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quinta-feira, 14 de novembro de 2013

EX-CÔNJUGE TEM DIREITO A ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS, DECIDIU O STJ



DECISÃO Quarta Turma admite fixação de alimentos compensatórios para ex-cônjuge
Presentes na doutrina, mas ainda pouco discutidos na jurisprudência brasileira, os alimentos compensatórios se destinam a restaurar o equilíbrio econômico-financeiro rompido com a dissolução do casamento. Na sessão desta terça-feira (12), a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu a fixação de alimentos compensatórios ao julgar recurso vindo de Alagoas.

No caso julgado, o ex-marido propôs duas ações – de oferecimento de alimentos e de separação judicial litigiosa. O juiz da 27ª Vara Cível da Comarca de Maceió reuniu as ações. O ex-marido ofereceu R$ 5,2 mil; a ex-mulher pediu R$ 40 mil.

Frustradas as tentativas de conciliação, o juiz proferiu sentença conjunta, arbitrando os alimentos em 30 salários mínimos mensais, a serem pagos enquanto a ex-mulher necessitar. Garantiu também à ex-mulher dois veículos (Corolla e Palio ou similares) e imóveis no valor total de R$ 950 mil.

Ao julgar a apelação, o Tribunal de Justiça de Alagoas, por maioria, reduziu a pensão mensal para 20 salários mínimos pelo período de três anos, mantendo a sentença no restante. No entanto, houve embargos infringentes, um tipo de recurso cabível quando a sentença é reformada por decisão não unânime. Nesse segundo julgamento, o tribunal estadual restabeleceu o valor de 30 salários mínimos e afastou a limitação de três anos.

Fora do pedido

No STJ, o ex-marido alegou que, na contestação, a ex-mulher fez referência tão somente aos alimentos no valor de R$ 40 mil, não mencionando nenhum valor a título compensatório. Para a defesa do ex-marido, isso representaria um julgamento extra petita, isto é, fora do pedido. Por isso, requereu a exclusão da obrigação quanto aos imóveis e aos veículos.

A defesa do ex-marido pediu, ainda, que o STJ fixasse um prazo certo para o pagamento dos alimentos, pois estes não poderiam configurar uma espécie de “aposentadoria”, estimulando o ócio. A ex-mulher tem 46 anos e possui formação superior.

Já a defesa da ex-mulher argumentou que ela se casou aos 19 anos e permaneceu ao lado do ex-marido por 22 anos, sem que qualquer bem tivesse sido colocado em seu nome, algo que demonstraria “abuso de confiança” por parte dele.

Livre convicção

Ao proferir seu voto, na sessão de 6 de novembro de 2012, o relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, entendeu não estar configurado julgamento extra petita. “A apreciação do pedido dentro dos limites propostos pelas partes na petição inicial ou na apelação não revela julgamento ultra ou extra petita”, afirmou.

O ministro explicou que o juiz fixa os alimentos segundo o seu convencimento, adotando os critérios da necessidade do alimentado e da possibilidade do alimentante. “Na ação de alimentos, a sentença não se subordina ao princípio da adstrição judicial à pretensão”, explicou.

O relator observou que a entrega dos apartamentos e dos veículos arbitrada pela sentença e a condenação ao pagamento de alimentos naturais (necessários) e alimentos civis (destinados à preservação da condição social da ex-mulher) levou em conta os elementos apresentados nos autos pelas partes.

Desequilíbrio

Para o relator, no caso, houve ruptura do equilíbrio econômico-financeiro com a separação, sendo possível a correção desse eventual desequilíbrio com a fixação de alimentos compensatórios.

Quanto ao prazo para os alimentos, o ministro Antonio Carlos destacou que o pagamento vem sendo feito desde 2002. Assim, como a ex-mulher tem idade e formação que permitem sua inserção no mercado de trabalho, o ministro votou, inicialmente, pelo pagamento de prestação alimentícia por três anos, a contar do trânsito em julgado da decisão.

Na sessão desta terça-feira, após os votos-vista da ministra Isabel Gallotti, proferido em 19 de setembro, e do ministro Marco Buzzi, a Turma, por maioria de votos, deu parcial provimento ao recurso, acompanhando o voto do relator.

O ministro Luis Felipe Salomão ressaltou que a conclusão do relator corresponde à jurisprudência do STJ. Há precedentes da Corte que fixam a tese de que o pedido de pensão formulado é meramente estimativo. Não configura decisão extra petita o arbitramento de valor maior que o solicitado, com base nos elementos do processo.

Nesse ponto, o ministro Marco Buzzi ficou vencido. Reconheceu o julgamento fora do pedido apresentado pelas partes e considerou que a cessão de bens viola o regime de casamento estabelecido em acordo pré-nupcial.

Prazo da pensão

No mesmo recurso, o ex-marido contestou o valor da pensão estabelecido em 30 salários mínimos, e sua duração por tempo indeterminado – enquanto a mulher necessitasse e o alimentante pudesse pagar, ou até a ocorrência de algum fato novo que permitisse a revisão dos alimentos. Na ação, o ex-marido ofertou pensão alimentícia de R$ 5,2 mil e a ex-mulher pediu R$ 40 mil.

Por unanimidade de votos, a Turma manteve a pensão em 30 salários mínimos. Contudo, após intenso debate, a maioria dos ministros fixou o prazo de três anos para pagamento da pensão, a contar da publicação do acórdão desse julgamento.

O ministro Antonio Carlos Ferreira aderiu, no ponto, aos votos dos ministros Luis Felipe Salomão e Raul Araújo, que consideraram o prazo de três anos, a contar dessa decisão, suficiente para a mulher se organizar e ingressar no mercado de trabalho.

A ministra Isabel Gallotti e o ministro Marco Buzzi ficaram vencidos. Votaram pela manutenção do prazo indeterminado. Segundo eles, é muito difícil para uma mulher de aproximadamente 50 anos de idade, sem nenhuma experiência profissional, inserir-se no mercado de trabalho. Apesar de ter concluído o ensino superior, a mulher nunca trabalhou. Casou-se aos 19 anos e sempre acompanhou o marido em sua carreira política.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.



Fonte: STJ

segunda-feira, 3 de junho de 2013

JUÍZA DE GOIÁS MUDA ENTENDIMENTO E AUTORIZA UNIÃO GAY

Em muitos casos, a demora ou omissão dos legisladores obriga juízes a produzirem normas que preencham, ao menos provisoriamente, as lacunas do ordenamento jurídico. Essa foi a percepção adotada pela juíza Sirlei Martins da Costa, da 1ª Vara de Família e Sucessões de Goiânia, quanto ao casamento homossexual. É que, se em junho de 2012 ela decidiu que dois homossexuais não poderiam se casar por falta de previsão legal, na terça-feira (28/5) ela mudou de opinião e autorizou um casamento gay.
Na decisão do ano passado, Sirlei da Costa afirmou que, apesar de não ver problemas no casamento entre duas pessoas do mesmo sexo, somente lei aprovada pelo Congresso Nacional poderia autorizá-lo. Para isso, escreveu, seria necessária ampla discussão social sobre o tema. Já na sentença da terça, ela segue em outra direção: "inegável que ao cumprir seu dever precípuo de interpretar a norma, o julgador também produz norma".
Para aprovar a união gay, ela recorre ao artigo 3º da Constituição Federal, que define como um dos objetivos do país “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Sirlei argumentou que a limitação da possibilidade de exercer a intimidade sexual conforme o desejo atenta contra a dignidade da pessoa. E a garantia apenas ao casamento heterossexual é uma restrição de direito, apontou.
“Não encontro nenhum motivo para dizer que o casamento entre pessoas do mesmo sexo pode trazer qualquer prejuízo para a sociedade. A história mostra que o exercício da intolerância é que gera catástrofes. Em corolário a isso, podemos vislumbrar que o exercício e a prática da tolerância podem, quiçá, ser positivos no sentido de promover o desenvolvimento da sociedade”, diz a juíza, na decisão mais recente. 
Em sua opinião, "não há como negar que o julgamento do STF (ADI 4277/DF e ADPF 132/RJ), o julgamento do STJ (RESP 1.183.378/RS) e até a Resolução 175 do CNJ sejam influenciadores da formação de convicção do julgador no sentido de permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo". Uma das provas disso, segundo ela, é que após julgamento do STF, Corregedorias de Justiça de dez estados regulamentaram a matéria: Santa Catarina, Rio de Janeiro, Roraima, Paraná, Mato Grosso do Sul, Bahia, Sergipe, Piauí, São Paulo e Rio de Janeiro
Ressalvas
Apesar do poder transformador dessas interpretações, ela tem ressalvas quanto aos seus impactos no ordenamento jurídico. Ela pondera que o Código Civil "afirma categoricamente" que o casamento se dá entre homem e mulher e compete ao legislador analisar a questão. “Na verdade, a admissão do direito de casamento entre pessoas do mesmo sexo apenas impõe aos demais um dever: tolerar e respeitar as diferenças”, disse. A guinada de entendimento, de acordo com a juíza, se deve ao atraso dos legisladores em atender aos anseios da sociedade.

Para ela, diferente de autorizar o casamento gay, a decisão do Supremo reconheceu a entidade familiar criada na relação pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo. O Supremo também garantiu, com aquele entendimento, que casais gays devem ter os mesmos benefícios de uma união heterossexual, conforme o artigo 226 da Constituição e o artigo 1.723 do Código Civil.
A juíza ainda destacou na sentença que a Resolução 175/2013, do Conselho Nacional de Justiça, vincula somente os cartórios a habilitarem o casamento gay. A norma obriga os cartórios a converter a união estável homossexual em casamento, se assim for o desejo do casal. Ao julgador, de acordo com ela, cabem os princípios determinados pelo artigo 93 da Constituição, que trata da prerrogativa de livre convencimento. 
Posicionamento anterior
Ao recusar o pedido de união civil feito por dois homens, em junho de 2012, ela destacou que a legislação civil reconhece diversas formas de entidades familiares, sendo o casamento entre homem e mulher apenas uma delas. Mas o ordenamento jurídico não permite, justificou, a união entre duas pessoas do mesmo sexo no Brasil.

Naquela época, a aprovação de regras sobre o tema já havia acontecido em alguns países da Europa, estados norte-americanos e na Argentina. Mas Sirlei da Costa ressaltou que, nesses casos, foram necessários amplos debates no Legislativo e na sociedade para garantir a norma.
"Em nenhum desses países, o casamento entre pessoas do mesmo sexo passou a ser possível por decisão judicial. Caso contrário, estar-se-ia permitindo decisões manipulativas aditivas de garantia em controle concreto de constitucionalidade, o que não é possível, conforme posicionamento atual do Supremo Tribunal Federal que, inclusive, nega possibilidade jurídica às sentenças manipulativas a pretexto de evitar uma atividade de 'legislação positiva' ao Judiciário.", ponderou.
Em fevereiro de 2007 a mesma juíza, à época na 3ª Vara de Família, Sucessões e Cível de Goiânia, já havia reconhecido um relacionamento homoafetivo estável como entidade familiar, com “todas as conseqüências legais advindas de uma união”. Segundo Sirlei Martins Costa, embora náo houvesse legislação específica para o tema, a jurisprudência era pacífica sobre a possibilidade jurídica da união de duas pessoas do mesmo sexo. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-GO.
Victor Vieira é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 1º de junho de 2013

sábado, 9 de junho de 2012

DIREITO DE FAMÍLIA E RESPONSABILIDADE CIVIL


Ênio Santarelli Zuliani



Desembargador da 4ª Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo e Professor de Direito Civil
na UNISEB - COC, de Ribeirão Preto-SP
e do Programa de Educação Continuada
e especialização em Direito GV/Law.



Artigo publicado na Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil nº 45 - Nov/Dez de 2011



RESUMO: Partindo da premissa de ter ocorrido, no casamento, ato ilícito que causou dano ao cônjuge inocente, a ordem jurídica dispõe de meios para compor os efeitos da ilicitude, realizando pela indenização pecuniária do dano emergente (déficit financeiro mensurável por simples cálculo devido a redução do patrimônio) a restauração econômica ou, quando houver dano moral, a compensação em dinheiro que visa contrabalançar os traumas da lesão.



PALAVRAS-CHAVE: Direito de Família. Rompimento de Noivado. Divórcio. União Estável. Obrigação de Indenizar.



SUMÁRIO: 1 Dano em Direito de Família. 2 Rompimento de Noivado. 3 Divórcio e União Estável: Obrigação de Indenizar em Caso de Dissolução dos Vínculos. 4 Responsabilidade pelas Violações dos Deveres de Guarda e Visitas.



1 Dano em Direito de Família



As pessoas se comportam das formas mais variadas, e essa diversificação de condutas cria os rótulos que classificam os seres humanos. Alguns são maus, egoístas e extremamente agressivos, enquanto outros, inclusive parentes próximos, são adeptos da paz e do respeito aos semelhantes. A sociedade não perdoa aos desagregadores e separa os seres imperfeitos dos que são considerados superiores, esses últimos os portadores de um senso ético exemplar, cuja vida é guiada por predicamentos morais insuspeitos. O ser superior que iniciar a leitura deste texto vai se perguntar como é possível cogitar de indenizar dano nas relações familiares, por ser inconcebível que isso ocorra dentro do lar, ponto físico do amor e do ambiente mais próximo da valorização da dignidade humana prevista no art. 1º, III, da Constituição Federal.



Lastimavelmente cabe responder que as ocorrências familiares desastrosas são frequentes, denunciando a depreciação do afeto e da convivência saudável que produz a felicidade, a mais prazerosa vantagem da existência. Os conflitos familiares são agudos e quase sempre inconciliáveis, mostrando que as rupturas modificam, para pior, a vida dos envolvidos. Exatamente em virtude desse efeito devastador é que cabe advertir não serem os juízes capazes de restaurar por completo as fissuras decorrentes do desamor, das hostilidades, das violências, embora possam, pelas sentenças emitidas graças ao instituto da responsabilidade civil, restaurar as avarias, aplicando os antídotos judiciais que prometem cicatrizar as feridas, devolvendo a estima própria que fortalece.



Não há responsabilidade civil quando não existe dano a ser reparado ou compensado. O prejuízo da vítima é a consequência concreta da nocividade da conduta alheia e representa o pressuposto objetivo do dever de indenizar, tanto que o art. 186 do CC estabelece que "aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que efetivamente moral, comete ato ilícito". A regra é completada pelo dispositivo que obriga o causador do dano a repará-lo (art. 927, caput, do CC) e, para fins de compreensão do nosso tema, estará quase sempre associada ao abuso de direito previsto no art. 187 do CC: "Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes".



Partindo da premissa de ter ocorrido, no casamento, ato ilícito que causou dano ao cônjuge inocente, a ordem jurídica dispõe de meios para compor os efeitos da ilicitude, realizando pela indenização pecuniária do dano emergente (déficit financeiro mensurável por simples cálculo devido a redução do patrimônio) a restauração econômica ou, quando houver dano moral, a compensação em dinheiro que visa contrabalançar os traumas da lesão. A ideia vitoriosa e extremamente benéfica é a de que, sendo impossível recuperar a desonra com dinheiro, ao menos se obrigue o infrator a pagar um valor que permita à vítima empregá-lo no consumo terapêutico das agruras da ilegalidade. É justamente o dano moral o ponto polêmico ou verdadeiro desafio jurídico da responsabilidade civil no direito de família, comportando, por isso, uma abordagem separada.



O dano moral, inicialmente previsto no art. 5º, V e X, da CF/88, se expandiu devido ao bom uso que dele se fez e hoje está capitulado no art. 186 do CC, bem como no art. 6º, VI, da Lei nº 8.078/90 (que, inclusive, introduziu os danos morais coletivos e difusos). Houve uma corrida desenfreada em busca de indenizações, o que é facilmente explicável pela incompreensão jurídica de uma temática reprimida pelo sistema jurídico e pela falsa ilusão do enriquecimento (pedidos milionários), movimentação que não cabe censurar pela utilidade resultante dos cortes das demandas frívolas que alimentam a indústria do dano moral. O filtro judiciário permitiu decotar a matéria e cunhar o princípio de que mero dissabor não se indeniza, base jurídica da certeza de que justifica compensar com dinheiro somente a lesão que provoca séria e grave perturbação (mesmo que anímica) do indivíduo e da pessoa jurídica (Súmula nº 227 do STJ).



Atingiu-se o clímax desse correto pensamento e, salvo raríssimas exceções, não se testemunham absurdos ou heresias na aplicação do instituto. O dano moral, quando concedido, chega apresentado em sentenças fundamentadas com lógica e razão jurídica, como é exigido pelo art. 93, IX, da CF, o que ocorre também nos arbitramentos, sempre lembrado como ponto vulnerável da providência. A indenização não possui o dom de enriquecer a vítima, servindo para contemporizar os malefícios do lesado e, por outro lado, não pode ser de tão alto valor que empobreça o infrator. Busca-se, e quase sempre é obtida, a medida equilibrada para fazer com que o bolso do infrator pese, fator de conscientização dos riscos econômicos de se tripudiar a lei.



O dano moral é apropriado para justas reivindicações das vítimas inocentes dos ilícitos e dos abusos perpetrados nas relações familiares, atendendo ao propósito de compensar lesões a direitos de personalidade, danos estéticos e perda de uma chance, o que não se confunde com a proibição de indenizar dano futuro ou remoto. Pode ocorrer que os pais, pelos maus-tratos impingidos ao filho menor ou adolescente, excedam na violência e provoquem nele mutilação ou algum outro tipo de incapacidade permanente para determinadas atividades físicas e profissionais, fato que interrompe uma carreira promissora que se iniciava e que tinha tudo para deslanchar (atleta profissional, atriz e modelo, musicista, etc.). Em se confirmando que a ilicitude familiar destruiu a chance real de um projeto de vida sustentável e plenamente realizável, é permitido que se indenizem os danos íntimos da frustração de um futuro perdido. Não se cuida de indenizar sonhos impossíveis, mas, sim, de compensar os danos dessa alteração da rota prevista e alcançável sem esforço extraordinário. Evidente que se ficar provado que a pessoa mutilada ou incapacitada conseguiu mudar a sorte, eliminando o previsível insucesso, não terá cabimento a indenização pela perda de uma chance, que é admitida apenas quando o ilícito esvazia a probabilidade verossímil da meta planejada, lançando a vítima em um caminho adverso e pontilhado de desacertos, mágoas, doenças psicossomáticas e um terrível isolamento social.



2 Rompimento de Noivado



O noivado é quase coisa do passado e poucos são os casais que vivem, de fato, essa fase antecedente ao matrimônio, marcada por forte aproximação deles. Os costumes foram se alterando e a etapa do comprometimento oficioso dos futuros cônjuges perdeu a importância e o glamour, até porque os interessados, com maior senso prático, preferem a experiência da coabitação provisória, antes da solenidade nupcial, como teste mais confiável de uma adaptação. Apesar de ser pouco festiva a inserção da aliança na mão direita, o fato é que o noivado continua tendo significado no direito civil, caracterizando um compromisso que vincula determinados interesses (tutela da confiança). Não é incomum que homens e mulheres recorram ao Judiciário com queixas sobre a ruptura abrupta e imotivada do noivado, reabrindo a controvérsia sobre cabimento de indenizações.



Evidente que a discussão cabe exclusivamente em hipóteses particulares, não servindo para as passionais e pueris brigas de namorados instáveis, como Nora Grey, que, em momento de fúria, desabafou não mais querer ouvir falar em namorados pelo restante da vida: "A única serventia que um namorado tinha era partir coração" (Crescendo, de Becca Fitzpatrick). O direito não possui remédio para curar as dores de um caso mal resolvido, ainda que a razão do desenlace surja como leviana aos olhos de terceiros. O que interessa para a ordem jurídica tem a ver com o desfazimento inexplicado do acordo celebrado para concluir a boda matrimonial, por arrependimento serôdio do noivo ou da noiva. Essa situação desestrutura um ato de vontade que saiu da esfera subjetiva e caminhou para a concretização pela habilitação do casamento iniciada ou concluída, com serviços contratados de buffet, vestido de noiva, salão da festa e da igreja. A reviravolta obriga, inclusive, a recolher os convites expedidos e espalhados, o que, sem dúvida alguma, constitui constrangimento extraordinário.



Ninguém pode ser compelido a contrair casamento compulsório. O art. 1.538 do CC admite que possa ser suspensa a solenidade do casamento pela recusa de consentimento, o que autoriza afirmar que cabe arrependimento até o instante decisivo de afirmar o famoso "sim, eu aceito". Nesse caso ou pela ausência do arrependido, haverá de ser justificada a negativa de subscrição do ato, sob pena de constituir abuso de direito (art. 187 do CC), tipificada clara situação de constrangimento social a justificar a indenização pecuniária para abrandar o drama daquele que é abandonado no altar. Isso porque o arrependimento, que se permite, não foi exercido de maneira razoável (com maior antecedência) ou de forma menos traumática para a outra parte interessada, residindo aí a figura do abuso do direito de recusar o consentimento para o ato.



A Quarta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça negou dano moral para a moça de Barretos, que pagou, com exclusividade, todos os gastos para a cerimônia, sendo surpreendida, menos de quinze dias da data do casamento, por um telefonema evasivo eliminando tudo. Houve um debate intenso na sessão de conferência de votos e, ao final, prevaleceu, contra a posição deste que escreve essas linhas, que cabia ao ex-noivo pagar somente metade das despesas adiantadas pela mulher. Entendi que não é lícito o arrependimento na antevéspera, por telefone e sem uma causa (sequer desamor o arrependido foi capaz de mencionar), quando ele, ao assinar a habilitação de casamento e consentir com todos os preparativos, conduziu a mulher a crer na oficialização. Também considerei equivocado, respeitado o entendimento dos meus ilustres colegas, repartir as despesas realizadas pela noiva, devido a constituir inadimplemento culposo do varão, que, com isso, responde pelos danos que a mulher suportou, inclusive porque não são aproveitáveis os produtos dos serviços contratados, sendo impensável cogitar de utilização do vestido de noiva para outro e incerto consórcio. Os presentes que os convivas ofertaram para os noivos serão devolvidos, nos termos do art. 546 do CC.



As posições divergentes revelam que se está longe de uma unanimidade e, evidentemente, somente as circunstâncias do caso concreto definem a existência de dano moral indenizável em prol daquele que suporta todo o peso do arrependimento tardio, sendo importantíssimo que o juiz conheça os detalhes da vida contemporânea da pessoa rejeitada, porque a repercussão é de maior ou de menor intensidade diante da publicidade e da importância social que se concede ao cerimonial frustrado. Uma festa de poucos convidados a ser realizada em uma grande capital terá o resultado adverso pouco comentado, o que repercute no aspecto da honra objetiva, enquanto, em uma cidade do interior, que cultiva a cerimônia como um acontecimento festivo socialmente valorizado, provoca humilhação maior a quem sobra o difícil mister de explicar o inexplicável para os amigos, parentes e conhecidos. Não é razoável considerar que uma confusão desse gênero cause mero dissabor e que obrigue a aceitar a ruptura como evento natural e previsível (risco da relação). Aceitar esse frágil argumento significa ignorar o estado de ânimo afetado da vítima (honra subjetiva), patrimônio moral tutelável.



3 Divórcio e União Estável: Obrigação de Indenizar em Caso de Dissolução dos Vínculos



A partir da EC nº 66/2010, alterando a redação do art. 226, § 6º, da CF (o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio), surgiram manifestações no sentido de ter sido banida a culpa como razão ou fundamento para dissolver casamentos. Esses comentários buscam sensibilizar os operadores jurídicos de ser o debate sobre a culpa um mal inútil, devido a ser possível alcançar, sem identificar culpados e estigmatizá-los, os mesmos resultados a que se chega sacrificando os infratores. Esse discurso charmoso não impressiona os destinatários (cônjuges inocentes), sendo que eles, nem sempre movidos por revanchismo ou outro sentimento vil, procuram, nas entranhas dos ordenamentos, os textos que definem as garantias de seus direitos, diante da falência matrimonial derivada de conduta desonrosa.



O divórcio desburocratizado é uma realidade que chegou em bom momento, preenchendo um vazio produtor de instabilidades sociais. Todos perseguem um relacionamento duradouro e completo em termos de satisfações conjuntas e nem sempre conseguem, o que é bem compreensível diante das dificuldades com os desafios da rotina, a qual enfraquece o mais nobre e vigoroso dos sentimentos. Os divórcios são celebrados quase na mesma proporção em que os casamentos se realizam, o que prova que a dissolução do vínculo não é encarada como problema, mas, sim, solução por abrir, pelo desatar dos laços, oportunidades para novos relacionamentos. Porém, facilitar o divórcio não significa dizer que os abusos e as ilicitudes dos cônjuges estão liberados, como se o mais importante para a família passasse, doravante, a ser o instituto do divórcio vazio ou cheio de vilipêndios.



Todo o cônjuge que se sentir traído ou ofendido por condutas consideradas desonrosas (art. 5º, caput, da Lei nº 6.515/77 e art. 1.573 do CC) poderá exigir que o juiz decrete o divórcio com reconhecimento e declaração da culpa, e não há motivo plausível para que se decomponha esse processo, como está sendo advogado pelos doutrinadores que, adeptos da solução dinâmica para o divórcio, consideram que o cônjuge deverá ajuizar duas ações distintas, sendo uma para obter o divórcio e outra para discutir a culpa como objeto de regulamentação dos alimentos e de direitos que versem o nome. O ideal é concentrar, unificar e economizar procedimentos para celeridade, o que se obtém eliminando ações paralelas que só dificultam a marcha em frente do processo civil e, por isso, considero que o juiz deve admitir que se promova a ação de divórcio, com denúncia de violação dos deveres do casamento, em um só libelo, lembrando que, para o caso de urgência da dissolução, nada obsta que se antecipe a sentença (art. 273 do CPC), de modo a resguardar as faculdades civis dos litigantes. Não é razoável obrigar o cônjuge a protocolizar duas petições, sendo uma para obter o divórcio e outra para alimentos por ser inocente e dependente econômico (art. 1.694 do CC).



A obrigação de indenizar decorre da violação dos deveres do casamento e dos efeitos do ato lesivo. O casamento não exonera ninguém do dever fundamental de não lesar outrem, e não é possível entender que a ofensa física praticada fora do lar produz o dever de indenizar, enquanto a mesma atitude ofensiva cometida no recesso do lar não o faz. Isso é absurdo e convém apenas admitir que talvez exista uma certa dificuldade em provar a ilicitude, como reclama o art. 333, I, do CPC, sabido que a responsabilidade por ofensas físicas ou verbais é de ordem subjetiva. Portanto e que não paire dúvida: a responsabilidade civil estendeu o seu manto protetor para as relações de família e deve atuar prontamente para reparar o dano injusto.



O cônjuge prejudicado deverá ajuizar ação de indenização concomitante com o divórcio ou separação, e adianto minha discordância sobre a afirmação de não existir mais o instituto da separação judicial ou consensual. Essa é outra interpretação que precisa ser analisada com cautela, visto que os cônjuges poderão optar pela separação e não o divórcio, e não cabe ao juiz intervir para determinar o que é melhor para eles, sabido que o art. 1.513 do CC estabelece que ser "defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família". Tenho ouvido de colegas que a separação não produz resultado útil, o que explicaria indeferimento e extinção de tal processo se os postulantes não optassem pelo divórcio, e fico imaginando como é possível decidir contra a vontade dos cônjuges que estão pedindo que se homologue a separação do casamento e não que se dissolva o casamento pelo divórcio. Imagino que, se a moda pega, logo devemos aceitar que o juiz designado para resolver incidentes da habilitação de casamentos aja, de ofício, indeferindo as propostas matrimoniais para mandar todos viverem em união estável, apenas por entender que a informalidade da vida em comum é mais vantajosa.



Retornando ao ponto anterior (necessidade de ser ajuizada ação de reparação civil em ação autônoma e concomitante ao pedido de separação ou divórcio), é essa exigência uma questão de interesse moral do pedido (art. 267, VI, do CPC). Não é possível que o cônjuge que reclama indenização do outro, pela violação dos deveres matrimoniais, continue casado ou coabitando com o infrator, por ser incoerente esse estado de coisas. O direito de indenização decorre da ofensa que motiva o divórcio e a separação litigiosa, sendo uma consequência que se postula em ação autônoma pela diversidade do enfoque jurídico do pedido principal. A competência é do juízo da vara de família, por ser ação decorrente da relação matrimonial, existindo conexidade que justifica o apensamento para, eventualmente, proporcionar decisões conjuntas (art. 106 do CPC).



A experiência judiciária permite afirmar que existem decisões favoráveis sobre indenização de dano moral para mulheres agredidas por maridos violentos, sabido que a ofensa à integridade física, a par de tipificar o crime definido no art. 129 do CP, constitui lesão ao direito de personalidade (ofensa à saúde), acrescentando que, se da ofensa resultar aleijão ou incapacidade, caberá indenização por dano estético e indenização pela incapacidade profissional (arts. 949 e 950 do CC). Ofensas verbais que não se imunizam pela retorsão imediata e racional são, igualmente, humilhantes e vexam os ofendidos, notadamente se forem expelidas em público e acompanhadas de afirmações injuriosas de conotação sexual que afrontem os sentidos da intimidade (art. 5º, V e X, da CF).



Os anais de jurisprudência informam que o segredo da gravidez adulterina revelado após longos anos de fraude da paternidade biológica conspurca o juramento de fidelidade e desonra o traído que, por anos, é mantido no erro, justificando deferir a ele a indenização por dano moral a ser paga pela mulher, sem prejuízo de revogação do reconhecimento de paternidade, caso não seja possível mantê-lo diante da paternidade socioafetiva. Relatei um caso horrível em que se admitiu a indenização por dano moral pelo fato de o marido já de idade avançada, ter abusado sexualmente do próprio neto, quando a Turma Julgadora considerou que a descoberta de uma perversão dessa índole, do homem que dividia a sua cama, causa uma indignação para a mulher capaz de perturbá-la para sempre. Também em outra ocasião subscrevi voto condutor de acórdão que estabeleceu o dever de pagar dano moral para a esposa que foi contaminada por doença sexualmente transmissível (sífilis e clamídia), tendo o varão admitido ter contraído a doença em coito praticado, sem preservativos, com prostituta de rua.



O emblemático nesse terreno diz respeito ao adultério. A fidelidade é dever do casamento e da união estável, sendo que a inobservância do compromisso gera a crise própria do que seria, para muitos, erro fatal e imperdoável. O adultério, que consiste em manter vida sexual com outro, enquanto coabita pelo casamento, nunca será abonado juridicamente, salvo quando se provar que o adúltero foi encaminhado para o deslize pelo cônjuge que se diz vítima da traição, o que é raro (e não impossível) de se verificar. Contudo e ainda que sobrem razões íntimas que o infrator suscite para justificar seu comportamento, o fato é que, enquanto persistir a vida em comum, não lhe é facultado transgredir o voto de confiança que estrutura a coabitação regular e socialmente produtiva. Assim e embora o adultério constitua a causa eficiente para decretar o fim anormal do casamento, não há uniformidade quanto a constituir tal infração uma fonte objetiva do dever de indenizar.



O adultério possui graduações pelas maneiras como se concretiza, embora o resultado destrutivo para a relação seja sempre agudo. Porém, e isso obriga refletir, nem sempre o adultério é tornado público ou de conhecimento de terceiros e, por vezes, tanto homem e mulher agem com discrição e poupam os cônjuges das adversidades e maledicências. Ainda que constitua quebra do dever de fidelidade, não há ofensa à honra, reputação, imagem do outro e, por isso, não cabe indenização por dano moral (art. 5º, V e X, da CF). Também não é permitido ignorar ser o adultério o fim da linha de um programa continuado de ofensas recíprocas, constituindo o ato derradeiro de uma batalha de vida infeliz, cujo grau de desinteligência e hostilidade foi animado pela mútua intransigência e revanchismo dos cônjuges. Nesse clima de irracionalidade em que a razão permanece obscura na névoa da beligerância recíproca, não soa razoável condenar o adúltero pela sexualidade alternativa que, nesse contexto de tudo errado, constitui, no aspecto dano moral, pecado venial.



Fui voto vencido em acórdão muito comentado e continuo convicto de que, naquela hipótese, o adultério que o marido praticou com a mulher que se imiscuiu na vida do casal como sendo a melhor amiga da esposa traída, justificava a incidência do art. 5º, V e X, da CF. Isso porque não foram somente as sessões de adultério na própria residência do casal que agravaram o quadro, mas, sim, a maneira como os amantes assumiram o caso, pois, de abrupto e sem qualquer comunicação, empreenderam fuga, permanecendo a esposa sem qualquer fonte de subsistência, com o encargo de criar dois filhos, o que foi desastroso, pelo menos em relação a um deles (viciou-se em drogas ilícitas). Sempre que o adultério for praticado de maneira a causar um mal maior do que perturbação do amor e confiança traídos, cabe conceder o dano moral que compense o trauma externo que resulta dessa violação.



O que se escreveu para o divórcio incide para a união estável, que é, como diz o art. 226, § 3º, da CF, entidade familiar. Quem vive em união estável não se matrimonia por pura opção, embora carregue, no espírito, os mesmos ideais da vida em comum, especialmente a obrigação de lealdade que prolonga e dá estabilidade ao convívio, sem o que não resiste aos sólidos fundamentos de projeto familiar (art. 1.723 do CC). Existe um diferencial nos dois organismos (casamento e união estável) digno de meditação quando em pauta a responsabilidade civil, e estou me referindo ao modo de dissolução. É possível especular que os interessados possam ser tomados da falsa impressão gerada pela ausência de papéis assinados para regularizar a junção de corpos, de ser permitido dispensar o companheiro, quando constatada a insuportabilidade da vida em comum, sem os cuidados com os direitos fundamentais do ser humano, o que constitui ilícito civil. Há, pois, evidente abuso de direito em desalojar o parceiro em condições adversas e por meio de ações que provocam vexame, humilhações e constrangimentos, lembrando sempre que o dano moral existe para compor lesões ao direito da personalidade e ofensas contra as graves desumanidades que não se admitem sequer quando o descontrole explode pelas contendas sentimentais.



4 Responsabilidade pelas Violações dos Deveres de Guarda e Visitas



Os adultos resolvem suas pendências, e os filhos menores, quase sempre, são os que sofrem as piores consequências da quebra da affectio maritalis. Isso invariavelmente ocorre ainda que concorram justas razões para o divórcio, sabido que as crianças sempre desejam que os pais continuem unidos, como se a presença deles fortalecesse o próprio abrigo e sua vida, o que é bem compreensível. O fato é que uma vez decidido pelo término da relação, é necessário dar atenção aos filhos menores, na tentativa de amenizar os impactos do vazio que se abre com a divisão de moradias dos pais.



Infelizmente os casais separados não fazem bom uso da guarda compartilhada (art. 1.584 do CC). Existe uma predileção pela unilateralidade da guarda, que, por vocação instintiva, é deferida para a mãe da criança, e logo surgem as desavenças derivadas das infantis intransigências no exercício do direito de visita (art. 1.589 do CC), mormente quando alguém assume o novo amor. As acusações se proliferam, e o juiz tenta, sem sucesso, a conciliação, revelando os processos que chegam ao Tribunal que o clima entre os divorciados e companheiros separados atinge uma escala de irracionalidade e de violência física e verbal totalmente prejudicial ao desenvolvimento psíquico da pobre criaturinha entrincheirada nas proposições radicalizadas dos pais. E fica pior quando é verificado que os avós entram na disputa para agravar a discórdia familiar.



A guarda compartilhada evitaria todo esse imbróglio e constituiria uma passagem inofensiva da transição a ser superada na adaptação dos filhos menores às vidas separadas dos pais, desde que a eles fossem oferecidas condições propícias. Os cônjuges e companheiros ainda não tomaram consciência de que o sistema jurídico foi alterado nesse segmento exatamente para proteger os menores dos desmandos cometidos por mágoas e ressentimentos amorosos, sendo necessário advertir que não se valorizaram os aspectos propedêuticos das sanções impostas pelo descumprimento (§§ 4º e 5º do art. 1.584 do CC). O juiz deve agir com firmeza para impedir que a alienação parental se transforme na síndrome que inferniza a vida das crianças, não só estabelecendo diretrizes e metas para que as visitas se façam sem martírios, como reduzindo prerrogativas tanto do guardador como do visitador. Não se descarta inverter a titularidade da guarda quando se verifica a inaptidão do escolhido, sendo de bom alvitre que se nomeie parente próximo para o mister quando os pais forem ineptos para o bom termo. A criança tem o direito preponderante, e todas as incursões necessárias para que seus interesses fiquem garantidos serão realizadas, ainda que para isso seja preciso afastá-las da convivência dos pais irresponsáveis e levianos.



Os filhos que não recebem as visitas dos pais, apesar de ter sido regulamentado esse direito, são titulares do direito indenizatório? Em se verificando que a ausência do visitador é repetida de forma inconsequente (sem as razões para a falta), essa conduta poderá ganhar status de ilicitude, em se verificando que o menor a ser visitado sofre demasiadamente com o descaso paterno ou materno, como, por exemplo, seguidas decepções angustiadas pela espera inútil, após ansiosa preparação para o encontro. Independente de caracterizar abandono afetivo, o visitador que não avisa dos desencontros ou da impossibilidade de comparecimento, gerando uma expectativa que se transforma em sentimento ruim pela frustração, deverá ser compelido a pagar uma multa (astreinte) para eliminar o mau vezo que depõe contra valores morais do filho repudiado. A aplicação da pena prevista no art. 461, § 5º, do CPC poderá ser imposta de ofício pelo juiz que se preocupa com o exato cumprimento dos acordos que envolvem filhos menores. Caso não se altere o proceder, poderá o filho exigir uma indenização pela humilhação do descumprimento.



É boa a discussão sobre a utilidade da indenização que se manda pagar em caso de recusa ao cumprimento do direito de visita, porque não irá auxiliar o propósito de aproximar pai e filho distanciados. Concorda-se que a solução indenizatória não contribui em nada para abrandar corações duros ou frios e nunca foi estímulo para o desabrochar de sentimentos ocultos ou adormecidos, o que não significa que tenha de ser descartada, pois se as multas não persuadiram o infrator e não existe a menor perspectiva de mudança saudável dos hábitos egocêntricos, a indenização aparece como benefício a uma vítima que não conta com outra opção para remediar o mal sofrido. A compensação financeira, no contexto, representaria um antídoto para a rejeição que atormenta, servindo para que a criança obtenha, com os privilégios financeiros, satisfações materiais que poderão contemporizar a dor experimentada. Não se está, com tal veredicto, condenando o pai pelo desamor, mas, sim, pelos efeitos do procedimento omisso que causa constrangimento, sofrimento, dor e vergonha (dano moral subjetivo).



Certa vez e durante conferência jurídica organizada pela AASP, fui indagado sobre eventual responsabilidade civil do sujeito que exerce a guarda e que coloca obstáculos e dificuldades ao direito de visita. Esclareci que tudo dependeria das provas sobre os episódios e dos resultados adversos dessa política insana. Não se permite que o visitador fique acomodado diante dessas ocorrências, sob pena de perder a legitimidade quanto ao direito de reivindicar direitos pela frustração do convívio, pois quem não reclama e exige respeito está sinalizando que se contentou com a situação, fato que elimina o dano indenizável. Portanto, provado que o visitador não consegue conectar-se com o filho por uma inadimplência incontrolada do titular da guarda, poderá, sim, ser exigida uma indenização pelo sofrimento e angústia que daí derivam. O filho que descobre ter perdido o amor filial pelo comportamento imprudente de quem detinha a guarda, é, igualmente, titular do direito indenizatório, patente o nexo de causalidade (art. 403 do CC) dessa ilicitude com o dano íntimo do tempo perdido ou do sentimento que não mais se resgatará.



O abandono afetivo continua presente na pauta dos debates, apesar do precedente isolado do colendo STJ, negando indenização pleiteada por um filho que se disse repudiado pelo pai, quando foi explicado que o desamor não é indenizado. Ocorre que há um equívoco na inserção desse fundamento, pois o motivo da pretensão ressarcitória não está calcado na exclusão do afeto, mas, sim, pelo não cumprimento dos deveres paternais previstos no art. 227 da CF. Não basta pagar alimentos para ser pai presente, pois a ordem jurídica exige mais, embora não chegue ao extremo de obrigar que o pai ame o filho. O que se obriga é que se respeite o ser humano que cresce, dedicando a atenção e o cuidado básicos para que o desenvolvimento da personalidade ocorra naturalmente pelo avançar cronológico. Ninguém poderá forçar um pai ou mãe a permanecer em contato vinte e quatro horas ou todos os dias do ano, sabido que as particularidades individuais justificam formas variadas para cumprimento da solidariedade familiar. O que não se admite é o completo isolamento ou a total indiferença, como se o filho não existisse ou que representasse um estranho indigno da atenção moral que se deve dedicar a um desconhecido (ou até aos bichos), porque esse comportamento configura um desprezo a quem, por razões de família, não pode ser ignorado.



Os juízes criaram uma jurisprudência formidável para restaurar os efeitos do abalo de crédito, porque sensíveis ao drama do sujeito que sofre uma inscrição indevida nos órgãos que cadastram devedores inadimplentes. Para essas vítimas da retração da confiança dos lojistas e banqueiros, que não mais fiam crediário para quem figura em listas emitidas pelo Serasa, SPC e outros, os magistrados concedem indenizações de valores variados e não há o que controverter sobre o acerto de tais julgamentos, pois comete ilícito e dano indenizável quem, indevidamente, coloca o sujeito em situação constrangedora. Ocorre que essa mesma justiça que aplica bem os pressupostos da responsabilidade civil para os cadastros indevidos nega a indenização para os filhos rejeitados e que sofrem pela indiferença e abandono dos pais. Inusitado paradoxo.



É difícil sustentar que filhos merecem abandono. Normalmente são eles atingidos em tenra idade, com a inocência purificada, e não há como atribuir a eles algum erro ou culpa. Poderá, em casos de filhos adolescentes, existir alguma rota de colisão que possa justificar um distanciamento e, salvo essas graves e extraordinárias hipóteses, o abandonador não poderá jamais culpar o filho ou quem detém a guarda para justificar a sua falta. Enjeitar o filho contrasta com o dever do pai de subsidiar o crescimento sereno da criança ou do adolescente e, se ficar demonstrado que essa negligente conduta causou um distúrbio psíquico que representou um ponto no somatório de efeitos ruins de um estigma imerecido, cabe indenização que tem como referência os arts. 5º, V e X, 1º, III, e 227, todos da CF c/c o art. 186 do CC.



Não custa lembrar que a indenização por abandono afetivo depende da prova do dano a ser compensado, que tanto poderá consistir no lado subjetivo (sofrimento, angústia, baixa estima, introversão, depressão, etc.) ou no aspecto objetivo (repercussão dos deslizes e desmandos na órbita social do abandonado, como ausência nas festas, solenidades, dias especiais comemorativos, etc.), o que reclama cuidado na confirmação do nexo de causalidade entre o abandono e os prejuízos citados. A Quarta Câmara de Direito Privado negou indenização a uma moça que se dizia (e foi) abandonada pelo pai, porque as provas demonstraram que, apesar da ausência paterna, o desenvolvimento psíquico foi regular e normal, tendo ela se transformado em adulto bem resolvido, obtendo graduação em Direito, com imediata aprovação na OAB e perfeita socialização. A conclusão foi a de que não se provou o dano indenizável.



A indenização por abandono afetivo não é uma resposta tardia para o descaso e a desumanidade familiar, como se fosse uma arma que se detona para arrancar da alma a revolta de uma infância ou adolescência que poderia ser mais feliz. A indenização é eficaz para o caso de confirmação do prejuízo decorrente da ilicitude, pelo não cumprimento dos deveres fundamentais dos pais, servindo para consolar o infeliz, permitindo que o dinheiro proporcione o mínimo que lhe foi negado pelo infortúnio da paternidade irresponsável. O lesado é titular do mesmo direito que a jurisprudência assegura aos destinatários do dano moral, como o sujeito que tem seu nome inscrito nas listas de devedores inadimplentes.



TITLE: Family Law and liability.



ABSTRACT: Assuming that have occurred in marriage, tort which caused damage to the innocent spouse, the law provides means for composing the effects of illegality, making the monetary compensation of actual damages (financial loss measurable by simple calculation due to reduction of assets) or the economic revival, when there is wounded feelings, which seeks compensation in cash in order to minimize the trauma of the injury.



KEYWORDS: Family Law. Disruption of Engagement. Divorce. Stable Union. Obligation to Indemnify.


Testemunha não é suspeita por mover ação idêntica contra mesma empresa

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