quarta-feira, 19 de março de 2014

DEVER DAS PARTES CONTINUA APÓS FIM DOS CONTRATOS DE DISTRIBUIÇÃO

Dever das partes continua após fim dos contratos de distribuição

 
Os contratos de distribuição, segundo a doutrina mais especializada, configuram um gênero de que são espécies diversos contratos celebrados entre empresários, tais como os de agência e distribuição — previstos nos art. 710 e seguintes do Código Civil —, de concessão comercial — regulado pela Lei Ferrari no que tange a veículos automotores, sendo, no mais, contrato atípico —, de representação comercial e de franquia — regidos, respectivamente, pelas leis 4.886/65 e 8.955/94.[1]
Traço comum entre tais tipos contratuais — e que justifica sua apreciação dentro de uma mesma categoria — é o fato de serem instrumentos que regulam a relação entre fornecedor e distribuidor visando ao desenvolvimento de um mercado consumidor através da comercialização de bens ou serviços do primeiro.
Trata-se, usualmente, de relações contratuais duradouras, que pressupõem intensa cooperação e confiança entre as partes, motivo pelo qual o momento de sua extinção adquire grande relevo, dados os diversos efeitos que dela podem advir.
As eventuais indenizações devidas pelos fornecedores aos seus parceiros comerciais em caso de denúncia imotivada do contrato sempre foram bastante discutidas em sede de doutrina e jurisprudência. No entanto, tais compensações não representam as únicas implicações relevantes da cessação dos contratos de distribuição.
Inicialmente, pode-se afirmar com relação a tais contratos que certos deveres de conduta — decorrentes, especialmente, do princípio da boa-fé que rege as relações contratuais — devem orientar o comportamento das partes não somente durante as negociações prévias e no decorrer da própria execução do contrato, mas também após a extinção do vínculo contratual, sendo certo que sua não obediência, mesmo após o fim do contrato, pode dar ensejo à obrigação de indenizar, fenômeno conhecido por responsabilidade pós-contratual[2].
Tem-se, assim, no período posterior à extinção do contrato, a necessidade de observância ao dever de proteção, que se traduz na obrigação de se evitar, tanto quanto possível, causar ou agravar eventuais danos patrimoniais que a contraparte venha a ter com o término da relação negocial[3].
Já o dever de lealdade, de caráter mais genérico, pode se explicar, por exemplo, como o dever de as partes observarem uma conduta leal em eventual competição no futuro ou mesmo como o dever de abstenção de concorrência, caso assim tenha sido estipulado. Em seu escopo inclui-se, ainda, o dever de confidencialidade, que adquire fundamental relevância nos contratos de distribuição dada a significativa troca de informações, muitas vezes confidenciais — pensemos, a este propósito, nos segredos de negócios —, ocorrida durante a execução do contrato.
Neste contexto, indaga-se se a lista de clientes do distribuidor deve ser caracterizada como confidencial após a extinção do contrato, o que resulta na abstenção tanto da divulgação da clientela para terceiros quanto da sua utilização, ainda que em proveito do próprio distribuidor. A questão é pouco enfrentada pela jurisprudência brasileira; na doutrina alemã, onde a discussão já se encontra em grau avançado, a tendência majoritária é no sentido da confidencialidade de tais informações[4]. De qualquer forma — e para evitar possível controvérsia — será sempre recomendável que as partes estabeleçam expressa e previamente o sigilo de tais dados.
Também em decorrência da constante troca de informações característica da relação contratual de distribuição, destaca-se o dever de informação ou esclarecimento. Isto porque determinados dados que estejam sob a posse de uma parte podem se fazer indispensáveis ao desenvolvimento das atividades empresariais da outra após o término do contrato, cabendo, então, à parte que os detenha franqueá-los à contraparte.[5]
Além dos deveres supramencionados, que resistem à extinção do contrato, surgem, com o término do vínculo contratual de distribuição, outras obrigações que se somam àquelas já analisadas.
De início, pondera-se a existência de um dever genérico de cooperação do fornecedor para com o distribuidor e que abrangeria comportamentos diversos, tais como a recompra de mercadorias e até mesmo a colaboração para inclusão do distribuidor em novas redes de distribuição. Com relação ao tema, parece-nos acertado afirmar que tais condutas, por se mostrarem excessivamente protetivas, não devem ser interpretadas como um dever implícito e inerente a qualquer contrato de distribuição, somente devendo ser impostas ao fornecedor em caso de expressa previsão contratual[6].
Em sequência, fala-se no dever de restituição como sendo aquele que orienta as partes a devolverem à contraparte bens que eventualmente estejam sob sua posse no momento da extinção de um vínculo contratual. Não consiste, como se depreende, em um dever privativo dos contratos de distribuição, mas comum a contratos de naturezas diversas.
Finalmente, menciona-se aqui a eventual existência de um dever de não concorrência pós-contratual. Isto porque, durante a execução do contrato, é sabido que os distribuidores podem sofrer restrições em sua atuação junto a concorrentes do fornecedor em razão da adoção, pelas partes, de cláusulas de exclusividade[7]. No entanto, findo o contrato, estaria o distribuidor livre para celebrar contratos com empresas concorrentes ou, ainda, concorrer ele mesmo, diretamente, com seu antigo parceiro negocial?
No âmbito dos contratos de distribuição, parece que o dever de concorrência pós-contratual não decorre diretamente de lei, não se tratando, assim, de cláusula implícita nestes instrumentos. Pode, no entanto, ser expressamente previsto pelas partes, desde que se opere de maneira equilibrada, de forma a evitar eventual ameaça à livre concorrência, posição amplamente reconhecida pela jurisprudência brasileira.
Sobre este tema, vale ressaltar a discussão — ainda sem conclusões definitivas — acerca da possibilidade de aplicação por analogia da regra de não concorrência contida no art. 1.147 do Código Civil — aplicável aos casos de trespasse de estabelecimento — a outras situações em que o dever de não concorrência não tenha sido expressamente previsto, desde que fosse razoável admiti-lo, tais como em contratos de franquia.
Ante o impasse, mais aconselhável será que o referido dever seja expressamente previsto em contrato e com prazo de duração razoável. A adoção de prazo de cerca de dois anos contados do término do contrato tem sido frequentemente verificada na praxe comercial, muito embora seja possível defender a utilização, como mero parâmetro — não havendo que se falar aqui em aplicação analógica —, do prazo de cinco anos previsto no art. 1.147 do Código Civil.
Desta breve análise, conclui-se serem diversos os deveres de conduta a serem obedecidos pelas partes ao final de uma relação contratual. Sejam os que emanam da boa-fé objetiva — positivada no Código Civil brasileiro pelo legislador de 2002 — sejam aqueles que derivam da própria autonomia da vontade das partes, seu descumprimento poderá acarretar a responsabilização da parte que os violou.
Visto por este ângulo o caso específico dos contratos de distribuição, revela-se fundamental ter em mente desde as primeiras negociações quais serão os deveres a serem cumpridos após a extinção do contrato, bem como sua respectiva extensão, evitando-se, com isso, consequências pecuniárias decorrentes da não observância de tais condutas, que podem, ao fim e ao cabo, trazer consideráveis prejuízos, seja para o fornecedor seja para o distribuidor.

[1] Fábio Ulhoa Coelho prefere utilizar o termo Contratos de Colaboração para designar o gênero de contratos aqui mencionado. In COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, volume 3: direito de empresa, 9ª. ed., São Paulo, Saraiva, 2008, p. 92.
[2] Os deveres de conduta pós-contratuais não são uma particularidade dos contratos de distribuição, podendo surgir em instrumentos diversos; no entanto, dada a intensa relação de colaboração existente entre as partes em tais contratos, apresentam-se nestes casos de forma bastante latente.
[3] O dever de proteção pós-contratual é de difícil individualização, coincidindo, no mais das vezes, com os deveres de lealdade e informação que serão vistos adiante.
[4] PINTO, Fernando A. Ferreira. Contratos de distribuição: Da tutela do distribuidor integrado em face da cessação do vínculo, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2013, p. 434-435.
[5] A sistematização dos deveres laterais de conduta em três principais —proteção, lealdade e informação — é há muito difundida na doutrina portuguesa (por todos, Menezes Cordeiro. In CORDEIRO, António Menezes. Tratado de Direito Civil Português, vol. I – Parte Geral, tomo I, p. 498-508). A doutrina brasileira vem, cada vez mais, tratando dos deveres contratuais que emanam da boa-fé (vide GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 3: contratos e atos unilaterais, 10ª. ed, São Paulo, Saraiva, 2013, p.59-60).
[6] Defende este entendimento o doutrinador português Ferreira Pinto, In PINTO, Fernando A. Ferreira ob. cit., p. 430.
[7] No contrato de agência, esta exclusividade decorre da lei (art. 711, CC), podendo, ao revés, ser afastada por previsão contratual.
Mariana Assunção de Moraes é advogada, mestranda em Direito Civil na Universidade de Lisboa e pós-graduada em Direito Processual Civil pela PUC-RJ. Formou-se pela Universidade Federal Fluminense.
Revista Consultor Jurídico, 13 de março de 2014

CONCESSIONÁRIA NÃO DEVE INDENIZAR SE RAIO NÃO ATINGE SUA REDE


Concessionária não deve indenizar se raio não atinge sua rede



Em casos de descarga elétrica, a concessionária de energia não pode ser responsabilizada por danos materiais se o raio não atingiu sua rede de transmissão. Seguindo esse entendimento, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais manteve sentença que negou ação de indenização movida por um consumidor que teve aparelhos eletrônicos danificados após um raio.

Na ação, o consumidor informou que, no dia 3 de fevereiro de 2011, uma forte descarga atmosférica conduzida através da rede de transmissão da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) atingiu imóvel de sua propriedade, danificando inúmeros aparelhos eletrônicos, entre eles uma bomba elétrica destinada ao fornecimento de água. Alegou que teve prejuízos materiais no valor de R$ 5,3 mil, além de danos morais, por ter sido privada dos serviços essenciais de luz e água.

Em primeira instância, a ação foi julgada improcedente, motivando o consumidor a recorrer da decisão. No recurso, defendeu a tese de que a Cemig desrespeitou os deveres de segurança e eficiência que lhe incumbiam, o que acabou por lhe causar danos materiais e morais.

Em seu voto, a relatora do processo, desembargadora Teresa Cristina da Cunha Peixoto, ressaltou que a descarga elétrica atmosférica não foi conduzida ao imóvel rural do consumidor através da rede de transmissão instalada pela Cemig, mas sim através da antena de telefonia existente na propriedade, conforme consta do boletim de ocorrência lavrado no dia do acidente.

Ainda de acordo com a relatora, a concessionária não constatou qualquer causa de interrupção do fornecimento de energia elétrica no imóvel nem recebeu reclamação por parte do consumidor, o que reforça a conclusão de que a descarga elétrica não atingiu os equipamentos de transmissão utilizados pela Cemig, mas a antena situada no próprio imóvel.

Assim, complementou a desembargadora, “embora, em regra, reconheça que a Cemig possui o dever contratual e legal de manter equipamentos de segurança destinados a evitar ou ao menos reduzir a incidência de descargas elétricas (atmosféricas ou não) sobre suas redes de transmissão, por se tratar de fato previsível que se insere no risco do fornecedor de energia elétrica, no caso em apreço, verifico que o sinistro não possui qualquer relação com o serviço prestado pela demandada”. Acompanharam o voto da relatora os desembargadores Bitencourt Marcondes e Alyrio Ramos. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-MG.

Processo
0099492-86.2011.8.13.0342


Revista Consultor Jurídico, 18 de março de 2014

terça-feira, 18 de março de 2014

EDIÇÃO DE SÚMULAS NA SEGUNDA INSTÂNCIA ESTÁ LONGE DO IDEAL

Edição de súmulas na segunda instância está longe do ideal

 
A edição de súmulas nos tribunais de 2ª instância, além de não ter uniformidade, está longe do ideal. Este é o resultado de uma pesquisa feita por alunos da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), publicada no site do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).
Segundo a pesquisa, novas súmulas nos tribunais de segunda instância contribuiriam para maior segurança jurídica e uma Justiça mais célere e eficiente. Enquanto alguns tribunais se destacam pela boa quantidade de súmulas, outros não têm nenhuma súmula editada.
“Por exemplo, o Tribunal de Justiça da Bahia, apesar da importância econômica e social do estado, não possui uma súmula sequer. Já o Tribunal de Justiça do Amapá, apesar de ser de menor tamanho, tem sua jurisprudência consolidada em 14 súmulas, o que é positivo”, diz a pesquisa.
"O ideal seria os tribunais estarem permanentemente atentos à evolução de sua jurisprudência. Assim que definissem sua posição a respeito de determinado assunto, principalmente os que apresentam causas repetitivas, editariam uma súmula", afirma o desembargador aposentado Vladimir Passos de Freitas, orientador do trabalho. 
A pesquisa levantou a quantidade de súmulas editadas pelos tribunais de segunda instância do país: tribunais de justiça dos estados, tribunais regionais do trabalho, tribunais regionais federais e tribunais de justiça militar nos estados. 
Os tribunais de justiça que mais editaram súmulas são o TJ-RJ, com 299, seguido pelo TJ-MG, com 197. Na terceira posição, um empate entre dois tribunais de tamanhos diferentes: o TJ-SP e o TJ-SE têm 115 súmulas editadas, cada um. Do outro lado, nove tribunais de justiça ainda não editaram súmulas. Entre eles estão os TJs do Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Tocantins, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul e Roraima. 
Os tribunais regionais federais também foram objeto de análise no estudo. Em 1990, o TRF da 3ª Região foi primeiro a editar uma súmula. Entretanto, de lá pra cá, pouco evoluiu e hoje conta com 35 súmulas. A liderança no grupo é do TRF-4, que tem 79 súmulas editadas, mas desde 2009 não aprova nenhuma. O TRF-2 tem 59 súmulas editadas e o TRF-1, “apesar de ter 13 estados sob sua jurisdição, tem apenas 40 súmulas”. Por último, o TRF-5 tem apenas 20 súmulas.
Já nos Tribunais Regionais do Trabalho, o TRT-4 (RS) e o TRT-12 (SC) foram os que editaram mais súmulas, ambos com 48 em vigor. Há três deles sem nenhuma súmula: TRT-16 (MA), TRT-19 (AL) e TRT-21 (RN). A pesquisa mostra o TRT da 22ª Região (Piauí) como uma boa supresa: "apesar de seu pequeno porte, possui 24 súmulas editadas”. Nos tribunais de justiça militar estaduais, o TJM-MG lidera com sete súmulas, o TJM-SP editou uma súmula, enquanto o TJM-RS não tem nenhuma.
O estudo mostra também que não há preocupação nos tribunais em editar súmulas em matéria de Direito Ambiental. O TRF-2 é o único com uma súmula sobre a matéria, que reconhece  a competência da Justiça Estadual, como regra geral, nos crimes ambientais, e a da Justiça Federal quando praticados contra bens da União, suas empresas públicas ou autarquias.
Clique aqui para ler o estudo na íntegra.
Veja abaixo quantas súmulas foram editadas em cada tribunal e o link para acessá-las. 
Tribunais de Justiça
TribunalTotalPrimeira súmula Última súmula Link
TJ-ACnão possui súmulas
TJ-ALnão possui súmulas
TJ-AP1417/05/200008/04/2013clique aqui
TJ-AMnão possui súmulas
TJ-BAnão possui súmulas
TJ-CE3202/12/200413/12/2007clique aqui
TJ-DF2120/06/199622/09/2003clique aqui
TJ-ES1010/12/200921/11/2011clique aqui
TJ-GO614/03/200712/09/2012clique aqui
TJ-MAnão possui súmulas
TJ-MG19710/12/200212/09/2008clique aqui
TJ-MT1não localizadanão localizadaclique aqui
TJ-MSnão possui súmulas
TJ-PA11não localizada19/08/2013clique aqui
TJ-PB4107/08/199414/11/2001clique aqui
TJ-PR4720/06/197722/12/2012clique aqui
TJ-PE10915/05/200702/10/2009clique aqui
TJ-PI6não localizadanão localizadaclique aqui
TJ-RJ29927/04/197615/07/2013clique aqui
TJ-RN112/06/201312/06/2013clique aqui
TJ-RS4317/05/198424/10/2013clique aqui
TJ-RO9não localizadanão localizadaclique aqui
TJ-RRnão possui súmulas
TJ-SC2522/11/197819/11/2010clique aqui
TJ-SP115não localizadanão localizadaclique aqui
TJ-SE11507/10/200524/07/2013clique aqui
TJ-TOnão possui súmulas
 
Tribunais Regionais Federais
TribunalTotalPrimeira súmulaÚltima súmulaLink
TRF-14011/12/199003/06/2013clique aqui
TRF-25921/06/199010/05/2012clique aqui
TRF-33503/05/199021/10/2010clique aqui
TRF-47902/10/199126/05/2009clique aqui
TRF-52014/08/199126/09/2012clique aqui
  
Tribunais Regionais do Trabalho
TribunalTotalPrimeira súmulaÚltima súmulaLink
TRT-1 (RJ)4321/05/200930/10/2013clique aqui
TRT-2 (SP)1528/06/200226/08/2013clique aqui
TRT-3 (MG) 33 (destas, foram canceladas as Súmulas 1, 3, 8, 9, 12, 13, 20, 21, 22, 26) 11/08/200513/11/2013clique aqui
TRT-4 (RS) 60 (destas, foram canceladas as Súmulas 2, 5, 6, 7, 9, 17, 19, 20, 24, 33, 34, 44)08/06/199218/11/2013clique aqui
TRT-5 (BA) 4326/10/200129/07/2013clique aqui
TRT-6 (PE) 1822/07/200013/11/2013clique aqui
TRT-7 (CE) 115/10/200815/10/2008clique aqui
TRT-8 (PA/AP) 21 (destas, a Súmula 15 foi cancelada)05/08/201010/07/2013clique aqui
TRT-9 (PR) 18 (destas, a Súmula 1 foi cancelada) 10/07/199103/05/2012clique aqui
TRT-10 (DF/TO) 42 (destas, a Súmula 9 foi cancelada).16/03/200029/01/2010clique aqui
TRT-11 (RR/AM) 726/03/201001/10/2012clique aqui
TRT-12 (SC) 51 (destas, foram canceladas as Súmulas 8, 19 e 21)30/05/200118/12/2013clique aqui
TRT-13 (PB)17 (destas, foram canceladas os Verbetes 4 e 8)11/12/200308/02/2013clique aqui
TRT-14 (RO) 315/12/200808/01/2008clique aqui
TRT-15 (Campinas)30 (destas, foram canceladas as Súmulas 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 22, 28 e 29)25/11/201001/10/2012clique aqui
TRT-16 (MA) não possui súmulas
TRT-17 (ES) 1709/06/201006/08/2013clique aqui
TRT-18 (GO) 2517/10/201227/09/2013clique aqui
TRT-19 (AL)não possui súmulas
TRT-20 (SE)1419/04/200517/05/2011clique aqui
TRT-21 (RN)não possui súmulas
TRT-22 (PI) 2412/06/200712/06/2013clique aqui
TRT-23 (MT)8 (destas, foi cancelada a Súmula 1)30/04/200712/11/2013clique aqui
TRT-24 (MS)810/09/200815/08/2012clique aqui
  
Tribunais de Justiça Militar
TribunalTotalPrimeira súmulaÚltima súmulaLink
TJM-MG7não localizada03/04/2013clique aqui
TJM-RSnão possui sumulas
TJM-SP104/05/200504/05/2005clique aqui
 
 
Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 18 de março de 2014

SENADO DEVE SER ÁGIL NO EXAME DAS EMENDAS AO PROJETO DO CPC

Senado deve ser ágil no exame das emendas ao projeto de CPC

 
Há poucos dias, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou o projeto do novo Código de Processo Civil. Após os ajustes relativos à sua redação, nos próximos dias o texto deve retornar ao Plenário para votação da redação final. Em seguida, o projeto retornará ao Senado. Nesta fase final, deverão os senadores examinar as muitas emendas feitas ao texto.
Não vejo, contudo, razão para demora. Se é certo que houve alterações, considero que, em grande medida, muitas delas avançaram no sentido antes proposto, originalmente. Mais que voltar atrás, tais emendas aprofundaram algo que já constava tanto no anteprojeto quanto na versão antes aprovada pelo Senado.
É o que ocorre, por exemplo, com a preocupação com a integridade da jurisprudência. O tema consta do artigo 882 da versão do Senado — em cujo caput consta um inexplicável “em princípio”[1]. Na Câmara, os ideais que inspiraram a Comissão que elaborou o anteprojeto foram considerados, e inseridas disposições relacionadas à formulação de precedentes (cf. artigos 520 e 521 da versão aprovada pela Câmara).
Poder-se-ia dizer que a inserção de disposição específica a respeito seria desnecessária. Há muitos anos venho sustentando que mais importante que impor aos juízes a observância de precedentes deve ser a preocupação com a criação de decisões judiciais bem fundamentadas. Um modelo precedentalista depende, sobretudo, da mudança de atitude dos juízes, não no sentido de se dever obediência ao precedente, mas, especialmente, no sentido de se produzir julgados modelares, que sirvam de referência, que gerem confiança nos cidadãos.
Também manteve-se o rumo e esmiuçou-se o texto dedicado à fundamentação das decisões judiciais — artigo 476 na versão do Senado; artigo 499 na versão da Câmara.
Entendo que, em tais casos — e, certamente, representam a imensa maioria das emendas —, deveria o Senado, em homenagem ao trabalho feito pela Câmara, simplesmente aceitar as modificações realizadas por esta casa.
Há, contudo, emendas que merecem análise cuidadosa pelo Senado, e que, segundo penso, devem ser rejeitadas. Como exemplo, podem-se citar as emendas referentes ao efeito suspensivo da apelação e à vedação de penhora on line na execução de liminares. Mas emendas como essas são exceção.
Espero, contudo, que os trabalhos não sejam excessivamente demorados, no Senado. Como disse acima, não há razão para isso. Ademais, discute-se um novo CPC, no Congresso, desde o final de 2009 — quando foi instituída a Comissão de Juristas que elaborou o anteprojeto. Feitos e superados os debates em torno de questões relacionadas à legislação processual, deve-se dar ênfase a outras questões que interferem na eficiência da tutela jurisdicional, como as relacionadas a investimento, gestão etc.
Como os trabalhos do Congresso no projeto de novo CPC, ao que tudo indica, entram agora em sua reta final, acabaremos enfatizando, nos próximos textos da coluna Processo Novo, aquelas modificações que nos parecem mais interessantes para a comunidade jurídica em geral.

[1] De acordo com referido texto, “os tribunais, em princípio, velarão pela uniformização e pela estabilidade da jurisprudência, [...]” (grifou-se).
José Miguel Garcia Medina é doutor em Direito, advogado, professor e membro da Comissão de Juristas nomeada pelo Senado Federal para elaboração do anteprojeto de Código de Processo Civil. Acompanhe-o no Twitter, no Facebook e em seu blog.
Revista Consultor Jurídico, 17 de março de 2014

quinta-feira, 13 de março de 2014

EIS PORQUE ABANDONEI O "NEOCONSTITUCIONALISMO"

Eis porque abandonei o “neoconstitucionalismo”

 
A coluna de hoje é um tanto quanto hermética. Entretanto, ela trata de uma questão que diz com a cotidianidade das práticas jurídicas no Brasil (inclusive com um pequena nota sobre o mensalão). Com efeito, tenho pesquisado algo denominado neoconstitucionalismo (e suas derivações psico-axiologistas). Penso que o termo pode nos ter levado a equívocos. Como no romance de John Steinbeck, prometeu-se fartura de vinhas, mas o que resultou fora as Vinhas da Ira. Em linhas gerais, é possível afirmar que, em nome de teses como a do neoconstitucionalismo[1], percorremos um caminho que levou à jurisprudência da valoração e suas derivações axiologistas, temperada por elementos analítico-conceituais provenientes da ponderação alexyana (ou a sua vulgata). Tenho criticado fortemente o ovo da serpente que as teses axiologistas (onde se inclui a jurisprudência dos valores) representam para o direito de terrae brasilis. Se lermos bem Roberto Lyra Filho, lá encontraremos — nos anos 70 e 80 — as suas críticas aquilo que ele chamava de “positivismo psicologista”. Encaixa como uma luva!
Pois as diversas manifestações ativistas exsurgem exatamente desse behaviorismo interpretativo (espécie de psicologização do direito). Portanto, para esclarecer os não iniciados, ativismo não é apenas quando o Judiciário “passa por cima” (ou pelo “lado”) da lei, mas, sim, ocorre também toda vez que o julgador se substitui aos legislador (juízos morais, éticos). Há farta literatura sobre isso, mas parece que há uma barreira ideológica que impede que parcela da comunidade se dê conta disso (e é nisso que entra a diferença entre ativismo e judicialização). Outra coisa: criticar o axiologismo (e seus derivações genéricas que falam dessa coisa chamada “valores”) não quer dizer que exista apenas o seu contraponto — o não-axiologismo (espécie de exegetismo?). Enfim, despiciendo discutir isso, porque fica no plano da pequena-gnosiologia jurídica. Como diz Shakespeare em A Megera Domada, Ato V, “quem tem vertigens pensa que o mundo roda...”!
Recado dado, sigo. Pois esse belo epíteto — cunhado por um grupo de constitucionalistas espanhóis e italianos —, embora tenha representado um importante passo para afirmação da força normativa da Constituição na Europa Continental, no Brasil acabou por incentivar uma recepção acrítica da jurisprudência dos valores, da teoria da argumentação de Robert Alexy (que cunhou o procedimento da ponderação com instrumento pretensamente racionalizador da decisão judicial) e do ativismo judicial norte-americano (explico isso já no início de Verdade e Consenso).
Falando-se em Alexy, por sinal, cabem algumas considerações aos desavisados que querem importar uma teoria, mas esquecem sua origem. E, não raro, sem sequer conhecer, também, seus fundamentos, ocasionando um reducionismo simplista que desrespeita inclusive a tese de Alexy. Digo isso porque sob o pretexto da ponderação de princípios também tem havido mero exercício de arbítrio, de vontade de poder. Um ex-orientando meu, inclusive, citou um caso ilustrativo. Ao travar um diálogo com um amigo magistrado acerca da concessão ou não do direito de apelar em liberdade, o colega lhe explicou que quando-queria-soltar-ou-prender fazia sempre uma ponderação de princípios, elegendo aqueles em “conflito” (sic) e os sopesando (sic), de modo a dar maior peso ao que achava ser o mais adequado ao seu “pensar”, pois, segundo ele, o que importaria seria fazer “justiça”. Ah, a Justiça — esse significante tão vago a ponto de ter sido utilizado trinta e sete vezes por Hitler no seu Mein Kampf. Pois é para os “fazedores” de “justiça” que a ponderação serve. E os princípios ponderados são vistos, comumente, como se valores fossem, o que nem Alexy autoriza porque os princípios são deontológicos. Cabe destacar que Alexy fala a partir de uma matriz teórica alicerçada no racionalismo discursivo e analítico. Sua obra é repleta de fórmulas matemáticas. Que tal essa? GPi-nC = IPiC * GPiA/ WPjC * GPjA+ …WPnC * GPnA. Mas o que comumente faz o neoconstitucionalista? Desvirtua a ponderação alexyana (advertindo que ela também não consegue resolver a questão da vontade de poder), simplesmente escolhendo o “valor” que lhe interessa, relegando o outro, ou outros. Ora, um juiz não pode impor aos jurisdicionados os seus próprios valores, não pode construir sua decisão com base em argumentos de política. Isso não é ser democrático. O campo de atuação do juiz deve ser o normativo.
Nesse sentido, torna-se necessário afirmar que a adoção do nomen juris “neoconstitucionalismo” certamente é motivo de ambiguidades teóricas e até (ou sobremodo) de mal-entendidos. Em um primeiro momento, foi de importância estratégica a importação do termo e de algumas das propostas trabalhadas pelos autores da Europa Ibérica. Isto porque o Brasil — assim como a América Latina — ingressou tardiamente nesse “novo mundo constitucional”, fator que, aliás, é similar ao da realidade europeia, que, antes da segunda metade do século XX, não conhecia o conceito de constituição normativa. Portanto, em países como o Brasil, falar de neoconstitucionalismo implicava ir além de um constitucionalismo de feições liberais — que, no Brasil, sempre foi um simulacro em anos intercalados por regimes autoritários — na direção de um constitucionalismo compromissório que possibilitasse, em todos os níveis, a efetivação de um regime democrático.
Destarte, passadas mais de duas décadas da Constituição de 1988 e levando em conta as especificidades do direito brasileiro, é necessário reconhecer que as características desse neoconstitucionalismo acabaram por provocar condições patológicas que acabam por contribuir para a corrupção do próprio texto da Constituição. Aqui, refiro que, se, em um primeiro momento, apoiei a tese neoconstitucionalista, em um segundo momento, ao constatar a sua inexorável filiação às posturas voluntaristas, passei a colocá-la entre parênteses ou entre aspas, a partir da ressalva bem explícita, verbis: “entendo o neoconstitucionalismo como o constitucionalismo compromissório do segundo pós-guerra” e “longe de ativismos e práticas discricionárias”. Finalmente, a partir da 4ª edição de Verdade e Consenso (Saraiva, 2011 – vem aí a 5ª Edição) definitivamente abandonei a tese, passando a chamar o constitucionalismo do pós-Segunda Guerra de Constitucionalismo Contemporâneo.
Ora, sob a bandeira neoconstitucionalista (mas não só dele, porque o ponto central é a “moralização do direito” e o discricionarismo) vem sendo defendido, ao mesmo tempo, um direito constitucional da efetividade, um direito assombrado pela ponderação de valores, uma concretização ad hoc da Constituição e uma pretensa constitucionalização do ordenamento (por exemplo, constitucionalização do direito civil,[2] espécie de imperialismo da publicização do direito), a partir de jargões vazios de conteúdo e que reproduzem o prefixo neo em diversas ocasiões, tais como: neoprocessualismo (sic) e neopositivismo (sic). Tudo porque, ao fim e ao cabo, acreditou-se ser a jurisdição responsável pela incorporação dos “verdadeiros valores” que definem o direito justo (vide, a este respeito, as posturas decorrentes do instrumentalismo processual, a que denomino de “fator Oskar Bülow”). Nesse sentido, já de pronto é necessário indagar: de que modo se pode falar em “valores” em sociedades complexas (“pós-tradicionais”, como se refere Habermas) como as nossas? Não há como defender um “método de ponderação”, porque ele supõe valores intersubjetivamente compartilhados.
O que é interessante sobre esta “adoção acrítica” (e entusiasta!) da jurisprudência dos valores germânica é que, lá, ela sofre duras críticas, feitas, por exemplo, por Habermas, a partir, inclusive, de constitucionalistas e justeóricos como Denninger, Müller, Grimm e Böckenförde, bem como Ingeborg Maus, que fala do mal que se abateu sobre o Judiciário de seu país desde o final da II Guerra, dizendo que o mesmo assumiu o “superego de uma sociedade órfã”.[3] Bingo, Senhora Maus! Bingo!
Princípio, ergo sum!
Aliás, a referência reiterada aos “valores” demonstra bem que o ranço neokantiano permeia o imaginário até mesmo daqueles que pretendem fazer uma dogmática crítica. Desse ranço já falei em outras colunas.
A própria formação da cultura é algo muito mais ligado à linguagem e à constituição de contextos significativos, do que propriamente ao problema da formação e transformação deste enigma chamado “valores”. Isso fica bem representado na formulação daquilo que Ernildo Stein denomina “paradoxo de Humbolt”: nós possuímos linguagem porque temos cultura ou temos cultura porque possuímos linguagem?
Portanto, o discurso axiológico no interior do direito deveria ter sucumbido junto com o paradigma filosófico que o sustentava. A despeito disso, continua-se a falar — acriticamente, por certo — em “valores”, sem levar em conta a sua conhecida e problemática origem filosófica. Aqui também é possível dizer que a palavra “valores” assumiu uma dimensão “performativa”, bastando que se a invoque para que as portas da “crítica” do direito se abram...! E o pior parece estar no jargão “princípios são valores”. Logo, por ele o jurista corrige o mundo “insignificante” das regras...! Claro que o faz de acordo com os “seus” valores... Princípio, ergo sum!
A expressão “neoconstitucionalismo” não faz mais sentidoAssim, reconheço que — para os propósitos daquilo que denomino de Crítica Hermenêutica do Direito — não faz mais sentido continuar a usar a expressão neoconstitucionalismo para mencionar aquilo que venho querendo apontar em minhas obras: a construção de um direito democraticamente produzido, sob o signo de uma constituição normativa e da integridade da jurisdição, em que o direito possui DNA e seja reduzido ao máximo o grau de discricionariedade. É preferível chamar o constitucionalismo instituído a partir do segundo pós-guerra de Constitucionalismo Contemporâneo (CC), para evitar os mal-entendidos que permeiam o termo neoconstitucionalismo.
Nessa medida, pode-se dizer que o CC representa um redimensionamento na práxis político-jurídica, que se dá em dois níveis: no plano na teoria do Estado e da Constituição, com o advento do Estado Democrático de Direito; e no plano da Teoria do Direito, no interior da qual se dá a reformulação da teoria das fontes (a supremacia da lei cede lugar à onipresença da Constituição); na teoria da norma (devido à normatividade dos princípios — atenção: princípios não como valores e, sim, operando no código lícito-ilícito), na teoria da interpretação, que, nos termos que proponho, representa uma blindagem às discricionariedades e ativismos, a partir da construção de uma teoria da decisão judicial e em uma teoria da decisão, que complementa a teoria da interpretação.
Todas essas conquistas devem ser pensadas, num primeiro momento, como continuadoras do processo histórico através do qual se desenvolve o constitucionalismo. Assim, se, por um lado, há esse processo de agregação com relação ao primeiro constitucionalismo, por outro, há uma nítida ruptura com os postulados hermenêuticos vigentes desde o final do século XIX e que terá seu apogeu durante a primeira metade do século XX.
Resumindo: o neoconstitucionalismo — no modo como vem sendo entendido em terrae brasilis — vem sendo apenas (um)a superação do paleo-juspositivismo (exegetismo). A exceção (correndo o risco de cometer injustiças) fica com Ecio Oto, que, a partir de sua tese de doutorado orientada por Martonio Barreto Lima e por mim,[4] deixa claro que a perspectiva de neoconstitucionalismo que propugna é a de ser antipositivista.[5] De registrar que, já antes, em obra em conjunto com Susanna Pozzolo,[6] Oto mostrava, em caráter inovador, as características desse fenômeno (para ele, são onze), deixando claro que a perspectiva de neoconstitucionalismo que propugna é a de ser antipositivista, avançando, desse modo, para além dos neoconstitucionalistas de terrae brasilis. Esse me parece ser um ponto de fundamental importância: dar-se conta das incongruência do(s) positivismo(s) e seus malefícios para a democracia.
O busílis, pois, é que o neoconstitucionalismo, ao apostar na ponderação e no poder discricionário, não supera a outra forma de positivismo que se segue ao exegético. Afinal, existem vários positivismos, pois não? Mas os neoconstitucionalistas acham que supera.
Portanto, Ferrajoli tem razão quando critica a ponderação e sua ligação com o neoconstitucionalismo. Ele, inclusive, se declara um antineoconstitucionalista. Sim, sei que há vários neoconstitucionalismos, tanto é que o próprio livro que lança o termo possui um “s” atrás do nome. Mas há algo que é comum a todos os tipos, que é a aposta na ponderação (problemática que é abandonada por Ecio Oto, como já referi).
Despiciendo acrescentar que compartilho da tese antiponderativa de Ferrajoli. Minhas diferenças com o mestre fiorentino se localizam em outros pontos, conforme explicitado no debate que com ele travei em Garantismo, Hermenêutica e Neoconstitucionalismo[7], para onde me permito remeter os leitores. Mas isso é assunto para outra(s) coluna(s). Por ora, apenas registro a minha saída do barco do neoconstitucionalismo. Na verdade, stricto sensu, nunca havia embarcado mesmo... Já que os (a maioria dos) neoconstitucionalistas não abrem mão da ponderação (para ficar apenas nesse defeito da tese), peço que “me incluam fora dessa”.
Numa palavra: “tudo isso” e a relação com o mensalão!Em seguimento, uma nota acerca da razões pelas quais não preciso fazer uma coluna específica para o affair mensalão. O julgamento do mensalão e tudo-o-mais em terrae brasilis está inserido nesse imaginário que venho criticando. Quero que os leitores entendam isso. Assim, podemos evitar de nos cansarmos na discussão sobre se no caso Donadon a pena de dois anos e três meses para o crime de quadrilha foi tão discrepante da aplicação no caso da Ação Penal (AP) 470. No caso Donadon, dois anos e três meses. Para José Dirceu e Valério, dois anos e seis meses. Portanto, não houve nada de novo na aplicação da pena do crime de quadrilha na AP 470. O que há/houve de novo foi a mudança de placar proporcionado pelos dois novos ministros, que não estavam comprometidos com o critério adotado pelo Supremo Tribunal Federal no caso Donadon. E nem é preciso fazer juízo de valor sobre isso. De velho, apenas a irritação e o voluntarismo do presidente, ministro Joaquim Barbosa.
O que quero dizer é que o julgamento resultou demasiadamente — e registre-se meu eufemismo — dependente das posições pessoais-subjetivas dos ministros. Este é o ponto fulcral do qual falei na coluna da semana passada (clique aqui para ler). De todo modo: no caso Donadon, presentes apenas oito ministros, somente Peluso e Gilmar não votaram pela pena de dois anos e três meses no crime de quadrilha. Já na AP 470, inicialmente votaram pelo reconhecimento da quadrilha, Barbosa, Fux, Gilmar, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ayres Brito. Ainda no primeiro julgamento, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Lewandowski e Toffoli votaram pela absolvição do crime de quadrilha. No segundo julgamento, pós-embargos infringentes, votaram pela absolvição em razão da não configuração de quadrilha: Rosa, Toffoli, Lewandowski, Zavascki, Carmen Lúcia e Barroso. Desses entenderam pela prescrição em razão da dosimetria, mesmo que não utilizando-a como fundamento de sua decisão, os dois novos ministros (Barroso e Zavascki). No caso Donadon, em circunstâncias menos desfavoráveis para o réu, os mesmos Toffoli, Carmen Lúcia e Lewandowski votaram pela condenação em dois anos e três meses. Menos desfavoráveis, pois os elementos da quadrilha eram cambiantes, especialmente o receptador dos valores desviados do erário. Barroso e Zavascki não votaram no caso Donadon, é verdade. No caso dos que condenaram, a fixação das penas foi dois anos e três meses para a maioria dos réus (Cristiano, Delúbio, Salgado, Genoíno, Kátia e Hollerbach) e dois anos e seis meses para Dirceu e Valério. Vê-se, assim, que, em relação ao caso Donadon, utilizado como paradigma pelo voto do próprio Barroso para justificar a aludida "discrepância", o incremento da pena-base foi de 65%, ao passo que no mensalão o incremento para Dirceu e Valério foi de 75%.
Portanto, a diferença mesmo — e que fez a diferença — consistiu na mudança da composição da corte. Isso se prova ao observar o placar do primeiro julgamento, que ficou em 6x4 para a condenação, ao passo que no segundo o placar foi de 6x5 para a absolvição. A diferença? Saiu Carlos Ayres (que condenou) e entraram Zavascki e Barroso (com o que a votação ganha o placar final de 6x5 para a absolvição). Simples, pois!
Para o bem e para o mal, chamemos as coisas pelo nome. Ou seja, a tal discrepância é um argumento circunstancial. Para um hermeneuta, basta ver algumas frases proferidas no caso Donadon (nem vou falar dos enunciados proferidos no mensalão, como “julgamentos conforme o sentimento pessoal”, etc): Lewandowski (que condenou Donadon em dois anos e três meses por formação de quadrilha, falou em discricionariedade e prudente arbítrio; Marco Aurélio: "não estamos no campo da legalidade estrita, mas da justiça", Toffoli falou "do prudente arbítrio".
Pronto. É por isso que não faço uma coluna específica sobre a polêmica da absolvição do crime de quadrilha. Basta-me discutir o problema de fundo, qual seja, a-insistência-dos-juristas-no-protagonismo-judicial e em julgamentos “conforme a subjetividade de cada um”.
Aguardemos os próximos julgamentos do STF. De minha parte, continuo dizendo: direito possui DNA; os julgamentos não devem ser feitos a partir das apreciações subjetivas (valorativas, ideológicas, etc) dos julgadores. Eis o cerne de minha chatice epistêmica, que me faz voltar a esse assunto tão seguidamente. Também... a cada dia esse fenômeno do solipsismo ganha mais força. Eis porque volto à carga. E eis também porque abandonei o neoconstitucionalismo, porque ele contribuiu para o estado de fragmentação das decisões em terrae brasilis. Não é por nada que o próprio establishment decidiu colocar barreiras contra si mesmo, mediante a criação de súmulas vinculantes, repercussão geral e jurisprudência defensiva. Não é por nada...
Numa palavra: aquilo que hoje lhe agrada, amanhã pode lhe desagradar. Daí minha pergunta que não quer calar: é melhor confiar no direito (naquilo que venho explicitando de há muito, não uma simples estrutura formal, é claro) ou no subjetivismo dos julgadores? Cartas para a coluna!

[1] O neoconstitucionalismo tem sido teorizado sob os mais diferentes enfoques. No Brasil, Ecio Oto Ramos Duarte, em obra em conjunto com Susanna Pozzolo (Neoconstitucionalismo e Positivismo jurídico: as faces da Teoria do Direito em tempos de interpretação moral da Constituição. São Paulo: Landy, 2010), faz uma descrição – de caráter original –desse fenômeno. Também as obras de Luis R. Barroso, Daniel Sarmento, Eduardo Moreira, Antonio Maia, Eduardo Cambi, entre outros livros importantes.
[2] Remeto o leitor, para esse tipo de crítica, às impagáveis Colunas de Otávio Luis Rodrigues Jr, aqui do Conjur. Otávio vai à raiz do problema que sempre esteve aí, mas pouquíssimos se deram conta.
[3] Cf. Maus, Ingeborg. Judiciário como Superego da Sociedade: o papel da atividade jurisprudencial na “sociedade órfã”. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, n. 58, pp. 183-202, 2000.
[4] O prefácio do livro de Ecio Oto, no prelo, que se chamará Constitucionalismo Global ou Pluriversalismo Internacional? O neoconstitucionalismo na perspectiva da teoria e da filosofia políticas contemporâneas é de Gilberto Bercovici.
[5] Positivismo não é apenas o exegético, por óbvio. Remeto o leitor para o meu Hermeneutica Juridica e(m) Crise, 11ª. Ed. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2013.
[6] Cf. Neoconstitucionalismo e Positivismo jurídico: as faces da Teoria do Direito em tempos de interpretação moral da Constituição. São Paulo: Landy, 2010.
[7] Cf. Garantismo, Hermenêutica e Neoconstitucionalismo(s). 2ª. Ed. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2013.
Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.
Revista Consultor Jurídico, 13 de março de 2014

TESTEMUNHA QUE DEMONSTROU MANIFESTO INTERESSE EM AJUDAR O RECLAMANTE LEVA AO INDEFERIMENTO DOS PEDIDOS




Testemunha que demonstrou manifesto interesse em ajudar o reclamante leva ao indeferimento dos pedidos (13/03/2014) 




As impressões do juiz de Primeiro Grau, colhidas ali, ao vivo e no calor do momento, durante a audiência em que se ouvem as testemunhas, têm peso considerável na valoração dos elementos que levarão à decisão do caso. Nos fundamentos, ele apresenta as razões que sustentam o modo como um juiz interpreta não apenas o depoimento, mas eventuais fatos colaterais ocorridos no momento em que ele foi colhido. Esse relato, detalhado, permite a cada uma das dez turmas julgadoras do TRT de Minas, recuperar com mais propriedade, circunstâncias da audiência, que podem levar a uma compreensão mais exata do sentido da prova testemunhal.

E esses elementos foram mesmo decisivos no caso julgado pela juíza Rosângela Pereira Bhering, na Vara do Trabalho de Conselheiro Lafaiete-MG. É que, tanto fez uma testemunha para ajudar o reclamante a conseguir êxito na ação que a juíza percebeu o manifesto interesse na demanda. E aí, a consequência foi a desconsideração do conteúdo do depoimento naqueles pontos em que confirmavam fatos alegados pelo autor como justificativa para seus pedidos.

Segundo relatou a juíza, a conduta testemunha chegou ao extremo de obrigar à inutilização de duas atas, porque insistia em fazer registros a mão nos documentos que lhe foram entregues para colheita de assinatura. E mais: "Quando interrogada pelo reclamante, apressava-se em dar detalhes que não lhe eram questionados e que julgava serem úteis ao reclamante (até porque se disse também advogado, além de professor), mas quando questionado pelos réus ou se julgava que a pergunta não atingiria o fim almejado, dizia que não sabia e/ou não se lembrava" .

Alegações visivelmente absurdas, não tardavam a revelar contradições: "Depois de tentar convencer que ficava com o reclamante na Faculdade entre 8 e 23 horas, numa coletânea absurda de atividades (não sobraria tempo útil para a atividade de lecionar), foi obrigado a dizer, indagado pelos réus, que ia à Faculdade duas vezes na semana, que tinha outras atividades e viajava muito, coisa a que era obrigado em razão do exercício da advocacia", acrescentou a juíza.

Entre os vários pleitos na ação, o reclamante pretendia provar que sua dispensa tinha se dado se forma ilícita e pedia a reintegração e pagamento dos salários desde então, quase dois anos depois da rescisão. Mas a juíza não viu qualquer irregularidade no procedimento da empresa, que dispensou o trabalhador sem justa causa, não tendo imputado a ele nenhuma falta: "Ora, o reclamante é empregado celetista e não necessita o empregador de justificar a sua demissão, bastando que pague (sob pena de responder judicialmente) as verbas decorrentes da rescisão", pontuou.

Quanto à acusação de ter sido alvo de perseguição por parte do diretor geral que, segundo argumentou, "fazia pouco do seu trabalho", e de sofrer pressões para contratar pessoas não habilitadas, também não houve prova suficiente, no entendimento da magistrada. O reclamante citou como exemplo dessa perseguição o fato de ter sido afastado da organização de uma semana jurídica em 2008, depois de ter convidado palestrantes. Ao que a Faculdade retrucou, dizendo que ele queria gastar 20 mil reais num evento que acabou saindo por 3 mil reais. A magistrada considerou que a empregadora, no uso do seu poder diretivo, tinha o direito de entender que o reclamante não era a pessoa mais indicada para organizar o evento. E o fato de ter de desconvidar os palestrantes faz parte da rotina e do rol de possibilidades a que estão sujeitos os que se ocupam desse tipo de atividade.

Para tentar convencer do assédio moral, a testemunha afirmou que o diretor dizia nas reuniões que o reclamante era desorganizado, que o seu perfil não se enquadrava no da instituição e que, se aquilo persistisse, ele seria dispensado. "Ora, parece evidente que o empregado que não se ajuste às exigências do empregador seja passível de demissão. Até porque a própria CLT enumera os casos em que a dispensa pode se dar sem conceder direito algum ao empregado e ninguém diria que a CLT expressa ameaça de algum tipo", observou a magistrada.

A juíza indeferiu os pleitos de reintegração e de indenização por dano moral, por não provados, e julgou parcialmente procedente a reclamação trabalhista, deferindo ao reclamante diferenças salariais e de adicional extra-classe, com base nas provas documentais anexadas ao processo. Confirmando a valoração da prova atribuída pela juíza de 1º Grau, por não ver nenhum traço de contradição ou fragilidade nos fundamentos adotados por ela, a 4ª Turma do TRT de Minas manteve a sentença nesse aspecto.( 0000027-23.2011.5.03.0055 AIRR )

Fonte: TRT3ª Região

COCA-COLA É CONDENADA POR ACIDENTE DE CONSUMO

Coca-Cola terá de indenizar mulher que diz ter encontrado lagartixa na garrafa de refrigerante
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão que condenou a Coca-Cola Indústrias Ltda. ao pagamento de indenização, no valor equivalente a 20 salários mínimos (R$ 14.480,00), a uma consumidora que diz ter encontrado uma lagartixa dentro da garrafa do refrigerante.

O colegiado, por maioria, entendeu que, mesmo sem ter havido abertura da embalagem ou ingestão do líquido, a existência de um corpo estranho em produto de gênero alimentício colocou em risco a saúde e a integridade física ou psíquica da consumidora.

“A aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana”, afirmou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.

Promessa de troca 
Em novembro de 2005, a consumidora comprou a garrafa de Coca-Cola. Antes de ingerir o refrigerante, reparou que em seu interior havia fragmentos estranhos. O exame mais apurado, com ajuda de uma lupa, revelou tratar-se de “algo semelhante a uma lagartixa ou, ainda, pedaços de pele humana”.

A consumidora procurou a empresa, que prometeu a troca do produto. Entretanto, isso não ocorreu, o que a levou a ajuizar a ação de indenização por dano material e moral no valor equivalente a 300 salários mínimos.

A sentença condenou a Coca-Cola ao pagamento de indenização no valor de R$ 2,49. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), entretanto, aumentou o valor para 20 salários mínimos, ao entendimento de que se indeniza a mera potencialidade, mesmo que o produto alimentício contaminado não chegue a ser ingerido.

Sofrimento moral

Em recurso ao STJ, a Coca-Cola sustentou que a alegada sensação de nojo e asco por ter a consumidora encontrado o corpo estranho na garrafa de refrigerante, cujo conteúdo nem sequer foi consumido, não gera sofrimento moral capaz de justificar o pagamento de indenização.

Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi observou que, segundo algumas decisões do STJ em situações idênticas ou pelo menos semelhantes, o fato de não haver ingestão do produto cuja embalagem continha um corpo estranho não imporia ao fornecedor o dever de indenizar o consumidor, na medida em que este, em tais circunstâncias, não teria sofrido dano algum.

Entretanto, para a ministra, a sistemática implementada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC) exige um olhar mais cuidadoso para o caso, em especial porque este protege a pessoa contra produtos que coloquem em risco sua segurança, saúde, integridade física ou psíquica.

Conforme explicou Andrighi, existe um dever legal, imposto ao fornecedor, de evitar que a saúde e a segurança do consumidor sejam colocadas sob risco (artigo 8º do CDC), sendo que a lei consumerista “tutela o dano ainda em sua potencialidade, buscando prevenir sua ocorrência efetiva”.

Exposição a risco

“É indubitável que o corpo estranho contido na garrafa de refrigerante expôs o consumidor a risco, na medida em que, na hipotética ingestão, não seria pequena a probabilidade de ocorrência de dano, seja à sua saúde física, seja à sua integridade psíquica. O consumidor foi, portanto, exposto a risco, o que torna ipso facto defeituoso o produto”, disse a relatora.

Finalizando, afirmou que “o dano indenizável decorre do risco a que fora exposto o consumidor”, muito embora “a potencialidade lesiva do dano não se equipare à hipótese de ingestão do produto contaminado (diferença que necessariamente repercutirá no valor da indenização)”.

Quanto ao valor da indenização, a ministra Andrighi afirmou que a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a modificação do valor fixado a título de danos morais somente é permitida quando a quantia estipulada for irrisória ou exagerada, o que não está caracterizado neste processo. Assim, ficou mantido o valor de 20 salários mínimos fixado na segunda instância. 

Fonte: STJ

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...