Mas a questão que mais bate com o conto de Tolstói é o artigo 23 da LC 64, pelo qual


O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal julgou constitucional o referido dispositivo (ADI 1082). Nas palavras do relator, ministro Marco Aurélio (Regras que permitem produção de provas por juiz eleitoral são válidas),


A possibilidade de o juiz formular presunções mediante raciocínios indutivos feitos a partir da prova indiciária, e fatos publicamente conhecidos ou das regras de experiência não afronta o devido processo legal, porquanto as premissas da decisão devem ser estampadas no pronunciamento, o qual está sujeito aos recursos inerentes à legislação processual.

Pronto. Eis o busílis da questão. Pode, na democracia, o juiz formular presunções mediante raciocínios indutivos feitos a partir da prova indiciária? O que mais me impressiona-é-o-silencio-eloquente-da-comunidade-jurídica. Ela se queda silente. Sem o mínimo pudor. A doutrina não esboça a mínima reação. Doutrina, doutrina, onde estás que não respondes?

Como no julgamento do Carneiro — acusado injustamente de furtar galináceos do Mujique — , contra ele pesavam presunções. Só poderia ter sido ele que comera as galinhas. E a juíza Raposa, com base em sua livre convicção, apreciando fatos públicos e notórios, mandou esfolar o pobre carneiro. Formulou contra o carneiro, de forma “indutiva”, uma presunção. 
Qual é o problema de induções e julgamentos por presunções? Um não. Vários. O principal deles é que, em julgamentos por presunções, o pobre do utente não pode provar o contrário. Ele é culpado de plano, só porque só-podia-ser-ele e que “todo-mundo-sabe-que-foi-assim”.

E tem outra: o que é isso, o “interesse público de lisura eleitoral”, que tudo justifica? Quem dirá o que interessa ao público? Vejam a fragilidade normativa de um dispositivo desse tipo. Substitua-se-o por “o juiz decidirá conforme a sua consciência e da forma que melhor atenda ao interesse público de lisura eleitoral”, e não haverá nenhuma diferença relevante da situação atual. Se o juiz está autorizado a decidir com base em indícios e presunções, e se é ele mesmo quem decide como e quando deve fazê-lo, estamos simplesmente dependentes não de uma estrutura e, sim, de um olhar individual.

É a antiteoria da decisão jurídica. Uma decisão assim não é produzida no ambiente democrático do processo, mas no terreno solitário da mente judicial. O fato de ela ser “jogada” num processo, e de se submeter “aos recursos inerentes à legislação processual” não é o suficiente para salvá-la. A decisão democrática deve ser precedida de debate em contraditório, pois não? Com a palavra, os processualistas e constitucionalistas!

Dworkin lembra que, dependendo do que se entenda por “liberdade”, a “liberdade” do lobo é a morte do carneiro. Ele tem razão. É por isso que a “livre” apreciação da prova, ao contrário do que vai na lei eleitoral, não pode ser tão livre assim. Se o juiz tiver mesmo esse tipo de liberdade, pobres dos carneiros.

Falando (mais) sério: deve-se dar ao processo jurisdicional a dimensão decontrole do exercício do poder de decidir. Decisão judicial é algo muito importante para ficar ao sabor de indícios e presunções. Numa democracia, poder público é poder fiscalizado e controlado. Do início ao fim. Não deve importar a convicção íntima do juiz, mas sim o que o direito como um todo apresenta como resposta para um determinado contexto probatório.

Ora, não há uma relação de oposição entre o tal “interesse público de lisura eleitoral” e o direito dos contraditores ao... contraditório! Soberania popular e direitos individuais são cooriginários e interdependentes. Se o fato é público e notório, que se discutam os seus efeitos no lugar certo, isto é, no curso do processo. Se o “raciocínio indutivo” (sic) é consistente com a prova, isso é tema para debate processual. É assim que se constrói uma decisão. Será tão difícil assim entender isso? Não é que o juiz não possa se valer, por exemplo, das tais “regras de experiência”; mas a validade desta (e dos raciocínios que se desdobram a partir desta) devem ser explorados dialogicamente.

Nesse sentido, o julgamento por presunções e induções fere de morte a presunção da inocência. Engraçado: a lei diz que é possível julgar “presumindo”; só que esquecemos (eu, pelo menos, não) que existe um princípio que obriga a que o judiciário não presuma nada contra o réu. Está lá na Constituição. Bingo! Vou dizer de novo, com certa ironia epistêmica: A-Constituição-proíbe-que-se-presuma-contra-o-réu... e, por incrível que pareça, a lei eleitoral diz o contrário. Assim, na ADI 1082, o que o STF fez foi interpretar a Constituição de acordo com a lei eleitoral.

PS: penso que, depois de tanto tempo, não é necessário dizer que não devemos confundir a necessidade de punir e a necessidade de preservamos as garantias processuais. Tem gente que confunde isso. Pensam que, para punir, há que diminuir as garantias. Ora, o direito penal deve ser duro; mas sem abrir mão das garantias. Por isso — convenhamos — o Estado não necessita de presunções a seu favor. Aliás: onde fica a isonomia? O acusado em processo comum não tem induções e presunções contra si (pelo menos formalmente); já o do “processo eleitoral”, sim (o tal artigo 23 da LC 64). Mais uma vez, pergunto: oh, doutrina, onde estás?

PS1: em um país em que a polícia só investiga 1 a cada 10 roubos e que menos de 10% dos crimes lato sensu são apurados, querem que se resolva esse déficit fiasquento usando presunções contra a malta? Incluam-me fora dessa.

Uma ode ao respeito à presunção da inocência

Tenho a satisfação de dizer que, enquanto Procurador de Justiça, travei longas batalhas contra a violação do princípio da presunção da inocência. Por várias vezes consegui convencer o órgão fracionário do tribunal que, por exemplo, nem sempre o porte ilegal de arma pode ser tipificado. Tampouco o disparo de arma de fogo. E a direção por embriaguez. Enfim, nenhum delito admite responsabilidade objetiva. Somente o caso concreto é que pode levar ao enquadramento. Direito penal não pune tabula rasa. Um Estado Democrático não convive com responsabilidade penal objetiva.

Travei longas batalhas contra prisões processuais que, pela falta de um fundamento concreto, não raro sequer conseguiam esconder o caráter de adiantamento de uma pretensa e futura pena. Também é grande a desconsideração do ambiente institucional sob o qual foram erigidos tanto o Código Penal quanto o Código de Processo Penal. Esquece-se que são diplomas do seu tempo. O autoritarismo de ambos, cuja incompatibilidade com uma Constituição Democrática é de uma obviedade ululante, para usar a expressão de Nelson Rodrigues, é o reflexo de uma época ditatorial. Mas o senso comum teórico reinante ignora isso. Parece que está fora da história, pois parte de uma premissa atemporal, nas reiteradas fundamentações com base em julgados cujos casos subjacentes são impertinentes e/ou anteriores ao contexto normativo discutido no caso concreto. Gadamer teceu severas críticas a esse modus operandi de encobrimento do processo histórico quando discorreu sobre a importância da consciência histórica nas ciências humanas.

Várias vezes utilizei-me da técnica da nulidade parcial sem redução de texto (Teilnichtigerklärung ohne Normtextreduzierung), também conhecida na Europa como sentença redutiva. Com ela, faz-se uma abdução de sentido. A regra permanece no sistema; somente não é aplicada naquele caso concreto, porque, fosse aplicada tabula rasa, violaria a presunção da inocência.

E não o fiz pela primeira vez. Infelizmente não inventei isso. Há várias decisões nos tribunais europeus. Permito-me remeter o leitor para o meuVerdade e Consenso (Saraiva, 2014, pp. 319 e segs), assim como em vários pareceres (p.ex., 70009228594 TJRS), onde esmiúço a tese. Mas, resumidamente, trata-se do seguinte: em Espanha, um sujeito foi processado por ter sido preso transportando “ganzuas” (micha, entre outros). A Lei culminava a pena de 1 a 5 anos para quem fosse preso transportando esse material. O advogado do cidadão arguiu a inconstitucionalidade do dispositivo. O juiz trancou o processo e remeteu, per saltum, para o TC. Lá, depois de longa discussão, decidiu-se que o dispositivo que criminaliza a posse de ganzuas não era inconstitucional stricto sensu. Afinal, não é vedado que o Estado criminalize esse tipo de conduta. Mas, então, onde reside o problema? Simples: o tribunal disse que o dispositivo seria inconstitucional se aplicado na hipótese de ocorrer a violação da presunção da inocência. Isto é, no caso concreto, se o dispositivo é aplicado violando a presunção da inocência ou outro princípio, a aplicação incorrerá em uma inconstitucionalidade. Isso, entretanto, não invalida a regra, que poderá ser aplicada nos demais casos. Por isso, fala-se em inconstitucionalidade sem redução de texto. Aqui não há espaço para explicar com mais detalhes. No livro mostro como isso foi feito.

Em outras palavras: o Estado somente pode processar alguém se provar que um bem jurídico está em jogo concretamente; e tem de provar isso; ou seja, ele, o Estado, não pode presumir. Simples assim. Presumir é impedir que o sujeito prove o contrário; enfim, presumir é impedir que o utente prove sua inocência. Não há, assim, responsabilidade objetiva. Como Procurador de Justiça, fiz isso várias vezes, com êxito. Aquilo que para o Delegado, o Promotor e o Juiz era um easy case, eu transformava, mediante este raciocínio, em um hard case. Assim foi em um caso de um utente condenado por disparo de arma de fogo, que não pôde provar sua inocência. Mostrei que o crime de disparo de arma de fogo, se aplicado por responsabilidade objetiva, viola o princípio constitucional da presunção da inocência. Isso também prova que não há cisão entre casos fáceis e casos difíceis. Um caso é um caso. Depende da compreensão do intérprete. Bingo de novo!

Numa palavra final

O carneiro se lascou porque contra ele foi usada uma presunção. Quantos utentes de terrae brasilis se lascam porque contra eles militam presunções e outros quetais? Mas como isso é possível se a Constituição garante que a única presunção possível é aquela usada a favor do cidadão?

Pois é. Tolstói estava certo ao denunciar isso em sua fábula. Por tudo isso é que eu não gosto de raposas. Como na estorinha trabalhada por Isaiah Berlin, reutilizada por Dworkin, as raposas sabem um pouco de muitas coisas..., já os Ouriços sabem uma grande coisa (vejam o livro Justiça para Ouriços, de Dworkin). Como disse, prefiro Ouriços, animais da minha espécie. Neste caso — e desculpem a minha falta de modéstia — fico alisando meus longos espinhos!

Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.

Revista Consultor Jurídico, 26 de junho de 2014, 08:02h

Seguro prestamista ainda não respeita o consumidor integralmente


Seguro prestamista ainda não respeita o consumidor integralmente



O aumento do acesso ao crédito ampliou a discussão em torno de cláusulas e condições do contrato de financiamento, dentre as quais a situação do consumidor face ao seguro prestamista.

A jurisprudência na interpretação do tema não está harmônica, oscilando para tutela protetiva do consumidor, ao fundamento do abuso, falta de opção e a mesma figura entre estipulante e beneficiário da cobertura, outra sustenta que, por ser benéfico ao consumidor no caso de desemprego, invalidez ou óbito, não há qualquer pecha de irregularidade ou ilegalidade.

A grande verdade é que nenhuma instituição financeira, de modo convincente, transparente e consoante as regras de informação, disponibiliza a apólice ou sinaliza o valor da cobertura e suas hipóteses, cuja zona cinzenta não oportuniza discernimento mais arraigado do modelo ou de sua essencialidade.

A par dessa regra, se o seguro visa, uma espécie de claúsula del credere,indiretamente beneficiar ao consumidor, não haveria de se cogitar a respeito de sua invalidade ou ineficácia.

Normalmente, o valor, se cotejado com o financiamento, é de pequeno e de pouco conteúdo.

Há casos nos quais o contratante deixa de esclarecer a existência de uma doença ou eventual moléstia capaz de evitar a própria contratação, disperso o princípio da boa-fé objetiva, tem-se que haveria prejuízo da casa bancária ou da financeira se eventualmente confiasse apenas na remuneração e não nos demais aspectos do consumidor.

A partir dessa premissa, as entidades deveriam agir com transparência e fidedignidade, exibindo a apólice, revelando a cobertura e os casos concretos, no ditar a função real do benefício e a respectiva circunstância pautada.

Dizer, pura e simplesmente, que há uma venda casada, por si só, não convence, haja vista que sem um seguro o valor do custo efetivo financeiro será maior, e o spread encarecerá.

Frente ao modelo descrito, pode-se facultar ao consumidor a livre escolha da contratação, como se normatiza, mas a prudência, somada à cautela, ambas condizem com a cobertura e sua incidência na proteção do contratante do financiamento.

E isso é tábula rasa na questão do financiamento imobiliário, cuja duração é bem maior e pode chegar até trinta anos, assim, e por não saber se o mutuário terá longa vida para pagar e liquidar sua obrigação, a contratação de um seguro é regra inerente ao juízo de ponderação, marcando mais uma etapa do relacionamento entre as partes.

Esclareça-se que o seguro pode ser contratado com uma empresa do grupo econômico, mas o consumidor não está obrigado a aceitar e pode fazer um levantamento a fim de obter uma proposta mais interessante.

No entanto, faltante clareza e uma efetiva prestação de contas frente eventual sinistro, não se conhece a realidade e a instituição financeira poderá levar alguma vantagem.

Entretanto, a apólice deve prever o limite da cobertura e, se houver sobra, essa terá às mãos dos beneficiários, no caso familiares e/ou herdeiros do mutuário.

A matéria é palpitante e, ao mesmo tempo, polêmica, mas não podemos nos centrar exclusivamente na vulnerabilidade e falta de opção, a exemplo de uma venda casada para tisnar o seguro.

Fundamental sabermos o valor, a categoria da apólice, sua cobertura e os eventuais beneficiários para, dentro desse contexto, aplicarmos o bom direito e separarmos o joio do trigo, na definição da legalidade ou não desse tipo, imbricado no financiamento contratado.

Carlos Henrique Abrão é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.



Revista Consultor Jurídico, 29 de junho de 2014, 10:36h

TST julga primeiro processo eletrônico da Justiça do Trabalho


TST julga primeiro processo eletrônico da Justiça do Trabalho


Na última quarta-feira (25/06), a 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho julgou o primeiro processo eletrônico do sistema de Processo Eletrônico da Justiça do Trabalho (Pje-JT). Na ocasião, o presidente da Turma, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, disse esperar que a nova modalidade "traga de fato uma mudança, sobretudo na possibilidade de análise dos recursos com maior celeridade, retirando o tempo morto da relação jurídico processual".

O processo em questão (RR-18-72-2012.5.12.0056), de relatoria da ministra Kátia Magalhães Arruda, é do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. A ação é contra a Caixa Econômica Federal e trata de temas como auxílio-alimentação. A 6ª Turma reformou uma decisão do TRT. 

Segundo a relatora, a Caixa não poderia mudar a natureza do auxílio de salarial para indenizatório. Pois sendo salarial, o valor tem reflexos nas verbas trabalhistas, o que não ocorre com o que é recebido como indenização.

Desde o ajuizamento na Vara do Trabalho de Navegantes (SC), o processo teve toda a sua tramitação no sistema do PJe-JT, sem a utilização de papel.

A 6ª Turma foi a primeira do TST a receber, em caráter experimental, os processos iniciados eletronicamente desde a origem. O piloto do PJe-JT foi implantado na Turma em fevereiro de 2013. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

Revista Consultor Jurídico, 30 de junho de 2014, 16:02h

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...