segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Média de mercado da taxa de juros de cheque especial não pode ser aplicada em operações de cartão de crédito




A inexistência de cálculo pelo Banco Central de taxa média de juros para as operações de cartão de crédito não é razão suficiente para aplicar a essas transações a taxa média cobrada nas operações de cheque especial. Esse foi o entendimento da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em julgamento de recurso especial do Hipercard Banco Múltiplo S/A.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), ao considerar abusiva a taxa de juros cobrada pelo banco em contrato de cartão de crédito, decidiu limitá-la às taxas médias cobradas em contratos de cheque especial.

Segundo o acórdão, “como inexiste uma tabela elaborada pelo Banco Central acerca da taxa média de mercado para os contratos de cartão de crédito, no caso da abusividade dos juros, utiliza-se, como paradigma, a média para os contratos de cheque especial”.

Precedente

No recurso especial, a instituição financeira sustentou a impossibilidade de ser adotada a taxa média de mercado do cheque especial constante da tabela do Banco Central do Brasil, por se tratar de operação de crédito distinta.

A relatora, ministra Isabel Gallotti, entendeu pela reforma do acórdão. Ela lembrou que a mesma controvérsia já foi apreciada pela Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp 125639, de relatoria da ministra Nancy Andrighi.

De acordo com a fundamentação do precedente citado, a média das taxas praticadas nas operações de cartão de crédito é superior àquela relativa ao cheque especial, não sendo lícita a equiparação das operações.

Na ocasião, a ministra Nancy Andrigui destacou que, nas operações de cartão de crédito, “a relação de mútuo intermediada pela administradora somente se concretizará nas hipóteses de efetivo inadimplemento pelo cliente. Este fato, por si só, se traduz economicamente em aumento da taxa de juros, afora outras discussões acerca dos riscos do negócio, certamente assumidos pela administradora, mas traduzidos em custo operacional com reflexo nas taxas de juros praticadas”.

A solução encontrada pela ministra Gallotti em relação ao Hipercard foi a devolução dos autos à fase instrutória para exame da alegação de abuso, mas com base nas taxas aplicadas pelo mercado nos contratos de mesma natureza (cartão de crédito).

Fonte: STJ

Gol deve indenização a mulher que perdeu meio-irmão em acidente aéreo




A VRG Linhas Aéreas S/A, que opera comercialmente com o nome Gol Linhas Aéreas, deve pagar indenização por dano moral, no valor de R$ 111 mil, à meia-irmã de uma vítima do acidente com o voo 1907, ocorrido em setembro de 2006. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que irmãos têm legitimidade para pedir a reparação.

O fato de se tratar de irmão/irmã unilateral que reside em cidade diferente da que vivia o falecido não interfere nesse direito, ao contrário do que alegou a companhia aérea, apontando a falta de comprovação de laços afetivos. Segundo a decisão da Turma, eventual investigação sobre o real afeto existente entre os irmãos “não ultrapassa a esfera das meras elucubrações”. Nesses casos, basta a certeza de que a morte de um irmão é apta a gerar dano moral ao que sobrevive.

Ao negar recurso da VRG, a Turma manteve integralmente a condenação imposta pela Justiça do Rio de Janeiro, inclusive o valor da indexação, considerada pelos ministros dentro da razoabilidade. 

Vocação hereditária

A tese fixada nesse julgamento trata da legitimidade de irmãos de vítima fatal para pedir indenização por danos morais. O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, destacou que não existe dispositivo legal na legislação brasileira sobre essa situação e que a doutrina jurídica é controversa.

Segundo Salomão, a melhor solução já adotada pela Quarta Turma foi equiparar a legitimidade dos vocacionados à herança, observadas as peculiaridades do caso concreto.

Por essa analogia, os ministros entendem que, como regra que pode comportar exceções, têm legitimidade para pedir indenização por morte de parente o cônjuge ou companheiro, os descendentes, os ascendentes e os colaterais, de forma não excludente e ressalvada a análise de peculiaridades do caso concreto que possam inserir ou excluir pessoas. 

A Turma concluiu que a meia-irmã tem legitimidade para pedir a indenização porque, nos termos dos artigos 1.829 e 1.839 do Código Civil de 2002, o colateral tem vocação hereditária quando o irmão é morto.

No caso, o falecido era solteiro, irmão apenas por parte de pai da autora da ação, não tinha descendentes, seu pai já havia morrido e a mãe também faleceu no acidente.

Industrialização do dano moral

Salomão afirmou que a Justiça não quer fomentar a industrialização do dano moral. Ele entende que se a investigação pura e simples acerca do sofrimento de alguém fosse suficiente para dar legitimidade à pretensão, a cadeia de legitimados para pedir compensação de dor moral se estenderia infinitamente, abarcando todos os parentes, amigos, vizinhos e até admiradores da vítima.

“Se todos aqueles que sofressem abalo moral pudessem buscar sua compensação, ter-se-ia a esdrúxula situação de, por exemplo, fãs de um astro da música morto requererem judicialmente a verba compensatória”, comparou o relator.Por essa razão, o ministro esclareceu que, para haver a legitimidade, é preciso exigir mais do que sofrimento que atinge uma gama de pessoas que conviveram ou admiravam a pessoa que falece.

Fonte: STJ

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Juíza responsabiliza empresa por briga entre empregadas com base em gravações de câmaras internas e celulares



Elas estão onde menos imaginamos: nos elevadores, escadas, halls, lojas, empresas e até nas ruas a céu aberto. Em geral ocultas, as câmeras nos observam e vigiam nossos passos por onde andamos, como se vivêssemos um verdadeiro "Big Brother" em tempo integral. E, como tudo tem dois lados, isso pode ser bom e ruim: ruim, porque muitas vezes somos invadidos em nossa privacidade; bom, porque as imagens gravadas podem ajudar a esclarecer situações conflituosas que, antes, ficariam só nas palavras e versões dos envolvidos. Nos conflitos trazidos à apreciação da Justiça, é essencial que a parte faça prova de suas alegações para conseguir o fim pretendido. É aí que entra a força e importância dessas gravações obtidas por câmaras de segurança, ou mesmo por celulares de curiosos ou interessados que, sempre à mão, são bem úteis para registrar acontecimentos considerados relevantes. Esse material ajuda a trazer à tona a verdade real para o julgador.

E as câmeras foram cruciais para a solução de um caso analisado pela juíza Keyla de Oliveira Toledo e Veiga, em sua atuação na da 3ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora. Ao examinar as gravações feitas pelas câmaras de segurança da empresa e de celulares de alguns empregados, a juíza pôde ver, com os próprios olhos, uma briga entre a reclamante e sua colega de trabalho. E, pelas imagens, ela viu claramente que as agressões à reclamante se iniciaram dentro da empresa e continuaram do lado de fora, sem que os seguranças, que a tudo assistiam, agissem para apartar a briga. Diante disso, a magistrada entendeu ser evidente o despreparo dos profissionais de segurança da empresa para controlar a situação e concluiu que a ré descumpriu sua obrigação de fornecer aos empregados um ambiente de trabalho seguro e sadio. Por essa razão, condenou a empresa a pagar indenização por danos morais à empregada agredida.

No caso, a empregada afirmou que, em certo dia, quando se preparava para iniciar o serviço, foi verbal e fisicamente agredida por uma colega de trabalho, situação que teve início dentro da empresa e continuou fora dela. Disse que, sem qualquer razão, essa pessoa a arrastou com violência para o exterior do prédio e, embora tenha pedido ajuda aos seguranças da empresa, eles nada fizeram. Acrescentou que a "cena" foi filmada por vários colegas e também pelas câmeras de segurança internas da empresa. Ela disse que precisou fazer tratamento psicológico em decorrência do trauma que sofreu e, por isso, pediu uma compensação financeira pelos danos morais sofridos.

No processo, a juíza teve acesso às filmagens internas da empresa no dia do fato, sem áudio, assim como gravações feitas por colegas da reclamante através de celular, com áudio, que mostraram o momento em que a reclamante e a outra empregada se aproximaram da catraca eletrônica na saída da empresa, vindo de dentro do prédio. A colega empurrava a reclamante, dizendo-lhe para sair que elas iriam "resolver lá fora". Pelas imagens, ficou clara a alteração de ânimos e o conflito que se dava entre as duas. Além disso, as imagens mostraram os seguranças se aproximando e se comunicando no rádio e, após a saída das duas empregadas da empresa, a câmera captou ainda que um segurança permaneceu próximo a porta, testemunhando os desdobramentos do fato. Essas cenas foram minuciosamente examinadas pela magistrada.

Logo de início, a julgadora afastou a alegação da empresa de que a atitude da agressora para com a reclamante "deveria ter um motivo". "A Constituição Federal nos garante a presunção de inocência, não servindo de argumentação jurídica a distorcida lógica de que se a autora foi agredida, alguma razão para tal teve a agressora. A narrativa da empregadora vai contra os princípios basilares do nosso Estado Democrático de Direito.", destacou. E, para a magistrada, apesar de não esclarecidas as motivações das agressões havidas entre as funcionárias, nem mesmo como ela se iniciou, a prova produzida deixou evidente a negligência da ré em face dos acontecimentos, pois os profissionais de segurança da empresa nada fizeram para impedir que as duas colaboradoras deixassem a sede da empresa aos empurrões.

De acordo com a juíza, a situação ficou bem clara: as empregadas estavam se desentendendo, já havendo contato físico e violência. E os seguranças se mostraram absolutamente despreparados, não apartando o embate e não impedindo a saída das duas da empresa. Além disso, a julgadora observou que a reclamante teve uma conduta mais apática, sem revidar os empurrões da colega, levando a crer que quem partiu para a agressão e pretendia o confronto físico era a outra.

Nos termos do art. 7º, XXII da Constituição Federal, é obrigação do empregador propiciar ambiente harmônico e sadio, condizente com o espaço e a importância que o trabalho tem na vida das pessoas, frisou a juíza, acrescentando que o ambiente de trabalho possui proteção constitucional no artigo 200, VIII, da CF/88. Assim, independente dos acontecimentos anteriores aos filmados no saguão da empresa, na visão da julgadora, a negligência e o despreparo dos profissionais de segurança em conter a situação conflituosa atrai a responsabilização subjetiva da empresa, pois é dever do empregador zelar pela integridade física e psíquica de seus funcionários durante a jornada de trabalho.

Nesse quadro, a magistrada concluiu serem presumidos os prejuízos morais causados à trabalhadora pela inércia da empresa, surgindo a obrigação de indenizar, nos termos do artigo 7o, inciso XXVIII, da Constituição e dos artigos 186 e 927 do Código Civil Brasileiro. A empresa foi condenada a pagar à reclamante indenização no valor de R$5.000,00. Houve recurso da empresa que se encontra em trâmite no TRT/MG.( nº 01377-2014-037-03-00-0 )
fONTE: TRT 3ª

A decisão de um ministro do STF pode valer como medida provisória?LE





A pergunta acima poderia estar em um concurso público. E poderia ser rapidamente respondida, sem muito esforço. A resposta por óbvio, é, não. Mas se as palavras “valer” e “medida provisória” vierem entre aspas, então poderemos discutir o assunto. Explico: na verdade, estou fazendo uma alegoria jurídica. Assim: um pedido cautelar em ADI, por exemplo, pode ser deferido liminarmente por um ministro, segundo o artigo 10 [1] da Lei 9.868. No recesso, ela valerá durante esse período. Isso quer dizer o quê? Muito simples: uma tutela cautelar concedida monocraticamente deve, em períodos de não recesso, ser levada de imediato ao plenário. Terminado o recesso, deve ser levada a full bench (decisão do plenário em banca cheia). Logo, fazendo um raciocínio lógico: uma cautelar originária de recesso só pode vale durante esse período (30 dias, supondo que ela seja deferida no primeiro dia do recesso). 

Mas o que a alegoria com a medida provisória (entre aspas) tem a ver com isso? A questão é óbvia: uma lei aprovada pelo parlamento e devidamente sancionada pode vir a ter a sua validade suspensa por uma Medida Cautelar em ADI. Se for no recesso, logo após o término do recesso, deve ser submetida ao plenário. Mas, se não o for? E se a suspensão perdurar no tempo indefinidamente sem que o plenário a confirme? Então os efeitos da ADI são semelhantes aos de uma medida provisória, uma vez que, segundo o parágrafo segundo do artigo 10 da Lei 8.868, entre outras coisas a concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário. Isto é: uma MC, além de suspender a validade (se se quiser, pode-se até falar em vigência) de um ato normativo (inclusive Emenda Constitucional), pode “repristinar” lei anterior. Há, ainda, algo mais grave: a MP tranca pauta e tem prazo para ser votada. Só que no STF — como explicarei adiante —, a não submissão da MC ao full bench não tranca a pauta do tribunal. Simples assim.

O exemplo privilegiado da ADI dos Royalties
Embora essa situação se repita em muitos outros casos — que relato na sequencia —, há uma ADI da e na qual pende de remessa ao full bench uma Medida Cautelar há um ano de oito meses. Falo da ADI 4917-RJ, que tratou da inconstitucionalidade da Lei dos Royalties (Lei 12.734/2012). Foi concedida MC, com o que a lei, cujo veto havia sido derrubado no Congresso Nacional, foi invalidada de imediato por decisão monocrática. Não vou discutir o mérito de quem deva receber os royalties ou de como deve ser distribuído esse butim financeiro. Disso poderei tratar em outro momento.

O que importa, aqui, é tratar do não cumprimento — frequente — por parte do Supremo Tribunal Federal de uma lei que trata exatamente dos procedimentos das ações de sua competência, a propalada Lei 9.868/98. No caso da ADI 4.917, há uma MC concedida não em período de recesso e que pende de apreciação em full bench há quase dois anos. Veja-se que a Medida Cautelar suspendeu os efeitos dos artigos 42-B; 42-C; 48, II; 49, II; 49-A; 49-B; 49-C; parágrafo 2º do artigo 50; 50-A; 50-B; 50-C; 50-D; e 50-E da Lei Federal 9.478/97, com as alterações promovidas pela Lei 12.734/2012, até o julgamento final da ADI 4.917. Só que essa MC deveria ter sido levada ao Plenário em seguida, o que significaria alguns dias, apenas. Na verdade, essa Medida Cautelar, por ter sido deferida em período normal (não recesso), sequer poderia ter sido deferida, porque a única exceção para a concessão de Medida Cautelar em ADI é estar a corte em período de recesso.

Só para termos uma ideia daquilo que denomino, alegoricamente, de “efeitos similares aos de medida provisória”: o resultado da demora na decisão pelo STF em modo full bench tem gerado um enorme prejuízo aos cofres públicos dos Estados. Com exceção de Rio de Janeiro e Espírito Santo, todos os demais estados vêm deixando de receber valores substancias da distribuição dos royalties.[2]

O descumprimento da Lei 9.868 e do artigo 97 da CF
Esse problema de o relator de MC em ADI não submeter a decisão concessiva ao full bench já havia sido denunciada pelo ministro Gilmar Mendes quando de seu voto na ADI 4.638, em 2011. Ali ele já elencou uma dezena de casos em que isso ocorreu e vinha ocorrendo. Hoje, um rápido levantamento mostra uma dezena de Medidas Cautelares concedidas e que estão pendentes de full bench, algumas com vários anos de atraso: ADI 4.232, de 19.05.2009; ADI 4.598, de 23.2.2012); ADI 4.628, de 18.03.2013; ADI 5.091, de 21.03.2014; ADI 5.086, de 28.01.2014; ADI 4.874, de 13.09.2013; ADI 4.843, de 30.1.2014; ADI 4.707, de 30.1.2014; ADI 4.258, de 3.07.2009; ADI 4.144, de 7.02.2104; ADI 5.171, de 21.11.2014.

Por todo o exposto, destaca-se o velho problema da morosidade judicial, que, por meio de uma medida cautelar, torna-se “(in)satisfativa” por vias oblíquas. Entra em questão a usurpação tácita de uma competência: a decisão monocrática se substitui no tempo à do colegiado (e a outro Poder, negando-se validade à lei sob mero “juízo de aparência”). Pense-se, ademais, em casos de liminares concedidas em mandados de segurança com ampla repercussão (coletiva) ou ações ordinárias que atingem milhares de pessoas, como a MC na AO 1.773, que trata do auxílio moradia, que, embora não abrangida pela determinação do artigo 10 da Lei 9.868, tem e gera efeitos similares aos de uma MC em ADI. Não se trata, aqui, de uma crítica aos eminentes relatores de qualquer ADI — minha crítica é reflexiva e visa a aprimorar o sistema —, mas, sim, à dependência pessoal em que muitas vezes se encontram os cases na Suprema Corte. Ora, a necessidade de remessa ao colegiado busca justamente garantir uma melhor deliberação, ao propiciar a transcendência heterorreflexiva no julgamento de causas complexas.

Há muito critico os abusos doutrinários e forenses no apelo à celeridade judicial. Por óbvio, não o faço por acreditar que a prestação jurisdicional brasileira seja célere ou por negar que a morosidade constatada seja um problema. Antes, preocupa-me o não dito nesses discursos: as propostas concretas de aceleração do trâmite processual frequentemente recorrem a expedientes autoritários e acabam perdendo de vista direitos e garantias fundamentais estruturantes do nosso ordenamento. O sistema de justiça tem que ser pensado de modo sistêmico, jamais fora do marco democrático que conquistamos.

Sob certas perspectivas, porém, a morosidade não levanta qualquer falsa dicotomia entre efetividade judicial quantitativa e qualitativa. Nesse caso, por exemplo: falha-se em dar resultados práticos definitivos aos jurisdicionados e falha-se também numa perspectiva interna à formação da decisão democrática, ao retardar a deliberação constitucionalmente garantida (e suspendendo a validade de lei ou até de emenda constitucional aprovada) em prol de decisão individual.

A Medida Cautelar em sede de controle concentrado de constitucionalidade é uma adaptação darwiniana do sistema jurídico. Mas não pode ser usada para substituir a decisão no modo full bench. Por isso deve ser bem observada a sua operacionalização monocrática apenas em “recesso” judiciário — que é a exceção —, sendo em regra por “maioria absoluta dos membros do Tribunal” (artigo 10, Lei 9.868/99 e artigo 97 da CF). Por isso, é certo que uma MC em sede de ADI deve ser referendada em plenário, conforme firmaram precedentes (por exemplo ADI 1.898, 1.899, 4.307, 4.635 e etc.).

Por tudo isso, não se pode perder de vista a primazia do colegiado, autonomizando esse poder do relator. Na decisão do caso dos royalties, por exemplo, em 18 de março de 2013, isso vai registrado na própria ementa (excepcional urgência configurada a impor deferimento cautelar ad referendum do plenário (ipsis literis).

Numa palavra
Minha crítica é, pois, sistêmica. Objetiva a preservação dos direitos constitucionais dos que são atingidos e pelos que são beneficiados por uma decisão em sede cautelar. Há um direito fundamental dos cidadãos no sentido de que sejam cumpridos os artigos 10 da Lei 9.868 e 97 da CF. Parece-me que o legislador foi sábio no sentido de permitir que, no recesso, a cautelar possa ser emitida monocraticamente. Mas me parece, também, que foi mais sábio ainda ao exigir que, imediatamente, essa mesma decisão seja submetida aos demais membros do STF.

No específico, em face do exemplo privilegiado da ADI dos royalties, não quero, nem de longe, incrementar uma guerra entre os estados pelo recebimento dos royalties. Poderia registrar, por exemplo, o valor que o Piauí — talvez o que mais necessite dos aportes dos royalties — perdeu no período (mais de R$ 300 milhões). Apenas trago o assunto à colação pelo amor ao debate e ao direito constitucional. Penso que isso é um dever cívico da doutrina de terrae brasilis.

Em resumo: Por se tratar de situação excepcional, a decisão monocrática que concede liminar e em procedimento abreviado só faz sentido quando for levada rapidamente ao plenário (full bench). O constrangimento para sua colocação em pauta deveria ser tanto maior. Por isso, posso afirmar que não há o que “ponderar” (Abwägung de Alexy); há, sim, apenas o “dever” (has a duty de Dworkin) de decidir. Penso, desse modo, estar colaborando com a Suprema Corte de meu país, além de contribuir — e essa, repito, é a tarefa da doutrina — para uma melhor prestação da jurisdição constitucional, na busca de uma melhor relação entre os Poderes da República.

Post scriptum: Ainda a separação judicial e o novo CPC
Li a tréplica à minha posição sobre a inconstitucionalidade da ressuscitação da separação no novo CPC feita pelos ilustres Professores Venceslau T. Costa Filho e Torquato Castro Jr. Dou uma palavra sobre isso. Concordo que intérpretes não devem mesmo estender a Constituição para além do seu sentido ("pam-constitucionalização"), sobretudo porque este “puxadinho hermenêutico” é feito pelo recurso externo à moral (axiologismos) em caráter pretensamente corretivo ao direito, “cavando-se por baixo da lei”. Concordo com Habermas, que visualiza a cooriginariedade entre direito e moral, a partir de onde seguem caminhos distintos.

Mas tampouco podemos ficar aquém do sentido que sabemos (e sabemos que sabemos) em questão, em deferência a “liberdades de conformação”. É preciso levar textos “em sério”, se não quisermos ser lesados no uso de nosso maior patrimônio público: os sentidos. Não existe linguagem privada, estando os sentidos lançados numa rede simbólica comunitária. Exatamente por isso é que a redação/interpretação legal não é um espaço para jogos artificiosos, armadilhas e pegadinhas. Do contrário, para revogar um instituto por Emenda Constitucional teríamos que estilhaçar a Constituição com algo do tipo: "fica revogada a separação judicial", colocando um parágrafo único assim:

“Fica revogada, mesmo, inclusive se a doutrina e a jurisprudência forem recalcitrantes e o NCPC dispuser sobre prazos para a ação”.



[1] Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art. 22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias

[2] Após a suspensão liminar da Lei 12.734/2012 eles deixaram de receber em um ano os seguintes valores: Acre –R$ 193.406.356,00; Alagoas – R$ 258.349.043,00; Amazonas – R$ 199.958.610,00; Amapá – R$ 186.827.262,00; Bahia – R$ 707.535.775,00; Ceará – R$ 527.609.273,00; Distrito Federal – R$ 41.709.142,00; Goiás – R$ 299.327.049,00; Maranhão – R$ 539.078.045,00; Minas Gerais –R$ 764.492.095,00; Mato Grosso – R$ 194.382.497,00; Mato Grosso do Sul – R$ 131.641.564,00; Pará – R$ 461.035.749,00; Paraíba – R$ 355.544.030,00; Pernambuco – R$ 489.672.006,00; Piauí – R$ 329.811.936,00; Paraná – R$ 434.726.107,00; Rio Grande do Norte – R$ 179.635.629,00; Rondônia – R$ 177.927.815,00; Roraima – R$ 139.226.897,00; Rio Grande do Sul –R$ 323.546.138,00; Santa Catarina – R$ 186.805.671,00; Sergipe – R$ 138.152.166,00; São Paulo – R$ 93.389.160,00; Tocantins – R$ 277.574.795,00.


Lenio Luiz Streck é jurista, professor, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.



Revista Consultor Jurídico, 4 de dezembro de 2014, 8h00

Professor alemão Zimmermann ministra palestra na USP nesta quinta-feira





Dois grandes nomes do Direito mundial participarão de eventos grautitos na Universidade de São Paulo, nesta quinta (4/12) e sexta-feira (5/12). A Faculdade de Direito da USP sediará os debates sobre Direito Contemporâneo. Na quinta-feira, o professor Reinhard Zimmermann (foto), diretor do Instituto Max-Planck para o Direito Estrangeiro e Internacional Privado, com sede em Hamburgo, ministrará a palestra inaugural, com o temaLimitation of Liability for Damages in European Contract Law.

O pesquisador Jan Peter Schmidt (foto), vinculado ao mesmo instituto e doutor em Direito pela Universidade de Ratisbona, falará sobre os dez anos do artigo 422 do Código Civil: Luz e sombra na aplicação do princípio da boa-fé objetiva na práxis judicial brasileira.

Os dois eventos serão promovidos a partir das 10h, no auditório do 1º andar no prédio histórico do Largo São Francisco, e a entrada é aberta a todos os interessados, sem necessidade de inscrição prévia. 

Zimmermann tem o nome reconhecido internacionalmente, com diversos títulos de doutor honoris causa (leia aqui o histórico dele). Ele foi recebido nesta quarta-feira (3/12) pelo reitor da USP, Marco Antonio Zago, abordando a experiência em seu país na pesquisa científica, na estrutura universitária e nas oportunidades de intercâmbio internacional.

Os juristas vieram ao Brasil a convite dos professores Otavio Luiz Rodrigues Jr. e Ignacio Poveda. As palestras integram o Ciclo de Estudos de Direito Privado Contemporâneo, organizado pela Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo, pelo Grupo de Pesquisa de Direito Privado Comparado Contemporâneo e Reforma Legislativa da USP, pelo Grupo de Pesquisa de Direito Privado Romano da universidade e ainda pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Bioética e Biodireito. Mais informações pelo e-mail: direitocontemporaneo@direitocontemporaneo.com.

Revista Consultor Jurídico, 3 de dezembro de 2014, 19h49

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Simples participação em processo seletivo não obriga a contratação




Simples participação em processo seletivo não obriga a contratação (03/12/2014) 




A simples participação do trabalhador em processo seletivo não obriga a sua contratação. Assim, o candidato ao emprego que, por alguma razão, não chegou a ser contratado e a prestar serviços na empresa, não pode receber parcelas devidas exclusivamente a quem é empregado. Esse tema foi objeto de análise do juiz substituto Henrique Alves Vilela, em atuação na 3ª Vara do Trabalho de Coronel Fabriciano. Ele julgou o caso de um candidato à vaga de "Operador de Trator Esteira" que, ao participar do processo seletivo em uma empresa e realizar os exames pré-admissionais, teve como resultado "baixa visão", o que criou obstáculo para a sua contratação. Na avaliação do magistrado, as partes não celebraram contrato de trabalho, pois o reclamante não chegou a trabalhar um dia sequer.

O trabalhador afirmou que, depois de ter sido contratado pelo diretor da empresa e de acertar todos os detalhes do contrato, realizou exames médicos admissionais em uma clínica e foi aprovado para a admissão. Disse que entregou todos os exames à reclamada e ela determinou que aguardasse em casa, ficando com a sua CTPS. Em razão da demora, procurou a empresa que, para sua surpresa, devolveu-lhe os documentos, afirmando que o quadro estava completo e que ele não seria contratado. Em razão disso, o reclamante requereu o pagamento dos quatro meses em que ficou à disposição da ré.

Mas, ao examinar as provas, o magistrado observou que o médico responsável pelo exame admissional orientou o reclamante para que adquirisse lentes corretivas e retornasse à clínica para a realização de novo teste de visão e exame clínico. Mas ele não retornou. Além disso, o próprio juiz, na audiência de instrução, concedeu ao trabalhador um prazo para adquirir as lentes corretivas e retornar à clínica para o término dos exames admissionais. E, novamente, nenhuma providência foi tomada. No mais, os depoimentos das testemunhas revelaram que as partes envolvidas não chegaram a celebrar contrato de trabalho e que o reclamante não prestou serviço um dia sequer. Também não houve prova de que ele tenha ficado à disposição da empresa aguardando a contratação.

Assim, o magistrado concluiu que o trabalhador apenas participou de processo seletivo na empresa, o que não obriga à sua contratação. Portanto, ele não tem direito a nenhuma parcela decorrente do vínculo de emprego, que não chegou a existir.( nº 00984-2014-089-03-00-1 )
Fonte: TRT 3ª

Princípio da insignificância não pode ser aplicado em casos de infrator contumaz

Princípio da insignificância não pode ser aplicado em casos de infrator contumaz


Não se admite a incidência do princípio da insignificância nos casos em que o agente é autor contumaz de crimes contra o patrimônio. Esse foi o entendimento da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento de um habeas corpus.

A condenada furtou de uma drogaria dois desodorantes, quatro barbeadores, um gel fixador, um gel creme modelador, um creme de pentear, cinco caixas de preservativos e 13 barras de chocolate. Tudo foi avaliado em R$ 88,24 à época dos fatos.

A mulher foi condenada a cumprir pena de dois anos de reclusão em regime semiaberto. Para o juiz, deixar de reprimir a acusada em virtude do “pequeno valor subtraído” seria “estimulá-la a constantes pequenas investidas contra o patrimônio alheio”.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais confirmou a sentença, mas modificou a pena para um ano e 10 dias de reclusão, mantido o regime semiaberto. Para o TJMG, a aplicação do princípio da insignificância ao caso “certamente representaria um estímulo à delinquência e à reiteração criminosa da apelante”. Entretanto, a defensoria pública insistiu que fosse aplicado o princípio, dessa vez no STJ.

De acordo com o ministro Rogerio Schietti, cujo pensamento foi o vencedor na Turma, o princípio da insignificância é um “tema que desperta grande dificuldade ao operador do direito, quer para aceitar a incidência de tal princípio orientador da aplicação da lei penal, quer para lhe definir os contornos precisos”.

Visão do STF

Segundo Schietti, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendido que o princípio da insignificância qualifica-se como fator de descaracterização material da tipicidade penal.

Para o STF, “o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor – por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes – não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social”.

O STJ, nas Quinta e Sexta Turmas, tem decidido que, para delimitar o âmbito de aplicação da insignificância, o juiz deverá ponderar o conjunto de circunstâncias que rodeiam a ação, de modo a descobrir se, mesmo estando ela descrita em um tipo penal, não afeta de maneira relevante o bem jurídico que o tipo protege.

Fatores

Para isso, Schietti elencou fatores que devem ser avaliados para saber se um comportamento formalmente típico deve ou não receber punição: “o valor do bem ou dos bens furtados; a situação econômica da vítima; as circunstâncias em que o crime foi perpetrado, ou seja, se foi de dia ou durante o repouso noturno, se teve o concurso de terceira pessoa, sobretudo adolescente, se rompeu obstáculo de considerável valor para a subtração da coisa, se abusou da confiança da vítima etc.; a personalidade e as condições pessoais do agente, notadamente se demonstra fazer da subtração de coisas alheias um meio ou seu estilo de vida, com sucessivas ocorrências (reincidente ou não)”.

Para o ministro, avaliar os dados empíricos implica reconhecer que, “na concretização do poder punitivo estatal, há algo além da mera tipicidade formal do comportamento”. De acordo com o ministro, implica reconhecer que, “conservador ou liberal, o julgador densifica uma dada política criminal, que há de dialogar, necessariamente, com a dogmática penal”.

Schietti destacou que a “simples existência de maus antecedentes penais, sem a devida e criteriosa verificação da natureza desses atos pretéritos, não pode servir de barreira automática para a invocação do princípio bagatelar”.

Conexão comportamental

Dessa maneira, o ministro ressaltou que os crimes cometidos anteriormente pelo agente devem ter alguma conexão comportamental com o crime patrimonial cometido para que a insignificância seja afastada.

Conforme os autos, a condenada já havia cometido o mesmo crime em ocasiões anteriores. Schietti analisou que o valor dos bens subtraídos da drogaria não poderia ser considerado “ínfimo”, pois, de acordo com ele, não é ínfimo valor furtado equivalente a aproximadamente 20% do salário mínimo vigente (R$ 415). Nesse sentido, o ministro disse que a conduta da paciente não possuiu “escassa lesividade penal”,

Schietti afirmou que a paciente é “contumaz e multirreincidente em crimes da mesma natureza, ostentando pelos menos três condenações anteriores por crime de furto e por crimes de roubo, a denotar sua habitualidade criminosa, de maneira que a lesão jurídica provocada não pode ser considerada insignificante”.

Tais fatores foram decisivos para que a maioria dos magistrados da Turma rejeitasse o habeas corpus, não conhecendo do pedido.

Fonte: STJ

Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

Deve-se presumir que as pessoas agem de boa-fé, diz a decisão. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que a teste...