quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

A decisão de um ministro do STF pode valer como medida provisória?LE





A pergunta acima poderia estar em um concurso público. E poderia ser rapidamente respondida, sem muito esforço. A resposta por óbvio, é, não. Mas se as palavras “valer” e “medida provisória” vierem entre aspas, então poderemos discutir o assunto. Explico: na verdade, estou fazendo uma alegoria jurídica. Assim: um pedido cautelar em ADI, por exemplo, pode ser deferido liminarmente por um ministro, segundo o artigo 10 [1] da Lei 9.868. No recesso, ela valerá durante esse período. Isso quer dizer o quê? Muito simples: uma tutela cautelar concedida monocraticamente deve, em períodos de não recesso, ser levada de imediato ao plenário. Terminado o recesso, deve ser levada a full bench (decisão do plenário em banca cheia). Logo, fazendo um raciocínio lógico: uma cautelar originária de recesso só pode vale durante esse período (30 dias, supondo que ela seja deferida no primeiro dia do recesso). 

Mas o que a alegoria com a medida provisória (entre aspas) tem a ver com isso? A questão é óbvia: uma lei aprovada pelo parlamento e devidamente sancionada pode vir a ter a sua validade suspensa por uma Medida Cautelar em ADI. Se for no recesso, logo após o término do recesso, deve ser submetida ao plenário. Mas, se não o for? E se a suspensão perdurar no tempo indefinidamente sem que o plenário a confirme? Então os efeitos da ADI são semelhantes aos de uma medida provisória, uma vez que, segundo o parágrafo segundo do artigo 10 da Lei 8.868, entre outras coisas a concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário. Isto é: uma MC, além de suspender a validade (se se quiser, pode-se até falar em vigência) de um ato normativo (inclusive Emenda Constitucional), pode “repristinar” lei anterior. Há, ainda, algo mais grave: a MP tranca pauta e tem prazo para ser votada. Só que no STF — como explicarei adiante —, a não submissão da MC ao full bench não tranca a pauta do tribunal. Simples assim.

O exemplo privilegiado da ADI dos Royalties
Embora essa situação se repita em muitos outros casos — que relato na sequencia —, há uma ADI da e na qual pende de remessa ao full bench uma Medida Cautelar há um ano de oito meses. Falo da ADI 4917-RJ, que tratou da inconstitucionalidade da Lei dos Royalties (Lei 12.734/2012). Foi concedida MC, com o que a lei, cujo veto havia sido derrubado no Congresso Nacional, foi invalidada de imediato por decisão monocrática. Não vou discutir o mérito de quem deva receber os royalties ou de como deve ser distribuído esse butim financeiro. Disso poderei tratar em outro momento.

O que importa, aqui, é tratar do não cumprimento — frequente — por parte do Supremo Tribunal Federal de uma lei que trata exatamente dos procedimentos das ações de sua competência, a propalada Lei 9.868/98. No caso da ADI 4.917, há uma MC concedida não em período de recesso e que pende de apreciação em full bench há quase dois anos. Veja-se que a Medida Cautelar suspendeu os efeitos dos artigos 42-B; 42-C; 48, II; 49, II; 49-A; 49-B; 49-C; parágrafo 2º do artigo 50; 50-A; 50-B; 50-C; 50-D; e 50-E da Lei Federal 9.478/97, com as alterações promovidas pela Lei 12.734/2012, até o julgamento final da ADI 4.917. Só que essa MC deveria ter sido levada ao Plenário em seguida, o que significaria alguns dias, apenas. Na verdade, essa Medida Cautelar, por ter sido deferida em período normal (não recesso), sequer poderia ter sido deferida, porque a única exceção para a concessão de Medida Cautelar em ADI é estar a corte em período de recesso.

Só para termos uma ideia daquilo que denomino, alegoricamente, de “efeitos similares aos de medida provisória”: o resultado da demora na decisão pelo STF em modo full bench tem gerado um enorme prejuízo aos cofres públicos dos Estados. Com exceção de Rio de Janeiro e Espírito Santo, todos os demais estados vêm deixando de receber valores substancias da distribuição dos royalties.[2]

O descumprimento da Lei 9.868 e do artigo 97 da CF
Esse problema de o relator de MC em ADI não submeter a decisão concessiva ao full bench já havia sido denunciada pelo ministro Gilmar Mendes quando de seu voto na ADI 4.638, em 2011. Ali ele já elencou uma dezena de casos em que isso ocorreu e vinha ocorrendo. Hoje, um rápido levantamento mostra uma dezena de Medidas Cautelares concedidas e que estão pendentes de full bench, algumas com vários anos de atraso: ADI 4.232, de 19.05.2009; ADI 4.598, de 23.2.2012); ADI 4.628, de 18.03.2013; ADI 5.091, de 21.03.2014; ADI 5.086, de 28.01.2014; ADI 4.874, de 13.09.2013; ADI 4.843, de 30.1.2014; ADI 4.707, de 30.1.2014; ADI 4.258, de 3.07.2009; ADI 4.144, de 7.02.2104; ADI 5.171, de 21.11.2014.

Por todo o exposto, destaca-se o velho problema da morosidade judicial, que, por meio de uma medida cautelar, torna-se “(in)satisfativa” por vias oblíquas. Entra em questão a usurpação tácita de uma competência: a decisão monocrática se substitui no tempo à do colegiado (e a outro Poder, negando-se validade à lei sob mero “juízo de aparência”). Pense-se, ademais, em casos de liminares concedidas em mandados de segurança com ampla repercussão (coletiva) ou ações ordinárias que atingem milhares de pessoas, como a MC na AO 1.773, que trata do auxílio moradia, que, embora não abrangida pela determinação do artigo 10 da Lei 9.868, tem e gera efeitos similares aos de uma MC em ADI. Não se trata, aqui, de uma crítica aos eminentes relatores de qualquer ADI — minha crítica é reflexiva e visa a aprimorar o sistema —, mas, sim, à dependência pessoal em que muitas vezes se encontram os cases na Suprema Corte. Ora, a necessidade de remessa ao colegiado busca justamente garantir uma melhor deliberação, ao propiciar a transcendência heterorreflexiva no julgamento de causas complexas.

Há muito critico os abusos doutrinários e forenses no apelo à celeridade judicial. Por óbvio, não o faço por acreditar que a prestação jurisdicional brasileira seja célere ou por negar que a morosidade constatada seja um problema. Antes, preocupa-me o não dito nesses discursos: as propostas concretas de aceleração do trâmite processual frequentemente recorrem a expedientes autoritários e acabam perdendo de vista direitos e garantias fundamentais estruturantes do nosso ordenamento. O sistema de justiça tem que ser pensado de modo sistêmico, jamais fora do marco democrático que conquistamos.

Sob certas perspectivas, porém, a morosidade não levanta qualquer falsa dicotomia entre efetividade judicial quantitativa e qualitativa. Nesse caso, por exemplo: falha-se em dar resultados práticos definitivos aos jurisdicionados e falha-se também numa perspectiva interna à formação da decisão democrática, ao retardar a deliberação constitucionalmente garantida (e suspendendo a validade de lei ou até de emenda constitucional aprovada) em prol de decisão individual.

A Medida Cautelar em sede de controle concentrado de constitucionalidade é uma adaptação darwiniana do sistema jurídico. Mas não pode ser usada para substituir a decisão no modo full bench. Por isso deve ser bem observada a sua operacionalização monocrática apenas em “recesso” judiciário — que é a exceção —, sendo em regra por “maioria absoluta dos membros do Tribunal” (artigo 10, Lei 9.868/99 e artigo 97 da CF). Por isso, é certo que uma MC em sede de ADI deve ser referendada em plenário, conforme firmaram precedentes (por exemplo ADI 1.898, 1.899, 4.307, 4.635 e etc.).

Por tudo isso, não se pode perder de vista a primazia do colegiado, autonomizando esse poder do relator. Na decisão do caso dos royalties, por exemplo, em 18 de março de 2013, isso vai registrado na própria ementa (excepcional urgência configurada a impor deferimento cautelar ad referendum do plenário (ipsis literis).

Numa palavra
Minha crítica é, pois, sistêmica. Objetiva a preservação dos direitos constitucionais dos que são atingidos e pelos que são beneficiados por uma decisão em sede cautelar. Há um direito fundamental dos cidadãos no sentido de que sejam cumpridos os artigos 10 da Lei 9.868 e 97 da CF. Parece-me que o legislador foi sábio no sentido de permitir que, no recesso, a cautelar possa ser emitida monocraticamente. Mas me parece, também, que foi mais sábio ainda ao exigir que, imediatamente, essa mesma decisão seja submetida aos demais membros do STF.

No específico, em face do exemplo privilegiado da ADI dos royalties, não quero, nem de longe, incrementar uma guerra entre os estados pelo recebimento dos royalties. Poderia registrar, por exemplo, o valor que o Piauí — talvez o que mais necessite dos aportes dos royalties — perdeu no período (mais de R$ 300 milhões). Apenas trago o assunto à colação pelo amor ao debate e ao direito constitucional. Penso que isso é um dever cívico da doutrina de terrae brasilis.

Em resumo: Por se tratar de situação excepcional, a decisão monocrática que concede liminar e em procedimento abreviado só faz sentido quando for levada rapidamente ao plenário (full bench). O constrangimento para sua colocação em pauta deveria ser tanto maior. Por isso, posso afirmar que não há o que “ponderar” (Abwägung de Alexy); há, sim, apenas o “dever” (has a duty de Dworkin) de decidir. Penso, desse modo, estar colaborando com a Suprema Corte de meu país, além de contribuir — e essa, repito, é a tarefa da doutrina — para uma melhor prestação da jurisdição constitucional, na busca de uma melhor relação entre os Poderes da República.

Post scriptum: Ainda a separação judicial e o novo CPC
Li a tréplica à minha posição sobre a inconstitucionalidade da ressuscitação da separação no novo CPC feita pelos ilustres Professores Venceslau T. Costa Filho e Torquato Castro Jr. Dou uma palavra sobre isso. Concordo que intérpretes não devem mesmo estender a Constituição para além do seu sentido ("pam-constitucionalização"), sobretudo porque este “puxadinho hermenêutico” é feito pelo recurso externo à moral (axiologismos) em caráter pretensamente corretivo ao direito, “cavando-se por baixo da lei”. Concordo com Habermas, que visualiza a cooriginariedade entre direito e moral, a partir de onde seguem caminhos distintos.

Mas tampouco podemos ficar aquém do sentido que sabemos (e sabemos que sabemos) em questão, em deferência a “liberdades de conformação”. É preciso levar textos “em sério”, se não quisermos ser lesados no uso de nosso maior patrimônio público: os sentidos. Não existe linguagem privada, estando os sentidos lançados numa rede simbólica comunitária. Exatamente por isso é que a redação/interpretação legal não é um espaço para jogos artificiosos, armadilhas e pegadinhas. Do contrário, para revogar um instituto por Emenda Constitucional teríamos que estilhaçar a Constituição com algo do tipo: "fica revogada a separação judicial", colocando um parágrafo único assim:

“Fica revogada, mesmo, inclusive se a doutrina e a jurisprudência forem recalcitrantes e o NCPC dispuser sobre prazos para a ação”.



[1] Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art. 22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias

[2] Após a suspensão liminar da Lei 12.734/2012 eles deixaram de receber em um ano os seguintes valores: Acre –R$ 193.406.356,00; Alagoas – R$ 258.349.043,00; Amazonas – R$ 199.958.610,00; Amapá – R$ 186.827.262,00; Bahia – R$ 707.535.775,00; Ceará – R$ 527.609.273,00; Distrito Federal – R$ 41.709.142,00; Goiás – R$ 299.327.049,00; Maranhão – R$ 539.078.045,00; Minas Gerais –R$ 764.492.095,00; Mato Grosso – R$ 194.382.497,00; Mato Grosso do Sul – R$ 131.641.564,00; Pará – R$ 461.035.749,00; Paraíba – R$ 355.544.030,00; Pernambuco – R$ 489.672.006,00; Piauí – R$ 329.811.936,00; Paraná – R$ 434.726.107,00; Rio Grande do Norte – R$ 179.635.629,00; Rondônia – R$ 177.927.815,00; Roraima – R$ 139.226.897,00; Rio Grande do Sul –R$ 323.546.138,00; Santa Catarina – R$ 186.805.671,00; Sergipe – R$ 138.152.166,00; São Paulo – R$ 93.389.160,00; Tocantins – R$ 277.574.795,00.


Lenio Luiz Streck é jurista, professor, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine o Facebook.



Revista Consultor Jurídico, 4 de dezembro de 2014, 8h00

Professor alemão Zimmermann ministra palestra na USP nesta quinta-feira





Dois grandes nomes do Direito mundial participarão de eventos grautitos na Universidade de São Paulo, nesta quinta (4/12) e sexta-feira (5/12). A Faculdade de Direito da USP sediará os debates sobre Direito Contemporâneo. Na quinta-feira, o professor Reinhard Zimmermann (foto), diretor do Instituto Max-Planck para o Direito Estrangeiro e Internacional Privado, com sede em Hamburgo, ministrará a palestra inaugural, com o temaLimitation of Liability for Damages in European Contract Law.

O pesquisador Jan Peter Schmidt (foto), vinculado ao mesmo instituto e doutor em Direito pela Universidade de Ratisbona, falará sobre os dez anos do artigo 422 do Código Civil: Luz e sombra na aplicação do princípio da boa-fé objetiva na práxis judicial brasileira.

Os dois eventos serão promovidos a partir das 10h, no auditório do 1º andar no prédio histórico do Largo São Francisco, e a entrada é aberta a todos os interessados, sem necessidade de inscrição prévia. 

Zimmermann tem o nome reconhecido internacionalmente, com diversos títulos de doutor honoris causa (leia aqui o histórico dele). Ele foi recebido nesta quarta-feira (3/12) pelo reitor da USP, Marco Antonio Zago, abordando a experiência em seu país na pesquisa científica, na estrutura universitária e nas oportunidades de intercâmbio internacional.

Os juristas vieram ao Brasil a convite dos professores Otavio Luiz Rodrigues Jr. e Ignacio Poveda. As palestras integram o Ciclo de Estudos de Direito Privado Contemporâneo, organizado pela Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo, pelo Grupo de Pesquisa de Direito Privado Comparado Contemporâneo e Reforma Legislativa da USP, pelo Grupo de Pesquisa de Direito Privado Romano da universidade e ainda pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Bioética e Biodireito. Mais informações pelo e-mail: direitocontemporaneo@direitocontemporaneo.com.

Revista Consultor Jurídico, 3 de dezembro de 2014, 19h49

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Simples participação em processo seletivo não obriga a contratação




Simples participação em processo seletivo não obriga a contratação (03/12/2014) 




A simples participação do trabalhador em processo seletivo não obriga a sua contratação. Assim, o candidato ao emprego que, por alguma razão, não chegou a ser contratado e a prestar serviços na empresa, não pode receber parcelas devidas exclusivamente a quem é empregado. Esse tema foi objeto de análise do juiz substituto Henrique Alves Vilela, em atuação na 3ª Vara do Trabalho de Coronel Fabriciano. Ele julgou o caso de um candidato à vaga de "Operador de Trator Esteira" que, ao participar do processo seletivo em uma empresa e realizar os exames pré-admissionais, teve como resultado "baixa visão", o que criou obstáculo para a sua contratação. Na avaliação do magistrado, as partes não celebraram contrato de trabalho, pois o reclamante não chegou a trabalhar um dia sequer.

O trabalhador afirmou que, depois de ter sido contratado pelo diretor da empresa e de acertar todos os detalhes do contrato, realizou exames médicos admissionais em uma clínica e foi aprovado para a admissão. Disse que entregou todos os exames à reclamada e ela determinou que aguardasse em casa, ficando com a sua CTPS. Em razão da demora, procurou a empresa que, para sua surpresa, devolveu-lhe os documentos, afirmando que o quadro estava completo e que ele não seria contratado. Em razão disso, o reclamante requereu o pagamento dos quatro meses em que ficou à disposição da ré.

Mas, ao examinar as provas, o magistrado observou que o médico responsável pelo exame admissional orientou o reclamante para que adquirisse lentes corretivas e retornasse à clínica para a realização de novo teste de visão e exame clínico. Mas ele não retornou. Além disso, o próprio juiz, na audiência de instrução, concedeu ao trabalhador um prazo para adquirir as lentes corretivas e retornar à clínica para o término dos exames admissionais. E, novamente, nenhuma providência foi tomada. No mais, os depoimentos das testemunhas revelaram que as partes envolvidas não chegaram a celebrar contrato de trabalho e que o reclamante não prestou serviço um dia sequer. Também não houve prova de que ele tenha ficado à disposição da empresa aguardando a contratação.

Assim, o magistrado concluiu que o trabalhador apenas participou de processo seletivo na empresa, o que não obriga à sua contratação. Portanto, ele não tem direito a nenhuma parcela decorrente do vínculo de emprego, que não chegou a existir.( nº 00984-2014-089-03-00-1 )
Fonte: TRT 3ª

Princípio da insignificância não pode ser aplicado em casos de infrator contumaz

Princípio da insignificância não pode ser aplicado em casos de infrator contumaz


Não se admite a incidência do princípio da insignificância nos casos em que o agente é autor contumaz de crimes contra o patrimônio. Esse foi o entendimento da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento de um habeas corpus.

A condenada furtou de uma drogaria dois desodorantes, quatro barbeadores, um gel fixador, um gel creme modelador, um creme de pentear, cinco caixas de preservativos e 13 barras de chocolate. Tudo foi avaliado em R$ 88,24 à época dos fatos.

A mulher foi condenada a cumprir pena de dois anos de reclusão em regime semiaberto. Para o juiz, deixar de reprimir a acusada em virtude do “pequeno valor subtraído” seria “estimulá-la a constantes pequenas investidas contra o patrimônio alheio”.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais confirmou a sentença, mas modificou a pena para um ano e 10 dias de reclusão, mantido o regime semiaberto. Para o TJMG, a aplicação do princípio da insignificância ao caso “certamente representaria um estímulo à delinquência e à reiteração criminosa da apelante”. Entretanto, a defensoria pública insistiu que fosse aplicado o princípio, dessa vez no STJ.

De acordo com o ministro Rogerio Schietti, cujo pensamento foi o vencedor na Turma, o princípio da insignificância é um “tema que desperta grande dificuldade ao operador do direito, quer para aceitar a incidência de tal princípio orientador da aplicação da lei penal, quer para lhe definir os contornos precisos”.

Visão do STF

Segundo Schietti, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendido que o princípio da insignificância qualifica-se como fator de descaracterização material da tipicidade penal.

Para o STF, “o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor – por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes – não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social”.

O STJ, nas Quinta e Sexta Turmas, tem decidido que, para delimitar o âmbito de aplicação da insignificância, o juiz deverá ponderar o conjunto de circunstâncias que rodeiam a ação, de modo a descobrir se, mesmo estando ela descrita em um tipo penal, não afeta de maneira relevante o bem jurídico que o tipo protege.

Fatores

Para isso, Schietti elencou fatores que devem ser avaliados para saber se um comportamento formalmente típico deve ou não receber punição: “o valor do bem ou dos bens furtados; a situação econômica da vítima; as circunstâncias em que o crime foi perpetrado, ou seja, se foi de dia ou durante o repouso noturno, se teve o concurso de terceira pessoa, sobretudo adolescente, se rompeu obstáculo de considerável valor para a subtração da coisa, se abusou da confiança da vítima etc.; a personalidade e as condições pessoais do agente, notadamente se demonstra fazer da subtração de coisas alheias um meio ou seu estilo de vida, com sucessivas ocorrências (reincidente ou não)”.

Para o ministro, avaliar os dados empíricos implica reconhecer que, “na concretização do poder punitivo estatal, há algo além da mera tipicidade formal do comportamento”. De acordo com o ministro, implica reconhecer que, “conservador ou liberal, o julgador densifica uma dada política criminal, que há de dialogar, necessariamente, com a dogmática penal”.

Schietti destacou que a “simples existência de maus antecedentes penais, sem a devida e criteriosa verificação da natureza desses atos pretéritos, não pode servir de barreira automática para a invocação do princípio bagatelar”.

Conexão comportamental

Dessa maneira, o ministro ressaltou que os crimes cometidos anteriormente pelo agente devem ter alguma conexão comportamental com o crime patrimonial cometido para que a insignificância seja afastada.

Conforme os autos, a condenada já havia cometido o mesmo crime em ocasiões anteriores. Schietti analisou que o valor dos bens subtraídos da drogaria não poderia ser considerado “ínfimo”, pois, de acordo com ele, não é ínfimo valor furtado equivalente a aproximadamente 20% do salário mínimo vigente (R$ 415). Nesse sentido, o ministro disse que a conduta da paciente não possuiu “escassa lesividade penal”,

Schietti afirmou que a paciente é “contumaz e multirreincidente em crimes da mesma natureza, ostentando pelos menos três condenações anteriores por crime de furto e por crimes de roubo, a denotar sua habitualidade criminosa, de maneira que a lesão jurídica provocada não pode ser considerada insignificante”.

Tais fatores foram decisivos para que a maioria dos magistrados da Turma rejeitasse o habeas corpus, não conhecendo do pedido.

Fonte: STJ

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Colocar escritório em "nuvem" pode reduzir investimentos


Colocar escritório em "nuvem" pode reduzir investimentos



Quais ferramentas e aplicações um escritório jurídico pode utilizar — desde sua fundação, pequeno e com poucos sócios, até se transformar em uma corporação com centenas de pessoas ligadas ao seu cotidiano?

Dois conceitos precisam ser antes apresentados: 1) computação em nuvem (cloud computing) e 2)Software como um serviço (SaaS).

A nuvem já é um termo comum em nosso dia a dia, designando que um programa ou aplicação é acessado pela rede mundial de computadores, por meio de uma interface cujo processamento computacional está se realizando, essencialmente, em outra máquina que não seu computador. Os arquivos em uso não estão “salvos” em seu computador e, sim, em algum centro de dados (data center), o qual, provavelmente, nem fisicamente está instalado em nosso país.

Para além das questões jurídicas que desta situação derivam — como as ligadas ao Marco Civil da Internet e às responsabilidades consequentes — o intuito aqui é verificar como isso funciona e como pode ser útil ao operador jurídico.

A grande vantagem da nuvem é a possibilidade de se reduzir o investimento para uso de ferramentas atualizadas, além do aumento da segurança conferida aos dados armazenados. Menor investimento porque não será necessário adquirir servidores próprios para sua organização; maior segurança porque o investimento individual em proteção, possivelmente, será menor do que o feito por um centro unificado mundial de computadores. Claro que estas afirmações são relativas ao valor de sua informação mas, regra geral, seria mais fácil um cracker (hacker do mal) atacar e invadir seu sistema do que o da Microsoft, do Google ou do seu banco.

O segundo conceito listado é o de software como um serviço. “Antigamente”, era comum adquirirmos uma licença perpétua de um editor de texto (por exemplo o MS Word); a cada nova versão lançada, adquiria-se um upgrade. Nesse modelo, um Microsoft Office Professional 2013 (com Outlook, Word,Excel, Access e Publisher) custa hoje, em média, R$ 1,5 mil. 

Ocorre que, hoje, diversas empresas fabricantes de programas para computadores, como a própria Microsoft e a Adobe com seu Photoshop, oferecem seus softwares como um serviço, ou seja, os alugam para que sejam utilizados por demanda. Neste modelo o mesmo pacote Office listado acima custa em média US$ 20 por mês, ao qual é agregada a uma série de funcionalidades que serão comentadas mais à frente.

A junção dos conceitos Cloud e SaaS desloca a concentração de investimento — dos programas, máquinas e equipe de suporte em tecnologia para o acesso à internet com estabilidade e velocidade. O link do escritório — aqui em visão abrangente, englobando a acepção privada da advocacia e a pública do gabinete ou da vara — precisa ter uma boa configuração, fibra ótica de preferência e com redundância — ou seja, dois provedores se possível. O acesso à internet deve permitir que todos na organização acessem vídeos ao mesmo tempo, por exemplo. Estar na nuvem é poder fazer download e upload em velocidades que não deixem ninguém desesperado para quebrar o computador. Uma boa largura de banda (medida de acesso à rede) não é um luxo e, sim, uma necessidade.

Passando para o campo empírico, como exemplo de uma plataforma baseada na nuvem com a disponibilidade de serviços cita-se o Microsoft Office 365. Na tela abaixo está apresentada a interface do usuário para as ferramentas disponíveis como base. As licenças de toda a suíte de escritório do Office podem ser instaladas em cinco computadores diferentes por usuário, inclusive em sua residência. A integração com dispositivos móveis já foi assunto de uma de nossas colunas.


Os planos de assinatura contemplam diversas funcionalidades. A central de controle, representada na figura abaixo, gerencia boa parte da tecnologia disponível para o escritório.


Duas aplicações se destacam nessa central: o Exchange e o SharePoint. OExchange é o programa servidor de correio eletrônico e trabalho em grupo, no qual se unifica o gerenciamento integrado de e-mails, agendas e tarefas de toda a organização. Já o SharePoint é o programa que gerencia o conteúdo produzido, contemplando a definição de pastas para armazenamento dos arquivos, a criação de sites de trabalho em equipe e ferramentas como murais e linhas de tempo de tarefas em projetos.

O Office 365 permite que todos os arquivos e sites de colaboração sejam localizados por uma única ferramenta de busca. Cada arquivo ou site poderá ser visualizado e localizado apenas por quem tem acesso a ele, podendo ser definidas senhas e perfis de acesso para cada um deles.

As utilidades e funcionalidades desses programas levou a Microsoft a criar configurações especificas para a área jurídica. O sistema Matter Center, referente ao logotipo ao lado, provê um pacote desenhado para escritórios, especialmente no tocante ao espaço para armazenamento, gestão eletrônica de documentos e trabalho em conjunto na construção de peças processuais e outros textos. Alguns escritórios early adopters (que são os primeiros a adotarem tecnologias novas) no Brasil já o estão testando.

Para não ficarmos só com um exemplo, o Google também disponibiliza toda uma plataforma com aplicações semelhantes. Com valor médio mais baixo, mas com a proporcional redução de funcionalidades, o Google Apps, representado pela figura abaixo, permite gerenciar, na nuvem, usuários, acessos a documentos, pastas e sites.


As duas plataformas apresentadas permitem que o escritório gerencie tudo isso utilizando seu próprio domínio na Internet (exemplo: www.seu_escritorio.com.br), tornando-se a central de gerenciamento até da comunicação com os clientes, por meio da qual se compartilham e recebem arquivos e se gerenciam sites com conteúdo externo, sempre utilizando a marca do escritório.

Grandes empresas utilizam uma ou outra plataforma, conforme suas conveniências e necessidades de funcionalidades específicas. O escritório pode utilizar, desde pequeno, uma solução de tecnologia que acompanhe seu crescimento, mas que não perca em nada, desde o início, para organizações maiores.

PS: Alguns leitores têm perguntado se ganho algum ‘jabá’ para descrever ferramentas aqui na coluna. Esclareço que não e que vou continuar escrevendo sobre ferramentas de tecnologia da informação úteis para os operadores jurídicos.

Marcelo Stopanovski é Diretor de Produção da i-luminas — suporte a litígios e consultor do escritório FeldensMadruga. Professor da FGV in Company com a disciplina Engenharia do Conhecimento Jurídico. É mestre em Inteligência Aplicada na Engenharia de Produção e Bacharel em Direito, ambos pela Universidade Federal de Santa Catarina.



Revista Consultor Jurídico, 1 de dezembro de 2014, 12h05

Juízes e membros do MP também devem passar por detector de metais, decide CNJ


Juízes e membros do MP também devem passar por detector de metais, decide CNJ



Todas as pessoas que entram em prédios do Judiciário devem passar por detectores de metais e por outras medidas de segurança. Inclusive os juízes, desembargadores, ministros e membros do Ministério Público. Foi o que decidiu, nesta segunda-feira (1º/12), o Conselho Nacional de Justiça, em sua 22ª sessão extraordinária.

Os detectores de metais na entrada de prédios forenses vêm desagradando advogados desde que começaram a ser implantados, em 2010, a partir da edição das resoluções 104 e 124 do CNJ. Em julho de 2012 a possibilidade foi repetida na Lei 12.694/2012. E ela fala especificamente na “instalação de detectores de metais, aos quais devem se submeter todos os que querem ter acesso aos seus prédios”.

A reclamação dos advogados é que os detectores só foram instalados nas entradas comuns, que não são usadas pelos magistrados e membros do MP. Normalmente eles têm entradas especiais, ou podem acessar os prédios pelo estacionamento, o que não é permitido aos demais cidadãos. Ou seja, só advogados e “cidadãos comuns” é que são obrigados, hoje, a passar pelo detector de metais.

Com a decisão desta segunda do CNJ, foi aplicado o princípio da isonomia. Os detectores devem ser instalados em todas as entradas que o tribunal entender haver necessidade de maior controle de segurança.

O conselheiro Emmanoel Campelo, voto vencedor na discussão, entendeu que, se ficou decidido sobre a necessidade do uso de detector, todos devem se submeter a ele, não só advogados. “Quanto mais exceções, mais vulnerabilidade”, completou o conselheiro Flávio Sirangelo.

A discussão começou no CNJ em março de 2013, mas foi interrompida por pedido de vista dos conselheiros Campelo e Sirangelo. O caso foi levado ao CNJ em pedido de providências feito pelo advogado Marcos Alves Pintar começou a ser julgado. Ele reclamava da prática em fóruns de São José do Rio Preto (SP) e levou o caso ao conselho, onde foi apoiado pela Ordem dos Advogados do Brasil, que entrou no caso como terceiro interessado.

O relator original do pedido era o conselho Jorge Hélio. E os votos-vista discutidos nesta segunda seguiram seu entendimento, de que as medidas de segurança se aplicam a todos. Também votaram nesse sentido a vice-presidente do CNJ, ministra Cármen Lúcia, e os conselheiros Paulo Teixeira, Gilberto Valente, Guilherme Calmon, Maria Cristina Peduzzi e a corregedora nacional, ministra Nancy Andrighi. Além deles, os ex-conselheiros Bruno Dantas e Silvio Rocha.

A ministra Cármen Lúcia, ao final do julgamento, comentou que “não é possível, em uma República que tenha tantas falas sobre igualdade, desigualar justo em segurança pública, que é uma garantia de todos”. Ela presidiu a sessão desta segunda.

O presidente do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, considerou a decisão “acertada e contundente”. “Assim como os advogados, juízes e promotores de Justiça devem, por igual, serem submetidos a tratamento da mesma natureza para fins de segurança”, declarou.

Para Marcelo Knopfelmacher, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), a decisão é exemplar e assegura a justa aplicação do princípio da igualdade. "Não há hierarquia entre juízes, membros do Ministério Público e advogados como reza a lei ordinária. E a razão disso é a indispensabilidade do advogado à administração da justiça e, mais ainda, o princípio da isonomia previsto pelo artigo 5º da Constituição".

Pedido de Providências 0004482-98.2012.2.00.0000



Revista Consultor Jurídico, 1 de dezembro de 2014, 20h44

Definidos requisitos para decretação de indisponibilidade de bens em execução fiscal

Definidos requisitos para decretação de indisponibilidade de bens em execução fiscal


Para obter a decretação de indisponibilidade de bens em execuções fiscais, a Fazenda Pública terá de comprovar ao juiz o esgotamento de diligências em busca de bens penhoráveis. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu, em julgamento de recurso repetitivo, que entre as diligências da Fazenda devem estar o acionamento do Bacen-Jud (penhoraon-line) e a expedição de ofícios aos registros públicos do domicílio executado e ao Departamento de Trânsito Nacional ou Estadual (Denatran ou Detran) para que informem se há patrimônio em nome do devedor.

A tese passa a orientar as demais instâncias do Judiciário que tratarem do tema e sinaliza que, havendo decisão em acordo com o que foi definido pelo STJ, recurso contra ela não será mais admitido na corte superior.

O centro da controvérsia é a interpretação do artigo 185-A do Código Tributário Nacional (CTN), segundo o qual, na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos.

O ministro Og Fernandes, relator do recurso repetitivo, destacou que a ordem judicial para decretação da indisponibilidade é, portanto: citação do executado; inexistência de pagamento ou de oferecimento de bens à penhora no prazo legal; e, por fim, não localização de bens penhoráveis após esgotamento das diligências realizadas pela Fazenda, caracterizado quando houver nos autos (a) pedido de acionamento do Bacen Jud e consequente determinação pelo magistrado e (b) expedição de ofícios aos registros públicos do domicílio do executado e ao Departamento Nacional ou Estadual de Trânsito - DENATRAN ou DETRAN.

Quanto ao último requisito, o ministro relator observou que a decisão define as diligências que podem ser consideradas suficientes para permitir que se afirme, com segurança, que não foram encontrados bens penhoráveis.

Recusa

No caso julgado como recurso repetitivo, mesmo diante dos requisitos previstos nesse dispositivo (citação do devedor, ausência de pagamento, não apresentação de bens à penhora e infrutífera tentativa de localizar bens penhoráveis), o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) negou pedido formulado pela Fazenda para bloquear bens e direitos do devedor para fins de indisponibilidade.

No recurso, a Fazenda sustentou que realizou diligências que estavam ao seu alcance, sendo elas, contudo, infrutíferas. Por essa razão, entende ser o caso do bloqueio cautelar de bens previsto no artigo 185-A do CTN, ante a não localização de bens passíveis de penhora.

O caso

Em 2004, o INSS ajuizou execução fiscal contra uma empresa para saldar dívida tributária no valor de R$ 346.982,12. Com a notícia de decretação da falência da empresa, o juiz incluiu os dois sócios no polo passivo da execução. Foi pedida, então, a indisponibilidade dos bens dos executados, até o limite do débito acrescido de custas processuais e demais encargos, atualizados monetariamente.

O juiz negou o pedido, e o TRF3 ratificou a decisão sob o argumento de que “não houve esgotamento das diligências para localização de bens passíveis de penhora, especialmente com relação aos coexecutados [sócios]”, o que não autorizaria a adoção da “medida excepcional e extrema” de decretação da indisponibilidade dos bens e direitos dos executados.

Recurso

Ao analisar o recurso repetitivo, o ministro Og Fernandes ressaltou que esse artigo foi inserido no código tributário como medida para aumentar a probabilidade de pagamento do devedor, por razões de interesse público. Por isso, a leitura do dispositivo legal, no seu entender, deve ser feita sob essa perspectiva.

No recurso analisado, o ministro relator verificou que, apesar de o TRF3 ter considerado não haver o esgotamento das diligências, não há indicação a respeito das medidas já adotadas pela Fazenda Nacional, nem daquelas que o tribunal regional entenderia como suficientes para caracterizar o esgotamento das diligências e, por consequência, determinar a indisponibilidade de bens.

Por isso, no caso concreto, a Primeira Seção determinou o retorno dos autos ao TRF3 para que reanalise a questão, agora com base nos critérios definidos pelo STJ no recurso repetitivo.

Fonte: STJ

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